Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00471/20.9BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/23/2021
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:DISPENSA DE PROVA TESTEMUNHAL – CASO JULGADO - NULIDADE DE SENTENÇA - OMISSÃO DE PRONÚNCIA – FALTA DE NOTIFICAÇÃO NA PLATAFORMA ELETRÓNICA VORTALGOV
Sumário:I- Na ausência de impugnação judicial do despacho intercalar que operou a dispensa da produção da prova testemunhal, transitou em julgado tal decisão, tornando-se definitiva [caso julgado formal].

II- Resulta inútil ordenar a realização de quaisquer diligências de prova adicionais quando a matéria de facto atinente, por ser mostrar documentalmente fixada, não for controvertida.


III- A nulidade de sentença, por omissão de pronúncia [art. 615º nº 1 d) do CPC], é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre essas questões com relevância para a decisão de mérito, sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.

IV- A falta de recebimento de uma alerta no sistema Megafone por conta da existência de uma notificação na plataforma eletrónica VORTALGOV não traduz automaticamente a falta de notificação de determinado ato procedimental
Recorrente:S., Lda
Recorrido 1:MUNICÍPIO (...)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I – RELATÓRIO
S. LDA., devidamente identificada nos autos, vem interpor RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datado de 05.02.2021, e promanado no âmbito da ação de contencioso pré-contratual por esta intentada contra o MUNICÍPIO (...), também com os sinais dos autos, que julgou a presente ação improcedente, e, em consequência, absolveu o Réu dos pedidos

Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)

1- A douta sentença recorrida dispensou a produção de prova testemunhal por considerar que dos articulados das partes «não se vislumbra que deles conste a alegação de factos com relevância para a decisão da causa que careçam da produção de prova testemunhal, porquanto são alegados factos cujo pilar probatório assenta no conjunto de documentos juntos aos autos e que constam do processo administrativo.»
2- A Recorrente considera que o douto Tribunal a quo não deveria ter dispensado a produção de prova testemunhal, tendo em conta a alegação da Recorrente, e tendo por pressuposto o cerne da matéria controvertida no processo;
3- A Recorrente apresentou alegação expressa na petição inicial de que apenas teve conhecimento no dia 28/09/2020, de que o Júri do Procedimento havia decidido pedir esclarecimentos à Autora, quando constatou, por consulta ao fluxo do processo através da plataforma eletrónica, que o Réu/Recorrido havia proferido despacho de adjudicação.
4- Foi relativamente à falta de notificação, que a Recorrente imputou a ilegalidade os atos de aprovação do relatório final e de adjudicação.
5- Para decidir pela dispensa da produção de prova testemunhal, o douto Tribunal a quo não apreciou toda a argumentação aduzida pela Recorrente na petição inicial, nomeadamente quanto ao quanto à alegação da Autora/Recorrente de que não recebeu a notificação para prestar esclarecimentos, sendo que foi para demonstrar esse facto que a Recorrente apresentou testemunhas.
6- A produção de prova testemunhal por parte da Recorrente destinava-se, precisamente, a ilidir o suporte documental que foi junto pelo Réu/Recorrido, que apenas poderia, quanto muito, evidenciar o envio através do documento com a referência PT1.RECEIPT.38342077, mas não a receção do mesmo por parte da Autora/Recorrente.
7-Na fundamentação da dispensa de produção de prova testemunhal, o Tribunal a quo não fez qualquer menção à posição expressa pela Autora/Recorrente nos presentes autos, nomeadamente a afirmação categórica de que não rececionou a comunicação para prestar esclarecimentos.
8- O Tribunal a quo, incorretamente, deteve-se apenas na prova documental, numa clara subversão da prova testemunhal, e sem que tenha fundamentado ou justificado tal decisão de forma rigorosa, não tendo analisado a matéria que efetivamente estava controvertida no processo.
9- O indeferimento da utilização de meios de prova (in casu, da produção de prova testemunhal) não é uma prerrogativa incondicionada do Mm.° Juiz, e impende sobre este um dever acrescido de fundamentação, que não foi concretizado.
10- A Autora/Recorrente teria possibilidade de, através da produção de prova testemunhal, demonstrar o que alegou nos artigos art.° 15.° a 22.° da petição inicial.
11- A Autora/Recorrente juntou através do documento 4 da sua petição inicial, um print screen alargado de todas as datas e todas as notificações efetuadas pela Vortal, que abrangia o período de 27/07/2020 a 25/09/2020, através do qual se verifica que não se encontra qualquer notificação referente ao pedido de esclarecimentos e ao relatório preliminar.
12- A prova testemunhal teria sido essencial para confirmar a alegação da Autora, ora Recorrente, quanto à não receção da notificação, pois as evidências resultantes do documento 4 junto pela Autora/Recorrente, e dos documentos juntos pelo Réu/Recorrido, quanto à notificação da Recorrente, apresentam dados contraditórios.
13- Deveria o Tribunal a quo ter considerado controvertida a matéria da notificação da Autora, devendo ser ordenada a baixa do processo à primeira instância para que Portal seja aberto um período de produção de prova testemunhal sobre os factos indicados nos artigos 15.° a 22.° da petição inicial da Autora.
14- O Tribunal a quo não se pronunciou quanto a factos alegados pela Autora, ora recorrente, nos artigos 21.°, 22.°, 23.°, 24.°, 31.°, 34.°, 36.° e 37.° da petição inicial da Autora/Recorrente.
15- A Autora/Recorrente, colocou à apreciação do Tribunal a quo a sua alegação quanto à não notificação do relatório e, nomeadamente, o documento 4 junto com a petição inicial, do qual deflui que não se encontra elencada a notificação do pedido de esclarecimentos.
16- A douta sentença recorrida, não se debruçou sobre a referida alegação, não tendo tomado qualquer posição quanto ao documento 4 junto com a petição inicial da Autora, que foi indicado como demonstrativo da alegação apresentada pela ora recorrente quanto à falta de notificação.
17- A sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, nos termos do disposto art.° 615.°, d) do CCP e art.° 608.° do CPC, aplicáveis ex vi do art.° 1.° do CPTA. 
18- A recorrente não se conforma com a interpretação dos art.° 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08 levada a cabo na douta sentença recorrida, no que concerne às regras legais impostas ao funcionamento das plataformas eletrónicas, nomeadamente no que se refere às notificações e comunicações entre os intervenientes.
19- A douta sentença recorrida deu como provado no ponto 20 do facto assente / provado que a “VORTALgov”, informou a Autora/Recorrente através de e-mail de 01/10/2020, de que a publicação dos relatórios preliminar e final, e consequente pedido de esclarecimentos, é feita por mensagem, pelo que a notificação dos mesmos aparece no Gestor de Mensagens na plataforma Vortal. A notificação de publicação das listas de concorrentes e propostas é gerada no Megafone, mas não o teve em conta este facto na apreciação de direito.
20- Uma correta concatenação do procedimento instituído e assumido pela Vortal no que concerne à forma das notificações - sistema "Megafone", demandaria que o Tribunal a quo concluísse que, sendo esse o procedimento instituído para efeitos das disposições conjugadas dos art.° 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08, e tendo sido comprovado pela Autora/Recorrente que o mesmo não lhe foi comunicado por essa via que não foi dado cumprimento às exigências legais dos artigos art.° 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08.
21- Pelo que deveria o douto Tribunal a quo ter considerado que a notificação à Autora, ora recorrente, não cumpriu com o disposto nos art.° 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08 (…)”.
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Notificada da interposição do recurso jurisdicional, o Recorrido produziu contra-alegações, que rematou nos seguintes termos: “(…)

1. O presente recurso, interposto pela Autora S. Lda., tem por objeto o despacho saneador sentença de 05.02.2021 proferido pela M. Juiz a quo, que julgou totalmente improcedente a presente ação de contencioso pré-contratual e, em consequência, absolveu o Réu dos pedidos apresentados pela Autora.
2. A entidade Recorrida discorda de toda a motivação de facto e de direito que sustenta as alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, porquanto assenta em fundamentos que carecem manifestamente de sustentação legal, subscrevendo na íntegra o entendimento plasmado na douta sentença recorrida.
3. Pretendia a Autora, ora Recorrente, com a prova testemunhal requerida na sua petição inicial, fazer prova de um facto negativo, isto é, de que não foi notificada do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e relatório final do júri do procedimento concursal em apreço nos presentes autos, pretendendo, como refere nas suas alegações de recurso, ilidir o suporte documental que foi junto pelo Réu.
4. A prova documental, por comparação à prova testemunhal, é uma prova mais fidedigna, autêntica, segura e fiel. Há factos que apenas se provam através da prova documental, na medida em que existindo documentação que o comprove, de nada serve eventual prova testemunhal sobre os mesmos factos, pois não poderá a prova testemunhal, de forma alguma, abalar a prova documental apresentada sobre os mesmos factos.
5. Exemplo disso mesmo são as notificações efetuadas por via eletrónica, as quais ficam registadas no respectivo servidor, dando origem à emissão dos respetivos recibos de envio e de receção, como é o caso das notificações efetuadas no âmbito do procedimento concursal em causa nos presentes autos.
6. Havendo prova documental bastante - e cuja autenticidade não foi colocada em causa pela Autora ora Recorrente - de que a Recorrente foi notificada do pedido de esclarecimentos e dos relatórios preliminar e final no âmbito do presente procedimento concursal, é completamente inócuo qualquer prova testemunhal que venha contrariar a prova documental existente das notificações efetuadas.
7. O Recorrido fez prova do facto positivo, ou seja, fez prova de que a Recorrente foi notificada do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e do relatório final. E efetuou essa prova através de prova documental. A rainha das provas. Desta forma, a eventual prova testemunhal requerida pela Recorrente sobre os mesmos factos revelava-se totalmente inútil, desnecessária, irrelevante e dispensável.
8. Cabe ao juiz ordenar as diligências de prova que considere necessárias para o apuramento da verdade, podendo indeferir a prova requerida pelas partes, quando considere que as mesmas se revelam desnecessárias. In casu, face à indiscutível e inequívoca prova documental existente nos autos relativa às notificações efetuadas à Recorrente, era totalmente desnecessária e dispensável a prova testemunhal requerida pelas partes, na medida em que os factos controvertidos entre as partes se encontram sobejamente provados através dos documentos constantes do processo administrativo junto pelo Recorrido.
9. Bem andou a sentença recorrida ao decidir que analisados os articulados das partes, não se vislumbra que deles conste a alegação de factos com relevância para a decisão da causa que careçam da produção de prova testemunhal, porquanto são alegados factos cujo pilar probatório assenta no conjunto de documentos juntos aos autos e que constam do processo administrativo, dispensa-se, por desnecessária, a produção da prova testemunhal requerida.
10. A douta sentença recorrida pronunciou-se sobre os factos alegados pela Recorrente nos artigos 21.° a 24.°, 31.°, 34.°, 36.° e 37.° da petição inicial, na medida em que se pronunciou sobre o cerne dos presentes autos - alegada falta de notificação do pedido de esclarecimentos e dos relatórios preliminar e final do júri do procedimento - tendo essa pronúncia sido no sentido de que a Recorrente foi efectivamente notificada, constando dos autos prova documental do envio e da receção das referidas notificações.
11. É indiscutível que a sentença recorrida se pronunciou, detalhada e minuciosamente, analisando todos os factos alegados pela Recorrente, bem assim a documentação junta com a petição inicial, sobre a alegada falta de notificação do pedido de esclarecimentos e dos relatórios preliminar e final, tendo resolvido todas as questões colocadas à sua apreciação e tendo, consequentemente, concluído, e bem, que a Recorrente foi devidamente notificada daqueles atos através de um sistema de mensagens implementado na plataforma, o qual assegurou, como vimos, o envio e a receção de tais mensagens por todos os concorrentes e pela Recorrente, certificando, aliás, em termos cronológicos, o dia e a hora concretos em que tais mensagens, contendo as notificações em crise, foram enviadas e recebidas pela concorrente.
12. Desta forma, encontram-se destituídas de qualquer fundamento as alegações da Recorrente no sentido da sentença recorrida padecer de nulidade por omissão de pronúncia, sendo forçoso concluir que de nenhum vício padece a douta sentença recorrida, pelo que deverá a mesma manter-se inalterada.
13. Por fim, resulta também inequívoco dos presentes autos que todos os comandos legais constantes da Lei n.° 96/2015, de 17.08 (lei que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública), nomeadamente os presentes nos artigos 24.°, 30.° e 61.°, foram escrupulosa e estritamente cumpridos pela plataforma eletrónica VortalGov no âmbito do procedimento concursal em apreço.
14. Inexistem quaisquer dúvidas de que a plataforma utilizada para tramitação do concurso público aqui em apreço - a plataforma VortalGov - assegurou a efetiva notificação à Recorrente dos atos praticados no procedimento, em particular do pedido de esclarecimentos que lhe foi dirigido pelo Recorrido acerca do preço constante da sua proposta e, bem assim, dos relatórios preliminar e final, na medida em que da prova documental constante dos presentes autos resulta claro que a Recorrente foi devidamente notificada, através da plataforma eletrónica VortalGov, do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e do relatório final elaborados pelo júri, em pleno cumprimento das regras legais impostas ao funcionamento das plataformas eletrónicas, nomeadamente no que se refere às notificações e comunicações entre os intervenientes.
15. Termos em que deverão ser julgados improcedentes todos os vícios assacados à douta sentença recorrida.
16. Pelo exposto, outro não poderá ser o entendimento deste Venerando Tribunal senão confirmar a sentença recorrida, que decidiu julgar a presente ação de contencioso pré-contratual totalmente improcedente, absolvendo o Réu dos pedidos nela formulados (…)”.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida, tendo ainda sustentado a inexistência de qualquer nulidade de sentença.
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O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A..
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Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir são as seguintes: (i) erro de julgamento quanto à decidida dispensa da produção de prova testemunhal; (ii) nulidade de sentença, por omissão de pronúncia; e (iii) erro de julgamento de direito, por errada interpretação do disposto nos artigos 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08.
Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO

O quadro fáctico apurado [positivo, negativo e respetiva motivação] na decisão judicial recorrida foi o seguinte:“(…)
1) A A. é uma sociedade comercial que tem por objeto o transporte rodoviário de mercadorias, obras públicas, construção civil, asfaltagem, materiais de construção e aluguer de máquinas e exploração de areias, fabricação de betão pronto, tratamento e eliminação de resíduos inertes, tratamento e eliminação de outros resíduos não perigosos (cfr. doc. de fls. 17 a 19 do suporte físico do processo).
2) Através do Anúncio de procedimento n.° 4100/2020, publicado em Diário da República, 2ª Série, n.° 78, de 21/04/2020, foi publicitada a abertura do concurso público, lançado pelo R., tendo em vista a celebração do contrato de empreitada de obras públicas para “Pavimentações na Freguesia de Carvalho - Troço 5 Caminhos/Carvalho”, cujo objeto consiste na “intervenção para execução de obras de conservação de infraestruturas viárias, contemplando a execução de alargamentos e pavimentação de arruamentos, instalação de órgãos de drenagem pluvial, dispositivos de segurança e sinalização rodoviária vertical e horizontal”, com o preço base de € 1.321.352,93 e um prazo de execução de 360 dias (cfr. doc. de fls. 21 e 22 do suporte físico do processo).
3) Nos termos do programa do procedimento, a adjudicação seria feita de acordo com o critério da proposta economicamente mais vantajosa, na modalidade prevista na alínea a) do n.° 1 do art.° 74.° do CCP, tendo em conta os seguintes fatores e subfatores, com a respetiva ponderação: a) Preço, com coeficiente de ponderação de 60%; b) Valia Técnica, com coeficiente de ponderação de 40% (cfr. doc. de fls. 7 a 25 do processo administrativo).
4) Do programa do procedimento constam, além do mais, as seguintes cláusulas:
“2. Consulta e disponibilização das Peças do Procedimento
2.1. As peças do procedimento são integralmente disponibilizadas na plataforma eletrónica de contratação pública VORTALgov, disponibilizada pela empresa VORTAL — Comércio Eletrónico, Consultoria e Multimédia, S.A. e acessível através do respetivo sítio da internet, desde o dia da publicação do anúncio no Diário da República;
2.2. O acesso à referida plataforma eletrónica permite efetuar a consulta e descarregar gratuitamente as peças do procedimento, bem como apresentar proposta;
(…)
14. Documentos que instruem a proposta
(…)
14.12. Ao abrigo do disposto no n. ° 2, do artigo 132. ° do CCP, fixa-se no presente programa que o preço total de uma proposta será considerado anormalmente baixo verificando-se um desvio percentual em relação ao preço base superior a 40%, uma vez que o preço base foi determinado como sendo a despesa máxima em relação a preços unitários obtidos pelo conhecimento técnico e tendo em conta os preços médios praticados no mercado para a execução dos trabalhos definidos, ou seja, o preço do custo efetivo dos trabalhos.
Admite-se esse desvio face a fatores como margens de lucro, custos administrativos ou outros encargos que possam diferir de concorrente para concorrente.
Nenhuma proposta pode ser excluída com fundamento no facto de dela constar um preço total anormalmente baixo sem antes ter sido solicitado ao respetivo concorrente, por escrito, que em prazo adequado, preste esclarecimentos justificativos relativos aos elementos constitutivos da proposta que considere relevantes para esse efeito.
Na análise dos esclarecimentos prestados pelo concorrente nos termos do número anterior, pode tomar-se em consideração justificações inerentes, designadamente:
a. À economia do processo de construção, de fabrico ou de prestação do serviço;
b. Às soluções técnicas adotadas ou às condições excecionalmente favoráveis de que o concorrente comprovadamente disponha para a execução da prestação objeto do contrato a celebrar;
c. À originalidade da obra, dos bens ou dos serviços propostos;
d. Às específicas condições de trabalho de que beneficia o concorrente;
e. À possibilidade de obtenção de um auxílio de Estado pelo concorrente, desde que legalmente concedido;
f. À verificação da decomposição do respetivo preço, por meio de documentos comprovativos dos preços unitários incorporados no mesmo, nomeadamente folhas de pagamento e declarações de fornecedores, que atestem a conformidade dos preços apresentados e demonstrem a sua racionalidade económica;
g. Ao cumprimento das obrigações decorrentes da legislação em matéria ambiental, social e laboral, referidas no n.°2 do artigo 1.°-A do CCP.
(…)
20. Esclarecimentos a prestar pelos Concorrentes
20.1. O Júri do Concurso pode pedir aos Concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeito da análise e avaliação das mesmas;
20.2. Os esclarecimentos prestados pelos Concorrentes sobre as respetivas propostas fazem parte integrante das mesmas, desde que observadas as regras fixadas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão, nos termos do disposto na alínea a) do n.°2 do art.° 70.°, do CCP;
20.3. Os esclarecimentos prestados devem ser juntos ao processo do concurso, devendo todos os Concorrentes ser notificados dos mesmos.
(…)
22. Júri do Concurso
(…)
22.3. O Júri do Concurso elaborará um Relatório Preliminar de Avaliação das Propostas fundamentado sobre o mérito das propostas avaliadas, ordenando-as por ordem decrescente, de acordo com metodologia de avaliação fixada para o efeito;
22.4. No Relatório Preliminar, o Júri do Concurso deverá também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas, nos termos do artigo 146.° do CCP.
23. Audiência prévia
23.1. A decisão de adjudicação será precedida de audiência prévia escrita dos Concorrentes, nos termos do disposto no artigo 147.° do CCP;
23.2. Os Concorrentes têm 5 (cinco) dias úteis após a notificação do projeto de decisão final para se pronunciarem sobre o mesmo;
23.3. A notificação fornece os elementos necessários para que os interessados fiquem a conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de Direito, indicando também as horas e o local onde o processo poderá ser consultado.
24. Relatório Final
24.1. Cumprido o disposto no ponto 21., o Júri do Concurso elaborará um Relatório Final fundamentado, no qual pondera as observações dos Concorrentes efetuadas ao abrigo do direito de audiência prévia, mantendo ou modificando o teor e as conclusões do Relatório Preliminar, podendo ainda propor a exclusão de qualquer proposta se verificar, nesta fase, a ocorrência de qualquer dos motivos previstos no n.° 2 do artigo 146. ° do CCP” (cfr. doc. de fls. 7 a 25 do processo administrativo).
5) Apresentaram proposta ao concurso a ora A. e os contrainteressados, nos seguintes termos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

(cfr. doc. de fls. 4308 a 4320 do processo administrativo).
6) A proposta da A. integra um documento intitulado “Esclarecimentos Justificativos de Apresentação de Preço Anormalmente Baixo”, do qual consta o seguinte:
“Nos termos do Artigo 71.° do Código dos Contratos Públicos apresentamos as justificações da apresentação de preço anormalmente baixo, baseados nas seguintes premissas:
a) Política da empresa;
b) Localização da obra;
c) Análise do projeto;
d) Experiência na execução de obras similares;
e) Custos de mão-de-obra;
f) Custos dos materiais;
g) Equipamentos;
h) Margem de lucro;
i) Subcontratação.
Política da Empresa
A nossa empresa tem como base o compromisso de respeitar e cumprir sempre as necessidades dos seus clientes, baseando-se em pontos estratégicos:
• Fornecer produtos e serviços de acordo com as especificações contratualmente exigidas;
• Utilizar métodos de execução que respeitem as regras de segurança e minimizem os impactes ambientais negativos;
• Assegurar o desenvolvimento da empresa;
• Otimização dos recursos eliminando os desperdícios e minimizando os custos;
• Satisfação dos nossos clientes.
Localização da Obra
A obra localiza-se a cerca de 21.2Km pela N234 e 28.1Kms pelo IP3 da empresa, situado no Parque Industrial de Mortágua.
A S. assegura internamente o completo fabrico e transporte dos materiais, bem como o fornecimento de mão-de-obra necessária para a empreitada em epígrafe. Neste sentido, e através da experiência adquirida na execução de obras em municípios na mesma zona, o estudo cuidado da empreitada possibilita uma redução de custos conforme descrito na nossa memória descritiva e justificativa (Ponto 3), nomeadamente:
• (Sendo o aumento constante dos combustíveis um fator de elevada relevância) Em transportes quer dos materiais necessários à obra, quer da deslocação do pessoal durante o prazo de execução da obra;
• Redução dos tempos de transporte e fornecimento (com recurso à frota própria da empresa) o que permite o incremento dos rendimentos associados.
Análise do Projeto
Foi realizada uma inspeção atenta e cuidada ao local da obra, de forma a examinar as condições do mesmo, que possam influenciar o modo de execução das tarefas de modo a otimizar os recursos utilizados na realização da empreitada.
Experiência na execução de obras similares
A experiência da empresa comprova-se através da relação de obras já executadas e em execução que permitem a verificação rigorosa dos meios e métodos construtivos bem como dos rendimentos esperados na execução das atividades.
Custos de mão-de-obra
Na presente empreitada a empresa teve em consideração nos custos de mão-de-obra para além dos custos fixos, os seguintes custos variáveis:
• A não necessidade de alojamento do pessoal afeto à obra;
• A atenção às recentes alterações à lei laboral e as que estão em curso e que se traduzem em uma redução no valor de mão-de-obra;
• Alto Rendimento obtido pelo pessoal neste tipo de obra fruto da sua vasta experiência.
Custos dos Materiais
O custo dos materiais a aplicar na empreitada teve como base os seguintes fatores:
• As relações favoráveis com os fornecedores estratégicos de materiais, nomeadamente com o pagamento dos respetivos materiais a pronto pagamento o que permite preços muito favoráveis para a empresa que a torna mais competitiva relativamente aos restantes concorrentes;
• O betuminoso ser fabricado pela Central da empresa sita no seu Estaleiro em Mortágua, distando (em média) a cerca de 21.2Km pela N234 e 28.1Kms pelo IP3 do local da obra;
• Ter uma política proativa no sentido de procurar o mais baixo preço garantindo a qualidade dos produtos.
A produção de misturas betuminosas cumpre a diretiva 89/106/CEE que torna obrigatória a Marcação CE para o fabrico das misturas betuminosas, sendo a S. titular do certificado do Controlo de Produção em Fábrica n. ° 1029-CPD-PT10/03412.
Dado o nosso controle rigoroso de custos implementados na empresa o mesmo permite apresentar um custo muito competitivo em relação às misturas betuminosas.
Equipamentos
A empresa possui um parque de máquinas dimensionado para este tipo de trabalho, não sendo necessário recorrer ao aluguer a terceiros.
Todo o equipamento se encontra em bom estado de conservação e em plenas condições de funcionamento.
O rendimento obtido através da relação máquina/operador satisfaz as necessidades para a realização das atividades.
Margem de Lucro
A filosofia da empresa, tendo em consideração a crise atual que o país tem atravessado nos últimos anos, é a seguinte:
• A empresa recusa a prática de “dumping”;
• A empresa não apresenta margens elevadas no intuito de conseguir concorrer e ganhar concursos;
• Assim o preço apresentado na proposta representa para a empresa uma percentagem extremamente reduzida de lucro, mas que permite a continuidade da atividade honrando os seus compromissos empresariais;
• A organização funcional da empresa assenta numa estrutura simplificada e dinâmica o que permite uma otimização generalizada de recursos e uma consequente redução significativa de custos.
Subcontratação
Dada a sua estrutura, nomeadamente no que diz respeito ao nível de equipamentos e pessoal e face às necessidades da empreitada, a S. não tem necessidade de recorrer a subempreiteiros para a realização da obra, resultando uma economia de custos.
Conclusão
Foi a conjugação destes fatores atrás mencionados que intervieram no cálculo dos preços unitários apresentados na proposta” (cfr. doc. de fls. 351 a 354 do processo administrativo).
7) A A. foi notificada, via plataforma eletrónica “VORTALgov”, da lista de concorrentes ao concurso, em 13/05/2020, bem como da lista de propostas apresentadas, em 18/05/2020 (cfr. doc. de fls. 23 do suporte físico do processo).
8) Em 05/08/2020 reuniu o júri do procedimento, tendo em vista proceder à análise das propostas apresentadas, reunião na qual foi proposto o seguinte:
2.5 De acordo com o disposto no n.° 14.12 do Programa do Procedimento e face aos documentos submetidos na plataforma eletrónica pela empresa ‘S. , LDA", nomeadamente ANEXO III - Modelo de Indicação do Preço Contratual e Lista de Preços Unitários de todas as espécies de trabalho previstas no Mapa de Quantidades, o Júri do Procedimento concluiu que o Concorrente entregou uma proposta cuja preço contratual é inferior ao valor considerado anormalmente baixo, por verificar-se um desvio percentual em relação ao preço base superior a 40%.
2.6 O Concorrente apresentou um documento designado “Esclarecimentos justificativos de Apresentação de Preço Anormalmente Baixo" que o Júri do Procedimento considera não ser suficientemente esclarecedor sobre as razões que o Concorrente entende serem justificativas do preço proposto.
2.7 Assim, a fim do Júri do Procedimento poder prosseguir com a análise das propostas, ao Concorrente deverão ser solicitados esclarecimentos adicionais nos termos do n.° 3 do art.° 71 do CCP, a apresentar de forma detalhada e suficientemente esclarecedora para que seja possível concluir se o concorrente possui ou não condições vantajosas e se as mesmas são bastantes para que se possa avaliar se a proposta apresentada é anormalmente baixa, sob pena da mesma ser excluída nos termos da alínea e) do n.° 2 do art.° 70 do CCP.
2.8 Propõe-se que os esclarecimentos sejam prestados no prazo de 5 (cinco) dias
2.9 Assim, atendendo ao disposto no n.° 3 do art.° 71 do CCP, tendo o “órgão competente para a decisão de contratar de fundamentar uma eventual decisão de exclusão de uma proposta deve solicitar previamente ao respetivo concorrente que preste esclarecimentos, por escrito e em prazo adequado, relativos aos elementos constitutivos relevantes da proposta".
III. ENCERRAMENTO
3.1 Com o enquadramento suprarreferido, deliberou o Júri do Procedimento, por unanimidade, propor ao Órgão Competente para a decisão de contratar que tome a decisão de solicitar ao Concorrente ‘S. , LDA" que preste os devidos esclarecimentos, por escrito e em prazo adequado, nos termos do disposto nas alíneas a) a g) do n.° 4 do art.° 71 do CCP, relativamente à apresentação de um eventual preço ou custo anormalmente baixo.
3.2 Face ao exposto e a título de exemplo, o Júri do Procedimento entende que o Concorrente deve justificar objetivamente:
• em que medida o processo de construção ou de fabrico ou de prestação de serviço que prevê adotar é mais económico que os processos “normais’ de mercado e qual o impacto que tal processo tem nos preços praticados (alínea a) do n.° 4 do art.° 71 do CCP), ou:
• que especificações técnicas prevê adotar ou condições excecionalmente favoráveis o concorrente comprovadamente possui ou em que medida a obra é tão 'originar que permite uma substancial redução dos preços praticados (alínea b) e c) do n.° 4 do art.° 71 do CCP), ou ainda:
• quais as condições do auxílio de Estado que recebeu ou prevê vir a receber para o desempenho da sua atividade, bem como os respetivos montantes e, sobretudo, em que medida a sua concessão não é ilegal (alínea e) do n.° 4 do art.° 71 do CCP).
Entende o Júri do Procedimento que não é suficiente o Concorrente referir que possui condições como a 'frota própria’, “central de betuminoso’ ou ‘a proximidade da sede da empresa à obra’, tem de comprovar justificadamente a vantagem financeira / comercial / monetária que resulta de cada uma delas.
Face ao exposto e de acordo com o n.° 3 do art.° 71 do CCP, deve o Órgão competente para a decisão de contratar solicitar ao Concorrente “S. , LDA’ que, no prazo de 5 (cinco) dias, preste por escrito os esclarecimentos relativos aos elementos constitutivos relevantes da proposta. (cfr. doc. de fls. 4302 a 4304 do processo administrativo).
9) Em reunião camarária de 07/08/2020, o R. deliberou, por unanimidade, aprovar a proposta do júri do procedimento que antecede e solicitar à A. que, no prazo de 5 dias, prestasse, por escrito, “os esclarecimentos relativos aos elementos constitutivos relevantes da proposta” (cfr. doc. de fls. 4305 do processo administrativo).
10) Em 10/08/2020 o R. submeteu na plataforma eletrónica “VORTALgov” uma mensagem com o assunto “Pedido de Esclarecimentos” e com a referência PT1.MSG.1582985, cujo destinatário era a A., tendo em vista a sua notificação para prestar os esclarecimentos solicitados nos termos da proposta do júri de 05/08/2020 e da deliberação do R. de 07/08/2020 (cfr. doc. de fls. 4306 do processo administrativo).
11) A mensagem que antecede, contendo a notificação da A. para prestar os esclarecimentos solicitados, foi enviada a esta concorrente no dia 10/08/2020, às 12:24:32 horas, através da plataforma eletrónica “VORTALgov”, conforme recibo de envio com a referência n.° PT1.RECEIPT.37518818, e foi recebida pela A. no mesmo dia 10/08/2020, às 12:24:34 horas, conforme recibo de receção ou recebimento com a referência n.° PT1.RECEIPT.37527128 (cfr. docs. de fls. 4451 e 4453 do processo administrativo).
12) Em 03/09/2020 o júri do procedimento elaborou o Relatório Preliminar, do qual consta, além do mais, o seguinte:
As razões que, nos termos do CCP podem levar á não admissão de uma proposta, estão previstas no art.° 146 - especifico do concurso público - que nos remete para o n.° 2 do artigo 70° - aplicável a todos os procedimentos.
Findo o prazo definido, verificou-se que o concorrente ‘S. . LDA" não prestou os esclarecimentos solicitados pelo Órgão Competente para a decisão de contratar nos termos do n.° 3 do art.° 71, pelo que de acordo com o disposto na alínea e) do n.° 2 do art.° 70, propõe-se a Exclusão da proposta.
Efetivamente, apesar do concorrente ter apresentado nos documentos que Instruem a sua proposta, o documento denominado ‘Esclarecimentos justificativos de Apresentação de Preço Anormalmente Baixo", que não era exigível de acordo com o ponto 14. Documentos que instruem a proposta do Programa do Procedimento, entendeu o Júri do Procedimento considerar não ser suficientemente esclarecedor sobre as razões que o concorrente "S. , LDA' entende serem justificativas do preço proposto, conforme previsto, objetivamente. nas alíneas a) a g) do n.° 4 do art.° 71 do CCP (…).
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

(cfr. doc. de fls. 4308 a 4320 do processo administrativo).
13) Em 04/09/2020, às 11:30:20 horas, o R. procedeu ao envio a todos os concorrentes, incluindo à A., através da plataforma eletrónica “VORTALgov”, conforme recibo de envio com a referência n.° PT1.RECEIPT.37916949, de uma mensagem que continha, em anexo, o Relatório Preliminar do júri que antecede (cfr. doc. de fls. 4362 do processo administrativo).
14) A mensagem que antecede, contendo a notificação do Relatório Preliminar, foi recebida pela A. no mesmo dia 04/09/2020, às 11:30:38 horas, através da plataforma eletrónica “VORTALgov”, conforme recibo de receção ou recebimento com a referência n.° PT1.RECEIPT.37916890 (cfr. doc. de fls. 4521 do processo administrativo).
15) Não tendo sido apresentadas quaisquer pronúncias em sede de audiência prévia, o júri do procedimento elaborou, em 14/09/2020, o Relatório Final, do qual consta, além do mais, o seguinte:
2. ANÁLISE
O júri do procedimento, dando cumprimento ao estabelecido no n.° 2, do artigo 146.° do CCP, procedeu à verificação dos documentos que constituem as propostas dos concorrentes [ver - Tabela II. -], conforme artigo 57.° do CCP e ponto 14. Documentos que instruem a proposta, do Programa do Procedimento, tendo concluído que:
a) De acordo com o disposto no ponto 14.12 do Programa do Procedimento e face aos documentos submetidos na plataforma eletrónica pelo concorrente “S. , LDA", nomeadamente ANEXO III - Modelo de Indicação do Preço Contratual e Lista de Preços Unitários de todas as espécies de trabalho previstas no Mapa de Quantidades, o Júri do Procedimento concluiu que o concorrente entregou uma proposta cujo preço contratual (792.711,76 €) é inferior ao valor considerado anormalmente baixo, no caso 792.811,76 €, verificando-se um desvio percentual em relação ao preço base superior a 40%.
O concorrente apresentou um documento designado ‘Esclarecimentos Justificativos de Apresentação de Preço Anormalmente Baixo’ que o Júri do Procedimento considerou não ser suficientemente esclarecedor sobre as razões que o concorrente ‘S. , LDA" entende serem justificativas do preço proposto. (ver anexo I)
Assim, e de acordo com a Ata da Reunião N.° III de 05/08/2020 o Júri do Procedimento, por unanimidade, propôs ao Órgão Competente para a decisão de contratar que tomasse a decisão de solicitar ao concorrente ‘S. , LDA' que prestasse os devidos esclarecimentos, por escrito e no prazo de 5 (cinco) dias, nos termos do disposto nas alíneas a) a g) do n.° 4 do art.° 71 do CCP. relativamente à apresentação de um eventual preço ou custo anormalmente baixo.
Neste âmbito, em reunião de Câmara de 07/08/2020 (Ata n.° 15/2020), o órgão competente para a decisão de contratar deliberou, por unanimidade, solicitar ao concorrente “S. , LDA.' que, no prazo de 5 (cinco) dias, prestasse os esclarecimentos relativos aos elementos constitutivos relevantes da proposta. (ver anexo II)
As razões que, nos termos do CCP podem levar à não admissão de uma proposta, estão previstas no art.° 146 - especifico do concurso público - que nos remete para o n.° 2 do artigo 70° - aplicável a todos os procedimentos.
Findo o prazo definido, verificou-se que o concorrente "S. . LDA” não prestou os esclarecimentos solicitados pelo Órgão Competente para a decisão de contratar nos termos do n.° 3 do art.° 71, pelo que de acordo com o disposto na alínea e) do n.° 2 do art.° 70, propõe-se a Exclusão da proposta.
Efetivamente, apesar do concorrente ter apresentado nos documentos que instruem a sua proposta, o documento denominado "Esclarecimentos justificativos de Apresentação de Preço Anormalmente Baixo”, que não era exigível de acordo com o ponto 14. Documentos que instruem a proposta do Programa do Procedimento, entendeu o Júri do Procedimento considerar não ser suficientemente esclarecedor sobre as razões que o concorrente “S. , LDA" entende serem justificativas do preço proposto, conforme previsto, objetivamente. nas alíneas a) a g) do n.° 4 do art.° 71 do CCP (…)
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Sendo o critério de adjudicação fixado o da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante (ver ponto 21. - Critério de adjudicação e modelo de avaliação das propostas, do programa do procedimento) e, em consequência e em virtude da proposta do concorrente W., Lda. ter obtido a melhor classificação final, o Júri do Procedimento propõe que a adjudicação seja efetuada à mesma, pela quantia de 866.321,87 € (oitocentos e sessenta e seis mil, trezentos e vinte e um euros e oitenta e sete cêntimos), à qual acresce o IVA à taxa legal aplicável de 6% no montante de 51.979,31 € (cinquenta e um mil, novecentos e setenta e nove euros e trinta e um cêntimos), o que totaliza o valor de 918.301,18 € (novecentos e dezoito mil, trezentos e um euros e dezoito cêntimos).
O contrato a celebrar relativo à empreitada de obras públicas manter-se-á em vigor pelo prazo de 360 (trezentos e sessenta) dias, sem prejuízo das obrigações acessórias que devam perdurar para além da cessação do contrato.
O compromisso financeiro da despesa terá de refletir o Plano de Pagamentos da proposta vencedora, observando o cronograma de evolução da tramitação legal aplicável que decorre do CCP, nomeadamente a data previsível para efetivação do Auto de Consignação.
(cfr. doc. de fls. 4363 a 4375 do processo administrativo).
16) Em reunião camarária de 22/09/2020, o R. deliberou, por unanimidade, face à proposta apresentada no Relatório Final do júri, adjudicar a proposta da contrainteressada W., Lda., pela quantia de € 866.321,87, acrescida de IVA, nos termos do disposto no n.° 1 do art.° 76.° do CCP (cfr. doc. de fls. 4418 e 4419 do processo administrativo).
17) Em 28/09/2020 o R. submeteu na plataforma eletrónica “VORTALgov” uma mensagem com o assunto “Notificação da Decisão de Adjudicação — Relatório Final” e com a referência PT1.MSG.1638118, cujos destinatários eram todos os concorrentes, incluindo a A., tendo em vista a sua notificação da decisão de adjudicação, nos termos do Relatório Final do júri e da deliberação camarária de 22/09/2020 (cfr. doc. de fls. 4421 do processo administrativo).
18) A mensagem que antecede, contendo a notificação do Relatório Final e da decisão de adjudicação, foi enviada a todos os concorrentes, incluindo à A., no mesmo dia 28/09/2020, às 15:11:15 horas, através da plataforma eletrónica “VORTALgov”, conforme recibo de envio com a referência n.° PT1.RECEIPT.38342077, e foi recebida pela A. no mesmo dia 28/09/2020, às 15:11:32 horas, conforme recibo de receção ou recebimento com a referência n.° PT1.RECEIPT.38342676 (cfr. docs. de fls. 4594 e 4595 do processo administrativo).
19) Em 02/10/2020 a A. apresentou, através da plataforma eletrónica, impugnação administrativa contra o relatório final e a decisão de adjudicação, alegando, em suma, a sua não notificação, na referida plataforma, do relatório preliminar e do pedido de esclarecimentos (cfr. docs. de fls. 4428 a 4433 do processo administrativo).
20) Na sequência de um pedido de esclarecimentos efetuado pela A. junto da entidade responsável pela plataforma eletrónica “VORTALgov”, esta informou aquela, através de e-mail de 01/10/2020, do seguinte:
“(…) vimos por este meio esclarecer que a publicação dos relatórios preliminar e final, e consequente pedido de esclarecimentos, é feita por mensagem, pelo que a notificação dos mesmos aparece no Gestor de Mensagens na plataforma Vortal.
A notificação de publicação das listas de concorrentes e propostas é gerada no Megafone” (cfr. doc. de fls. 25 a 27 do suporte físico do processo).
21) Através de e-mail de 01/10/2020, a entidade responsável pela plataforma eletrónica “VORTALgov” informou o R. do seguinte:
“Vimos pelo presente prestar o seguinte esclarecimento:
Após análise por parte do N/ Depto. de Qualidade e o Dpto. de Engenharia verificamos que os e-mails de agosto e setembro, referentes ao operador económico S. , Lda., foram entregues no servidor de destino.
Abaixo seguem os logs: (…]”
(cfr. doc. de fls. 4612 do processo administrativo).
22) A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 12/10/2020 (cfr. doc. de fls. 1 do suporte físico do processo).
*

Factos não provados:
Não há factos que cumpra julgar não provados com interesse para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito.
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Os factos que foram considerados provados resultaram do exame dos documentos supra identificados, juntos aos autos e constantes do processo administrativo apenso, nos termos expressamente referidos no final de cada facto.
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III.2 - DO DIREITO
*

Assente a factualidade que antecede, cumpre, agora, apreciar as questões suscitadas no recurso jurisdicionais em análise.
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I- Do imputado erro de julgamento quanto à decidida dispensa de prova testemunhal
*
A Recorrente começa por arguir o erro de julgamento do despacho saneador-sentença recorrida quanto à decidida dispensa da produção de prova testemunhal, por manter a firme convicção de que deveria o “(…) Tribunal a quo ter considerado controvertida a matéria da notificação da Autora, devendo ser ordenada a baixa do processo à primeira instância para que seja aberto um período de produção de prova testemunhal sobre os factos indicados nos artigos 15.° a 22.° da petição inicial da Autora (…)”.
Sem fundamento, porém.
Na verdade, conforme emerge grandemente de fls. 1100 e seguintes dos autos [suporte digital], a determinação judicial que operou a dispensa da produção da prova testemunhal oferecida pela Recorrente mostra-se plasmada, não na decisão judicial recorrida, mas antes no despacho intercalar que antecedeu a prolação daquela, não integrando, portanto, o conteúdo daquela.
Ora, não tendo a Recorrente impugnado judicialmente o despacho intercalar que operou a dispensa da produção da prova testemunhal oferecida pela Recorrente, é de manifesta evidência transitou em julgado tal decisão, tornando-se definitiva [caso julgado formal].
Pelo que deve necessariamente improceder o erro de julgamento em análise que visa se dê sem efeito aquela decisão que, dentro do processo, constitui caso julgado.
Mas ainda que por hipótese assim não fosse, sempre o erro de julgamento em análise estaria votado ao insucesso.
De facto, não se contesta que não pode o juiz, uma vez confrontado com existência de factualidade controvertida essencial para a boa e correta decisão da causa, e sob pena de ilegalidade por preterição das mais elementares regras, suprimir ou omitir qualquer daquelas fases processuais, precludindo os direitos das partes em litígio, seja em termos de ação ou de defesa.
Porém, no caso recursivo em análise, é para nós insofismável que, quanto à invocada ausência de notificação do pedido de esclarecimentos formulado pelo júri concursal, resulta inútil ordenar a realização de quaisquer diligências de prova adicionais, por a matéria de facto atinente, documentalmente fixada, não ser controvertida.
De facto, não só o envio através da plataforma eletrónica “VORTALgov” do aludido pedido de esclarecimentos se mostra documentalmente sustentado, mas também resulta processualmente adquirida a sua receção por parte da Recorrente nos autos.
Tal é o que deriva da análise do recibo de envio com a referência n.º PT1.RECEIPT.37518818, bem como recibo de receção ou recebimento com a referência n.º PT1.RECEIPT.37527128, que fazem fls. 4451 e 4453 do processo administrativo.
Naturalmente, pode equacionar-se que estes registos não correspondem à verdade procedimental, por estarem inculcados de alguma patologia que impossibilitou verdadeiramente o conhecimento do pedido de esclarecimentos por parte da Recorrente, o que nos parecer ser a real questão suscitada neste domínio.
Contudo, não se pode ignorar a evidência da Recorrente ter suscitado, em 29.09.2020, esta mesma questão junto da entidade fiscalizadora, tendo esta asseverado, após “(…) análise por parte do N/ Depto., de Qualidade e o Dpto. de Engenharia (…)”, que todos “(…) os e-mails de Agosto e Setembro, referentes ao operador económico S. , Lda., foram entregues no servidor de destino (…)”, o que serve para afastar qualquer dúvida existente neste domínio.
Tal materialidade é inequivocamente extraível de fls. 4609 a 4612 do P.A. anexo aos autos.
Desta feita, e sopesando que a prova testemunhal nunca poderia obliterar a realidade que se vem de evidenciar, resultando, por isso, inútil a sua realização, impera concluir que o Tribunal a quo não errou ao indeferir a realização de diligências de prova, não sendo, portanto, merecedora a decidida dispensa da produção de prova testemunhal da censura que a Recorrente lhe dirige.
Assim, se não fora a circunstância de se mostrar já transitada a determinação judicial ora em análise, também por estas razões soçobraria o invocado erro de julgamento quanto à decidida dispensa de prova testemunhal ora em análise.
Improcedem, portanto, as conclusões 1) a 13) do recurso do Recorrente.
*
II- Da imputada nulidade de sentença, por omissão de pronúncia
*
Vem a Recorrente arguir a nulidade do despacho saneador-sentença proferido nos autos, por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do nº.1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
Cumpre, por isso, emitir pronúncia nos termos do disposto no artigo 617.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Assim, e entrando na questão que cabe apreciar, dir-se-á que de acordo com o art. 608º n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), “(…) O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, (...).”
A inobservância de tal comando é, como se sabe, sancionada com a nulidade da sentença: art. 615º n.º 1 al. d) CPC.
O exato conteúdo do que sejam as questões a resolver de que falam tais normativos foi objeto de abundante tratamento jurisprudencial.
Destaca-se, nesta problemática, o Acórdão produzido por este Tribunal Central Administrativo Norte de 07.01.2016, no processo 02279/11.5BEPRT, cujo teor ora parcialmente se transcreve:
“(…) As causas determinantes de nulidade de decisões judiciais correspondem a irregularidades que afetam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua validade encontrando-se tipificadas, de forma taxativa, no artigo 615.º do CPC. O que não se confunde, naturalmente, com errados fundamentos de facto e/ou de direito.
Determina o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 1.º do CPTA, que a nulidade por omissão de pronúncia ocorre “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Este preceito relaciona-se com o comando ínsito na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e não todos e cada um dos argumentos/fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão); e os acórdãos, entre outros, do STA de 03.07.2007, rec. 043/07, de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09 de 17/03/2010, rec. 0964/09).
Do mesmo modo estipula o artigo 95.º do CPTA que “Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tribunal deve decidir, na sentença ou acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras”.
Questões, para este efeito, são pois as pretensões processuais formuladas pelas partes no processo que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer ato (processual), quando realmente debatidos entre as partes – cfr. Antunes Varela in RLJ, Ano 122.º, p. 112 – a decidir pelo Tribunal enquanto problemas fundamentais e necessários à decisão da causa – cfr. Teixeira de Sousa in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221.
Exige-se pois ao Tribunal que examine toda a matéria de facto alegada pelas partes e analise todos pedidos formulados por elas, com exceção das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se torne inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões – cfr. M. Teixeira de Sousa, ob. e pp. cits.”.

Posição que se manteve no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 20.10.2017, no Procº. n.º 00048/17.6, que: “(…) A questão está desde logo em saber se o tribunal se deixou de pronunciar face ao suscitado e, em qualquer caso, se teria de o fazer.
Referiu a este propósito o STJ, no seu acórdão de 21.12.2005, no Processo n.º 05B2287 que:
“A nulidade do acórdão por omissão de pronúncia (art. 668º nº 1 d) do CPC), traduzindo-se no incumprimento, por parte do julgador, do dever consignado no art. 660º nº 2 - 1ª parte - do CPC, só acontece quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes das posições dos pleiteantes, nomeadamente as que se prendem com a causa de pedir, pedido e exceções (excetuados aqueles cuja decisão esteja prejudicada por mor do plasmado no último dos normativos citados), não, pois, quando tão só ocorre mera ausência de discussão das "razões ou dos "argumentos" invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas.”
Como se refere no Acórdão, desta feita do STA nº 01035/12, de 11-03-2015, “a nulidade de sentença por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixar de apreciar questão que devia conhecer (artigos 668.º, n.º 1, alínea d) e 660.º, n.º 2 do Código de Processo Civil revogado, aplicável no caso sub judice).
(…)
Resulta também do artº 95º, nº 1, do CPTA que, sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tribunal deve decidir, na sentença ou acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras.
Como este Supremo Tribunal Administrativo vem entendendo, haverá omissão de pronúncia sempre que o tribunal, pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, inclusivamente, não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento – cf. neste sentido Acórdãos de 19.02.2014, recurso 126/14, de 09.04.2008, recurso 756/07, e de 23.04.2008, recurso 964/06.
Numa correta abordagem da questão importa ainda ter presente, como também vem sublinhando de forma pacífica a jurisprudência, que esta obrigação não significa que o juiz tenha de conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes hajam produzido. Uma coisa são as questões submetidas ao Tribunal e outra são os argumentos que se usam na sua defesa para fazer valer o seu ponto de vista.
Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.”

Em reforço deste entendimento, ressalte-se o expendido no Acórdão do S.T.A. de 12.06.2018 [processo n.º 0930/12.7BALSB], consultável em www.dgsi.pt: “(…)
24. Caraterizando a arguida nulidade de decisão temos que a mesma se consubstancia na infração ao dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja ou fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. art. 608.º, n.º 2, CPC].
25. Com efeito, o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos/pretensões pelas mesmas formulados, ressalvadas apenas as matérias ou pedidos/pretensões que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se haja tornado inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.
26. Questões para este efeito são, assim, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que exigem decisão do julgador, bem como, ainda, os pressupostos processuais [gerais e específicos] debatidos nos autos, sendo que não podem confundir-se aquilo que são as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com o que são as razões de facto ou de direito, os argumentos, ou os pressupostos em que cada a parte funda a sua posição nas questões objeto de litígio (…)”.

Tendo presente estes considerandos de enquadramento jurisprudencial, e volvendo agora ao caso concreto, temos que a Recorrente invoca, no mais essencial, que “(…) o Tribunal a quo não se pronunciou quanto a factos alegados pela Autora, ora recorrente, nos artigos 21.°, 22.°, 23.°, 24.°, 31.°, 34.°, 36.° e 37.° da petição inicial da Autora/Recorrente (…)”, que contendem com a invocada falta de notificação do pedido de esclarecimentos dirigido pelo júri concursal à Recorrente.
Porém, salvo o devido respeito, a Recorrente labora em manifesto equívoco quanto à imputada nulidade de sentença.
Na verdade, como se pode verificar da simples leitura do aresto sob censura, o TAF de Coimbra, de entre outras realidades, pronunciou-se expressamente quanto ao particular conspecto da ausência de notificação do pedido de esclarecimentos dirigido pelo júri concursal nos seguintes termos:“(…)
Na presente ação, a A. insurge-se contra o ato de aprovação do relatório final do júri do procedimento, proferido no âmbito do concurso público para contratação da empreitada “Pavimentações na Freguesia de Carvalho - Troço 5 Caminhos/Carvalho”, e, bem assim, contra o ato de adjudicação da referida empreitada à contrainteressada W., Lda., constante da deliberação de 22/09/2020 (e, implicitamente, contra o ato de exclusão da sua proposta), alegando, em suma, que apenas teve conhecimento da tramitação do concurso quando constatou, por consulta ao fluxo do procedimento através da plataforma eletrónica, que o R. havia proferido despacho de adjudicação, pois não foi notificada de qualquer pedido de esclarecimentos — cuja falta de resposta motivou diretamente a decisão de exclusão da sua proposta —, nem do relatório preliminar, nem do relatório final, sendo que a falta de notificação das referidas fases do procedimento inquina de ilegalidade os atos de aprovação do relatório final e de adjudicação. Pede, em consequência, que o R. seja condenado a retomar o procedimento, emitindo novo relatório final e nova decisão de adjudicação que não padeçam das ilegalidades apontadas.
Vejamos.
Não é controvertido que a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública, abreviadamente designadas por plataformas eletrónicas, previstas no CCP, incluindo o estabelecimento dos requisitos e das condições a que as mesmas devem obedecer, vêm regulados na Lei n.° 96/2015, de 17/08.
Dispõe o art.° 24.° da referida Lei que “os serviços base a disponibilizar aos operadores económicos nos termos dos n.°s 2 e 3 do artigo anterior compreendem o acesso a todas as funcionalidades essenciais, mediante contrato de utilização com a plataforma selecionada, que permitam o desenvolvimento total e completo dos procedimentos pré-contratuais públicos, designadamente: a) o acesso aos procedimentos e às peças do procedimento que tenham sido publicadas; b) o envio de mensagens através da plataforma eletrónica; c) o envio de mensagens de correio eletrónico para todos os intervenientes na fase do procedimento deformação de contratos públicos em curso, sempre que, nos termos do CCP, tal comunicação seja obrigatória; d) os pedidos de esclarecimentos e listas de erros e omissões; e) a submissão de candidaturas, de propostas e de soluções; f) as pronúncias em audiência prévia; g) as reclamações e as impugnações; h) a decisão de adjudicação; i) a entrega de documentos de habilitação; j) a visualização de todas as mensagens e avisos criados pelas entidades adjudicantes a que, nos termos da lei, deva ter acesso” (n.° 1). Ademais, “o acesso aos serviços base da plataforma eletrónica é concedido aos operadores económicos registados numa plataforma” (n.° 2), sendo que “os serviços a prestar pelas empresas gestoras devem satisfazer todas as exigências e condições estabelecidas no CCP e na presente lei, no âmbito de cada uma das fases do procedimento de formação dos contratos públicos” (n.° 3). A empresa gestora é “responsável pela disponibilização das funcionalidades necessárias à aplicação das disposições do CCP e da presente lei, no que respeita à contratação eletrónica em boas condições de segurança, de registo, de fiabilidade e de sustentabilidade”” (n.° 4) (sublinhado nosso).
Em matéria de requisitos funcionais, prevê o art.° 30.°, n.° 1, da Lei n.° 96/2015 que “as plataformas eletrónicas devem garantir, no mínimo, os seguintes requisitos funcionais: (...) b) garantir que todas as mensagens entre interessados, candidatos, concorrentes e adjudicatários, relativas a pedidos de esclarecimentos, lista de erros e omissões, pronúncias, incluindo os documentos anexos às mesmas, ficam automaticamente disponíveis para visualização daqueles que tenham acesso à fase do procedimento em curso;
c) garantir o envio de mensagens de correio eletrónico para todos os intervenientes na fase do procedimento de formação do contrato público em curso, sempre que, nos termos do CCP, tais comunicações sejam obrigatórias;
d) garantir o registo do envio das mensagens de correio eletrónico; e) garantir o registo de qualquer ação efetuada pelos diversos utilizadores registados; (,,,f (sublinhado nosso). Por seu turno, o art.° 31.° do mesmo diploma legal estabelece que “as plataformas eletrónicas mantêm em vigor um sistema que documenta as várias fases do procedimento conduzido por meios eletrónicos, permitindo, em cada momento, fornecer informação adequada e fidedigna que se revele necessária” (n.° 1), devendo “disponibilizar as funcionalidades necessárias para o cumprimento desta obrigação de forma a permitir manter os documentos no seu formato original, devidamente conservados, bem como um registo de todas as incidências do procedimento apto a servir de prova, em caso de litígio” (n.° 2). Este sistema “deve permitir identificar, entre outras informações: a) a entidade e o utilizador que acedeu às peças do procedimento; b) a data e hora exatas da submissão dos documentos; c) o documento enviado, bem como a entidade e o utilizador que o enviou; e d) a duração da comunicação” (n.° 3).
Relativamente às notificações e comunicações, estipula o art.° 61.° da Lei n.° 96/2015 que “todas as notificações e comunicações entre a entidade adjudicante ou o júri do procedimento e os interessados, os concorrentes ou o adjudicatário, relativas à fase de formação do contrato e que, nos termos do CCP, devem ser praticadas num determinado prazo são feitas através das plataformas eletrónicas por via de envio automático de mensagens eletrónicas, devendo as mesmas ficar disponíveis para consulta na área exclusiva respetiva” (n.° 1). Neste contexto, “a data e a hora precisas das notificações e comunicações são registadas, de acordo com o artigo 469.° do CCP, devendo os serviços da plataforma eletrónica ser detentores de mecanismos que permitam obter com exatidão a data e a hora fornecidas por uma entidade certificadora que preste serviços de validação cronológica” (n.° 2) (sublinhado nosso).
Também o CCP contém algumas regras específicas a respeito da realização de notificações e comunicações na fase pré-contratual. Com efeito, dispõe o art.° 467.° que “as notificações previstas no presente Código devem ser efetuadas através de correio eletrónico ou de outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dados”. E, nos termos do art.° 468.°, n.° 1, “todas as comunicações entre a entidade adjudicante ou o júri do procedimento e os interessados, os candidatos, os concorrentes ou o adjudicatário relativas à fase de formação do contrato devem ser escritas e redigidas em português e efetuadas através de correio eletrónico ou de outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dados”. Por fim, o art.° 469.° determina que “as notificações e as comunicações consideram-se feitas: a) na data da respetiva expedição, quando efetuadas através de correio eletrónico ou de outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dados, salvo o disposto no número seguinte; b) na data constante do relatório de transmissão bem sucedido, quando efetuado através de telecópia, salvo o disposto no número seguinte; c) na data indicada pelos serviços postais, quando efetuadas por carta registada; d) na data da assinatura do aviso, quando efetuadas por carta registada com aviso de receção” (n.° 1) (sublinhado nosso).
Ora, tendo presente as disposições legais acima citadas, a questão que se coloca nos autos é a de saber se a plataforma eletrónica utilizada para tramitação do concurso público aqui em apreço — a “VORTALgov” — assegurou, ou não, a efetiva notificação à A. dos atos praticados no procedimento, em particular do pedido de esclarecimentos que lhe foi dirigido pelo R. acerca do preço constante da sua proposta e, bem assim, dos relatórios preliminar e final (contendo a decisão de exclusão da proposta da A. e a decisão final de adjudicação.
E a factualidade provada demonstra, à saciedade, que assim foi, isto é, que a A. foi devidamente notificada, através da plataforma eletrónica “VORTALgov”, do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e do relatório final elaborados pelo júri, em pleno cumprimento das regras legais impostas ao funcionamento das plataformas eletrónicas, nomeadamente no que se refere às notificações e comunicações entre os intervenientes.
Com efeito, do probatório extrai-se, além do mais, o seguinte:
- a A. e os contrainteressados apresentaram as respetivas propostas ao concurso público, lançado pelo R., tendo em vista a celebração do contrato de empreitada de obras públicas para “Pavimentações na Freguesia de Carvalho — Troço 5 Caminhos/Carvalho”, cujo procedimento decorreu na plataforma eletrónica “VORTALgov”;
- a A. foi notificada, via plataforma eletrónica, da lista de concorrentes ao concurso, em 13/05/2020, bem como da lista de propostas apresentadas, em 18/05/2020;
- após análise das propostas, o R. submeteu na plataforma eletrónica, em 10/08/2020, uma mensagem com o assunto “Pedido de Esclarecimentos” e com a referência PT1.MSG.1582985, cujo destinatário era a A., tendo em vista a sua notificação para prestar os esclarecimentos solicitados nos termos da proposta do júri de 05/08/2020 e da deliberação do R. de 07/08/2020, relativamente à apresentação de um preço ou custo anormalmente baixo, nos termos do disposto nas alíneas a) a g) do n.° 4 do art.° 71.° do CCP;
- a referida mensagem, contendo a notificação da A. para prestar os esclarecimentos solicitados, foi-lhe enviada no próprio dia 10/08/2020, às 12:24:32 horas, através da plataforma eletrónica, conforme recibo de envio com a referência n.° PT1.RECEIPT.37518818, e foi recebida pela A. no mesmo dia 10/08/2020, às 12:24:34 horas, conforme recibo de receção ou recebimento com a referência n.° PT1.RECEIPT.37527128;
- em 04/09/2020, às 11:30:20 horas, o R. procedeu ao envio a todos os concorrentes, incluindo à A., através da plataforma eletrónica, conforme recibo de envio com a referência n.° PT1.RECEIPT.37916949, de uma mensagem que continha, em anexo, o Relatório Preliminar elaborado pelo júri, no qual este concluiu, entre o mais, pela exclusão da proposta da A., considerando que a concorrente não respondeu ao pedido de esclarecimentos que lhe foi dirigido;
- a referida mensagem, contendo a notificação do Relatório Preliminar, foi recebida pela A. no mesmo dia 04/09/2020, às 11:30:38 horas, através da plataforma eletrónica, conforme recibo de receção ou recebimento com a referência n.° PT1.RECEIPT.37916890;
- não tendo sido apresentadas pronúncias em sede de audiência prévia ao Relatório Preliminar, o R. submeteu na plataforma eletrónica, em 28/09/2020, uma mensagem com o assunto “Notificação da Decisão de Adjudicação — Relatório Final” e com a referência PT1.MSG.1638118, cujos destinatários eram todos os concorrentes, incluindo a A., tendo em vista a sua notificação da decisão de adjudicação, nos termos do Relatório Final do júri e da deliberação camarária de 22/09/2020 (que mantiveram a exclusão da proposta da A.);
- a referida mensagem, contendo a notificação do Relatório Final e da decisão de adjudicação, foi enviada a todos os concorrentes, incluindo à A., no mesmo dia 28/09/2020, às 15:11:15 horas, através da plataforma eletrónica, conforme recibo de envio com a referência n.° PT1.RECEIPT.38342077, e foi recebida pela A. no mesmo dia 28/09/2020, às 15:11:32 horas, conforme recibo de receção ou recebimento com a referência n.° PT1.RECEIPT.38342676;
- na sequência de pedidos de esclarecimentos efetuados quer pela A., quer pelo R. junto da entidade responsável pela plataforma eletrónica “VORTALgov”, esta informou que “a publicação dos relatórios preliminar e final, e consequente pedido de esclarecimentos, é feita por mensagem, pelo que a notificação dos mesmos aparece no Gestor de Mensagens na plataforma Vortal”, tendo, ainda, esclarecido que, “após análise por parte do N/ Depto. de Qualidade e o Dpto. de Engenharia verificamos que os e-mails de agosto e setembro, referentes ao operador económico S. , Lda., foram entregues no servidor de destino” (cfr. pontos 5, 7, 10, 11, 13, 14, 17, 18, 20 e 21 dos factos provados).
Aqui chegados, considerando a factualidade acima descrita, facilmente se constata que, ao invés do alegado pela A., a mesma foi efetivamente notificada, através do sistema de envio e recebimento de mensagens na plataforma eletrónica “VORTALgov”, dos atos praticados no procedimento, com especial enfoque para a notificação do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e do relatório final, estes últimos contendo a decisão de exclusão da sua proposta e a decisão de adjudicação à contrainteressada W., Lda.
Se a A., como alega, não tomou conhecimento das referidas notificações, enviadas e recebidas por intermédio da plataforma eletrónica, tal não ficou a dever-se, como resultou provado, a uma qualquer “falha clamorosa” no sistema de notificações da plataforma eletrónica. Pelo contrário, os autos demonstram que esse sistema de notificações esteve sempre em correto e pleno funcionamento, assim cumprindo as regras legais impostas pela Lei n.° 96/2015, de 17/08, e pelo CCP.
Não colhe o argumento de que, sendo as notificações aos concorrentes efetuadas, na plataforma “VORTALgov”, através de um sistema de alerta designado por “Megafone” e não tendo as notificações do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e do relatório final sido efetuadas através do “Megafone”, tal comprova que a A. não foi notificada destes atos. O que é certo é que, independentemente da existência de um sistema de alerta na plataforma, designado por “Megafone”, que sinaliza as notificações aos concorrentes, a A. foi devidamente notificada daqueles atos através de um sistema de mensagens implementado na plataforma, a qual assegurou, como vimos, o envio e o recebimento de tais mensagens por todos os concorrentes e pela A., certificando, aliás, em termos cronológicos, o dia e a hora concretos em que tais mensagens, contendo as notificações em crise, foram enviadas e recebidas pela concorrente.
Não releva, por isso, a alegação de que existem outras plataformas de contratação pública nas quais todas as notificações geram um alerta no sistema das notificações, de modo a advertir os concorrentes do seu envio. A partir do momento em que a plataforma utilizada no procedimento aqui em apreço garante (como garantiu), em cumprimento das regras legais aplicáveis, através de um sistema de envio e recebimento de mensagens eletrónicas, as notificações aos concorrentes de todos os atos praticados no procedimento, caberá a estes, naturalmente, diligenciarem no sentido de acederem à plataforma, com a regularidade imposta neste tipo de procedimentos, para aí consultarem as eventuais mensagens recebidas para efeitos de notificação dos atos praticados e das decisões tomadas.
Também não se vislumbra em que medida o facto de o “Gestor de Mensagens” da plataforma “VORTALgov” ser uma funcionalidade “premium” afasta o que acima deixámos exposto acerca da efetiva notificação à A. do pedido de esclarecimentos e dos relatórios preliminar e final. Mesmo que assim fosse, caberia à concorrente, enquanto utilizadora da plataforma, neste como noutros procedimentos pré-contratuais, tomar as providências necessárias para se certificar de que, à luz dos termos do contrato de utilização com a plataforma selecionada, teria acesso a todas as funcionalidades por esta disponibilizadas, procedendo, se fosse esse o caso, às atualizações indispensáveis para esse efeito.
Assim, ante todo o exposto, impõe-se concluir que a A. foi devidamente notificada, através do sistema de mensagens em vigor na plataforma eletrónica, não só do pedido de esclarecimentos do júri acerca do preço anormalmente baixo por si proposto, como também do relatório preliminar e do relatório final, nenhuma irregularidade ou ilegalidade havendo a apontar, nesta matéria, ao procedimento e à tramitação seguida na plataforma eletrónica. Aliás, quanto ao relatório final, e como refere o R., é a própria A. que, na impugnação administrativa apresentada, reconhece ter sido notificada do relatório final, pelo que, também por este motivo, não se compreende a invocação da sua falta de notificação (cfr. ponto 19 dos factos provados) [destaque nosso].
Assim, temos que, não tendo a A. correspondido ao convite do júri para prestar os esclarecimentos solicitados a respeito da apresentação de um preço ou custo anormalmente baixo — por motivos que apenas a si poderão ser imputados, e não a quaisquer “falhas” no funcionamento da plataforma e das respetivas notificações, como vimos —, outra não podia ter sido a decisão do júri senão a de excluir a proposta apresentada pela concorrente, à luz dos normativos ao caso aplicáveis. (…)”.

Conforme emerge grandemente do que se vem de transcrever, a decisão judicial sob censura não violou a normação contida no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC.

De facto, o T.A.F de Coimbra analisou e ponderou – diga-se, com particular afinco e acerto, a argumentação aduzida em torno da falta de notificação do pedido de esclarecimentos dirigido pelo júri concursal, tendo julgado que a mesma não procedia.
Em todo o caso, e para que não subsistam quaisquer dúvidas, refira-se que esta nulidade de sentença é apenas aquela que não trata da questão colocada, e não também a que não responde a cada um dos motivos, argumentos, usados pelo interveniente.
Efetivamente, não se devem confundir as questões a resolver propriamente ditas com as razões ou argumentos, de facto ou de direito, invocadas pelas partes, para sustentar a solução que defendem a propósito de cada questão a resolver e, assim, a nulidade não se verifica quando o juiz deixe de apreciar algum ou todos os argumentos invocados, conhecendo contudo da questão.
O que importa é que o tribunal a quo decida a questão colocada - que in casu se reconduzia à questão de saber se a Recorrente foi [ou não] notificada do pedido de esclarecimentos dirigido pelo júri concursal - e não que tenha que apreciar todos os fundamentos ou razões que foram invocados para suporte dessa pretensão.
E isso, claramente, sucedeu no caso apreço.
Não se divisa, portanto, a existência de qualquer nulidade de sentença, por omissão de pronúncia.
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III- Do imputado erro de julgamento de direito, por errada interpretação do disposto nos artigos 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08.
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Esta questão está veiculada nas conclusões 18) a 21) do recurso da Recorrente supra transcritas, substanciando-se na alegação de que, tendo sido comprovado pela Autora/Recorrente que as peças concursais, mormente o pedido de esclarecimentos do júri concursal, não lhe foram comunicadas pelo sistema “Megafone”, que não foi dado cumprimento às exigências legais dos artigos art.º 24.º, 30.º e 61.º da Lei n.º 96/2015, de 17/08, o Tribunal a quo deveria ter considerado.

Adiante-se, desde já, que esta pretensão da Recorrente não vingará.
Na verdade, conforme emerge grandemente da fundamentação de direito ante transcrita, o Tribunal a quo entendeu que, em face do tecido fáctico apurado nos autos, não podia subsistir quaisquer dúvidas de que a Recorrente “(…) foi efetivamente notificada, através do sistema de envio e recebimento de mensagens na plataforma eletrónica “VORTALgov”, dos atos praticados no procedimento, com especial enfoque para a notificação do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e do relatório final, estes últimos contendo a decisão de exclusão da sua proposta e a decisão de adjudicação à contrainteressada W., Lda. (…)”, não sendo de colher o argumentário que, na ausência de alerta de notificação no sistema “Megafone” do pedido de esclarecimentos, não foi a Recorrente notificada deste acto, por serem realidades distintas, reportando-se a primeira apenas à sinalização da existência de uma notificação na plataforma eletrónica e não à própria consumação da notificação em si própria do ato procedimental visado.
Ao que a Recorrente é incapaz de fulminar com erro de julgamento de direito com os termos em que desenvolve a sua argumentação.
Desde logo, porque, não tendo sido impugnada a matéria de facto, em sede de recurso, não pode este Tribunal Superior alhear-se dos concretos factos provados.

De facto, não pode este Tribunal decidir, na ausência de impugnação da matéria de facto, que as peças produzidas no procedimento concursal, no qual se integra o pedido de esclarecimentos do júri concursal, não foram notificadas à Recorrente na plataforma eletrónica “VORTALGOV”.
De facto, ao não impugnar a matéria de facto provada, a Recorrente está a admitir a mesma.

Portanto, sendo os contornos fácticos dos quais este Tribunal Superior não se pode desviar os que derivam apenas do probatório coligido nos autos, é nosso entendimento que, tal como bem apontou a decisão judicial recorrida, a Recorrente “(…) foi efetivamente notificada, através do sistema de envio e recebimento de mensagens na plataforma eletrónica “VORTALgov”, dos atos praticados no procedimento, com especial enfoque para a notificação do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e do relatório final, estes últimos contendo a decisão de exclusão da sua proposta e a decisão de adjudicação à contrainteressada W., Lda. (…)”
E tal não obsta a eventual falta de alerta no sistema Megafone da existência de uma notificação na aludida plataforma eletrónica.
De facto, uma coisa é a notificação em si, que existiu ou não.
Outra coisa é recebimento de um alerta por conta da existência de uma notificação na plataforma eletrónica.
A falta deste alerta não traduz automaticamente, como quer fazer pretender a Recorrente, a falta de notificação de um ato procedimental.
Com efeito, pode verificar-se a existência de uma anomalia no sistema de alertas que impeça a sinalização de uma notificação de um ato procedimental que, verdadeiramente, ocorreu.
Em todo o caso, é insofismável que a Recorrente foi notificada das peças produzidas no procedimento concursal, pelo que a alegação de que a Recorrente - de que não foi alertada no sistema Megafone para a existência de um ato procedimental, não devendo, por isso, considerar-se notificada do mesmo -, é absolutamente imprestável para obstaculizar a aquisição de tal realidade processual.
Por outra banda, considerando o quadro normativo que deriva da alínea c) do nº.1 do artigo 24º da Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto, nada impede que a notificação dos atos produzidos no procedimento concursal visado não possa ser operada igualmente via correio eletrónico.

Efetivamente, nos termos da normação que se vem de invocar - a qual estabelece que os serviços base a disponibilizar aos operadores económicos compreendem o acesso a todas as funcionalidades essenciais, mediante contrato de utilização com a plataforma selecionada, que permitam o desenvolvimento total e completo dos procedimentos pré-contratuais públicos, designadamente o envio de mensagens de correio eletrónico para todos os intervenientes na fase do procedimento de formação de contratos públicos em curso, sempre que, nos termos do CCP, tal comunicação seja obrigatória -, é nosso entendimento que a notificação de eventuais atos procedimentais em tais termos obedece também à ritologia preconizada na apontada Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto.
Idêntica conclusão é extraível quanto à eventual falta de alerta no sistema megafone da existência de uma notificação.
O que o quadro normativo previsto no artigo 24º da Lei nº. 96/2015 exige, de entre outras exigências, é que os concorrentes sejam notificados, tanto por via mensagem gerada dentro da plataforma eletrónica, como por via correio eletrónico, dos atos produzidos no procedimento visado, não sendo, por isso, de relevar, em termos de conformidade com exigências legais ali plasmadas, a eventual falta de alerta da existência de notificações por conta de atos produzidos no procedimento.
É recomendável, mas não obrigatório.

Tudo o que se vem de expor serve para concluir que a sentença recorrida não merece qualquer censura no que concerne ao seu julgamento de direito.

O presente recurso jurisdicional não merece, portanto, provimento.
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V – DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso jurisdicional, e manter a decisão judicial recorrida.
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Custas do recurso pela Recorrente.
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Registe e Notifique-se.
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Porto, 23 de maio de 2021,

Ricardo de Oliveira e Sousa
João Beato
Helena Ribeiro