Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01358/11.1BEBRG-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/22/2015
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:REALIZAÇÃO DE SEGUNDA PERÍCIA;
INDEFERIMENTO; ARTIGO 589º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1995.
Sumário:1. É condição do deferimento da realização da 2ª perícia a sua fundamentação, através da alegação das razões da sua discordância relativamente ao relatório apresentado.
2- Sendo o requerimento devidamente fundamentado, não pode ser indeferida a segunda perícia, por se discordar das razões invocadas.
3. O requerimento para a realização de segunda perícia que alega as razões da discordância relativamente aos resultados da primeira determinada oficiosamente, apontando-lhe inexactidões e deficiências passíveis de correcções, preenche os pressupostos do art. 589º do Código de Processo Civil de 1995 (aplicável no tempo ao caso), pelo que não deve ser indeferido.
4. Os eventuais esclarecimentos a prestar em julgamento, referidos no despacho que indeferiu a realização da requerida segunda perícia não substituem esta diligência por se tratar de órgão colegial necessariamente distinto. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Construções EC & Irmão, L.da
Recorrido 1:RJFR, Município de G... e Outro(s)...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO
Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
A sociedade “Construções EC & Irmão, L.da” veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho do juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 07.04.2014, pelo qual foi indeferida a realização de segunda perícia que a ora recorrente tinha requerido na acção interposta por RJFR contra o Município de G... e em que foram indicados como contra-interessados JOR, a ora recorrente e outros.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação ao caso concreto, o disposto nos artigos 90º, n.º2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais, o artigo 389º do Código Civil, e os artigos 195º, 265º, 487º, n.º1, e 489º, todos do actual Código de Processo Civil.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

*
Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
*

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1. Vem o presente recurso interposto do despacho proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que indeferiu o requerimento apresentado pela contra-interessada, ora recorrente, para a realização de segunda perícia colegial, nos termos dos artigos 487º e 489º do Código de Processo Civil.

2. Foi requerida e deferida a realização de uma primeira Perícia Colegial. Notificada a recorrente do resultado da mesma, reclamou requerendo, de imediato, a prestação de esclarecimentos para suprir a falta de fundamentação, as insuficiências e obscuridade que o relatório pericial notificado padecia, requerendo, ainda, e subsidiariamente, segunda perícia colegial, fundamentando as razões da discordância do relatório pericial apresentado.

3. Entendeu o juiz a quo notificar os peritos para prestarem esclarecimentos sobre as insuficiências aí apontadas no relatório pericial. Tais esclarecimentos vieram a ser prestados, mas, no entender da recorrente de uma forma insuficiente.

4. Por isso, a ora recorrente apresentou nova reclamação contra o resultado da perícia notificada, requerendo que os peritos viessem prestar esclarecimentos sobre as insuficiências aí apontadas no relatório pericial. Tais esclarecimentos vieram a ser prestados, mas, no entender da recorrente de uma forma insuficiente.

4. Por isso, a recorrente apresentou reclamação contra o resultado da perícia notificada, requerendo que os peritos viessem prestar os esclarecimentos para suprir a falta de fundamentação, as insuficiências e obscuridade que o relatório pericial notificado padecia, renovando, ainda, a recorrente o requerimento para realização de segunda perícia colegial, alegando novamente, em concreto, as razões da discordância e, fundamentando-as.

5. Entendeu o juiz a quo indeferir a realização da segunda perícia colegial, alegando, sumariamente, que “(…) por se considerar que a mesma se não revela útil para a decisão da causa. Neste particular há que salientar que uma segunda perícia, mesmo que vivesse a ser realizada, sempre teria o seu objecto definido pelo objecto do labor pericial já fixado no processo, e dentro das limitações e contingências que do mesmo possam porventura ter resultado, nomeadamente quanto aos conceitos que foram utilizados. Daí que se mostre desnecessária a realização de nova perícia.”

6. Ora, entendimento diverso tem a recorrente, porquanto entende que os fundamentos por si invocados e as razões da discordância em relação à primeira perícia colegial são pertinentes. A não realização da segunda perícia colegial poderá ser susceptível de influenciar a decisão da causa, o que constitui nulidade que inquina os termos subsequentes ai despacho que a indeferiu.

7. Nos termos do disposto no artigo 487°, n.° 1 do Código de Processo Civil "Qualquer das partes pode requerer se proceda a segunda perícia, no prazo de dez dias a contar do conhecimento do resultado da primeira, alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado" ( n. o 1 ), sendo que a segunda perícia tem por objecto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destina-se a corrigir a eventual inexactidão dos resultados desta.

8. Atento o disposto no citado 487°, n.º 1 do Código de Processo Civil, que, não resultando da versão aplicável do preceito tratar-se de um poder discricionário da parte o de requerer e ver deferida a realização de 2º perícia, como em versões anteriores se verificava, dispensando a lei o requerente do segundo arbitramento "de justificar o pedido, de apontar defeitos ou vícios ocorridos no primeiro arbitramento, de apontar as razões por que julga pouco satisfatório ou pouco convincente o resultado do primeiro arbitramento" - cf. A. Reis, Código de Processo Civil, anotado, Vol. IV, pg.302, é hoje condição de deferimento do pedido de realização de 2a perícia a alegação fundamentada das razões de discordância relativamente aos resultados da lª perícia, e, ainda, que tal alegação especificada é o único requisito legal do requerimento em causa a formular nos termos do art.º 587º do Código de Processo Civil.

9. Para fundamentar a sua pretensão a recorrente alegou em síntese que, os senhores peritos recorreram a conceitos técnico-jurídicos que não são aplicáveis ao caso em concreto, e que nem sequer estavam em vigor à data da emissão do alvará de licenciamento n.° 568/09 para aferir e determinar o conceito de alinhamento dominante do conjunto.

10. Sendo certo que, é do conhecimento geral e também dos técnicos a impossibilidade de aplicar rectroactivamente legislação nova a licenciamentos concluídos em momento anterior à entrada em vigor dessa legislação. Ora, partindo os senhores peritos de uma premissa incorrecta, tal acarretou, necessariamente, que o resultado alcançado com a perícia tivesse ficado prejudicado, mais concretamente quanto às respostas dadas aos quesitos n. Os 5 a 9, não demonstrando o relatório pericial ser um resultado de confiança.

11. Fundamentou, ainda a recorrente a sua pretensão no facto de os senhores peritos e concretamente quanto aos quesitos seis e oito não terem esclarecido nem as partes, nem o Tribunal sobre o método de medição utilizado, levando a que ocorra uma inexactidão em sede de relatório pericial que impede a parte sequer de se pronunciar quanto ao resultado plasmado.

12. De salientar, ainda, pese embora, a recorrente não o tenha dito, porquanto resulta claro do relatório pericial, sobre os quesitos n.ºs 3, 4, e 5 existem ab initio dois resultados/opiniões/pareceres distintos.

13. Ao contrário do que resulta do despacho recorrido, "Analisado o teor do requerimento apresentado, resulta saliente que a matéria constante dos pontos 1º a 38º consubstancia, pela sua materialidade, considerandos da parte quanto à valia e/ou correcção do teor do relatório pericial e seus posteriores esclarecimentos, sendo portanto comentários que procuram infirmar o teor do Relatório em causa. Ora, a dinâmica processual não faculta às partes, e após a realização da perícia, qualquer faculdade para alegarem o que tiverem por pertinente quanto ao resultado da perícia, devendo as partes aguardarem pelo momento das alegações finais para aí analisarem, como melhor entendam em face dos seus interesses, a valia de todo o acervo probatório recolhido ao longo do processo e do qual naturalmente fará parte a perícia realizada nos presentes autos", cabe, também, mas não só, às partes sindicar e apreciar o resultado da perícia requerida.

14. Que foi o que fez a recorrente, fundadamente, discorreu sobre as razões pelas quais discorda com o resultado plasmado no relatório pericial.

15. É o que resulta por imperativo legal das disposições conjugadas dos artigos 900, n." 2 "in fine" do CPTA, dos artigos 487° e 4890 do Código de Processo Civil.

16. O que justifica a segunda perícia é a necessidade ou a conveniência de submeter à apreciação de outro perito ou peritos os factos que já foram apreciados. Face ao supra exposto, apenas se pode concluir pela necessidade de uma segunda perícia, porque, no entendimento da recorrente os primeiros peritos viram maios factos e emitiram sobre eles juízos de valor que não merecem confiança, que não satisfazem; porque não se considera convincente o parecer obtido na primeira perícia, tendo que se lançar mão da segunda.

17. O objecto da segunda perícia coincide com o da primeira, isto é, com as questões de facto indicadas pelas partes (artigos 475°, n.º 1 e 476°, 11.° 1 do Código de Processo Civil) ou de iniciativa oficiosa, a que o juiz a tenha circunscrito (artigo 476°, n.º 2 do Código de Processo Civil, "in fine"].

18. Tal não impede que, dentro desse objecto, outros factos, que a primeira perícia devesse ter considerado mas não haja considerado, sejam agora objecto de averiguação. A segunda perícia pode assim ler maior latitude do que quando, no regime anterior, o campo de intervenção dos peritos estava delimitado pelos quesitos que lhe eram formulados: embora a norma do n.º 3 do artigo 589º seja formalmente equivalente à do anterior artigo 609º, n.º 2, seu conteúdo substancial sofreu a modificação decorrente da nova regra de apuramento do objecto da prova pericial'".

19. Com efeito, a lei processual, nas normas em causa, apenas se reporta a "alegação fundamentada das razões da discordância" do requerente, não impondo que estas sejam, ainda, razões de "convencimento" do próprio tribunal, sendo que, nos termos do n.º 2 do artigo 487º do Código de Processo Civil, considerando o juiz existirem razões a tal realização de segundo arbitramento deve ordenar a sua realização oficiosamente, independentemente da vontade e requerimento das partes, com vista ao apuramento da verdade, tendo sempre a segunda perícia por objecto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destina-se a corrigir a eventual inexactidão dos resultados desta, sendo, ainda, que a segunda perícia não invalida a primeira, sendo uma e outra livremente apreciadas pelo tribunal (artigo 4890 do Código de Processo Civil).

20. No caso em apreço, a recorrente apresentou requerimento para realização de segunda perícia colegial nos termos do artigo 587º e fundamentou de forma completa e especificada as razões da sua discordância relativamente aos resultados da primeira perícia.

21. Cumpriu assim a ré o ónus de alegação fundamentada imposto pelo citado artigo 4870 do Código de Processo Civil, e, assim, deve ser ordenada a realização da requerida segunda perícia nos termos do citado preceito
.
22. Com efeito, o preceito do n.º 3 do artigo 48º0 do Código de Processo Civil, ao referir que a segunda perícia se destina a corrigir a eventual inexactidão dos resultados da primeira perícia, compreende qualquer inexactidão que seja relevante ao nível dos resultados da perícia e possa influir no juízo de avaliação do tribunal.

23. O significa que tanto abrange as inexactidões verificadas ao nível da fundamentação, como as relativas à percepção dos peritos ou às conclusões a que chegaram com base nos seus conhecimentos especializados. - (neste sentido cf. com Acórdão da Relação de G... datado de 20 de Abril de 2009, proferido no processo n." 202665/05.8TBOAZ.Pl).

24. "A lei, no artigo 589º do Código de Processo Civil confere às partes a faculdade de requerer a segunda perícia, fazendo depender a sua realização, somente, do seu requerimento tempestivo e da explicitação das razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, não podendo o juiz basear o indeferimento deste requerimento por discordar das razões invocadas para a pretensão formulada." - (sublinhado nosso, vide in, www.dgsi.pt , Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de I0 de Novembro de 2009).

25. E mesmo que o Tribunal "a quo" entendesse que o requerimento a peticionar a segunda perícia não se encontrava suficientemente fundamentado, "Não basta à parte requerer a realização de segunda perícia, sendo- lhe exigido que concretize os pontos que não encontra suficientemente esclarecidos na primeira, enunciando as razões por que entende que esse resultado deverá ser diferente. II – Quando tal não ocorra, fazendo uso dos poderes que são conferidos ao juiz, pelo art.º 265º, n.ºs 1 e 2, do C. P. Civil, deve ser proferido despacho de convite com vista à omissão da fundamentação do requerimento para segunda perícia e não indeferido de imediato esse pedido. - (Cf. com Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 13 de Outubro de 2010).

26. Ao decidir em contrário, a decisão proferida violou nomeadamente, o disposto nos artigos 90°, n.º 2 do C.P.T.A., 195°, 265°, 487°, n." 1 e 489°, todos do Código de Processo Civil, e o artigo 389° do Código Civil, pelo que deve ser revogada e, consequentemente, anulado tudo O que vier a ser processado posteriormente.

(…)”
*

II – Matéria de facto.

1. A contra-interessada “Construções EC & Irmão L.da”, ora recorrente, notificada do relatório pericial junto aos autos principais, apresentou o seguinte requerimento:
“(…)


É muito difícil escrever-se nem que seja uma linha de direito…” (anónimo).

Determina o artigo 485°, n.º 2 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 90º do CPTA que, "Se as partes entenderem que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas, podem formular as suas reclamações."

Sob o n.º 5 foi quesitado, "A construção licenciada através do alvará de licenciamento n.º 568/09 não respeita o alinhamento das fachadas do conjunto onde se insere?"

Salvo melhor opinião, ab initio, os senhores peritos partem de uma premissa incorrecta e que não corresponde ao que o legislador pretendeu.

Escalpelizando,


O alvará de licenciamento relativo à edificação aqui em discussão foi emitido em 21 de Setembro de 2009.

Ora, o Regulamento n." 591/2010 - Regulamento Municipal de Edificação e Urbanização do concelho de G..., é datado de 29 de Junho de 2010.

Razão pela qual o diploma legal é inaplicável e não produz quaisquer efeitos relativamente ao alvará de licenciamento sub judice nos termos do artigo 60°, n.º 1 do RJUE.

À data da emissão da licença de construção estava em vigor o regulamento municipal de urbanização e de edificação e de taxas e encargos nas operações urbanísticas, publicado em Diário da República, Aviso n. 7848/2005 (Z." série), que não contempla a definição de alinhamento ou cércea dominante.

Nem tão pouco tem uma definição como a agora trazida pelos senhores peritos, estudo do conjunto, "Estudo englobando a área de intervenção e as construções adjacentes ou próximas, que visa garantir a salvaguarda de uma solução urbanística possível e viável (… embora não vinculativa e passivei de alteração). Em situações de loteamento, correspondendo à edificação de construção em banda ou geminada, o estudo de conjunto deverá salvaguardar a unidade formal do conjunto edificado, nomeadamente 110 que se refere aos materiais, coberturas, fenestrações e revestimentos." – (Cf. com artigo 3°, alínea s) do Regulamento n.º 591/2010 – Regulamento Municipal de Edificação e Urbanização do concelho de G...).

10°
Resulta, cristalino da letra da lei que o estudo do conjunto visa considerar especificadamente uma solução urbanística tendo em conta somente as edificações vizinhas,

11°
Quando o espírito do legislador presente no artigo 9° do Regulamento de PDM, claramente, refere que, nas áreas em que não existem planos de pormenor ou de alinhamento e cérceas aprovados se deve ter em conta não só os edifícios vizinhos como também os envolventes,

12°
Apontando para a definição constante da alínea t) do artigo 3° do Regulamento n." 591/2010 - Regulamento Municipal de Edificação e Urbanização do concelho de G..., que, efectivamente, in casu, não se aplica_

13°
Mas que, por mero exercício académico, infra se transcreve:

14°
"Estudo urbanístico - Proposta desenhada de ocupação do solo que, na ausência de planos de urbanização ou de pormenor, integra os projectos de operações urbanísticas, visando os seguintes objectivos: Servir de orientação na gestão urbanística. em zonas que apresentem indefinições ao nível da estrutura rodoviária, do ordenamento do espaço público e equipamentos. cérceas e afastamentos entre edificações; Justificar a solução que o promotor pretende fazer aprovar, devendo o estudo abranger a parcela do promotor em articulação com as envolventes, numa dimensão adequada que permita a avaliação qualitativa da solução."

15º
Tal definição de conjunto mostra-se muito mais consentânea com o espírito do legislador do que a apontada no relatório pericial, isto porque, na sua essência são conceitos diferentes, sendo que essa diferença reside no facto de o primeiro buscar uma solução individual, ao passo que o segundo aponta para uma solução global, considerado o conjunto.

Na verdade,


16º
Determina o artigo 9° do Regulamento que, "Nas áreas em que não existem planos de pormenor ali de alinhamento e cérceas aprovados. as edificações a licenciar nas zonas de construção ficam definidas pelo alinhamento das fachadas e pela cércea dominante do conjunto em que se inserem, não sendo invocável a eventual existência de edifícios vizinhos ou envolventes que excedam a altura ou o alinhamento dominante do conjunto. "

17º
A questão controversa quanto a este ponto reside na interpretação a dar-se ao conceito de "alinhamento das fachadas dominante do conjunto" para efeitos do artigo 9", do Regulamento de PDM de G... já que o mesmo não contém qualquer definição do mesmo.

18º
Trata-se de um conceito indeterminado, cujo conteúdo deve encontrar-se atendendo aos princípios interpretativos legais consagrados no artigo 9° do Código Civil, não havendo aqui qualquer discricionariedade da entidade administrativa competente pelo licenciamento, mas antes um poder vinculado, já que não se atribui à entidade administrativa competente um poder de escolha entre alternativas. - Cf. neste sentido, Acórdãos do STA de 20.11.2002, Processo n° 0433/02 e de 14.07.2010, Processo n" 0321/10, o que não ocorre in casu.

19°
Sendo um conceito indeterminado a entidade administrativa não o deve preencher com recurso a uma mera compreensão do sentido literal da expressão, não sendo admissível que não tenha em conta a unidade sistemática em que a norma se insere, as circunstância e condições (artigo 9°, n." J do Código Civil).

20º
No caso concreto, impõe-se perguntar se para o preenchimento do conceito de "alinhamento das fachadas dominante do conjunto" se deve atender ao conjunto dos edifícios que compõem a malha urbana (sentido estrito - rua ou quarteirão) onde o edifício a licenciar vai ser construído ou se se deve atender ao conjunto de edifícios que compõe todo o aglomerado urbano (sentido lato - povoação).

21°
Relativamente a este contexto consagrou-se no artigo 1210 do Regime Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n° 38 382 de 07.08.1951 "as construções em zonas urbanas ali rurais, seja qual for a sua natureza e o fim a que se destinem, deverão ser delineadas, executadas e mantidas de forma que contribuam para dignificação e valorização estética do conjunto em que venham a integrar-se. Não poderão erigir-se quaisquer construções susceptíveis de comprometerem, pela localização, aparência ou proporções, o especto das povoações ou dos conjuntos arquitectónicos, edifícios e locais de reconhecido interesse histórico ou artístico ou de prejudicar a beleza das paisagens".

22°
Norma que passou para o artigo 63°, n° 1, al. d) do Decreto-Lei n" 445/91, de 20 de Novembro, onde se afirma que o pedido de licenciamento é indeferido se a obra for "susceptível de manifestamente afectar a estética das povoações, a sua adequada inserção no ambiente urbano ou a beleza das paisagens, designadamente em resultado da desconformidade com as cérceas dominantes. a volumetria das edificações e outras prescrições expressamente previstas em regulamento", mantendo-se no artigo 24", n." 3 do Decreto-Lei n° 555/99, de 16 de Dezembro.

23º
E é neste ponto que se insere o artigo 9° do Regulamento de PDM de G..., o qual não poderá ser lido fora do contexto e circunstâncias específicas que este tipo de normatividade visa regular.

24°
A expressão "alinhamento das fachadas dominante do conjunto" deve ser entendido, em princípio e na falta de indicação em contrário, como aquele que garante um conjunto urbanístico mais uniforme, tendo em atenção a povoação, e não uma determinada Rua ou quarteirão.

25°
Sendo inconcebível e indefensável como fazem os senhores peritos circunscrever tal conceito ao local da obra: edifício sito a nascente do mesmo lado do arruamento.

26°
No entendimento dos senhores peritos o conjunto é composto por um edifício.

27°
Ora, da simples consulta de um dicionário da língua portuguesa resulta que conjunto é Um substantivo masculino e significa: resultado da união das partes de um todo, complexo; reunião das partes que constituem umtodo; totalidade de elementos que formam um todo.

28°
Gostaria de saber a Contra-Interessada se todos os edifícios existentes em Caldelas têm exactamente o mesmo alinhamento que o edifício existente (que é diferente do alinhamento do edifício a erigir),

29°
Porque de acordo com a "opinião" dos senhores peritos a maior parte dos edifícios de Caldelas deveria ser demolida, pois que, um único edifício constitui e é amostra suficiente para se determinar O alinhamento das fachadas dominante do conjunto.

30°
Quando conjunto necessariamente implica a ideia: mais do que um.

31º
Na óptica defendida pelos senhores peritos, na vila de Caldelas, nenhuma construção seria possível com um alinhamento inferior ao cio prédio existente (Prédio B) e até se imporia que se desencadeassem os mecanismos legais com vista à demolição das construções erigidas após a entrada em vigor do presente Regulamento do PDM, pois que, todas o violariam,

32°
Na verdade se o legislador pretendesse confinar o alinhamento das fachadas dominante do conjunto a uma determinada rua ou quarteirão tê-lo-ia referido expressamente como por exemplo se concretizou no Regulamento do PDM de Viana do Castelo, "alinhamento dominante - projecção horizontal do conjunto de planos de fachadas que num determinado arruamento dista a mesma distância do eixo da via e que constituem o número maioritário de casos de situação de planos de fachada", ou, no Regulamento de PDM de Vila Nova de Gaia, ou no Regulamento de PDM da Trofa.

33º
Mutatis mutandis; no mesmo sentido interpretativo já se pronunciou o STA ao afirmar que: “II – Na falta de precisão do conceito pelo legislador, por cércea dominante deve entender-se a cércea que apresenta maior frequência num conjunto edificado homogéneo, isto é aquela que corresponde à cércea dos edifícios que somem maior extensão de fachadas nesse conjunto, e por quarteirão o conjunto de edifícios implantados numa área urbana, delimitada por arruamentos”, vd in www.dgsi.pt, 10 de Maio de 2007.

34°
E também o Tribunal Central Administrativo do Norte, datado de 29 de Junho de 2012, "Resultando apenas do disposto no n" 2 do artº 37º do Reg. do P.D.M de Montemor-o-Velho que "Nas áreas urbanas de Montemor-o-Velho, Carapinheira, Tentúgal, Arazede e Pereira, o índice de construção máximo será de 1,20 e o número de pisos não pode exceder 3 acima do nível da rua, mantendo a cércea dominante, a cércea dominante deverá aferida por toda a área urbana da vila de Pereira e não apenas rua/local/zona onde se situa o prédio construído II - Deve, pois, ter-se em consideração que o vocábulo usado oi "dominante" e não " predominante" assim se concluindo que o legislador quis com aquela expressão afirmar aquele que domina em altura, sendo que esta altura tem de ser vista e analisada num contexto urbano que ultrapassa numa simples rua ou travessa, até porque estamos perante uma pequena povoação com um pequeno núcleo de aglomerado populacional." - (Sublinhado nosso).

35º
Assim, face ao supra exposto, temos por pacífico que a resposta dada ao quesito 5" padece de falta de fundamentação, apresentando, inclusive, contradições.

36°
Como é do conhecimento geral e também dos técnicos não se pode aplicar retroactivamente legislação nova a licenciamentos concluídos em momento anterior à entrada em vigor dessa legislação.

37°
Razão peja qual, a resposta dada ao quesito 5° sofre, nitidamente, de falta de fundamentação.

38º
Assim, devem os senhores peritos fundamentar a resposta dada ao quesito 5", esclarecendo, especificadamente aos seguintes pontos.

39º
É facto assente que o prédio a erigir (A) e o prédio existente (B), ambos, têm fachadas confrontantes com a Avenida 25 de Abril, vila e freguesia de Caldas das Taipas, concelho de G....

40°
A Avenida 25 de Abril, vila e freguesia de Caldas das Taipas, concelho de G..., no sentido Poente tem como prolongamento e intersecciona a Rua Escalheiro e perpendicularmente pela Rua de São Martinho e Rua do Comandante Carvalho Crato?

41º
A Avenida 25 de Abril, vila e freguesia de Caldas das Taipas, concelho de G..., no sentido Nascente tem como prolongamento e intersecciona a Avenida Francisco Martins Sarmento?

42°
Considerando a Avenida 25 de Abril, vila e freguesia de Caldas das Taipas, concelho de G..., em toda a sua extensão (interseccionada a Poente pela Rua Escalheiro e perpendicularmente pela Rua de São Martinho e Rua do Comandante Carvalho Crato e a Nascente pela Avenida Francisco Martins Sarmento), e considerando toda a frente edificada tanto a Norte como a Sul desse arruamento, digam os senhores peritos quantos prédios existem?

43º
Esclareçam os senhores peritos, e relativamente ao prédio existente (B) qual é a distância entre o plano de fachada Sul e o eixo da via?

44°
Considerando a Avenida 25 de Abril, vila e freguesia de Caldas das Taipas, concelho de G..., em toda a sua extensão (interseccionada a Poente pela Rua Escalheiro e perpendicularmente pela Rua de São Martinho e Rua do Comandante Carvalho Crato e a Nascente pela Avenida Francisco Martins Sarmento), algum dos prédios aí existentes tem o mesmo alinhamento do plano de fachada Sul do prédio existente (B), ou seja, algum desses prédios tem entre o plano de fachada confrontante com a Avenida 25 de Abril e o eixo da via a mesma distância do prédio B, e supra respondida?

45°
Esclareçam ainda os senhores peritos se o plano de fachada Nascente do prédio existente CB) é a fachada de entrada principal do prédio (ou fachada dominante do prédio)?

46º
Devendo, ainda, esclarecer se o plano de fachada Nascente do prédio existente (H) confronta ou não com a Rua Padre da Silva Gonçalves?

47°
E o plano de fachada Nascente do prédio existente (B), que confronta com a Rua Padre da Silva Gonçalves, dista que distância do eixo da via?

48°
A fachada do prédio existente (B) que confronta com a Avenida 25 de Abril pelo lado Sul constitui uma fachada secundária (de traseiras)?

49°
Considerando a povoação vila e freguesia de Caldas das Taipas, concelho de G..., digam os senhores peritos qual é o plano de fachada que naquela povoação dista a mesma distância do eixo da via e que constitui o número majoritário (metade de vezes mais um) de casos de situação de planos de fachada nessa povoação?

50º
Considerando a Avenida 25 de Abril, vila e freguesia de Caldas das Taipas, concelho de G..., em toda a sua extensão (interseccionada a Poente pela Rua do Pinheiral e a Nascente pela Avenida Francisco Martins Sarmento), e considerando toda a frente edificada tanto a Norte como a Sul desse arruamento, digam os senhores peritos, se em relação à frente edificada a Norte, se esta é ou não uma frente urbana consolidada, e se a frente edificada a Sul é ou não uma frente urbana consolidada? Justifiquem.

51º
Corresponde à realidade que o prédio a erigir (A) pelo lado Sul confronta com o passeio da Avenida 25 de Abril, ao passo que o prédio existente (B) pelo lado sul confronta com um parque de estacionamento, parque esse pelo qual se acede à Avenida 25 de Abril?

52º
Sob o quesito 6 foi perguntado aos senhores peritos se, "A fachada da construção a erigir está bem mais junta à estrada que o alinhamento das fachadas dominantes?"

53º
Sendo imediatamente perguntado sob o quesito 8 se esse desfasamento "(…) é, de pelo menos 2, 5 metros?"

54º
Ao que, os senhores peritos responderam que sim, e que tal desfasamento é de cerca de oito metros.

55º
Continua por esclarecer por parte dos senhores peritos qual o método de medição, as medições realizadas tiveram ou não como ponto de referência o eixo da via ou se tiveram como referência os planos de fachada dos prédios a erigir e o existente?

56°
Assim, é de concluir que a resposta dada aos quesitos 6 continua a padecer de insuficiência quanto à sua fundamentação, pois que, a Contra-Interessada, apenas, se pode pronunciar quando às conclusões patenteadas no relatório, se as mesmas estiverem devidamente fundamentadas.

57º
No quesito 10, continua por esclarecer qual é O valor de projecção das saliências/varandas sobre o espaço público? E qual é a altura das mesmas em relação ao solo?

58°
Pese embora tal esclarecimento já tenha sido ordenado por douto despacho proferido a fls... dos presentes autos.

59º
Salvo melhor opinião, o relatório pericial, contínua a padecer de insuficiências, obscuridades, contradições, conforme supra explanado.

60°
O relatório pericial, não cumpre, pois o objecto da perícia.

61°
E não permite, pois, uma conclusão cabal acerca do objecto da mesma, e que, por isso, não se pode aceitar, motivo pelo qual se deixa o seu conteúdo integralmente impugnado, nos termos do disposto no artigo 485°, n." 2 do Código de Processo Civil.

62º
Pelo que, devem os senhores peritos esclarecer em concreto os quesitos de que ora se reclama.

63º
Face ao supra exposto, em virtude da deficiência verificada, requer-se a V. Exa. se digne ordenar aos senhores peritos, esclarecer os pontos cuja fundamentação e esclarecimento o Tribunal já doutamente ordenou, sob cominação de multa, caso não o façam.

III - Subsidiariamente, caso assim não se entenda,


64°
Pelos motivos supra e abundantemente explanados, que aqui se dão integralmente por reproduzidos, requer-se desde já a realização de uma segunda perícia nos termos do artigo 486º do Código de Processo Civil, por forma a obter uma perícia válida, imparcial e coerente acerca dos factos quesitado, indicando-se desde já, como perito da parte, a Engenheira-Técnica, SF, com domicílio profissional na Praça ….

65°
Requer, ainda, desde já, a comparência dos senhores peritos em audiência de julgamento para prestarem os esclarecimentos necessários, nos termos do artigo 486º, nº 1 do Código de Processo Civil.

Junta: duplicados legais, DUC relativo ao 3° dia de multa e comprovativo de autoliquidação, comprovativo de notificação ao Ilustre Mandatário do Autor, da Ré e do Contra-Interessado.

(…)”

2. Com a data de 07.04.2014 foi proferido o despacho ora recorrido:
“(…)

A contra-interessada, no seguimento dos esclarecimentos prestados pelos Senhores Peritos, veio apresentar em 6 de Fevereiro de 2014 novo articulado (cf. fls. 347 ss do suporte físico dos autos).

Analisado o teor do requerimento apresentado, resulta saliente que a matéria constante dos pontos 1º a 38º, consubstancia, pela sua materialidade, considerandos da parte quanto à valia e/ou correcção do teor do relatório pericial e seus posteriores esclarecimentos, sendo portanto comentários que procuram infirmar o teor do Relatório em causa.

Ora, a dinâmica processual não faculta às partes, e após a realização da perícia, qualquer faculdade para alegarem o que tiverem por pertinente quanto ao resultado da perícia, devendo as partes aguardarem pelo momento das Alegações finais para aí analisarem, como melhor entendam em face dos seus interesses, a valia de todo o acervo probatório recolhido ao longo do processo e do qual naturalmente fará parte a perícia realizada nos presentes autos.

Nesta medida, as considerações vertidas no articulado em causa, não resultam legalmente admissíveis e, como tal, serão desconsideradas pelo Tribunal.

Continuando a análise do requerimento apresentado pela Contra-interessada, nos seus pontos 38º a 62º, vem a contra-interessada, uma vez mais, requerer dos peritos aquilo que reputa de esclarecimentos.

Antes de mais, cumpre salientar que a parte já formulou pedido de esclarecimentos/reclamação quanto ao teor do Relatório pericial, o que foi objecto de deferimento pelo Tribunal, tendo então os Senhores Peritos prestado os esclarecimentos constantes de fls. 335 a 341 do suporte físico dos autos.

Sendo assim, como é, não resulta processualmente admissível, nova insistência quanto a eventuais esclarecimentos, devendo a parte interessada requerer a presença dos Senhores Peritos em sede de Audiência Final, para aí prestarem os esclarecimentos que considere necessários (cfr. actual art.º 486º, n.º1, do CPC vigente, e cujo teor é idêntico ao anterior art.º 582º, n.º1, do CPC de 1961).

Nesta medida, o pedido de esclarecimentos sempre teria que ser indeferido, havendo ainda que referir que os esclarecimentos apenas visam tornar mais claro o juízo formulado pelos Senhores Peritos não servindo naturalmente para, com esse pretexto, se vir alargar o concreto objecto da perícia que foi inicialmente fixado.

Nestes termos, indefere-se o pedido de esclarecimentos ora apresentado, sem prejuízo de a Contra-interessada, em sede de Audiência final, poder obter dos Senhores Peritos os eventuais esclarecimentos que considere indispensáveis, ficando desde já determinada a comparência dos Senhores Peritos na Audiência a realizar, nos termos do disposto no art.º 486º, n.º1, do CPC.

A Contra-interessada requer, a título subsidiário a realização de uma segunda perícia.

Considerando o disposto no art.º 487º, n.º1, do CPC, indefere-se o pedido, por se considerar que a mesma se não revela útil para a decisão da causa.

Neste particular, há que salientar que uma segunda perícia, mesmo que viesse a ser realizada, sempre teria o seu objecto definido pelo objecto do labor pericial já fixado no processo, e dentro das limitações e contingências que do mesmo possam porventura ter resultado, nomeadamente quanto aos conceitos que foram utilizados.

Daí que se mostre desnecessária a realização de nova perícia.

(…)”.


*
III - Enquadramento jurídico.

Determina o n.º1, do artigo 487.º do actual Código de Processo Civil, de 2013, com a mesma redacção n.º1 do artigo 589º do Código de Processo Civil de 1995, aplicável por força do artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais, sob a epígrafe “Realização de segunda perícia”:

“Qualquer das partes pode requerer que se proceda a segunda perícia, no prazo de 10 dias a contar do conhecimento do resultado da primeira, alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado.”

Sobre esta questão existe abundante jurisprudência, toda ela no sentido favorável à ora recorrente.

Incluindo a citada pela recorrente e pelo Ministério Público, a seguinte:


Acórdão da Relação de G..., de 20.05.2010, na Colectânea de Jurisprudência, 2010, 3º tomo, página 281 (Sumério):

“I. É condição do deferimento da realização da 2ª perícia a sua fundamentação, através da alegação das razões da sua discordância relativamente ao relatório apresentado.

II- Sendo o requerimento devidamente fundamentado, não pode ser indeferida a 2ª perícia, por se discordar das razões invocadas.”.

Acórdão da Relação de G... de 22.06.2010, no processo 1282/06.0 – A VCT-G.1:

“ … é hoje condição de deferimento do pedido de realização de 2ª perícia a alegação fundamentada das razões de discordância relativamente aos resultados da 1ª perícia, e, tal alegação especificada é o único requisito legal do requerimento em causa a formular nos termos do art. 589º do CPC.”.

Acórdão da Relação de Coimbra, de 12.10.2010, no processo 675/08.2 – A CBR-C.1 (Sumário):

“I – A redacção introduzida no n.º 1 do artigo 589º do CPC pela reforma de 95 (DL n.º 329-A/95, de 12-12) caracteriza-se, relativamente ao regime anterior, pela oneração da parte que pretende a realização de uma segunda perícia, com a obrigação de explicitar as razões da respectiva discordância com o resultado da primeira perícia, preenchendo, portanto, o ónus indicado em I – a crítica à fundamentação das asserções presentes na primeira perícia. III – Tal crítica pode traduzir-se numa imputação de falta, insuficiência, ou mesmo pouca clareza ou de inconsistência, dirigida à fundamentação do prejuízo pericial expresso na primeira perícia, sendo que em qualquer desses casos, existindo uma alegação fundamentada, de razões de discordância, com a primeira perícia, haverá que realizar a segunda perícia.”.

Acórdão da Relação de Évora, de 23.02.2011, no processo 7/09.2-A E1:

“O requerimento para a realização de segunda perícia que alega as razões da discordância relativamente aos resultados da primeira determinada oficiosamente, apontando-lhe inexactidões e deficiências passíveis de correcções, preenche os pressupostos do art. 589º do CPC, pelo que não deve ser indeferido:”.

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 20.06.2013, no processo 0713/13 (Sumário):

“I - Nos termos do art. 589º, n.º 1, do CPC, é ilegal indeferir o requerimento de uma segunda perícia quando o requerente dela alegar «fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado».

II - Se um laudo pericial não respondeu aos quesitos - em que se inquiria da zona de um Plano Director onde se localizava uma moradia - por os peritos acharem que o Plano vinha acompanhado de plantas reciprocamente inconciliáveis, discorda fundadamente desse relatório a parte que requer a segunda perícia por recusar que deveras exista uma tal inconciliabilidade e por insistir pela obtenção de respostas precisas à matéria quesitada.”.

Ao contrário do decidido na decisão recorrida – conforme se extrai da citada jurisprudência à qual aderimos por ser pacífica, mais conforme com a letra e o espírito da norma interpretada – devia ter sido realizada a requerida segunda perícia.

A requerente pediu esclarecimentos que os senhores peritos tentaram satisfazer mas, insistindo a requerente em novos esclarecimentos, agora através de nova perícia, não havia razão legal para indeferir.

Não é necessário apurar se os fundamentos do requerimento de segunda perícia se verificam, no caso se há esclarecimentos ou não a prestar efectivamente. Basta que no requerimento se indique a necessidade de prestar esclarecimentos.

E a eventual prestação de esclarecimentos pelo mesmo colégio de peritos em audiência de julgamento não substitui, porque substancialmente diferente, a realização de uma segunda perícia por um diferente órgão colegial, como impõe a alínea a) do artigo 488º do actual Código de Processo Civil.

Não tendo sido realizada a requerida segunda perícia verifica-se a omissão de um acto que devia ter sido praticado, omissão esta susceptível de influir no exame ou decisão da causa, a impor a prática desse acto e a anulação de todo o processado posterior que dela dependa em absoluto – n.º1 e 2, do artigo 195º do actual Código de Processo Civil.

Em particular, se já tiver sido realizado, deverá ser repetido o julgamento da matéria de facto a cuja prova se dirigia a perícia e toda a matéria de facto dela logicamente indissociável, bem como, se for caso disso, o julgamento de Direito.


*
IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em CONCEDER PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que:

A) Revogam a decisão recorrida.

B) Determinam a realização da requerida segunda perícia.

C) Anulam todos os actos que tenham sido praticados e que dependam em absoluto desta diligência de instrução.

Não é devida tributação por não terem sido apresentadas contra-alegações.


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Porto, 22.10.2015.
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Luís Migueis Garcia
Ass.: Frederico Branco