Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00916/23.6BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:09/13/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:INTIMAÇÃO PARA A PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÃO E PASSAGEM DE CERTIDÃO ; DIREITO DE DEFESA EM PROCESSO PENAL; LEGITIMIDADE INTERESSE EM AGIR;
SOLICITAÇÃO DE PARECER À C.A.D.A.; SUSPENSÃO DO PRAZO; PRAZO INICIAL; PRAZO FINAL; ELEMENTOS NOMINATIVOS; N.º1 DO ARTIGO 9º DO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS;
N.º1 DO ARTIGO 104º DO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS; ARTIGO 15º DA REGIME DE ACESSO À INFORMAÇÃO ADMINISTRATIVA E AMBIENTAL, APROVADO PELA LEI 26/2016, DE 22.08 (LADA).
Sumário:
1. O interesse em agir consiste na necessidade de recorrer ao processo. A legitimidade consiste em ser parte na relação material controvertida tal como alegada pelo autor – n.º1 do artigo 9º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

2. No caso concreto das intimações tem legitimidade e interesse em agir quem formulou pedido no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos e esse pedido não lhe foi satisfeito ou não foi integralmente satisfeito
3. Não importa, para aferir da legitimidade na intimação (como em qualquer outro meio processual) saber se existe ou não o direito à informação que o requerente se arroga. Essa é a questão de fundo ou de mérito que se situa, lógica e legalmente, depois de se resolver a questão, puramente adjectiva, da legitimidade.

4. Nem importa para averiguar destes pressupostos processuais, da legitimidade e interesse em agir, saber se previamente a requerente deveria aguardar pela decisão da C.A.D.A. . Esse é um pressuposto que, a existir, é um pressuposto substantivo que vem logicamente depois de resolvidas as questões adjectivas da legitimidade e do interesse em agir.

5. O direito potestativo da entidade requerida solicitar parecer à C.A.D.A, não tem como correlativo o dever de a recorrente esperar pelo decurso do prazo para a C.A.D.A. emitir parecer. Porque tal é incompatível com o prazo, peremptório, que lhe é fixado por lei para prestar as informações ou emitir as certidões e que corresponde ao direito do Requerente obter a informação ou obter a certidão no curto espaço de tempo fixado por lei, de 10 dias úteis – artigo 15º da regime de acesso à informação administrativa e ambiental, aprovado pela Lei 26/2016, de 22.08 (LADA).

6. Reconhecer tal direito potestativo sem a restrição de cumprir o referido dever legal, seria esvaziar de conteúdo útil o prazo, curto, fixado por lei, no referido artigo 15º da LADA. Isto sendo certo que a Lei não atribui carácter obrigatório nem vinculativo ao parecer da LADA.

7. A suspensão do prazo para deduzir o pedido de intimação apenas ocorre quando a queixa é apresentada pelo interessado e não quando o pedido é feito pela entidade requerida – n.º 1 do artigo 16º da LADA. O que faz sentido na perspectiva de que, nessa hipótese, ainda é possível, no próprio entendimento do Requerente, resolver a questão em sede administrativa, admitindo a hipótese de a Administração seguir o parecer da C.A.D.A.. Não faz sentido suspender um prazo que é claramente estabelecido a favor do particular por um acto de vontade da entidade requerida que está sujeita ao cumprimento desse prazo.

8. A suspensão do prazo não impede que o interessado apresente a intimação em Tribunal porque é a suspensão de um prazo final, não a suspensão de um prazo inicial.

9. Pretendendo o requerente obter documentos que poderão ou não instruir o processo penal, consoante isso seja do interesse da sua defesa, impor o requerimento de junção ao processo crime de documentos que podem prejudicar a defesa seria atacar frontalmente esse direito de defesa em processo penal , com protecção constitucional , nos artigos 2.º, 18.º, 32.º da Constituição da República Portuguesa.

10. Mostra-se nesse caso legítimo e atendível o interesse no acesso à informação e documentação pretendidos, apesar de conter dados nominativos de terceiros – alínea b) do n.º 5 do artigo 6º da LADA.

11. Em contraponto, mostra-se possível acautelar os legítimos interesses de terceiros se a informação e certidões omitirem nomes, moradas, números de contribuinte, da ADSE, de utente de Saúde, da CGA, da Segurança Social e dados bancários (IBAN) - preceito acabado de citar, da LADA.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Intimação para prestação de informações, consulta de documentos e passagem de certidões (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

«AA» veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 05.06.2023, que julgou verificada a excepção dilatória de falta de interesse em agir e, em consequência, absolveu a entidade requerida da instância, na intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões que moveu contra a AMP – Área Metropolitana do Porto.

Invocou para tanto, em síntese, que: a sentença padece de manifesto erro de julgamento, sendo que as normas e ou a interpretação que sufraga das normas (mormente do artigo 104.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa, artigos 82.º a 85.º do Código de Procedimento Administrativo, os artigos 5.º e 6.º da Lei nº 26/2016, artigo 423.º do Código de Processo Civil (e artigo 4.º do Código de Processo Penal) são inconstitucionais, não apenas por colocar em causa o direito à informação e as amplas garantias fundamentais de preparação de defesa do arguido (ao anular-lhe o único meio que a lei coloca à sua disposição para obter informação imprescindível na posse da Administração Pública) como ainda por promover e facilitar a violação do princípio da não auto-incriminação, que é um dos princípios basilares do nosso Estado de direito democrático dos cidadãos – cfr. artigos 1.º, 2.º, 18.º, 20.º, 32.º e 268.º, n.º1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.

O Recorrido contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso requerendo ao mesmo tempo a ampliação do âmbito do recurso, em que sustentou a procedência da matéria de excepção que tinha suscitado e, também por essa via, a improcedência do presente recurso.

A Recorrente veio responder à matéria de ampliação do âmbito do recurso, defendendo a respectiva improcedência.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*
Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
*

I.I. - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1. Sob as vestes de cumprimento de lei (ao solicitar parecer à digna CADA – que se encontra com uma pendência elevadíssima de processos e demora mais de seis meses a dar resposta aos pedidos de parecer), a Administração Recorrida intentou, na prática, boicotar o cumprimento dos fundamentais direitos de informação e de defesa da requerente – ao contrário do que fez o Ministério dos Negócios Estrangeiros, que prestou prontamente informações similares solicitadas com o mesmo intuito pela requerente.

2. Depois de citar alguma doutrina e jurisprudência, e mesmo sem fixar quaisquer factos provados, a sentença recorrida decidiu en passant que se verificaria falta de interesse em agir, porque a requerente poderia lançar mão dos mecanismos processuais aplicáveis, previstos no art. 423.º do CPC, aplicável ex vi art. 4.º do CPP, todavia, o referido artigo 423.º do CPC nem sequer se refere a qualquer “mecanismo processual aplicável” para aceder à informação administrativa, apenas dispondo sobre as regras gerais de junção de documentos aos processos, pelo que a sentença encerra, assim, erro de julgamento, e deve ser, pois, revogada.

3. Em segundo lugar e por cautela, mesmo que o Tribunal a quo estivesse a equacionar outros normativos, em que se estabeleçam poderes dos Juízes dos processos cíveis ou penais para obter informações, importa não confundir nem sequer restringir direitos dos particulares (sobretudo em sede criminal e de direitos fundamentais), incorrendo a sentença num manifesto lapso, até quando mobiliza a doutrina que mobilizou, pois que, na situação sub judice, não está em causa um qualquer documento que seja necessário para “instruir processos pendentes no contencioso administrativo ou na jurisdição comum”, mas sim para organizar e preparar a sua defesa (a montante disso, portanto).

4. Trata-se da fundamental garantia de defesa (estamos mesmo perante uma das garantias por excelência do nosso ordenamento jurídico), ou seja, a de preparar e organizar a sua defesa da forma mais apropriada à defesa dos seus direitos, tendo o arguido direito a analisar primeiro as informações e documentos antes de aquilatar da pertinência de juntar os mesmos ao processo ou não, pelo que a sentença incorre, assim, em manifesto erro de julgamento, por violação evidente das garantias de defesa do arguido – cfr. arts. 2.º, 18.º, 32.º da CRP.

5. Depois e por um lado, o entendimento versado por vários Acórdãos citados na sentença recorrida, foi proferido em situações de facto manifestamente distintas do caso dos autos (casos de cível, ou de tutela do segredo de justiça, que aqui não estão manifestamente em causa), e por outro lado, a doutrina do acórdão do STA de 27/05/1997 e a dogmática na esteira de Teixeira de Sousa (de janeiro de 1998), afiguram-se claramente desajustadas ao caso concreto e, pelo menos, anquilosadas e desactualizadas em relação ao novo paradigma do sistema jurídico-processual-administrativo, pelo que não tem aqui, por isso, aplicação, padecendo a sentença de erro de julgamento.

6. Com efeito, esse entendimento foi defendido quando a então “intimação para consulta de documentos ou passagem de certidão” era um meio processual acessório, funcionalizado ao recurso contencioso de anulação (cfr. art. 82.º da LPTA), ora, com o CPA de 1991 e com a LADA de 1993, que concretizaram com grande latitude os direitos de informação administrativa procedimental e não procedimental (assente no direito ao arquivo aberto não dependente de uso de meios administrativos ou contenciosos, dada a natureza uti cives do mesmo), começou a alterar-se para um meio autónomo e pleno (o que foi legalmente concretizado com o CPTA 2002).

7. Actualmente, aquele entendimento é constitucionalmente insuportável, porque, entre o mais, pressupõe e professa uma visão claramente redutora e minimalista da própria natureza, âmbito e objecto deste meio processual administrativo, subalternizando-o, o que não é mais permitido nem pelos artigos 104.º e ss. do CPTA, nem pela Lei Fundamental [que consagra o direito à informação como um direito fundamental – art. 268.º – e protege de forma veemente o direito fundamental de acesso à justiça, quer na sua vertente de a cada direito corresponder um tipo de acção ou processo (neste caso, o direito à informação é tutelado pelo processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões), quer na vertente de o arguido poder preparar e organizar cabalmente a sua defesa, tendo o direito de requerer informações e documentos que estejam na posse da Administração Pública (ao abrigo daquele seu direito fundamental à informação) antes de os juntar ao processo, devendo, para isso, recorrer ao processo de intimação - único meio legal que tem à sua disposição].

8. Assim e salvo o merecido respeito, a sentença padece de ostensivo erro de julgamento, pois este entendimento é não só violador do direito fundamental à informação, como também do direito fundamental de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva e das fundamentais garantias de defesa em processo crime, que são corolários do estruturante conceito do Estado de direito democrático dos cidadãos – cfr. arts. 2.º, 20.º, 32.º e 268.º, n.º 1 e 2 da CRP.

9. Em consonância temos que na sua formulação inicial a intimação era um meio acessório ao recurso contencioso, mas evoluiu, devido à doutrina e à jurisprudência, para um meio processual autónomo, e além disso, inicialmente era limitado à consulta de documentos ou passagem de certidões, passou a ser também uma forma de intimar a Administração a prestar informações, e mais importante ainda, transformou-se, pois e assim, num meio de processo próprio, urgente (em virtude da acentuação do valor da transparência) e autónomo, que visa a tutela do direito fundamental à informação, sendo o meio adequado para obter a satisfação de todas as pretensões informativas.

10. Aliás, por ser um meio de jurisdição plena e de objecto amplo, este processo é caracterizado por conceder ao Juiz poderes especialmente enérgicos, permitindo-lhe, através de um processo ainda declarativo, formular, com carácter definitivo, injunções à Administração e até sanções pecuniárias compulsórias.

11. Destaque-se que foi no âmbito daquela outra perspectiva, como mero meio acessório que, num processo cível (em que estava em causa apenas um contrato de arrendamento) foi prolatado aquele Acórdão do STA de 27/05/1997 que foi anotado por Teixeira de Sousa (em janeiro de 1998), o que é extraordinariamente oposto à actualidade e a uma situação em que esteja em causa um processo crime, como sucede in casu (como a requerente detalhadamente explicou, são informações e factos respeitantes a contratos de trabalho, processamentos de salários, mobilidade e consolidação de trabalhadores, que eram colegas da requerente e que estavam então sob a sua alçada hierárquica, e que conhecia por força do seu trabalho).

12. Actualmente, é pacificamente aceite que o direito à informação é um direito fundamental, de natureza semelhante aos direitos, liberdades e garantias do Título II da Parte I da CRP, e identifica-se com os princípios da publicidade e transparência que devem reger a actividade administrativa – cfr. Sofia David, Das Intimações, Almedina, 2005, pág. 57; José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, Almedina, 14ª edição, 2015, pág. 253; e cfr. Aresto do STA, de 17/01/2008, no proc. 0896/07.

13. Correspectivamente também a jurisprudência tem como assente que a intimação é o único meio e o meio próprio para reagir contra qualquer forma de recusa do direito à informação, sem necessidade de recurso a outro meio processual alternativo para a tutela efectiva daquele direito." (conforme dogmática e jurisprudência citadas no corpo das alegações) – razão acrescida no sentido de ser insustentável o entendimento vertido na sentença recorrida.

14. Por conseguinte, o direito à informação, a tutela judicial efectiva e as garantias de defesa são direitos fundamentais, consagrados na Lei Fundamental e nas Convenções Internacionais, e dos quais resulta um dever por parte da Administração de informar (de forma plena, cabal e verdadeira) os cidadãos, e como nos parece evidente, não deve sustentar-se qualquer falta de interesse em agir do particular, mesmo que este dispusesse eventualmente de outros meios processuais, sob pena de se frustrarem definitivamente os referidos direitos fundamentais dos cidadãos à informação, à tutela efectiva e garantias de defesa, e os princípios da legalidade e da transparência da actividade administrativa, e bem assim de se limitar, sem qualquer fundamento, o âmbito de tutela e o alcance deste meio processual de jurisdição plena e os amplos poderes judiciais consagrados para este efeito.

15. Em suma, actualmente, a intimação é um meio processual autónomo e de contencioso pleno, que visa – uma tarefa fundamental no nosso Estado de direito democrático dos cidadãos – garantir a tutela do direito fundamental à informação e, neste caso, ainda a protecção das garantias de defesa e de tutela jurisdicional efectiva, pelo que não se pode querer perspectivar o processo de intimação como um “parente pobre” ou “subalterno” dos restantes processos (previstos quer no CPTA; quer no CPC, quer no CPP) nem mesmo se pode anular este indefetível direito dos particulares.

16. Por outro lado e na mesma linha, não se pode sequer confundir este meio autónomo e pleno de tutela de direitos fundamentais com a eventual possibilidade das partes dum processo cível ou penal, se assim o entenderem (trata-se, pois, de uma faculdade ou direito da parte), solicitarem que seja o Tribunal a oficiar o detentor do documento ou informação a juntar ao processo para o instruir, desde logo, porquanto, por um lado, não se pode transformar um direito ou faculdade de requerer ao Tribunal cível ou penal que solicite documentos à Administração numa obrigação, que é o que resulta da sentença recorrida, pois isso mesmo não deriva da lei, pelo que viola o princípio da legalidade, padecendo a sentença de erro de julgamento.

17. Por outro lado e decisivamente, não se pode confundir estes institutos (absolutamente distintos a operar em situações diferenciadas – poder a parte solicitar eventualmente a intervenção do juiz cível ou penal, ficando na sua disponibilidade a decisão sobre os documentos serem ou não relevantes para instruir o processo pendente e, por outro lado, o processo de intimação), anulando, ademais, um dos direitos do particular (de recorrer ao processo de intimação para tutelar o seu direito fundamental à informação), sob pena de se violar frontalmente o princípio da tutela jurisdicional efectiva e de se esvaziar o conteúdo útil deste meio processual judicial (há, assim, inequívoca necessidade da tutela judicial, sendo este o meio adequado e mais nenhum outro), pelo que a sentença padece de erro de julgamento por violar os arts. 104.º e ss. do CPTA e os arts. 2.º, 18.º e 268.º da CRP.

18. Seguidamente e como já aflorámos, o interesse em agir no presente processo de intimação é óbvio e ainda mais reforçado, na medida em que a requerente pretende obter as informações para organizar e preparar a sua defesa (e não para instruir um processo – que são realidades objectivamente distintas), como aliás a requerente expôs.

19. Smr, é chocante e contrária à perspectiva humanista e tuteladora das garantias do arguido, que caracteriza a doutrina moderna em sede de direito sancionatório, no quadro de um verdadeiro Estado de direito democrático dos cidadãos, que se equacione que um particular, acusado da prática de crimes e dos quais se pretende defender, tenha que revelar ao Tribunal, ao Ministério Público e às outras partes do processo qual a sua estratégia e fito processual e quais os documentos que pretende obter para organizar a sua defesa.

20. Pois privar o particular do único e verdadeiro meio principal de acesso a documentos e informações em posse da administração pública (direito à informação), mormente quando se pretende defender em processo crime, restringindo os seus direitos fundamentais (quando tal não está previsto expressamente na Constituição, sendo, por isso, proibido – cfr. 18.º da CRP), afronta de modo patente e manifesto as garantias constitucionais do direito de defesa e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva do arguido, intrinsecamente ligadas ao estruturante conceito do Estado de direito democrático dos cidadãos (cfr. arts. 1.º, 2.º, 18.º, 20.º, 32.º e 268.º da CRP), como também as garantias internacionais do due process (art. 6.º da CEDH) – pois que impõe uma notória e proibida desigualdade de armas com o Estado.

21.Ora, como se vê com facilidade, caso se mantenha o entendimento da sentença (o que é insuportável à luz da Constituição e das Convenções Internacionais), os arguidos são até encaminhados para uma situação de auto-incriminação (e basta aqui o risco, para operar a proibição de violação do estruturante e angular princípio nemo tenetur se ipsum accusare), pois o particular desconhece com exactidão o conteúdo das informações e dos documentos, que estão na posse da administração pública.

22. Repise-se: não se trata de aferir qual o meio que as partes e o tribunal podem recorrer para a tutela dos interesses em causa, mas sim do único meio legal que o cidadão arguido tem, no ordenamento jurídico português, para obter informações e documentos na posse da Administração sem ter que revelar a sua estratégia processual a todos, e sem ter hipoteticamente que correr o risco de se auto-incriminar (é um custo que o nosso sistema jurídico-legal-constitucional não pode jamais impor aos cidadãos), como tal, existe e com agudeza necessidade de tutela judicial para as situações como a presente, sendo a intimação o único meio judicial adequado (quaisquer outros meios legais não são notoriamente adequados nem capazes para alcançar aquela tutela), pelo que se verifica inequivocamente interesse em agir.

23. Portanto, a sentença padece de manifesto erro de julgamento, sendo que as normas e ou a interpretação que sufraga das normas (mormente do art. 104.º, n.º 1 do CPTA, art. 268.º da CRP, arts. 82.º a 85.º do CPA, os arts. 5.º e 6.º da Lei nº 26/2016, art. 423.º do CPC e art. 4.º do CPP) são inconstitucionais, não apenas por colocar em causa o direito à informação e as amplas garantias fundamentais de preparação de defesa do arguido (ao anular-lhe o único meio que a lei coloca à sua disposição para obter informação imprescindível na posse da Administração Pública) como ainda por promover e facilitar a violação do princípio da não auto-incriminação, que é um dos princípios basilares do nosso Estado de direito democrático dos cidadãos – cfr. art. 1.º, 2.º, 18.º, 20.º, 32.º e 268.º, n.º1 e 2 da CRP.

24. O que vimos de alegar é ainda intensamente corroborado pelo facto de a própria CADA (entidade que tem como fim zelar pelo cumprimento das disposições legais referentes ao acesso à informação administrativa), jamais defender a tese que vem sufragada na sentença e entender que existe interesse directo, pessoal e legítimo no acesso a documentos nominativos que o requerente pretende, desde que necessários à sua defesa, quer em processo disciplinar, quer (ainda reforçadamente) em processo crime, como é o caso sub judice.


I.II. - São estas as conclusões das alegações do alargamento do âmbito do recurso que definem o respectivo objecto:

“(…)

Ao abrigo dos seus poderes de cognição, caso entenda que procede o recurso – o que não se espera –, o Tribunal ad quem, ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos pelo art.º 149º CPTA não deverá deixar de julgar procedente a exceção de intempestividade.

Com efeito, a recorrida enviou, em 18 de abril de 2023, o pedido da ora recorrente para a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, ao abrigo do disposto no art.º 15º, n.º 1, alínea e), da LADA, para efeitos de emissão de parecer, que deverá ser emitido no prazo (máximo) de 40 dias – art.º 16º, n.º 4, LADA.

A recorrida só pode decidir o procedimento depois de esta entidade se pronunciar. O requerimento judicial de intimação é de 9 de maio de 2023 – entrada da PI.

A recorrente não podia lançar deste meio processual, nem recorrer ao auxílio da Justiça, porque não estava (ainda) em tempo de o poder fazer.

Foi notificada do envio do expediente à CADA. Esta notificação, a lei impõe-na com o objetivo de o requerente, avisado da intervenção desta Comissão independente, sobrestar no ímpeto de recorrer à via judicial e deixar que a via administrativa faça o seu trabalho, opere e funcione nos termos, e tempos, legalmente estabelecidos.

Contra a necessidade de aguardar imperativamente pela pronúncia da CADA não vale o argumento da urgência, de resto só alegado e não provado. O processo de intimação já foi talhado pelo legislador como processo urgente.

Neste sentido, a aqui recorrida agiu no exercício de um direito potestativo, e a recorrente não pode opor-se à produção dos respetivos efeitos jurídicos.

Termos em que deverá o recurso ser julgado improcedente e não provido; sendo julgado procedente, deverá o douto TCAN alargar os seus poderes de cognição à matéria da exceção de intempestividade, julgando esta procedente e a ação improcedente, por não provada.

(…)”

*

II – Matéria de facto.

Tendo em conta a posição das partes e os documentos juntos aos autos cuja genuinidade e autenticidade não foram postos em causa damos como provados os seguintes factos:

1. No âmbito do processo crime que corre termos sob o n.º 14286/18...., foi deduzida contra a aqui Requerente e Recorrente acusação pelo Ministério Público por crime de falsificação de documentos, em Março de 2023, tendo por objecto factos relativos a contratos de trabalho em funções públicas, processamento de salários, processo de mobilidade interna e consequente consolidação, recebimento de quantias referentes ao período temporal entre Junho de 2012 e Julho de 2015, em que exerceu funções, primeiro como técnica superior jurista e, depois, como Chefe de Divisão dos Serviços Gerais na Autoridade Metropolitana de Transportes do Porto (AMTP), actual AMP.

2. Encontra-se a preparar a sua defesa, necessitando, para o efeito, de ter acesso a documentos relativos aos contratos de trabalho em funções públicas, processamento de salários, respectivo processo de mobilidade interna e consequente consolidação e recebimento de quantias, relativos a outros trabalhadores da então AMP, de quem era colega e superior hierárquica.

3. Em 06.04.2023, através de carta registada e correio electrónico, solicitou à AMP, com carácter de urgência, que lhe fosse prestada informação e passada certidão.

4. Tal pedido não lhe foi até ao momento satisfeito.

5. Pelo ofício n.º ...04..., de 18 de Abril, a AMPT suscitou a intervenção da C.A.D.A., invocando razões que se prendem com o levantamento de dados pessoais nominativos de terceiros que não prestaram a sua autorização, designadamente, respeitantes à composição do agregado familiar, morada, situação fiscal, perfil económico, dias de doença num determinado mês, números de ADSE, Utente de Saúde, CGA, SS e AT, filiação sindical e dados bancários (IBAN), elementos que podem emergir de contratos de trabalho e sobretudo recibos de vencimento.

6. Pelo ofício n.º ...23..., também de 18 de Abril, a Entidade Demandada deu conhecimento à Requerente e Recorrente do envio do requerimento à C.A.D.A. para consulta.

*
III - Enquadramento jurídico.

III.I - Matéria de excepção.

1. A falta de interesse em agir. A ilegitimidade.

O interesse em agir consiste na necessidade de recorrer ao processo.

A legitimidade consiste em ser parte na relação material controvertida tal como alegada pelo autor – n.º1 do artigo 9º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

No caso concreto das intimações tem legitimidade e interesse em agir quem formulou pedido no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos e esse pedido não lhe foi satisfeito ou não foi integralmente satisfeito – n.º1 do artigo 104º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Não importa, para aferir da legitimidade na intimação (como em qualquer outro meio processual) saber se existe ou não o direito à informação que o requerente se arroga.

Essa é a questão de fundo ou de mérito que se situa, lógica e legalmente, depois de se resolver a questão, puramente adjectiva, da legitimidade.

No caso concreto a Requerente, interessada no direito à informação e à passagem de certidão, invocou – e nem sequer foi contraditada nesta parte – que requereu determinada informação e certidão e que tal pedido não lhe foi satisfeito pela Requerida, entidade que tem em seu poder tais informações e documentos a certificar.

Tanto basta para assegurar a sua legitimidade e interesse em agir.

Nem importa para averiguar destes pressupostos processuais, da legitimidade e interesse em agir, saber se previamente a Requerente deveria aguardar pela decisão da C.A.D.A.

Esse é um pressuposto que também vem logicamente depois de resolvidas as questões adjectivas da legitimidade e do interesse em agir.

Apurado que o requerente não é parte na relação controvertida, tal como a configura, nem tem interesse em agir, não se coloca sequer a questão de saber se veria ou não aguardar pela decisão da C.A.D.A., pressuposto que, a existir, será substantivo para o exercício do direito à informação.

Se o pedido de informação ou de passagem de certidão lhe foi negado por quem dispõe da informação ou dos elementos a certificar, tem interesse em agir e legitimidade para deduzir judicialmente o pedido de intimação.

Saber se existe o direito, se estão ou não verificados todos os pressupostos substantivos do direito à informação, é questão de fundo ou de mérito, distinta e posterior das questões adjectivas suscitadas.
Não se verifica, pois, esta matéria de excepção.

2. A intempestividade do pedido. A intervenção da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (C.A.D.A.).

A Recorrida tem o direito (ou poder) de pedir parecer à C.A.D.A..

Mas ao contrário do que sustenta, esse poder, ou direito, não tem como correlativo o dever da Recorrente esperar pelo decurso do prazo para a C.A.D.A. emitir parecer.

Porque tal é incompatível com o prazo, peremptório, que lhe é fixado por lei para prestar as informações ou emitir as certidões e que corresponde ao direito do Requerente obter a informação ou obter a certidão no curto espaço de tempo fixado por lei, de 10 dias úteis – artigo 15º da regime de acesso à informação administrativa e ambiental, aprovado pela Lei 26/2016, de 22.08 (LADA).

Ou seja, é um poder que deve respeitar o dever que lhe cabe de prestar a informação ou entregar a certidão no prazo legal.

Reconhecer tal direito potestativo sem a restrição de cumprir o referido dever legal, seria esvaziar de conteúdo útil o prazo, curto, fixado por lei, no referido artigo 15º da LADA.

Isto sendo certo que a Lei não atribui carácter obrigatório nem vinculativo ao parecer da LADA.

E sendo certo também que a suspensão do prazo para deduzir o pedido de intimação apenas ocorre quando a queixa é apresentada pelo interessado e não quando o pedido é feito pela entidade requerida – n.º 1 do artigo 16º da LADA. O que faz sentido na perspectiva de que, nessa hipótese, ainda é possível, no próprio entendimento do Requerente, resolver a questão em sede administrativa, admitindo a hipótese de a Administração seguir o parecer da C.A.D.A.. Não faz sentido suspender um prazo que é claramente estabelecido a favor do particular por um acto de vontade da entidade requerida que está sujeita ao cumprimento desse prazo.

Finalmente a suspensão do prazo não impede que o interessado apresente a intimação em Tribunal.

Porque é a suspensão de um prazo final, não a suspensão de um prazo inicial.

A fixação do prazo final " ... funciona como instrumento de que a lei se serve em ordem a levar as partes a exercer os poderes-ónus de que são titulares segundo um determinado ritmo. De facto, tais prazos, na medida em que o seu transcurso implica a impossibilidade de praticar o acto, exercem uma acentuada pressão psicológica sobre o sujeito, titular do poder-ónus, uma vez que este, para evitar a caducidade de tal poder, terá de adoptar um determinado comportamento processual e, consequentemente, praticar o acto dentro dos limites de tempo que lhe são assinalados." - Anselmo de Castro, Direito Processual Civil, Vol. III, 1982, p. 50.

Apenas o prazo inicial significa que "O acto não pode ser praticado antes do termo desse prazo, tendendo este a interpor um certo espaço de tempo entre um acto processual e outros que possam seguir-se. São, pois, ditados no interesse da parte contrária à que pratica o acto e daí que se aquela não excepciona a intempestividade, originada pela prática do acto antes do decurso do termo dilatório, a nulidade decorrente não possa ser objecto de conhecimento oficioso, nem invocável pela parte que lhe deu causa" - Anselmo de Castro, op. Cit, p. 49.

O que significa que o requerente, iniciado o prazo para exercer um direito, pode exercê-lo até ao final do prazo, ou seja, enquanto este não se esgotar, esteja suspenso ou não.

No caso concreto, ainda que estivesse suspenso o prazo para requerer a Intimação da Entidade Demanda, a Requerente e Recorrente podia requerer, como requereu, a presente intimação porque o prazo fixado na lei é final e não inicial.

Quando à natureza urgente do pedido de intimação, não altera esta conclusão, antes a confirma.

Reconhecendo o legislador a urgência na prestação de informação ou entrega de certidão por parte da Administração quer pela LADA. - artigo 15º - quer pela lei processual - artigos 105º a 107ºdo Código de Processo nos Tribunais Administrativos -é imperioso concluir que as normas criada neste âmbito – quer as de caráter substantivo quer processual –devem ser interpretadas no sentido de esse direito ser satisfeito com a maior celeridade possível, o que é incompatível com deixar nas mãos da Administração a possibilidade de protelar o cumprimento desse dever, designadamente pelo pedido de emissão de parecer à C.A.D.A.

Termos em que também esta excepção se não verifica.

O que implica que o Tribunal recorrido deveria ter conhecido de mérito o pedido de intimação.

Não o tendo feito, cabe agora a este Tribunal de recurso fazê-lo, em substituição do Tribunal recorrido – n.º3 do artigo 149º do Código de Processo nos Tribunais Administrativo.

III.II. O mérito de pedido de intimação.

Subscreve-se desde logo aqui o acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 29.05.2023, no processo 03113/19.1BEPRT”

“Com efeito, o CPTA instituiu, em concretização da Constituição da República Portuguesa (CRP) o meio de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões como um meio principal, de carácter urgente, a usar pelos interessados nos casos de incumprimento dos deveres de informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos em todas as suas modalidades (informação/consulta de processos/passagem de certidões), bem como nos casos de notificação insuficiente, remetendo para a lei substantiva (constitucional e legal), a regulação do direito à informação e respetivos limites.

Tais direitos à informação procedimental e não procedimental encontram-se constitucionalmente reconhecidos como direitos fundamentais análogos aos direitos, liberdades e garantias (artigo 268.º da CRP) e, assim, submetidos ao regime previsto no artigo 18.º da CRP.

Lê-se no artigo 104.º do CPTA que “quando não seja dada integral satisfação a pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o interessado pode requerer a intimação da entidade administrativa competente” para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões e que o pedido de intimação é igualmente aplicável nos casos de notificação insuficiente previstos no n.º 2 do artigo 60.º.

Por sua vez, nos termos previstos no artigo 105.º do CPTA a intimação deve ser requerida ao tribunal competente, no prazo de 20 dias, que se inicia com a verificação das circunstâncias ali mencionadas, sintetizadas na formulação de pedido prévio à Administração para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões não satisfeito integralmente no prazo legalmente estabelecido.

Neste contexto, o CPA consagra o direito dos interessados de serem informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos procedimentos em que sejam diretamente interessados, abrangendo as informações a prestar os atos e diligências praticados, as decisões adotadas e quaisquer outros elementos solicitados, bem como a obter certidão dos documentos que constem dos processos e certificados de dados constantes de documentos do processo”.

No caso concreto o que se pretende, ao contrário do defendido pela Entidade Recorrida e do decidido na sentença recorrida, não é obter documentos destinados a instruir um processo de natureza penal.

Pretende, ao invés, obter documentos que poderão ou não instruir o processo penal, consoante isso seja do interesse da arguida, aqui Requerente, ou não. Impor o requerimento de junção ao processo crime de documentos que podem prejudicar a defesa seria atacar frontalmente esse direito de defesa em processo penal , com protecção constitucional , nos artigos 2.º, 18.º, 32.º da Constituição da República Portuguesa.

Trata-se aqui do pedido de intimação a prestar informações e entregar uma certidão que se encontram na posse de uma Entidade Administrativa que tem o poder, unilateral, de satisfazer esse pedido ou não, ao abrigo de normas de normas de direito administrativo, precisamente as que constam da LADA.

Estamos, portanto, perante um conflito de natureza jurídico-administrativa para a solução do qual são competentes os tribunais administrativos, sendo certo também que só pelo presente meio processual, de intimação para a prestação de informações ou passagem de certidão, se mostra possível satisfazer tal pedido, sem beliscar com o direito de defesa em processo penal - artigo 104º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e artigo 4º, n.º 1, alínea a), do Estatuo dos Tribunais Administrativos e Fiscais.

E, de um ponto de vista substantivo, mostra-se legítimo e atendível o interesse no acesso à informação e documentação pretendidos, apesar de conter dados nominativos de terceiros – alínea b) do n.º 5 do artigo 6º da LADA.

Em contraponto, mostra-se possível acautelar os legítimos interesses de terceiros se a informação e certidões omitirem nomes, moradas, números de contribuinte, da ADSE, de utente de Saúde, da CGA, da Segurança Social e dados bancários (IBAN) - preceito acabado de citar, da LADA.

Sendo certo que a Requerente poderá identificar nos documentos e nas informações a prestar pela Entidade Demandada quais os funcionários em causa, tendo em conta que é “conhecedora em geral dos seus conteúdos” – parte final do artigo 6º da petição inicial – e tendo em conta as objecções levantadas pela Entidade Administrativa – artigo 10º da sua resposta ao pedido de intimação.




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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO pelo que julgam parcialmente procedente o pedido de intimação, condenando a Entidade Demandada a prestar as informações e a passar a certidão requerida com as restrições acima apontadas.

Custas na proporção de 1/5 para a Recorrente e de 4/5 para a Recorrida em ambas as instâncias.

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Porto, 13.09.2023


Rogério Martins
Isabel Costa
Luís Migueis Garcia