Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01570/04
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/13/2005
Relator:Dulce Neto
Descritores:REGIME SIMPLIFICADO DETERMINAÇÃO LUCRO TRIBUTÁVEL
INTIMAÇÃO PARA COMPORTAMENTO
IRC
Sumário:1. Segundo o art. 53º do CIRC, introduzido pela Lei nº 30-G/2000, de 29.12, são automaticamente abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos cujo volume total de proveitos, no exercício anterior, seja inferior a 149.639,37€, a menos que expressamente optem por regime geral.
2. Porque quando se inicia actividade não há exercício anterior que possa ser tomado por referência, há que considerar nesse exercício inicial o montante anual de proveitos estimado constante da declaração de início de actividade, mas se face ao volume de proveitos posteriormente declarado relativamente a esse exercício, ocorrerem os requisitos para a inclusão no regime simplificado, há que aplicar este regime.
3. Os sujeitos passivos que ficam sujeitos ao regime simplificado podem optar pelo regime geral, devendo, para o efeito, fazê-lo na declaração de início de actividade ou em declaração de alterações a apresentar até ao fim do 3º mês do período de tributação do início de aplicação do regime.
4. Uma vez efectuada a opção pelo regime geral, a mesma é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se for renovada nos termos e prazos referidos nos nºs 8 e 9 do art. 53º do CIRC.
5. A inclusão automática no regime geral não se encontra sujeita a essa regra de validade, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

S .., Ldª recorre da sentença que julgou improcedente a acção para intimação para um comportamento que instaurara contra a Administração Tributária, com vista a obter a sua reintegração no regime geral de determinação do lucro tributável relativamente ao exercício de 2003 e a aceitação da declaração de rendimentos Mod. 22 de IRC relativa a esse exercício.
Rematou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
A. No artigo 53º do Código do IRC, concretamente nos seus números 1, 2 e 3, prevê-se a possibilidade dos contribuintes em geral, sem qualquer excepção, formalizarem a sua opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável na declaração de início de actividade ou de inscrição no registo;
B. Essa opção, nos termos do nº 8 do mesmo artigo, é válida por um período de três exercícios e permite renovação.
C. A declaração de início de actividade é, nos termos do artigo 109º nº 2 do Código do IRC, de modelo oficial, aprovado por despacho do Ministro das Finanças e publicado através de Portaria desse Ministério;
D. Verificando-se que o modelo oficial nº 1698 de declaração de início de actividade não permite à generalidade dos contribuintes a formalização da opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável, contrariamente ao que decorre do artigo 53º do Código de IRC, há violação do princípio da legalidade e da igualdade;
E. Verificando-se que, no caso em apreço, a recorrente foi impedida de formalizar a sua opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável na declaração de início de actividade do modelo nº 1698, pelo facto de nela ter estimado um valor total anual de proveitos superior a 149.639,37 €, ficando, em face da forma como se encontra elaborada aquela declaração, automaticamente excluído do regime simplificado, impedida preencher o quadro 19 dessa declaração e enquadrada, pelos Serviços da Administração Tributária que recepcionaram a declaração, no regime geral de determinação do lucro tributável, por remissão expressa para o nº 2 do artigo 53º do Código do IRC, não pode deixar de reconhecer-se esse enquadramento como válido pelo período de três exercícios e, em consequência ilegítima a recusa da Administração Tributária em recepcionar a declaração modelo 22 do IRC do exercício de 2003 com inclusão naquele regime;
F. Deve, ademais, ser a Administração Tributária intimada a reintegrar o direito violado, adoptando as condutas necessárias a esse efeito, nos termos previstos no artigo 147º do CPPT;
G. Ao decidir em sentido contrário, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, violando o disposto no art. 53º do Código do IRC, motivo por que deve ser revogada.

* * *
A recorrida Direcção Geral dos Impostos apresentou contra-alegações para defender a correcção do julgado e o improvimento do recurso.
O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso por sufragar o entendimento e a fundamentação constante da sentença recorrida.
Com dispensa dos legais vistos (art. 707º nº 2 do CPC), cumpre decidir.
* * *

Na sentença recorrida julgou-se provada a seguinte matéria de facto, que aqui se deixa submetida a alíneas da nossa iniciativa:
A- A A., em 10 de Maio de 2002, entregou a declaração de início de actividade, modelo 1698, reportada a 29 de 04 de 2002, onde inscreveu, no quadro 9, a previsão de 100.000 € de proveitos para os sete meses seguintes de 2002 e de 150.000 € anuais;
B- A A. não optou, nessa declaração, pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável;
C- No quadro 10 dessa declaração, os Serviços Tributários assinalaram o enquadramento da A. no regime geral de determinação do lucro tributável;
D- Verificou-se que no exercício de 2002 em que iniciou a sua actividade, contrariamente ao previsto, apenas obteve de proveitos um montante total de 25.777,95 € ;
E- Ao apresentar a declaração modelo 22 de imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas, via Internet, para o exercício de 2003, foi a mesma recusada com indicação de a A. estar enquadrada no regime simplificado de determinação do lucro tributável;
F- A A. foi convidada em Maio de 2004 a apresentar, em 30 dias, nova declaração;
G- A A. apresentou nova declaração em 18 de Maio de 2004, que foi novamente recusada, pelo mesmo erro em Junho de 2004;
H- O presente processo foi instaurado em 29 de Julho de 2004.

* * *
A questão colocada nos presentes autos prende-se com o enquadramento da Autora no regime de determinação do lucro tributável, sabido que ela fora inicialmente, aquando da apresentação da declaração de início de actividade, em 2002, enquadrada no regime geral e que posteriormente, durante 2003, a Administração Tributária procedeu à alteração desse enquadramento para o regime simplificado, o que a Autora contesta, visando com a presente acção intimar a AT a reintegrá-la no regime geral.
Na tese da Autora, dado que na declaração de início de actividade não optou por qualquer regime mas indicou a quantia de 150.000 € como estimado volume anual de vendas, tinha de ser enquadrada, como o foi inicialmente, no regime geral, já que por força do art. 53º nº 2 do CIRC os sujeitos passivos que nessa declaração declararem proveitos estimados superiores a 149.639,37 € ficam automaticamente enquadrados no regime geral, sem necessidade de fazerem qualquer opção. E porque tal enquadramento é válido por um período de três exercícios, de harmonia com o disposto nos nºs 8 e 9 do mesmo art. 53º, não podia a AT ter alterado, como alterou, esse enquadramento no exercício de 2003.

Segundo o entendimento vertido na sentença recorrida (e que acolhe a tese da AT sobre a questão), apesar de a Autora ter estimado, na declaração de início de actividade, um volume anual de vendas de 150.000 € para o exercício de 2002, o certo é que o volume total de proveitos que efectivamente veio a ser declarado em 2002 (e que substitui a quantia estimada) era inferior aquele valor, o que nos termos do artigo 53º nº 2 do CIRC obrigou ao seu enquadramento no regime simplificado, pois que ela expressamente não optou - nem inicialmente, na declaração de início de actividade, nem posteriormente, na declaração de alteração prevista nos arts. 110º e 111º do CIRC - pelo regime geral.
Assim, face ao volume de proveitos declarados e dada a falta de expressa opção pelo regime geral, julgou-se legal a actuação da AT de alterar para o regime simplificado a determinação do lucro tributável da autora, regime esse que lhe é automaticamente aplicável por um período de três exercícios, assim improcedendo a pretensão da Autora de intimar a AT para que a reintegrasse no regime geral relativamente ao exercício de 2003.

Apesar de a Autora se insurgir, neste recurso, contra tal entendimento, insistindo na tese por si sufragada e invocando a impossibilidade de formalização dessa opção em virtude de a declaração de início de actividade não permitir fazer esse opção relativamente aos sujeitos passivos que automaticamente ficaram enquadrados nesse regime geral, com o que se teria violado o princípio da legalidade e da igualdade, não cremos que lhe assista razão.
Vejamos.
O artigo 53º do CIRC, introduzido pela Lei nº 30-G/2000, de 29.12, instituiu o regime simplificado de apuramento do lucro tributável, quer para rendimentos empresariais ou equiparados de pessoas singulares, quer para os rendimentos das pessoas colectivas. Para os sujeitos passivos de IRC, o enquadramento nesse regime simplificado verifica-se quando se encontrem reunidas cumulativamente as seguintes condições:
a)- exerçam, a título principal, actividade comercial, industrial ou agrícola;
b)- não estejam isentos de IRC;
c)- não se encontrem sujeitos à revisão legal de contas;
d)- apresentem, no exercício anterior, um volume total de proveitos inferior a 149.639,37 €;
e)- não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável.

Assim, da leitura do referido preceito resulta que são automaticamente abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos cujo volume total de proveitos, no exercício anterior, seja inferior a 149.639,37€, a menos que expressamente optem por regime diferente, caso em que aquele deixa de ter aplicação automática. Mas porque quando se inicia actividade não há exercício anterior que possa ser tomado por referência, há que considerar nesse exercício inicial o montante anual de proveitos estimado constante da declaração de início de actividade.
Todavia, os sujeitos passivos que à luz dos aludidos critérios fiquem sujeitos ao regime simplificado podem optar pelo regime geral, devendo, para o efeito, fazê-lo na declaração de início de actividade, ou em declaração de alterações a apresentar até ao fim do 3º mês do período de tributação do início de aplicação do regime. Uma vez efectuada essa opção, a mesma é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se for renovada nos termos e prazos referidos nos nºs 8 e 9 do art. 53º do CIRC.
Donde decorre que só quando há uma expressa opção pelo regime geral este se mantém válido por um período de três exercícios, susceptível de renovação, e que a inclusão automática no regime geral não se encontra sujeita àquela regra de validade por três exercícios, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.

No caso vertente, a recorrente indicou na sua declaração de início de actividade, apresentada em 2002, um volume anual de vendas estimado em 150.000 €, pelo que foi automaticamente enquadrada no regime geral relativamente a esse exercício.
Porém, em 2003 a AT apurou que nesse exercício de 2002 a recorrente declarara proveitos no montante total de 25.777,95 €, valor este muito aquém do mínimo da previsão legal para não ser englobada no regime simplificado, o que determinou o seu automático enquadramento nesse regime simplificado dado que não veio expressar a sua opção pelo regime geral.
Daí que não mereça qualquer censura a actuação da AT, porquanto, no estrito cumprimento da lei a que se encontra vinculada, procedeu em 2003 ao enquadramento automático da recorrente no regime simplificado de tributação.
Face ao volume de proveitos declarado relativamente a 2002, e que a fazia abranger automaticamente pelo regime simplificado, a recorrente, se não pretendia ficar sujeita a tal regime, devia ter apresentado declaração de alteração para exercer a opção pelo regime geral, de harmonia com o disposto no nº 7 do art. 53º do CIRC.
Com efeito, no art. 53º do CIRC, concretamente nos seus números 1, 2 e 3, prevê-se a possibilidade de os contribuintes formalizarem a sua opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável na declaração de início de actividade (modelo nº 1698), opção que logo aí deve ser expressada (no quadro 19) se já nessa altura se encontrarem preenchidos os pressupostos de inclusão no regime simplificado.
No caso da recorrente, como do teor da sua declaração de início de actividade resultava a sua inclusão automática no regime geral (face ao volume estimado de vendas) não se tornava necessário que fizesse logo a opção pelo regime geral, opção que aí só se mostra configurada para os casos em que já nessa altura se mostram reunidos todos os pressupostos para a inclusão no regime simplificado.
Nestas situações, a opção deve ser exercida logo que ocorram os pressupostos para a inclusão no regime simplificado, o que no caso da recorrente ocorreu em 2003 quando declarou um volume de proveitos inferior a 149.639,37€, pelo que tinha a obrigação de apresentar a declaração de alteração (para opção pelo regime geral) até ao fim do 3º mês do período de tributação do início de aplicação do regime simplificado.
Não o tendo feito, e verificando-se os requisitos de enquadramento no regime simplificado, foi o mesmo aplicado automaticamente por um período de três exercícios, regime que só pode cessar após o decurso desse período mínimo de permanência e caso a recorrente impeça a sua renovação pela apresentação de opção pelo regime geral (assim como cessa se for ultrapassado o limite de volume total de proveitos em dois exercícios consecutivos, ou num só exercício em montante superior a 25% desse limite, ou ainda se deixarem de ocorrer os demais requisitos de que depende a aplicação do regime).
Do exposto resulta que, contrariamente ao defendido pela recorrente, esta não foi impedida de formalizar a sua opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável, nem ocorre qualquer motivo legal que permita a aplicabilidade desse regime ao exercício de 2003.
Se é verdade que a forma como se encontra elaborada e redigida a declaração de início de actividade (modelo nº 1698) só parece permitir fazer logo aí a opção pelo regime geral no caso de estarem reunidos os pressupostos para a aplicação do regime simplificado - o que é perfeitamente compreensível e legal, pois que só nesse caso se impõe saber se o sujeito passivo prefere outro regime - nada impediu a recorrente de apresentar declaração de alteração de regime quando ocorreram os pressupostos para a inclusão automática no regime simplificado, aí assinalando a sua opção pelo regime geral, pelo que não procede a sua argumentação sobre a impossibilidade de formalização dessa opção e sobre a violação do princípio da legalidade e da igualdade.
Termos em que improcedem todas as conclusões de recurso, sendo de manter a sentença recorrida.

* * *

Nestes termos, acorda-se em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3 UC.
Porto, 13 de Janeiro de 2005
Dulce Manuel Conceição Neto
José Maria Fonseca Carvalho
João António Valente Torrão