Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00897/21.0BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/10/2023
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:CONTENCIOSO PROCEDIMENTOS MASSA;
ERRO FORMA PROCESSO;
CONVOLAÇÃO – INTEMPESTIVIDADE;
Sumário:1 . Um dos pressupostos para a necessária utilização do procedimento de massa, consiste no facto do procedimento concursal ter mais de 50 participantes/concorrentes/candidatos, valor quantitativo que se afere com o número de pessoas que apresentam as respectivas candidaturas.

2 . Decorrendo dos autos, que, num concurso de pessoal, foram 51 os candidatos, de acordo com o n.º1 do art.º 99.º do CPTA, o meio processual adequado e legalmente tipificado é o procedimento de massa que, independentemente das invalidades suscitadas – impliquem a nulidade ou anulabilidade – deve ser instaurado no prazo de 1 mês.

3 . Porque o meio processual não foi o adequado – erro na forma do processo – a convolação no meio legalmente adequado/tipificado torna-se inconsequente, atenta a manifesta e incontroversa intempestividade da acção.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:
I
RELATÓRIO
1. AA, residente na Rua ..., ..., inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Aveiro, datada de 6 de Outubro de 2022, que, no âmbito da Acção Administrativa que havia instaurado contra o MUNICÍPIO ... --- na qual impugnava o acto administrativo consubstanciado no despacho de homologação da Lista Unitária de Ordenação Final, referente ao procedimento concursal comum para a constituição de relações jurídicas de emprego público na modalidade de contrato de trabalho por tempo indeterminado, pedindo ainda a condenação à prática de ato administrativo devido ---, julgou verificada a excepção de erro na forma do processo, insusceptível de convolação, por intempestividade do meio processual a convolar (ação de contencioso de procedimentos de massa) e, em consequência, absolveu o R:Recorrido da instância.
*
2. Nas suas alegações recursivas, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:
A. O presente recurso tem por objeto o douto saneador-sentença da Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, a qual, no seu dispositivo determinou, “(...) julgo verificada a exceção de erro na forma do processo, insuscetível de convolação por intempestividade do meio processual a convolar (ação de contencioso de procedimentos de massa) e, em consequência, absolvo o Réu da instância.”
B. Tal decisão partiu de uma interpretação indevida do enquadramento jurídico dos factos em juízo, o que culminou na verificação da “exceção dilatória de erro na forma do processo, sem possibilidade de convolação por intempestividade do meio adequado, que, por obstar ao conhecimento do mérito da ação, é causa de absolvição do Réu da instância (cfr. artigo 89.º, n.º 2, do CPTA).”
C. Entendeu o Tribunal, findos os articulados, nos termos do artigo 88.º do CPTA, proferir o saneador-sentença, considerando estarem os autos suficientemente instruídos, para tanto, conhecendo da exceção dilatória de erro na forma do processo suscitada pelo Réu, em consequência, absolvendo este Réu da instância.
D. Na ação intentada veio o Autor impugnar o “despacho emitido pela Exmª Srª. Presidente da Câmara ... a 22-10-2021 e que procedeu à Homologação da Lista Unitária de Ordenação Final (LUOF) referente do procedimento concursal comum para a constituição de relações jurídicas de emprego público na modalidade de contrato de trabalho por tempo indeterminado, tendo em vista o preenchimento de 1 (um) posto de trabalho para a carreira e categoria de Técnico Superior (Direito) previsto no mapa de pessoal da Câmara Municipal ... para o ano de 2021.”
E. Pretendia o Autor fazer valer e ver reconhecidos pela Tribunal a quo os vícios daquele ato administrativo, segundo o Autor, merecedores de censura do Direito, com a concomitante condenação à prática de ato administrativo devido, procedendo à ordenação decrescente da média aritmética ponderada das classificações quantitativas obtidas em cada método de seleção, colocando os candidatos no seu devido lugar.
F. Para tanto, assentou a sua pretensão no vicio de violação de lei no procedimento concursal comum em Juízo, designadamente na inexistência de prioridade no recrutamento e no âmbito deste procedimento sendo, por isso, este ato de homologação da lista unitária de ordenação final anulável, por violação dos princípios basilares da atividade administrativa e do bloco de legalidade aplicável.
G. Mais, apontou-se apontado o vicio de violação do conteúdo essencial do direito fundamental à função pública, causador da nulidade do ato impugnado.
H. Em sede de contestação o MUNICÍPIO ... – aqui Réu – apresentou defesa por exceção, sendo tal, o erro na forma do processo, a caducidade do direito de ação e a falta de interesse em agir.
I. Na decisão recorrida, declarou-se a procedência da exceção de erro na forma do processo e determinado a absolvição do Réu, ficando o conhecimento das demais exceções, assim como o fundo da questão, prejudicadas pela procedência daquela.
J. Entendeu o Tribunal a quo a forma processual pela qual correram estes autos não ser a adequada, mas sim, a ação de contencioso de procedimento de massa prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 97º e artigo 99º do CPTA.
K. Face à natureza urgente da ação de contencioso de procedimento de massa e ao prazo à disposição do Autor, à data da entrada da ação, já havia caducado o direito de ação, não sendo mais possível a convolação para o meio processual adequado.
L. No essencial, o motivo de desacordo, como perfeitamente adiantado neste libelo, atem-se com a procedência das exceções invocadas pelo Município Réu, como se fará missão do presente recurso, tal decisão não tem cabimento ou acolhimento no enquadramento legal aplicável.
M. O erro da forma de processo impõe-se como uma nulidade, da mesma forma, como uma exceção dilatória e, a sua procedência, determina a absolvição da instância, claro está, caso não seja viável a convolação dos autos no meio processual adequado.
N. Cremos, no caso destes autos, não ter existido tal erro na forma do processo, sendo o meio processual escolhido pelo Autor o adequado e a decisão constatada no despacho saneador – sentença exorbitou nas suas conclusões, porque da factualidade dada como provada resultou o acolhimento e acertamento do meio processual empregue, sendo a exorbitância da decisão recorrida ainda presente no desenquadramento legal da situação em juízo.
O. Tal erro afere-se pelo pedido e/ou pretensão explanado pelo Autor e que este pretende obter do Tribunal. Para tanto, constitui princípio basilar, o princípio da tipicidade das formas processuais, do qual emerge que a todo o direito corresponde um concreto tipo de acção adequada à efetivação do direito em causa (artigo 2.º do Código de Processo Civil), sendo pela concreta pretensão formulada pelo Autor que se deverá aferir da forma processualmente correcta para que o Autor possa fazer valer em Juízo a sua pretensão.
P. Do que resultado da decisão recorrida estarão em contraponto dois tipos de ações: a ação administrativa (comum) e o processo de contencioso de procedimentos de massa.
Q. Este último, previsto no artigo 99.º do CPTA, constitui-se numa forma de processo, tramitado sob a forma urgente e reporta-se à prática ou omissão de atos administrativos no âmbito de procedimentos com mais de 50 participantes, nos domínios de concursos de pessoal, de procedimentos de realização de provas e de recrutamento.
R. Abrange, tanto ações respeitantes à prática, como à omissão de atos administrativos, podendo nela se compreender pretensões impugnatórias, designadamente a declaração de nulidade ou a anulação de atos administrativos, quer pretensões condenatórias, a condenação das entidades administrativas na prática de atos administrativos ilegalmente omitidos ou recusados.
S. Para a qual estabelece-se um prazo mais curto, sendo este de 1 (um) mês.
T. Entendemos, como entendemos à data da propositura da ação, a forma processual eleita pelo Autor, face ao disposto na Lei, é a adequado, sendo o despacho reconhecedor da procedência das exceções invocadas pelo Réu, merecedor de clara reprovação dos Ilustres Juízes Desembargadores.
U. Da mesma forma, entendemos, não ser de proceder a invocada exceção de erro na forma do processo e a (dali decorrente) caducidade do direito de ação.
V. No entendimento do Recorrente, a decisão recorrida incorreu em flagrante erro de interpretação do Direito aplicável.
W. Não poderia o Tribunal desligar o disposto no artigo 99.º do CPTA, do disposto na Lei substantiva, isto porque, apresenta o referido artigo o seguinte teor: “Para os efeitos do disposto na presente secção, e sem prejuízo de outros casos previstos em lei especial, o contencioso dos atos administrativos praticados no âmbito de procedimentos de massa compreende as ações respeitantes à prática ou omissão de atos administrativos no âmbito de procedimentos com mais de 50 participantes”
X. A leitura do disposto no artigo 99.º do CPTA e a verificação dos pressupostos de que depende aquele meio processual, deve ter em conta, designadamente, o disposto no artigo 34.º da LTFP, tanto o seu n.º 1 como os n.º 4 e 5. E será assim, pois o Legislador ao introduzir esta forma de processo especial não concretizou o conceito de participante /participantes no âmbito de procedimento por ele abrangidos.
Y. Defende-se a leitura conjunta do que será participante /participantes e do que será candidato, na aceção do CPTA e da LTFP. Só assim se poderá encontrar harmonia e evitar interpretações distintas. Desta maneira, participante /participantes e candidato deverão reconduzir-se ao mesmo conceito, aquele presente na LTPF.
Z. A LTFP, refere-se ao seguinte: “Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, pode apenas ser candidato ao procedimento quem seja titular do nível habilitacional e, quando aplicável, da área de formação, correspondentes ao grau de complexidade funcional da carreira e categoria caracterizadoras do posto de trabalho para cuja ocupação o procedimento é publicitado.”
AA. E acrescenta o seguinte: “O júri analisa, preliminarmente, a formação e, ou, a experiência profissionais e delibera sobre a admissão do candidato ao procedimento concursal” e `Em caso de admissão, a deliberação, acompanhada do teor integral da sua fundamentação, é notificada aos restantes candidatos.”
BB. Disto resulta, apenas poder ser candidato ao procedimento o detento do nível habilitacional exigido pelo procedimento, isto é, apenas quem detenha o nível habilitacional referido nas peças do procedimento poderá ser admitido como candidato.
CC. Por outras palavras, depois de analisadas a formação dos proponentes, o Júri do procedimento delibera sobre a admissão ou exclusão do procedimento concursal, neste último caso, não sendo admitido, à luz do referido no n.º 1 do artigo 40.º da LTFP, nem sequer adquire o estatuto de candidato, já que não reunia os pressupostos para tal.
DD. Do que resulta dos atos praticados neste procedimento, nos termos da ata de 22 de abril de 2021, Ata de Apreciação de Candidaturas, dos 51 indivíduos que manifestaram a intenção de participar no procedimento concursal, 4 destes não foram admitidos, pelo que, à vista do disposto no artigo 40.º da LTFP, estes 4 não deveriam, muito menos poderiam, ser classificados como candidatos e, deste modo, classificados como participantes.
EE. Um entendimento diferente deste, como o defendido na decisão recorrida, aportaria a situações difíceis de compreender e resultados diferentes, consoante se faça a interpretação da LTFP ou do CPTA.
FF. Mas mais, foram 4 indivíduos não admitidos ao procedimento: 3 deles, como resulta da Ata de Apreciação de Candidaturas, não detinham o nível de habilitação exigido à candidatura, nos termos patenteados nas peças do procedimento e, mais concretamente, 1 destes indivíduos, não declarou a detenção dos requisitos de admissão, não anexou à candidatura o formulário de candidatura, não anexou o certificado de habilitações, não detinha o nível habilitacional exigido à candidatura e, por ultimo, não remeteu a candidatura nas formas previstas no procedimento.
GG. Aqueles 4 indivíduos não admitidos nem sequer adquiriram a designação de candidatos e/ou participante /participantes, mas um destes merece um novo olhar.
HH. O individuo BB, do que decorre do processo administrativo junto pelo Município Réu, folhas 311 e 312, apenas enviou o seu Curriculum Vitae, nada mais constando. Atente-se, à exceção do Curriculum Vitae, nenhum outro documento foi junto.
II. Tal permite-nos concluir que o referido individuo, não chegou a adquirir a posição de candidato e/ou participante, na aceção do artigo 99.º do CPTA.
JJ. Quanto a este, não podemos sequer falar de admissão ou exclusão do procedimento, porquanto, à partida e por diversos motivos (não declarou a detenção dos requisitos de admissão, não anexou à candidatura o formulário de candidatura, não anexou o certificado de habilitações, não detinha o nível habilitacional exigido à candidatura e, por último, não remeteu a candidatura nas formas previstas no procedimento), não podia ser candidato ou participante no procedimento.
KK. Não se verificou sequer uma manifestação de vontade do referido individuo para participação do procedimento concursal em questão, para desta se retirar uma participação ou a qualidade de candidato e/ou participante naquele procedimento. Na leitura do artigo 99.º do CPTA ou do artigo 40.º da LTFP, em qualquer das leituras, o referido individuo não se insere nessa categoria, porquanto, para estas exige-se a vontade ou intenção de tomar parte, neste caso, neste procedimento desencadeado pelo Réu Município, o que não podemos extrair do comportamento manifestado pelo individuo.
LL. Tal interpretação é consonante com a formulação do artigo 40.º da LTFP e do 99.º do CPTA, já que esta é em si deficitária e deverá ser considerada em paralelo com a LTFP.
MM. O artigo 99.º do CPTA não indica o momento em que se afere a existência de mais de 50 participantes ou sequer, como vimos, delimita o conceito de participantes, devendo V. Ex. Cias. interpretar este artigo em consonância com o restante a legislação aplicável.
NN. A formulação deste artigo 99.º levará a difíceis questões interpretativas, como aquela que trazemos a V. Ex. Cias..
OO. Estas questões interpretativas serão, a final, causadoras de violações de direitos fundamentais dos administrados, no direito de acesso ao Tribunais, consagrado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.
PP. E, também, do n.º 4 e 5 do artigo 268.º da CRP, é garantido aos administrados a existência de meios processuais para reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos, impugnação de atos administrativos, determinação da prática de atos devidos e a existência das medidas cautelares adequadas e a possibilidade de impugnação de normas administrativas com eficácia externa por parte dos cidadãos que presenciem à lesão por elas dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
QQ. A interpretação das normas invocadas na decisão recorrida e o dispositivo ali cristalizado, a não serem revertidos, serão fonte de perigo e atentatórios do direito fundamental do Recorrente ao acesso aos tribunais, consagrado e melhor explicitado no artigos 20 e 268.º n.º 4 e 5, todos da Constituição da República Portuguesa.
RR. Ademais, a interpretação abraçada pelo Recorrente, que vem sendo propalada desde o início da tramitação destes autos, é a única consentânea com a defesa daqueles direitos fundamentais do Recorrente”.
*
3. Notificado da interposição do recurso, veio o R./Recorrido MUNICÍPIO ..., apresentar contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:
1. O douto recurso apresentado pelo Autor, ora Recorrente, versa exclusivamente sobre matéria de direito, e não de facto, pelo que se consolida a decisão sobre a matéria de facto ínsita na sentença recorrida.
2. São, portanto, factos provados, designadamente os identificados sob as alíneas 1 a 3, quanto à abertura do “procedimento concursal com vista ao recrutamento de um técnico superior licenciado em Direito” e ao “universo total de 51 candidatos” que se apresentaram naquele procedimento.
3. O Autor, não se conformando com a douta decisão judicial, vem interpor recurso (de Direito), que, com todo o respeito e amizade (in casu, pela Ilustre Mandatária do Autor), assenta numa “visão obsoleta” do contencioso administrativo.
4. Na verdade, o recurso encontra-se (parcialmente) fundamentado num CPTA já “revogado”, anterior a 2015 e à reductio ad unum então operada com a revisão introduzida pelo Decreto Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro.
5. É, portanto, sob um lastro de memória do contencioso anterior que o Recorrente nos conduz ao presente recurso, numa confusão permanente entre o CPTA anterior à Revisão de 2015 (ao contrapor a velha ação administrativa comum) e o “novo” CPTA (ao contrapor o “novo” contencioso de procedimentos de massa), o que, desde logo, demonstra a improcedência do mesmo.
6. Como bem realça o Recorrente, esta nova ação urgente contencioso de procedimentos de massa, introduzida na Revisão de 2015 do CPTA (como bem explica a sentença recorrida), tem por objeto a prática ou omissão de atos administrativos relativos àqueles domínios identificados no artigo 99.º, sejam as pretensões impugnatórias, condenatórias ou ambas, sendo que a ação compreendia, exatamente, ambas.
7. Como tal, estando num desses domínios expressamente identificados no artigo 99.º do CPTA, conforme factos provados 1, 2 e 3 (não impugnados no presente recurso e, portanto, assentes), não merece qualquer censura a sentença recorrida.
8. Na verdade, “Verifica-se que o objeto da presente Acão, por referência à lista definitiva de ordenação final homologada (cfr. factos 4 e 5), diz respeito à prática de ato administrativo no âmbito de um concurso de pessoal que teve 51 participantes, correspondente ao número de candidaturas apresentadas (cfr. facto 3).”, sendo que, conforme jurisprudência superior (especificamente no Acórdão do TCANorte de 07-07-2021, proc. n.º 263/21.8BELSB), o artigo 99.º do CPTA se refere a “procedimentos com mais de 50 participantes”, o que inclui quer os candidatos admitidos, quer os candidatos excluídos do procedimento de referência. (...)”.
9. No ordenamento jurídico-processual vigora o princípio da tipicidade das formas processuais (cfr. artigo 2.º, n.º 2 do CPTA e artigo 2.º, n.º 2 do Código de Processo Civil), sendo inegável que, in casu, o objeto processual, bem identificado desde logo pelo Autor no artigo 7.º da mui douta P.I., reporta-se claramente a um designado concurso de pessoal (constituição de relação jurídica de emprego público), conforme facto provado 1 e 2, que teve a participação de mais de 50 participantes, conforme uma vez mais confessado pelo próprio Autor no artigo 35.º da mui douta P.I. e conforme também se alcança pela Lista de Candidaturas e respetiva Ata de Apreciação de Candidaturas de 22 de abril de 2021, junta pelo Autor na P.I. sob Doc. ..., o que consta, aliás, no facto provado 3, que não mereceu qualquer impugnação em sede de recurso.
10. Como tal, dando-se como provado que o procedimento concursal de pessoal em análise teve o universo de 51 participantes, terá de concluir-se forçosamente, à luz do princípio da tipicidade das formas de processo, pela atuação necessária do meio processual previsto no artigo 99.º do CPTA.
11. Participantes no concurso são todos aqueles que, bem ou mal, se apresentaram “a jogo”, sofrendo, com isso, depois, a aplicação das “regras desse jogo”, sendo que, in casu, foram “a jogo” 51 “jogadores”, entre aqueles que posteriormente foram excluídos e admitidos (facto provado 3).
12. Esta é, aliás, a jurisprudência assente, conforme resulta do Acórdão do TCANorte de 07-07-2021 (proc. n.º 263/21.8BELSB) invocado na sentença recorrida, mas também, exemplificativamente, do Acórdão do TCASul de 05-07-2017 (proc. 60/16.2BEPDL).
13. A confusão (perdoe-se, com todo o respeito) ínsita no recurso, entre requisitos e conceito, seguramente obnubilou o raciocínio e o trajeto cognitivo do Recorrente, pois não pode partir-se dos requisitos (para se poder ser legalmente candidato – admitido – no procedimento concursal de pessoal), definidos na lei substantiva (LTFP), para se afastar do conceito de participante aqueles que, participando no procedimento, não os cumprem.
14. Só é excluído quem participa.
15. Nesse sentido, é até contraditório o raciocínio do douto recurso, pois é exatamente a violação daqueles requisitos por parte do participante que determina, precisamente, a sua exclusão do procedimento em que participa: se se exclui por violação daqueles requisitos (ato administrativo vinculado), é porque o candidato em causa (mesmo não o devendo ser, daí a sua exclusão) é participante no procedimento, devendo dele ser excluído.
16. Como é habitual nos procedimentos concursais (sejam de pessoal, sejam de contratação pública), sob qualquer participante (candidatura ou proposta), há uma análise (que versa sobre os requisitos e formalidades, para eventual exclusão) e uma avaliação (aplicação dos critérios de avaliação aos não excluídos), as quais implicam, precisamente, a participação...
17. No caso sub judice, é inegável, como consta expressamente do facto provado 3 e conforme jurisprudência assente, que o procedimento concursal teve a participação de 51 candidatos, tendo da respetiva análise resultado a exclusão de quatro, precisamente por não cumprirem os requisitos definidos legalmente; já os demais, foram sujeitos a avaliação, também nos termos definidos legalmente.
18. Como tal, tendo o procedimento mais de 50 participantes (facto provado 3), verifica-se obviamente a exceção de erro na forma do processo, exceção dilatória que implica a absolvição da instância nos termos do artigo 89.º, n.º 2 do CPTA, como bem decidido na sentença recorrida.
19. É que, como igualmente fundamentado de forma clara e inequívoca na decisão judicial em análise, in casu é impossível a convolação/aproveitamento da ação administrativa apresentada para a forma de processo adequada.
20. Conforme factos provados 4 e 5, quando a ação deu entrada em juízo (apenas) em 02 de dezembro de 2021, o prazo imperativo estabelecido no artigo 99.º n.º 2 do CPTA (“um mês”) havia já sido esgotado, “verificando-se a caducidade do direito de ação para a qual os presentes autos teriam que ser convolados – ação de contencioso de procedimentos de massa – por força do verificado erro na forma do processo, (pelo que) fica inviabilizada tal convolação”, como expressamente decidido sem censura pelo Exmo. Senhor Juiz a quo (página 10 da sentença).
21. Portanto, decidiu bem o Exmo. Senhor Juiz a quo, sendo toda a demais discussão do recurso inócua, sob pena de, caso contrário, se o mesmo for procedente, então, ter de se analisar as demais exceções invocadas pelo Município em sede de contestação, designadamente a evidente falta de interesse em agir do Autor, que é igualmente procedente, com todas as consequências legais.
*
4. A Digna Magistrada do M.º P.º neste TCA, notificada nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, não se pronunciou.
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5. Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Exmos. Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
*
6. Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts. 1.º e 140.º, ambos do CPTA.
II
FUNDAMENTAÇÃO
1. MATÉRIA de FACTO
São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida, cuja fidelidade e completude não se mostram questionadas em sede recursiva:
1. Por deliberação do executivo da Câmara Municipal ..., datada de 20-01-2021 (ata n.º ...21) e por despacho da Presidente da Câmara ..., datado de 04-03-2021, foi determinada a abertura de um procedimento concursal com vista ao recrutamento de um técnico superior licenciado em Direito (cfr. doc. ... da PI);
2. O aviso relativo ao referido procedimento concursal foi publicado em Diário da República n.º 54/2021, 2.ª Série, parte H, de 18-03-2021, Aviso n.º ...21, e o anúncio publicado a 19-03-2021 na Bolsa de Emprego Público sob o código de oferta OE202103/0541 (cfr. doc. ..., ... e ... da PI);
3. A 22-04-2021, no âmbito daquele procedimento, foi lavrada ata de apreciação de candidaturas, a fim de proceder à verificação dos elementos das candidaturas apresentadas, tendo o júri do concurso deliberado a admissão de 47 candidatos e a exclusão de 4, num universo total de 51 candidatos (cfr. Doc. ... da PI);
4. Em 29-10-2021, foi publicada em Diário da República a homologação da lista unitária de ordenação final, por despacho da Presidente da Câmara Municipal ... datado de 22-10-2021, nos seguintes termos:

(cfr. doc. ... e ...1 da PI).
5. A 02-12-2021, deu entrada neste Tribunal a presente ação administrativa para impugnação do ato administrativo consubstanciado no despacho emitido pela Presidente da Câmara ... a 22-10-2021 que procedeu à homologação da lista unitária de ordenação final referida (cfr. SITAF).
2. MATÉRIA de DIREITO
No caso dos autos, delimitando o objecto do recurso, atentas, por um lado, as conclusões das alegações supra transcritas, por outro, as contra alegações e ainda a sentença recorrida, nos seus fundamentos e dispositivo, importa objectivar concretamente o dissídio que nos cumpre apreciar decidir e que consiste apenas em averiguar se, num concurso público com mais de 50 concorrentes, in casu, 51, deve ser utilizado o procedimento de massa, processo urgente, assim tipificado, nos termos do art.º 99.º do CPTA.
Sem discordar desta aplicação, o recorrente apenas questiona a utilização deste especial procedimento com base no facto de não estarem no concurso 51 candidatos, mas apenas 47, na medida em que 4 dos que se apresentaram a concurso não foram admitidos pelo júri concursal.
Sendo esta a razão da discórdia – 47 ou 51 candidatos – a tese imaginativa desenvolvida pelo recorrente, tentando, a todo o custo, contrariar a evidência objectiva dos factos levados ao probatório - não questionado – carece de total fundamento.
Dispõe o art.º 99.º do CPTA, sob a epígrafe “Contencioso dos procedimentos de massa”, inserido no TÍTULO III - Dos processos urgentes, CAPÍTULO I - Ação administrativa urgente, SECÇÃO II - Contencioso dos procedimentos de massa”:
1 - Para os efeitos do disposto na presente secção, e sem prejuízo de outros casos previstos em lei especial, o contencioso dos atos administrativos praticados no âmbito de procedimentos de massa compreende as ações respeitantes à prática ou omissão de atos administrativos no âmbito de procedimentos com mais de 50 participantes, nos seguintes domínios:
a) Concursos de pessoal;
b) Procedimentos de realização de provas;
c) Procedimentos de recrutamento.
2 - Salvo disposição legal em contrário, o prazo de propositura das ações a que se refere o presente artigo é de um mês e as ações devem ser propostas no tribunal da sede da entidade demandada.
”.
Ora, um dos pressupostos para a necessária utilização do procedimento de massa, previsto no referido normativo, consiste no facto do procedimento concursal ter mais de 50 participantes/concorrentes/candidatos, valor quantitativo que, obviamente, se afere com o número de pessoas que apresentam as respectivas candidaturas, bem ou mal instruídas, cabendo, depois, ao júri do concurso avaliar das condições das candidaturas, excluindo aqueles que, no seu entender, não cumprem/obedecem aos requisitos previstos na lei/concurso publicitado.
Avaliar/apreciar dos requisitos/documentos apresentados pelos concorrentes/candidatos/participantes para depois se aferir do número dos mesmos é argumentação indevida, na medida em que o número apenas se contabiliza com aqueles que enviaram as respectivas candidaturas.
No caso dos autos, como decorre do ponto 3 dos factos provados, foram 51 os candidatos, pelo que, de acordo com o n.º1 do art.º 99.º do CPTA, o meio processual adequado e legalmente tipificado é o procedimento de massa que, independentemente das invalidades suscitadas – impliquem a nulidade ou anulabilidade – deve ser instaurado no prazo de 1 mês.
Aliás, o próprio A./Recorrente, nos arts. 34.º e 35.º da petição inicial, consubstanciados no Doc. N.º ... (1) (1)Doc. ... que é a “Ata de apreciação de candidaturas” do júri do concurso, onde identifica, por ordem alfabética, os candidatos admitidos (47) e excluídos (4), indicando, em relação a estes, as respectivas razões de exclusão., junto com esse articulado inicial, não deixa margem para dúvidas, ao referir (ipsis verbis):
34.º
Mais tarde, a 22-04-2021, a fim de proceder à verificação dos elementos das candidaturas apresentadas pelos Candidatos, designadamente quanto ao preenchimento dos seus requisitos e apresentação de documentos que deveriam instruir a candidatura, em cumprimento da legislação aplicável, deliberou o Exm.º a admissão e exclusão dos candidatos constantes da lista anexa à ata e conceder prazo para os candidatos excluídos se pronunciarem sob a exclusão - cfr. documento n.º ....
35.º
O Autor e os contrainteressados constam da lista de admitidos ao procedimento, num total de 47 admitidos, sendo que 4 (quatro) candidatos foram excluídos, num universo total de 51 (cinquenta e um) candidatos, entre admitidos e não admitidos”.
*
Concluindo …. nos presentes autos, porque o meio processual não foi o adequado – erro na forma do processo – a convolação no meio legalmente adequado/tipificado torna-se inconsequente, atenta a manifesta e incontroversa intempestividade.
*
Importa, sem mais, em negação de provimento ao recurso, manter a decisão judicial do TAF de Aveiro.
III
DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e assim manter a sentença recorrida.
*
Custas pelo recorrente.
*
Notifique-se.
DN.

Porto, 10 de Fevereiro de 2023



Antero Salvador
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho