Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00028/03 - PORTO
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/10/2008
Relator:Fernanda Brandão
Descritores:NOTIFICAÇÃO PESSOAS COLECTIVAS E SOCIEDADES - PRAZO DE CADUCIDADE - IMPUGNAÇÃO
Sumário:I-A notificação das pessoas colectivas e sociedades apenas pode realizar-se na pessoa de qualquer empregado quando, de acordo com o nº 2 do artº 41º do CPPT, não possa efectuar-se na pessoa do representante por este não ser encontrado.
II-Não é válida e eficaz a notificação da liquidação de uma sociedade na pessoa de um terceiro, que não faça parte do quadro da empresa; tratando-se de um profissional liberal e trabalhador independente, que não um empregado daquela, não cabe na previsão do artº 41º do CPPT.
III-Este preceito determina as pessoas em quem pode ser feita a notificação, (tanto no caso da notificação postal como no caso da citação pessoal).
IV-A liquidação efectuada dentro do prazo de caducidade do respectivo direito, mas não notificada durante o seu curso, entretanto findo, é ilegal e não meramente ineficaz, sendo a ilegalidade insusceptível de servir de fundamento de oposição à execução fiscal.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
A exma. representante da Fazenda Pública veio recorrer da sentença proferida pela senhora juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial contra o acto de liquidação adicional em sede de IRC relativo ao exercício de 1998 no valor de € 9.647,21.
Nas alegações concluiu o seguinte:
1.Não se conforma a Fazenda Pública com a decisão que foi no sentido da procedência da impugnação contra a liquidação adicional de IRC e juros compensatórios referente ao exercício de 1998, por haver concluído ter caducado o direito à liquidação do imposto, dado não se poder considerar “efectuada a notificação da liquidação dentro do prazo fixado no art° 45° da LGT (por não ser válida e eficaz a notificação da liquidação na pessoa do técnico de contas e não tendo resultado provado que a impugnante teve conhecimento da liquidação até 31/12/2002).”
2.A notificação da impugnante, mediante mandado, na pessoa do seu técnico de contas, efectuada em 10/12/2002, foi uma notificação pessoal, admitida quer pelo art° 41°, nº 2, do CPPT, quer pelo art° 233°, n°s 1 e 4 do CPC, aplicável ao processo tributário ex vi da alínea e) do art° 2° do CPPT.
3.Se a lei admite, nos termos do nº 2 do art° 41° do CPPT, que a notificação se possa realizar na pessoa de qualquer empregado, apenas exigindo que o mesmo demonstre capacidade suficiente para transmitir os termos do acto notificado, por maioria de razão, admitirá, que a mesma se possa realizar na pessoa do técnico de contas, que embora in casu não seja trabalhador por conta de outrém, não deixa de ser trabalhador ao serviço da impugnante, embora por conta própria, e a pessoa que na situação concreta (notificação de liquidação de IRC), está mais do que apta a entender o conteúdo da notificação e capaz de transmitir os seus termos à impugnante, porquanto o mesmo, por força do exercício da sua profissão, é responsável pela elaboração da contabilidade e apresentação das contas de que resultam as liquidações de imposto.
4.Impendendo sobre o técnico de contas o dever de desempenhar conscienciosa e diligentemente as suas funções (art° 21° do Estatuto dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei n° 265/95, de 17 de Outubro), não é admissível que não tenha dado conta de imediato à impugnante da notificação da liquidação ora em causa, mas somente no mês seguinte (Janeiro de 2003, sem especificação de dia) como a mesma pretende, embora não tenha sido avançada qualquer explicação para o desiderato temporal (note-se que a notificação foi efectuada em 10/12/2002), sendo conhecedor como era, da importância da mesma e não podendo deixar de estar consciente das consequências, a nível disciplinar ou até mesmo criminal, em que eventualmente poderia incorrer pela sua falta de comunicação em tempo oportuno,
5.No caso concreto, a notificação do acto de liquidação não era de todo imprevisível, uma vez que resulta dos autos, embora tal não tenha sido levado ao probatório, que a impugnante foi notificada, após o decurso do prazo para o exercício do direito de audição previsto no art° 60° da LGT, dos fundamentos do processo de retenção na fonte para efeitos de liquidação do imposto, através do ofício da Direcção de Finanças do Porto n° 38769 de 2/12/2002, e no qual se informava, além do mais, que a liquidação seria notificada oportunamente.
6.A considerada, na sentença, falta de cumprimento das formalidades legais da notificação da liquidação, não afectou a finalidade da notificação, pois se atingiu o fim previsto na lei com a sua imposição - o de dar a conhecer à impugnante a liquidação do imposto e os meios de reacção ao seu dispor contra esse acto tributário, degradando-se essas formalidades em não essenciais.
7.Como conclui o Acordão do TCA de 20/11/2001, recurso n° 5615/01, deve considerar-se sanada a irregularidade procedimental decorrente da não observância da forma legal de notificação, pois foi atingida a mesma finalidade que se obteria com a notificação pela forma prevista na lei.
8.Nos termos do n° 4 do art° 233° do CPC, aplicável, salvo melhor entendimento, ao processo fiscal, ex vi da alínea e) do art° 20 do CPPT, caberia à impugnante ilidir a presunção de que teve oportuno conhecimento da notificação, demonstrando que não chegou a ter conhecimento do acto de liquidação até 31/12/2002, o que não logrou, pois apenas se limitou a alegar que o técnico de contas da empresa, Sr. Vitor Manuel de Lima Lobato, no decurso de uma visita à impugnante em Janeiro de 2003, entregou a um dos gerentes uma nota da liquidação presentemente impugnada.
9.Deve entender-se que a impugnante foi validamente notificada em 10/12/2002, mediante mandado, na pessoa do seu técnico de contas, da liquidação ora impugnada, considerando-se em consequência, que não se verificou a caducidade do direito à liquidação do IRC de 1998 e respectivos juros compensatórios, porquanto a referida notificação ocorreu dentro do prazo de caducidade de 4 anos previsto no art° 45º da LGT.
10.Ainda que assim não se considere, entende a Fazenda Pública que na perspectiva de se estar perante uma notificação irregular (decorrente de não se considerar válida a notificação na pessoa do técnico de contas), equivalente à falta de notificação dentro do prazo de caducidade, já que a notificação que obsta à caducidade terá de ser uma notificação válida, a impugnação judicial não é o meio processual adequado para com tal fundamento se conhecer do pedido.
11.Esta alegada ilegalidade -falta de notificação válida da liquidação dentro do prazo de caducidade -não é fundamento de impugnação, podendo fundamentar oposição à execução fiscal, nos termos da alínea e) do art° 204º do CPPT, parecendo tornar-se claro em face deste normativo, que tal falta de notificação afecta a eficácia do acto de liquidação e não a sua validade.
12.No sentido de que o acto de liquidação e a notificação dele são realidades jurídicas distintas e de que a falta de notificação afecta a eficácia do acto e não a sua validade, os Acordãos do TCA de 13/01/2004, processo no 07430/02 e de 12/11/2002, recurso n° 7002/02.
l3.Constituindo fundamento de Oposição à execução fiscal, a alegada falta de notificação válida dentro do prazo de caducidade, deveria ter sido desatendida no processo de impugnação judicial.
14.A sentença recorrida violou as disposições legais supracitadas.
Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida, com as legais consequências.
A recorrida contra-alegou e concluiu assim:
1.A sentença ordenou a anulação da liquidação de IRC e juros compensatórios n.° 2002 6420003443, relativa ao exercício de 1998, no montante de 9.647,21 euros, de que a recorrida foi objecto, visto aquela não ter sido notificada dentro do prazo fixado no artº 45° da LGT (por não ser válida e eficaz a notificação da liquidação na pessoa do técnico de contas e não tendo resultado provado que a impugnante teve conhecimento da liquidação até 31.12.2002), tendo concluído, assim, pela caducidade do direito à liquidação do IRC de 1998 e tendo ficado, nos termos do art. 660.°, n.° 2 do CPC, prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.
2.De acordo com o alt 41.°, n.° 2 do CPPT, as notificações a pessoas colectivas podem ser feitas «(...) na pessoa de qualquer empregado, capaz de transmitir os termos do acto, que se encontre no local onde normalmente funcione a administração da pessoa colectiva ou sociedade», apenas quando for de todo impossível citar os gerentes ou administradores, por não serem encontrados.
3.Ora, a Administração Fiscal não tentou encontrar os gerentes da MULTIPLIER, assim como também não notificou qualquer funcionário da empresa ou uma pessoa que se encontrasse na sua sede: bastou-se em entregar uma nota de liquidação a um terceiro, profissional liberal e trabalhador independente, que não é um empregado da empresa.
4.O argumento da Representante da Fazenda Pública segundo o qual a notificação do acto de liquidação em questão «não era de todo imprevisível» (Ofício da Direcção de Finanças do Porto n.° 38769 de 2.12.2002), não procede: a liquidação é o acto que releva e deveria ter sido notificada pessoalmente (art. 41.° CPPT) ou por carta registada com aviso de recepção (art. 38.° CPPT). Pelo contrário, a sua notificação não foi válida e tempestivamente efectuada, pelo que não é possível sanar a liquidação em causa.
5.A impugnação judicial é o meio processual adequado para, com o fundamento em causa, se conhecer do pedido, uma vez que decorrido o prazo de caducidade sem que tenha havido notificação, a falta desta integra-se na própria caducidade, concretizando a ilegalidade da liquidação (cfr. artº 99º CPPT e Acórdãos do STA: processo 0454/05, de 11.05.2005; processo n.° 084/02, de 24.04.2002 e processo n.° 026722, de 27.02.2002). O facto de se estar perante uma impugnação judicial não exclui a possibilidade de utilização da oposição, apesar de não fazer sentido vir utilizar-se este meio, quando a consequência da caducidade será sempre a da inutilidade superveniente da lide.
6.Deve, assim, manter-se o sentido da sentença aqui em apreço, não podendo considerar-se efectuada a notificação da liquidação dentro do prazo fixado no artº 45º da LGT, sendo de concluir pela caducidade do direito à liquidação do IRC de 1998.
Terminou pedindo que se negue provimento ao recurso e se mantenha a sentença em apreço.
A exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso por entender que a decisão recorrida fez correcta interpretação dos factos e do direito aplicável ao caso-cfr. fls. 95 e seg..
Colhidos os vistos foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
QUESTÕES A DECIDIR:
1-Se padece de erro de julgamento a sentença que considerou ter caducado o direito à liquidação do imposto impugnado, em virtude de não considerar efectuada a notificação da liquidação dentro do prazo fixado no art° 45° da LGT, por não julgar válida e eficaz a notificação da liquidação da sociedade recorrida na pessoa do técnico de contas;
2-Se esta ilegalidade -falta de notificação válida da liquidação dentro do prazo de caducidade-constitui fundamento de impugnação, ou se, pelo contrário, integra o fundamento de oposição à execução fiscal previsto na alínea e) do art° 204º do CPPT.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na sentença posta em causa foi dada como provada a seguinte factualidade:
1-Em 30/5/1999, a impugnante procedeu à entrega da declaração mod. 130, a qual veio a ser objecto de análise por parte da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais
(DSBF);
2-No âmbito da referida verificação, a DSBF apresentou proposta no sentido de serem efectuadas correcções àquela declaração, por ter considerado indevidamente aplicadas as normas previstas na Convenção para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e sobre o Capital celebrada entre Portugal e o Reino Unido, por inexistência de documentos comprovativos no montante de imposto a corrigir de € 6.964,46;
3-Conforme resulta do relatório constante do P.A anexo, foi proposta a correcção às retenções na fonte de imposto relativamente a rendimentos pagos a não residentes -Millennim Guers. Development Ltd - efectuadas e entregues «atendendo à aplicação indevida das normas previstas na(s) CDT(s) celebradas com o Reino Unido por inexistência dos respectivos documentos de prova”;
4-Na sequência do despacho concordante com tal proposta do Subdirector-Geral, a impugnante foi notificada nos termos do art. 60° da LGT, para exercer o direito de audição relativamente ao Projecto de conclusões elaborado pela DSBF -cfr. fis. 30/31 do P.A. anexo;
5-Em 18/10/2002, a impugnante foi notificada, mediante mandado, na pessoa do seu técnico de contas, Vitor Manuel de Lima Lobato, da liquidação de IRC referente ao exercício de 1998, no montante de € 9.647,2 cuja data limite de pagamento ocorria em 31/12/2002 - cfr. fls.12 dos autos;
6-A presente impugnação foi deduzida em 10/3/2003 - cfr. fls. 2 dos autos;
7-No ano de 1998, a beneficiária dos rendimentos - Milennium Guers. Development, Ltd.-era residente fiscal no Reino Unido-cfr. certificado de residência fiscal junto a fls. 38 dos autos;
8-O técnico de contas Vitor Manuel Lima Lobato não está inscrito na Segurança Social como trabalhador da impugnante - cfr. doc. de fls. 46/47.
Por estar documentalmente demonstrada nos autos adita-se a seguinte factualidade nos termos do artº 712º, nº 1, al. a), do CPC:
9-A ora recorrida foi notificada, após o decurso do prazo para o exercício do direito de audição previsto no art° 60° da LGT, dos fundamentos do processo de retenção na fonte para efeitos de liquidação do imposto, através do ofício da Direcção de Finanças do Porto n° 38769 de 2/12/2002, no qual se informava, além do mais, que a liquidação seria notificada oportunamente.
DE DIREITO
Está em causa nos presentes autos e em 1º lugar a validade da notificação efectuada pela Administração Fiscal em 18/10/2002.
Já se viu que a decisão objecto de recurso ordenou a anulação da liquidação de IRC e juros compensatórios n.° 2002 6420003443, relativa ao exercício de 1998, no montante de 9.647,21 euros, de que a recorrida foi objecto por entender que esta não foi notificada dentro do prazo fixado no artº 45° da LGT (por não ser válida e eficaz a notificação da liquidação na pessoa do técnico de contas e não ter resultado provado que a impugnante teve conhecimento da liquidação até 31.12.2002); desta forma o tribunal a quo concluiu pela caducidade do direito à liquidação do IRC de 1998.
Vejamos então.
Na hipótese vertente, através da referida notificação, a A.F. deu conhecimento à impugnante, na pessoa do seu técnico de contas, da liquidação de IRC referente ao exercício de 1998, no montante de € 9.647,2, cuja data limite de pagamento ocorria em 31/12/2002.
Ora, refere o artº 41º, nº 1, do CPPT que “As pessoas colectivas e sociedades serão citadas ou notificadas na pessoa de um dos seus administradores ou gerentes, ......”.
E, de acordo com o nº 2 deste preceito, “Não podendo efectuar-se na pessoa do representante por este não ser encontrado pelo funcionário a citação ou notificação realiza-se na pessoa de qualquer empregado, capaz de transmitir os termos do acto, que se encontre no local onde normalmente funcione a administração da pessoa colectiva ou sociedade».
Ou seja, a notificação das pessoas colectivas e sociedades apenas pode realizar-se na pessoa de qualquer empregado quando, de acordo com o nº 2 deste artº 41º, não possa efectuar-se na pessoa do representante por este não ser encontrado.
Sucede que, no caso posto, não se demonstrou que a Administração Fiscal tivesse tentado encontrar os gerentes da sociedade aqui recorrida, do mesmo modo que também a não notificou na pessoa de qualquer funcionário da empresa.
Como ressalta da parte discursiva da sentença objecto de censura, (a sociedade não foi notificada dentro do prazo fixado no artº 45° da LGT, “por não ser válida e eficaz a notificação da liquidação na pessoa do técnico de contas e não ter resultado provado que a impugnante teve conhecimento da liquidação até 31.12.2002”.
O que se apurou é que a nota de liquidação foi entregue ao técnico de contas que, tal como alegado pela recorrida é um terceiro, profissional liberal e trabalhador independente, que não um empregado da empresa-cfr. o ponto 8 do probatório.
É certo que se reconhece algum fundamento à FP quando argumenta que a notificação do acto de liquidação em questão «não era de todo imprevisível», atento o teor do Ofício da Direcção de Finanças do Porto n.° 38769 de 2.12.2002) contido no ponto nº 9 do probatório.
Do mesmo modo, não nos custa acreditar que, tal como defendido pela FP, “impendendo sobre o técnico de contas o dever de desempenhar conscienciosa e diligentemente as suas funções .......” não é muito plausível que “não tenha dado conta de imediato à impugnante da notificação da liquidação ora em causa, mas somente no mês seguinte (Janeiro de 2003, sem especificação de dia).....” .
Ainda assim esta argumentação não proceder, porquanto, “a liquidação é o acto que releva e deveria ter sido notificada pessoalmente (art. 41.° CPPT) ou por carta registada com aviso de recepção (art. 38.° CPPT)”, e sempre na pessoa de um dos seus administradores ou gerentes, ou, na impossibilidade de sê-lo na pessoa destes, na de um seu empregado.
Efectivamente o citado artº 41º determina as pessoas em quem pode ser feita a notificação, (tanto no caso da notificação postal como da citação pessoal) e o falado técnico de contas não se enquadra no leque das pessoas em quem deve ser praticado o acto.
Logo, não tendo sido válida e tempestivamente efectuada a sua notificação, não é possível sanar a liquidação em causaPara que determinado acto jurídico praticado pela Administração se possa considerar como uma notificação, é necessária a conjugação de dois factores essenciais: (i) a transmissão do conhecimento de um acto e, (ii) a específica vontade de o comunicar - cfr. Pedro Gonçalves, Notificação de actos administrativos (notas sobre a sua génese, âmbito, sentido e consequências de uma imposição constitucional), AB VNO AD OMNES - 75 anos da Coimbra Editora, pág. 1093.
Entre outras, a notificação tem como função (i) a garantia do administrado, e (ii) a constituição de certeza legal da cognoscibilidade do acto administrativo - cfr.ob. cit., págs. 1109 e ss..
A função garantística da notificação visa, sobretudo, assegurar que o interessado possa beneficiar da garantia da tutela jurisdicional efectiva, sendo que, sob este ponto de vista, os prazos de impugnação do acto não poderão começar a correr sem que a notificação do mesmo não se mostre devidamente efectuada. E acrescenta “A função de "criação de certeza da cognoscibilidade" subjacente à notificação do acto Administrativo está relacionada com a segurança como princípio basilar da Ordem Jurídica - cfr. artigo 2° da CRP - pois com a notificação pretende-se, precisamente, transmitir "uma informação, visando realizar uma Junção informativa, que se concretiza mediante a introdução do acto na esfera de perceptibilidade normal do destinatário, garantindo a respectiva cognoscibilidade "., tanto mais que não resultou provado que a impugnante tivesse tido conhecimento da liquidação até 31/12/2002.
Sustenta, em 2º lugar, a Fazenda Pública que esta ilegalidade -falta de notificação válida da liquidação dentro do prazo de caducidade - não é fundamento de impugnação, podendo, antes, fundamentar oposição à execução fiscal, nos termos da alínea e) do art° 204º do CPPT, já que tal falta (de notificação) afecta a eficácia do acto de liquidação e não a sua validade.
Contudo também aqui não vemos que assista razão à recorrente na medida em que, uma vez decorrido o prazo de caducidade sem que tenha havido notificação, a falta desta integra-se na própria caducidade, concretizando a ilegalidade da liquidação -artº 99º CPPT e acórdãos do STA nos processos 0454/05, de 11.05.2005, 084/02, de 24.04.2002 e 026722, de 27.02.2002-.
Assim, a impugnação judicial é o meio processual adequado para, com o fundamento em causa, se conhecer do pedido-ac. do STA de 31/10/2007, no prc. nº 0788/07, cujo sumário reza assim ”A liquidação efectuada dentro do prazo de caducidade do respectivo direito, mas não notificada durante o seu curso, entretanto findo, é ilegal e não meramente ineficaz, sendo a ilegalidade insusceptível de servir de fundamento de oposição à execução fiscal”.
“Tal ilegalidade serve de fundamento à impugnação judicial do acto de liquidação, mas não à oposição à execução, uma vez que esta só pode ter por fundamento a «ilegalidade da liquidação da dívida exequenda quando a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação» – alínea h) do nº 1 do artigo 204º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).”
E continua “É verdade que a «falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade» pode fundar a oposição à execução fiscal, como permite a alínea e) do artigo do CPPT referido.
Mas, como vem entendendo a jurisprudência deste Tribunal...., depois de caducado o direito à liquidação, a falta da respectiva notificação «integra-se na própria caducidade concretizando a ilegalidade da liquidação». Diferentemente, «a falta de notificação da liquidação antes de decorrido o prazo de caducidade, implicando a ineficácia daquela e consequenciando a inexigibilidade da dívida exequenda, constitui o fundamento de oposição tipificado na dita al. e) do art 204º do CPPT» -vd. o acórdão do STA de 27 de Fevereiro de 2002, proferido no processo nº 26722.
É que, enquanto estiver ainda em curso o prazo de caducidade, não pode falar-se em ilegalidade da liquidação, pois a Administração está ainda em tempo para proceder a essa notificação, escapando à caducidade. Se, antes de notificar, executar a dívida correspondente, estaremos perante a hipótese prevista na aludida alínea e)-falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade-, falta essa que torna a dívida inexigível, podendo, por isso, servir de fundamento à oposição. Mas, quando o prazo de caducidade estiver esgotado, a liquidação não notificada já não escapa à ilegalidade, mesmo que tenha sido feita dentro do prazo. Neste caso, a liquidação não notificada é ilegal, face àquela caducidade, e a ilegalidade não pode fundar a oposição à execução, mas só a impugnação judicial.”
Deste modo, improcedem as conclusões do recurso.
DECISÃO
Termos em que se acorda negar-lhe provimento, confirmando-se a sentença posta em crise.
Sem custas (por delas estar isenta a recorrente).
Notifique e D.N.
Porto, 2008/01/10
Fernanda Brandão
Moisés Rodrigues
Fonseca Carvalho