Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00412/11.4BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/22/2021
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:EDP; LINHAS ELÉTRICAS; LICENCIAMENTO; INDEMNIZAÇÃO.
Sumário:I-A EDP, enquanto concessionária do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia elétrica, beneficia do reconhecimento da utilidade pública das suas instalações ( art.º 1 do DL 43335 de 19/11/60) e tem direito a aceder a terrenos que não lhe pertençam para neles montar os necessários apoios das linhas elétricas, sempre que isso se mostre necessário ao cumprimento das suas funções, desde que para o efeito tenha obtido a necessária licença de estabelecimento da instalação, licenciamento este que se encontra regulado no DL 26852 de 30/6/1936, alterado pelo DL 446/76 de 5/6 e portaria nº 344/89 de 13/5.

II- Não se tendo provado que a localização dos apoios instalados no prédio dos autores e em que assentam as linhas elétricas, não respeitavam a planta geral e/ou a planta de perfis, nenhuma obrigação indemnizatória e/ou de recolocação dos referidos apoios recai sobre a EDP.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:J., e Outros
Recorrido 1:Direção Regional de Energia e Outra
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO

1.1.J., contribuinte fiscal n.º (…), residente na Rua do (…), J., contribuinte fiscal n.º (…), residente na Estrada (…), A., contribuinte fiscal n.º (…), residente no Terreiro (…), por si e como cabeça de casal de A., e G., contribuinte fiscal n.º (…), residente na Alameda (…), intentaram a presente ação administrativa comum, contra a EDP DISTRIBUIÇÃO – ENERGIA, S.A., pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…), e a Direção Regional de Energia - Ministério da Economia e do Emprego, com sede na Rua (…), por meio da qual peticionam a final:
a) a condenação dos réus a colocar as linhas 15KW e 60KW que atravessam a propriedade dos autores no seu traçado original,
b) aceitando que os réus instalem na propriedade dos autores um PT para diversificação das linhas em causa, e alinhamento da área envolvente,
c) ou no caso de assim se não entender, serem os réus condenados a enterrar as referidas linhas,
d) a condenação dos réus no pagamento àqueles de uma indemnização no valor de €400.000,00.

Alegaram, para tanto, em síntese, serem proprietários de um prédio urbano sito em (…), Concelho de Coimbra, que é atravessado por duas linhas aéreas de eletricidade, sendo uma de 60KV e outra de 15KV, as quais não se encontram instaladas de acordo com o projeto aprovado;
Dizem que a linha de 60KV encontra-se deslocada cerca de 140m do que foi aprovado e licenciado, pelo que a mesma é ilegal e que também a linha de 15KV encontra-se deslocada 30m em relação à sua implantação prevista;
Sustentam que o incumprimento quanto à localização das linhas em causa importa uma penalização para a propriedade dos mesmos, tanto mais que se encontra aprovado um projeto de loteamento para a mesma propriedade;
Referem que têm vindo a diligenciar junto da EDP e da Direção Regional de Economia pela deslocação das linhas para o traçado aprovado, ou pelo enterramento das mesmas, mas sem sucesso;
Para a instalação das linhas em causa foi criada uma DUP em 5/01/1928, pelo prazo de 75 anos, a qual caducou em 5/01/2003, sem que tivesse sido emitida nova DUP ou renovada a anterior, pelo que desde essa data que a linha aérea se encontra em situação ilegal por falta de DUP;
Apesar de o Decreto-lei n.º 29/2006 ter vindo declarar com DUP todas as instalações da RESP, ainda assim as referidas linhas estiveram sem DUP entre 2003 e 2006;
A DUP criada em 1928 para a linha aérea de 60KV terminava em Coimbra, pelo que a instalação entre Coimbra e Condeixa não estava abrangida pela DUP, nunca tendo assim existido DUP para a linha ora em causa, sendo a mesma ilegal;
Em 1987 no traçado da linha de 60KV foi instalada a linha de 15KV, considerando a DGE do Centro que, nos termos legais, a instalação deveria ser considerada como nova;
Não existindo assentamento relativamente à propriedade dos autores, terá de existir autorização expressa para a passagem, apesar de existir um documento de 1987 emitido pela DGE referindo que o estabelecimento foi aprovado e a concessão gozava de utilidade pública;
Apenas em 2008 viria a ser aprovada a exploração da referida linha;
Apesar do DL n.º 29/2006 ter regularizado as irregularidades e ilegalidades da falta de DUP para estas linhas, este diploma não exclui o pedido de autorização junto dos particulares afetados pelas partes integrantes da RESP, e por maioria de razão, a expropriação por utilidade pública para os assentamentos e a constituição de servidões sobre os imóveis necessários ao estabelecimento das partes integrantes da RESP;
O DL n.º 26852, estabelece no artigo 51.º que os postes, os apoios e os fios condutores deverão ser colocados de modo a que os proprietários dos imóveis sobre os quais seja estabelecidos possam dispor livremente das suas propriedades para o fim a que as mesmas se destinam e sofram o mínimo de prejuízo ou embaraço;
Casos há em que foi já determinado o enterramento/remoção das linhas;
O artigo 36.º do Decreto-lei n.º 43335 estabelece que os concessionários não têm direito a indemnização quando em causa esteja a deslocação de traçados aéreos ou sua substituição por subterrâneos dentro de perímetros urbanos onde estejam em execução planos de urbanização, ou quando esteja apenas em causa a deslocação ou substituição de postes de linhas de alta tensão até ao número de dois;
A atual situação causa grandes prejuízos aos autores, colocando em causa a saúde pública, o que ficaria salvaguardado com o enterramento das linhas;
O não cumprimento do traçado original, por forma a não atravessar um bairro social e um capo de futebol, teve como motivo a salvaguarda da saúde pública naqueles lugares, colocando em risco outras propriedades como as dos autores, estando assim em risco a saúde pública, ou seja, o direito à integridade física;
Os autores têm direito a serem indemnizados no valor de €400.000,00, valor correspondente à diminuição do seu património.
1.2. Citada, a ré EDP – Distribuição – energia, S.A., contestou, defendendo-se por exceção e impugnação, alegando, em suma, ser concessionária da rede de distribuição de energia elétrica em média e alta tensão no território nacional, assistindo-lhe o direito de atravessar prédios particulares com linhas aéreas, e o de montar nesses prédios os necessários apoios;
Alega que no prédio dos autores encontram-se implantados dois apoios, o da linha 15KV com o número 23, e o da linha 60KV com o n.º 24;
Refere que em 1933 foi concedida à UEP – União Elétrica Nacional licença de estabelecimento para uma linha aérea de 60KV de Coimbra a Condeixa, à qual foi concedida licença de exploração em 1936;
Que em 1941 foi concedida licença de estabelecimento à UEP para que utilizando os apoios da linha de 60KV, fosse montada uma linha de 15KV;
Em 1987 foi realizada a remodelação da linha de 15KV, tendo o projeto de remodelação sido tramitado como um novo projeto, e incluído a publicação de éditos, não tendo sido apresentada qualquer reclamação, razão pela qual, em 1989 foi concedida licença para o estabelecimento da linha de 15KV, seguida de licença de exploração;
Desde 1933 que o traçado da linha não sofreu qualquer desvio na sua trajetória, nem se verificou alteração da distância dos condutores ao solo, nomeadamente na parte em que atravessa o prédio dos autores;
Em 1985 a ré apresentou um projeto para o licenciamento de uma linha de alta tensão de 60KV, tendo o processo em causa incluído a publicação de éditos, sem que tivesse sido apresentada qualquer reclamação;
A. deu autorização à EDP para a implantação do apoio n.º 24 na referida linha, tendo recebido indemnização pela colocação do apoio e por via do corte de árvores, encontrando-se a linha em causa licenciada;
A ré tem vindo a explorar e efetuar reparações à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém;
Nos projetos das linhas foram ponderadas questões de natureza ambiental, estética, técnica e económica, visando causar o menor dano nos terrenos atravessados, seguindo-se um traçado retilíneo, que permite menos perdas de energia, maior facilidade de manutenção, e a utilização de um menor número de apoios;
Os valores do campo magnético que se verifica no prédio dos autores obedecem à legislação em vigor, sendo inofensivos;
A existir a aprovação do loteamento no prédio dos autores, tal foi muito posterior ao licenciamento e implantação das linhas em causa;
Os autores apenas questionaram a existência das linhas após o momento em que avançaram com a operação de loteamento do seu prédio, e verificaram que aquele importaria uma modificação de uma das linhas, com a consequente indemnização da concessionária.
Terminou a contestação que apresentou pedindo a sua absolvição do pedido.
1.3. Citado, o Ministério da Economia e do Emprego contestou, alegando, em síntese, que a Direção Geral de Energia e Geologia contra quem os autores intentaram a presente ação padece de falta de personalidade judiciária porquanto em causa está um serviço central da administração do Estado, devendo a presente ação prosseguir contra o Ministério;
O Ministério não tem interesse em contradizer, devendo ser considerado parte ilegítima, porquanto os pedidos formulados contra o mesmo não serão da sua competência;
O estabelecimento das linhas em causa é legal, tendo-lhes sido concedido licenciamento, o qual ainda se encontra em vigor;
A linha aérea de 60KV, que teve a publicação de éditos, não sofreu qualquer reclamação;
Não é correta a afirmação de que as linhas em causa não têm DUP, porquanto as DUP das antigas empresas de distribuição de energia elétrica transitaram para a EDP;
O DL 29/2006 veio considerar as instalações da RESP de utilidade pública, pelo que não se verificou assim qualquer caducidade ou causa de extinção das DUP referentes às aludidas linhas;
Resulta igualmente do PA que a ambas as linhas foram atribuídas DUP, sendo aquelas consideradas de utilidade pública em toda a sua extensão, não obstante, ter também sido atribuída autorização pelos proprietários do prédio em causa para a passagem da linha de 15KV;
Sendo a DUP válida, não é necessário qualquer ato de expropriação para que o concessionário disponha da propriedade privada em respeito pela lei;
Relativamente à saúde pública, inexistem quaisquer estudos ou evidências científicas que comprovem a ligação entre as radiações magnéticas e a existência de quaisquer riscos para a saúde.
Conclui a sua contestação, pugnando pela procedência das exceções dilatórias, ou pelo menos, pela improcedência da ação.
1.4. Os autores apresentaram réplica, peticionando uma indemnização de €400.000,00 por violação do seu património.
1.5.O réu Ministério da Economia treplicou, pugnando pela inadmissibilidade da réplica, ou pelo menos, por ser considerado ilegal a alteração efetuada ao pedido na réplica, com a inclusão de um pedido de indemnização.
1.6. Em 16/04/2018, no âmbito de incidente de habilitação de herdeiros, foi decidida a habilitação de M. como herdeira do co-autor J..
1.7. Em 23/11/2018, em função da verificação de alteração legislativa e governamental, foi admitido o prosseguimento da presente ação contra o Ministério do Ambiente e da Transição Energética, em substituição do Ministério da Economia e do Emprego.
1.8. Por despacho de 9/01/2019, na sequência de realização de escritura de partilha e doação, foi decidida a ilegitimidade superveniente dos co-autores A. e G., passando a figurar como autores, J. e M..
1.9. Foi proferido despacho saneador, pelo qual foi julgada procedente a exceção de falta de personalidade judiciária do réu Ministério do Ambiente, apenas quanto ao pedido do mesmo no pagamento de uma indemnização aos autores no valor de €400.000,00, tendo sido ainda fixados os temas de prova, objeto do litígio e o valor da ação.
1.10. Foi realizada a audiência de discussão e julgamento com a observância das formalidades legais, conforme ata a fls. 720 e ss. dos autos.
1.11. O TAF de Coimbra proferiu decisão que julgou a ação improcedente, constando da mesma o seguinte segmento decisório:
«Com base no exposto, julgo a presente ação totalmente improcedente e em consequência, absolvo os réus dos pedidos.
Custas pelos autores.
Registe e notifique.»

1.12. Inconformados com o assim decidido, os autores interpuseram recurso jurisdicional da sentença proferida, apresentando as seguintes conclusões:

«1 – O tribunal a quo, na douta sentença proferida, ao decidir pela absolvição da EDP- Distribuição, errou,
2 – De facto, ficou devidamente provado que a planta geral está errada – testemunha R.;
3 – Porque os apoios existentes no local estão colocados em local diverso daquele em que se encontram na planta geral das linhas aéreas de 15kv e 60 kv;
4 – Mas se a planta de perfis é executada com base na planta geral, então a planta que está errada só pode ser a planta dos perfis e não outra.
5 – Não pode a EDP fazer crer que a planta geral está errada, quando a planta que não respeita o traçado é a planta de perfis;
6 – Há assim um erro notório na implantação dos perfis, pois que a sua colocação não respeita a planta geral;
7 – A EDP ao actuar como actuou, ou seja, implantando os apoios em locais distintos daqueles que constam na planta geral única planta de consulta acessível ao cidadão comum induziu este em erro;
8 – Consequentemente executou uma obra diversa daquela que consta da planta geral, atendendo unicamente à planta de perfis planta que o cidadão comum não sabe nem ler nem interpretar e que está em desconformidade com a planta geral;
9 – Logo tem deve suportar todos os custos de deslocação das referidas linhas, por estas não respeitarem o traçado da planta geral é a ré EDP e não os autores;
10 – Deve a ré EDP ser condenada a deslocar a Linha aérea de 15kv SE Condeixa-Palheira, repondo-a no seu traçado original constante da planta geral doc. 5, junto com a petição inicial;
11 - Deve a ré EDP ser condenada a deslocar a Linha aérea de 60kv Santa Clara-Condeixa, repondo-a no seu traçado original constante da planta geral doc. nº 4 e 5 junto com a petição inicial.»
1.13. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.14. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público não emitiu parecer.

1.15. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

2.2. Assentes nas enunciadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação do tribunal ad quem resumem-se a saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento quanto ao mérito, ao absolver os Réus do pedido.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO
3.1. A 1.ª Instância considerou provados os seguintes factos:
«A) Através da Ap. 21 de 12/09/1997, mediante compra, foi registado em nome de A., J. e J., na proporção de 1/3 para cada, o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, freguesia de (...), sob a ficha 2639/19970912 (Cfr. doc. n.º1 junto aos autos com a petição inicial);
B) Através da Ap. 114 de 23/12/1998, mediante compra, foram registados em nome de A., J. e J., na proporção de 1/3 para cada, os prédios descritos na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, freguesia de (...), sob as fichas 2866/19981223 e 2867/19981223 (Cfr. doc. n.º1 junto aos autos com a petição inicial);
C) Através da Ap. 115 de 23/12/1998, mediante compra, foi registado em nome de A., J. e J., na proporção de 1/3 para cada, o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, freguesia de (...), sob a ficha 2869/19981223 (Cfr. doc. n.º1 junto aos autos com a petição inicial);
D) Através da Ap. 25 de 14/04/1999, mediante compra, foi registado em nome de A., J. e J., na proporção de 1/3 para cada, o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, freguesia de (...), sob a ficha 2930/19990414 (Cfr. doc. n.º1 junto aos autos com a petição inicial);
E) Após a anexação dos prédios descritos de A) a D), foi criado o prédio misto, situado em (…), com a área total de 21772m2, o qual confronta de norte com Vala e Regadio, de sul com trada, de nascente com M. e Poente com A., o qual está descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, sob a ficha n.º 3212/2000927 da freguesia de (...), inscrito na matriz predial urbana da freguesia de (...) sob os n.ºs 2601, 4002, 4003, 4004 2 4013 (Cfr. docs. n.º1 e 2 juntos aos autos com a petição inicial);
F) Em 15/07/1928, foi concedido pelo prazo de 75 anos, com declaração de utilidade pública, à UEP - UNIÃO ELÉCTRICA PORTUGUESA, S. A. R. L., o transporte e distribuição de energia elétrica por meio de uma linha de transporte à tensão de 60.000 voltes, entre o Porto e Coimbra, e redes de distribuição a 15.000 voltes, abrangendo, nomeadamente, o concelho de Condeixa (Cfr. Diário do Governo, n.º 170, (II Série), de 27/09/1928, págs. 2614 a 2618, cujo teor se tem por reproduzido);
G) Em 12 de Dezembro de 1933 foi concedida Licença de Estabelecimento à sociedade UEP - UNIÃO ELÉCTRICA PORTUGUESA, S. A. R. L., para uma linha aérea a 60 kV (60.000 volts), de Coimbra a Condeixa, com 12.717 metros (Cfr. doc. n.º 3 junto aos autos com a contestação da ré EDP Distribuição);
H) Em 29 de Dezembro de 1936 foi concedida à mesma sociedade Licença de Exploração para a referida linha (Cfr. doc. n.º 4 junto aos autos com a contestação da ré EDP Distribuição);
I) Em 18 de Setembro de 1941 foi concedida Licença de Estabelecimento à sociedade UEP, para que, utilizando os mesmos apoios da linha de Coimbra a Condeixa, montasse uma nova linha a 15 kV, a denominada linha “Condeixa Coimbra” (Cfr. doc. n.º 5 junto aos autos com a contestação da ré EDP Distribuição);
J) Em 21/05/1985, a Electricidade de Portugal EDP/Empresa Pública, Direção de Distribuição Centro, formalizou junto da Direção-Geral de Energia, Direção de Fiscalização Elétrica do Centro, um pedido de autorização de instalação de uma linha aérea a 60Kv, com 8114 metros, do apoio n.º 7 da Linha de Santa Clara – Figueira da Foz, à subestação de Condeixa, nas freguesias de Assafarge, Cernache e Condeixa a Nova (Cfr. fls. 14 do Processo Administrativo – Linha aérea a 60kv);
K) O requerimento apresentado era instruído por um projeto integrado por “memória descritiva”, “planta geral” à escala de 1:25000, “planta de perfil” às escalas de 1:500 e 1:25000, “traçado de linhas de telecomunicação numa fixa de 490m de cada lado do eixo da linha”, e “esforço sobre apoios e afastamento entre condutores” (cfr. fls. 1 a 13 do PA – Linha aérea a 60kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
L) Da peça desenhada “planta de perfil”, resultava o atravessamento do prédio em nome de A. pela linha de 60kv entre os apoios 23 e 24 (cfr. fls. 4 do PA – Linha aérea a 60kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
M) Em 13/08/1985 foi publicado no Jornal de Notícias, o aviso constante de fls. 21 do PA, com o título “Éditos”, cujo teor se tem por integralmente reproduzido, e pelo qual era dado conhecimento de que estava patente na Direcção de Serviços Regional de Coimbra, e na secretaria da Câmara Municipal de Coimbra, o projeto apresentado pela EDP – Direcção de Distribuição do Centro para o estabelecimento da linha aérea a 60kv com 8114 metros, do apoio 7 da Linha Santa Clara – Figueira da Foz I à subestação de Condeixa, podendo ser apresentadas reclamações à aprovação daquele projeto no prazo de 15 dias (cfr. fls. 21 do PA – Linha aérea a 60kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
N) Em 19/09/1985, igual publicação foi efetuada no Diário da República, III série, n.º 216 (cfr. fls. 22 do PA – Linha aérea a 60kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
O) Não foram apresentadas reclamações relativamente aos Éditos publicados (cfr. fls. 26 do PA – Linha aérea a 60kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
P) Em 3/12/1985 foi concedida à EDP – Direcção de Distribuição Centro licença de estabelecimento da Linha aérea a 60kv para a subestação de Condeixa (cfr. fls. 29 do PA – Linha aérea a 60kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Q) Em 3/09/1987 foi realizada pela Direcção de Serviços Regional de Coimbra, uma vistoria à linha instalada pela EDP – Direcção de Distribuição do Centro, da qual foi lavrado o “Relatório de vistoria” a fls. 31 do PA, cujo teor se tem por reproduzido, e pela qual se concluiu estar a mesma em condições de exploração (cfr. fls. 31 do PA – Linha aérea a 60kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
R) Em 3/06/1987 foi concedida licença de exploração à instalação elétrica da Linha aérea, a 60kv, com 8114 metros, do apoio n.º 7 da linha de Santa Clara-Figueira da Foz I, à subestação de Condeixa, nos concelhos de Coimbra e Condeixa (cfr. fls. 31 e 32 do PA – Linha aérea a 60kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
S) Em 23/04/1987, a Electricidade de Portugal EDP/Empresa Pública, Direção de Distribuição Centro, formalizou junto da Direção-Geral de Energia, Direção de Fiscalização Elétrica do Centro, um pedido de conceção de licença de estabelecimento de uma linha aérea a 15Kv, Subestação de Condeixa-Palheira, nas freguesias de Assafarge, Cernache e Condeixa-a-Nova, concelhos de Condeixa-a-Nova e Coimbra (Cfr. fls. 8 do Processo Administrativo – Linha aérea a 15kv);
T) O requerimento apresentado era instruído com um projeto integrado pelas seguintes peças: “memória descritiva”, “planta geral” à escala de 1:25000, “planta de perfil” às escalas de 1:500 e 1:25000, “Esforço sobre apoios e afastamento entre condutores”, e “Cabo AL/Aço Partridge 160/7” (cfr. fls. 1 a 7 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
U) Tendo-se verificado o cruzamento da linha em causa com linhas dos CTT, a Direcção Geral de Energia exigiu que o processo de licenciamento fosse tratado como processo novo (cfr. fls. 14 a 16 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
V) O apoio n.º 40 viria a recuar 15m em relação ao projeto fruto do cruzamento com a linha dos CTT (cfr. fls. 17 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
W) Em 1/03/1989 foi publicado no jornal Diário de Coimbra, o aviso constante de fls. 23 do PA, com o título “Éditos”, cujo teor se tem por integralmente reproduzido, e pelo qual era dado conhecimento de que estava patente na Direcção de Serviços Regional de Coimbra, e nas secretarias das Câmaras Municipais de Coimbra e de Condeixa-a-Nova, o projeto apresentado pela EDP – Direcção de Distribuição do Centro para o estabelecimento da linha aérea a 15kv com 7598 metros, da SE de Condeixa ao PTS da Palheira, podendo ser apresentadas reclamações à aprovação daquele projeto no prazo de 15 dias (cfr. fls. 23 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
X) Em 3/04/1989, igual publicação foi efetuada no Diário da República, III série, n.º 77 (cfr. fls. 24 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Y) Em 25/07/1989 foi concedida à EDP – Direcção de Distribuição Centro licença de estabelecimento da Linha aérea a 15kv, Subestação de Condeixa-Palheira (cfr. fls. 26 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Z) Em 19/09/1989 foi requerida a realização de vistoria à linha aérea a 15kv SE Condeixa-Palheira (cfr. fls. 28 e 29 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
AA) Em 19/10/89 foi realizada vistoria à instalação da Linha SE Condeixa-Palheira, tendo sido emitido parecer favorável à concessão de licença de utilização (cfr. fls. 28v do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
BB) Em 25/10/1989 foi concedida licença de exploração à instalação elétrica da Linha aérea, a 15kv, SE Condeixa-Palheira (cfr. fls. 28 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
CC) Em 12/06/2000, a Eletricidade do Centro, S.A, Centro de Distribuição de Coimbra, veio requerer junto da Direção Regional do Centro do Ministério da Economia, a alteração da linha existente entre os apoios n.ºs 33 e 36 da Linha aérea a 15kv (cfr. fls. 31 a 34 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
DD) Em 27/08/2000 foi aprovado o projeto retificado de instalação elétrica apresentando (cfr. fls. 34v e 35 do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
EE) Em 21/08/2000 foi realizada vistoria à Linha aérea a 15kv, SE Condeixa-Palheira, na sequência da qual foi emitido o parecer que a mesma estava em condições de exploração (cfr. fls. 38v do PA – Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
FF) Em 22/02/2008, foi emitida licença de exploração para a Linha aérea a 15kv, SE de Condeixa-Palheira (Cfr. fls. 38v e 39 do PA - Linha aérea a 15kv, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
GG) O apoio n.º 24 da. Nova, Linha aérea a 60kv encontra-se implantado no prédio dos autores (Provado por acordo);
HH) A. deu autorização à EDP para a implantação do apoio n.º 24 da Linha aérea a 60kv no prédio propriedade dos autores (Cfr. doc. n.º 21 junto aos autos com a contestação da ré EDP Distribuição);
II) Em 3/05/1995, J., ora autor, apresentou junto da Câmara Municipal de Coimbra um pedido de apreciação de estudo prévio sobre um loteamento a concretizar no prédio propriedade dos autores (Cfr. doc. n.º 23 junto aos autos com a contestação da ré EDP - Distribuição);
JJ) Em 2003, o autor J., apresentou junto da Câmara Municipal de Coimbra um pedido de licenciamento de projeto de loteamento, sito em (...), que correu termos sob o Processo n.º 3401/2003 (Cfr. documento junto a fls. 346 e ss. do processo físico);
KK) Por deliberação tomada da Câmara Municipal de Coimbra em 9/05/2005 foi aprovado o pedido de licenciamento da operação de loteamento identificada na alínea anterior (Cfr. documento junto a fls. 345 do processo físico);
LL) O loteamento em causa prevê a criação de 29 lotes, destinando-se 3 deles a serem integrados no domínio privado da Câmara Municipal de Coimbra (Cfr. documento junto a fls. 344 dos autos – processo físico);
MM) Em 4/01/2010, foi aprovado o pedido de licenciamento das obras de urbanização a realizar no âmbito do Processo de loteamento n.º 3401 (Cfr. documento junto a fls. 347 dos autos – processo físico);
NN) A densidade de fluxo magnético máximo extrapolado decorrente da linha a 15kv e da linha a 60kv é de 7,3% do limite legal previsto (Cfr. documento de fls. 481 a 490);
OO) O campo elétrico formado pelas linhas aéreas a 15kv e a 60kv representa cerca de 14,2% do limite legal (Cfr. documento de fls. 481 a 490);
PP) A implantação efetiva da linha aérea a 60kv corresponde à constante da planta de perfil que instrui o processo de licenciamento da mesma (Provado em face do depoimento das testemunhas R. e A.);
QQ) A implantação efetiva da linha aérea a 15kv corresponde à constante da planta de perfil que instrui o processo de licenciamento da mesma (Provado em face do depoimento das testemunhas R. e A.).

FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provaram outros factos relevantes para a boa decisão da causa, nomeadamente:
1. Não se provou que a linha aérea a 60kv esteja deslocada em 140 metros do alinhamento constante da planta de localização que instrui o processo de licenciamento da mesma;
2. Não se provou que a linha aérea a 15kv esteja deslocada em 30 metros do alinhamento constante da planta de localização que instrui o processo de licenciamento da mesma;
3. Não se provou que o alinhamento das linhas aéreas a 15kv e 60kv, na parte que atravessa o prédio dos autores, provocasse uma desvalorização do mesmo no valor de €400.000,00.»
*

III.B.DE DIREITO
3.2. Do mérito da decisão.

3.2.1.Vem o presente recurso jurisdicional interposto da sentença do TAF de Coimbra que julgou totalmente improcedente a ação instaurada pelos autores, absolvendo a Ré de todos os pedidos formulados.

3.2.2.Os Recorrentes asseveram que a sentença recorrida errou, uma vez que contrariamente ao decidido, devia ter condenado a Ré EDP a deslocar a Linha aérea de 15kv SE Condeixa-Palheira e a Linha aérea de 60kv Santa Clara-Condeixa, que atravessam o seu prédio, repondo-as no seu traçado original constante da planta geral e a suportar todos os custos de deslocação das referidas linhas, por estas não respeitarem o traçado da planta geral. Isso, porque ficou provado, conforme testemunho de R., que a planta geral está errada, uma vez que os apoios existentes no local estão colocados em local diverso daquele em que se encontram na planta geral das linhas aéreas de 15kv e 60 kv. Ademais, aduzem que se a planta de perfis é executada com base na planta geral, então a planta que está errada só pode ser a planta dos perfis e não outra, não podendo a EDP fazer crer que a planta geral está errada, quando a planta que não respeita o traçado é a planta de perfis, para concluírem que existe um erro notório na implantação dos perfis, pois que a sua colocação não respeita a planta geral.
3.2.3. Os Recorrentes insurgem-se contra a sentença recorrida apenas no segmento em que o Tribunal a quo julgou improcedente o pedido de condenação da Ré EDP a colocar as linhas de 15kv e 60kv que atravessam o prédio dos mesmos no seu traçado original, por continuarem a entender que aquelas linhas não estão instaladas de acordo com o traçado constante do projeto, sendo por isso ilegais, contrariamente ao que foi professado pela 1.ª Instância.
A sentença recorrida começou por efetuar o enquadramento jurídico a que se encontram submetidas as instalações elétricas e o respetivo licenciamento, nela se assinalando que foi o Decreto-lei n.º 26852 ( sucessivamente alterado pelos Decretos-lei: n.º 40722, de 2/08/1956; n.º 229/76, de 1/04, n.º 446/76, de 5/06, e n.º 51/80, de 31/10, bem como pela Portaria n.º 344/89, de 13/05), «que veio regulamentar e fixar as normas a observar para o “licenciamento de todas as instalações destinadas a produção, transporte, transformação, distribuição ou utilização de energia elétrica que se encontrem sujeitas à fiscalização da Repartição dos Serviços Elétricos” (Cfr. artigo 1.º), dividindo as instalações elétricas entre as que se destinam a serviço público, considerando-se como tal “as instalações destinadas a tração elétrica e aquelas que forem estabelecidas com o fim de fornecer energia elétrica a quaisquer consumidores que a pretendam adquirir, ou que sirvam para o transporte ou transformação de energia elétrica destinada ao mesmo fim” (Cfr. artigo 2.º), e as instalações destinadas a serviço particular.
As instalações destinadas a serviço público estão sujeitas a licença para o seu estabelecimento, fixando o referido diploma as condições de que depende a sua concessão (Cfr. artigo 8.º e 15.º). Quanto aos documentos a apresentar para instrução do pedido, estes são eram fixados pela Portaria n.º 401/76, de 6/07.
Estando em causa linhas de alta tensão, o artigo 19.º do regulamento de instalações elétricas previa a sujeição do projeto a uma fase de consulta pública, sendo publicados éditos no Diário da República e num jornal de grande circulação, sendo aquele projeto patenteado ao público por um período de 15 dias.
Cumprida a referida formalidade, sem que tivessem havido reclamações, ou havendo-as, mostrando-se as mesmas tratadas, e estando o projeto em condições de ser aprovado, era concedida licença ao mesmo (Cfr. artigos 21.º a 22.º do Decreto-lei n.º 26852).
Construída a instalação elétrica, a concessão de licença de exploração estava dependente de prévia vistoria, requerida pelo concessionário da rede destinada a aferir do cumprimento do projeto aprovado (cfr. artigo 41.º, n.º5 e 6 e 45.º), e das prescrições de segurança e regras técnicas (artigo 43.º).»
Sendo incontroverso que o prédio dos autores é efetivamente atravessado por duas linhas elétricas de 15 Kv e 60 Kv, diz-se na sentença sob escrutínio, quanto à primeira linha que a mesma « tem na sua origem uma linha de 60kv para a qual, em 1933, foi concedida Licença de Estabelecimento à sociedade UEP – União Elétrica Portuguesa, SARL (UEP), e subsequentemente, após a sua instalação, em 29/12/1936, atribuída licença de exploração [(cfr. als. G) e H) do probatório]» e que em «1941, a UEP viria a montar uma linha de 15kv nos mesmos apoios da identificada linha de 60kv de 1933, à qual viria a ser atribuída licença de estabelecimento em 18 de setembro [cfr. al. I) dos factos provados]». E que, após a « nacionalização da sociedade UEP – União Eléctrica Portuguesa, S.A., em 15/04/1975 pelo Decreto-lei n.º 205-G/75, de 16/04, pelo Decreto-lei n.º 502/76, de 30/06 viria a ser criada a Electricidade de Portugal, E.P. – EDP, tendo a mesma como objeto principal “o estabelecimento e a exploração do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica no território do continente, para promover e satisfazer as exigências de desenvolvimento social e económico de toda a população” (Cfr. artigo 2.º, n.º1), sendo atribuídas à mesma as prerrogativas concedidas anteriormente à UEP.»
Ou seja, resulta da sentença recorrida, que a linha elétrica de 60Kv remonta ao ano de 1933, para a qual foi concedida licença de instalação e exploração à EDP e que a linha de 15kv foi posteriormente montada, em 1941, precisamente sobre os mesmos apoios da primeira.
Lê-se também na sentença recorrida que já « enquanto concessionária da distribuição de energia elétrica, a EDP em 23/04/1987, visando proceder à remodelação da referida linha de 15kv, viria a apresentar pedido de concessão de licença de uma linha aérea a 15kv, Subestação de Condeixa-Palheira [cfr. al. S) dos factos provados], apresentando projeto para o efeito, relativamente ao qual foram publicados éditos nos termos do artigo 19.º do Decreto-lei n.º 26852 [cfr. als. W) e X) dos factos provados]». E que, em 15/17/1989 «viria a ser concedida licença de estabelecimento à linha em causa, para em 25/10/89, após a realização de vistoria, ser atribuída licença de exploração [cfr. als. Y) a BB) do probatório]».
Quanto à linha de 60 Kv, que também atravessa o prédio dos autores, na sentença recorrida afirma-se que a mesma foi «instalada pela EDP, na sequência da formalização junto da Direção-geral de Energia em 21/05/1985, de um procedimento para a instalação de uma linha aérea a 60kv, do apoio n.º 7 de Santa Clara – Figueira da Foz, à subestação de Condeixa [cfr. al. J) dos factos provados]. Após a publicação de éditos, sem terem sido apresentadas reclamações, em 3/12/1985 viria a ser atribuída licença de estabelecimento à referida linha. Após a sua instalação no local, e realização de vistoria, em 3/06/1987 viria a ser concedida licença de exploração à instalação elétrica da Linha aérea a 60kv em causa [cfr. als. P) a R) do probatório].»
E conclui-se que «quer a linha aérea a 15kv quer a linha aérea a 60kv, que atravessam o terreno dos autores foram objeto de licenciamento nos termos do supra analisado Decreto-lei n.º 26852, na redação em vigor à época.
Em primeiro lugar ressalte-se que, o licenciamento de que foram objeto ambas as linhas, e que culminou, em ambos os casos, na atribuição das respetivas licenças de exploração, não é o objeto destes autos, consolidado que está, num caso desde 1987, e no outro desde 1989».

3.2.4. A EDP é uma empresa que, como concessionária do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia elétrica, beneficia do reconhecimento da utilidade pública das suas instalações (ver art.º 1 do DL 43335 de 19/11/60).
Decorre do disposto no art.º 51º, 2º desse diploma, que a Ré tem o direito, nomeadamente, a aceder a terrenos que não lhe pertençam e montar nesses prédios os necessários apoios, sempre que isso se mostre necessário ao cumprimento das suas funções.
No entanto, decorre do § 1º do mesmo preceito que tais direitos só poderão ser exercidos quando o concessionário tiver obtido a necessária licença de estabelecimento da instalação, licenciamento este que se encontra regulado no DL 26852 de 30/6/1936, alterado pelo DL 446/76 de 5/6 e portaria nº 344/89 de 13/5.
Destes diplomas decorre, pois, que a Ré beneficia do direito de servidão administrativa.
Na verdade, conforme escreveu Marcello Caetano (
in Manual de Direito Administrativo, vol. II, pág. 1052) servidão administrativa é o encargo imposto por disposição da lei sobre certo prédio em proveito da utilidade pública de uma coisa.
Podia assim a Ré fazer passar pelo terreno dos AA. as linhas de transporte de energia, bem como montar no mesmo os necessários apoios, não obstante a discordância dos respetivos proprietários desde que obtenha a necessária licença.
Nem mesmo para a obtenção dessa licença é necessária tal autorização em face do disposto no art.º 16º, nº 3 do mencionado DL 26852, com a redação do DL 446/76, uma vez que, como decorre dessa norma, só é exigida a junção de autorização dos proprietários para obtenção da licença quando as instalações a executar não gozem de declaração de utilidade pública, o que, conforme vimos acima não ocorre no caso em apreço.( cfr. Acórdão do TRG, de 07.06.2018, proc. n.º 846/17.0T8BCL.G1).
3.2.5.Quanto à alegação por parte dos autores de que as referidas linhas se encontram em situação de ilegalidade por não respeitarem o traçado licenciado em relação às mesmas, e correspetivo pedido de condenação dos réus a procederem à mudança das linhas para o alinhamento licenciado, a sentença recorrida, como já se disse, absolveu a Ré desse pedido, julgando não se verificar a invocada ilegalidade.
Essa improcedência assentou na seguinte fundamentação: « (…) conforme decorre da factualidade provada e não provada, o pedido formulado em primeiro lugar pelos autores não poderá proceder com base nesta causa de pedir.
Com efeito, não resultou demonstrada nos autos a alegação dos autores de que as linhas em causa não se encontram de acordo com o projeto aprovado, nomeadamente, que a linha de 60kv se encontra deslocada em 140m do que foi aprovado e licenciado, bem como que, no que respeita à linha de 15kv, o desfasamento desta é de cerca de 30m.
Em primeiro lugar, e no que concerne à linha atualmente de 15kv, conforme decorre da factualidade supra elencada, a mesma mostra-se instalada no local desde 1933, então como linha a 60kv, para em 1941, sob os mesmos apoios, ser instalada uma linha de 15kv. Esta linha veio a ser objeto de remodelação em 1987, dando origem à atual linha de 15kv.
Do que se deixou dito, e provado nos autos, a linha em causa, mostra-se instalada no mesmo lugar, assente sobre os mesmos apoios, há cerca de 87 anos.
Não obstante, e analisando a factualidade provada, também quanto à linha aérea a 60kv instalada em 1985, não resulta prova de que o processo de licenciamento que ocorreu em ambos os casos não tivesse sido cumprido aquando da implantação.
Conforme se deixou dito em sede de motivação da matéria de facto, cujo discurso damos aqui por reiterado, não lograram os autores trazer aos autos prova que importasse conclusão diferente.
Com efeito, em sede de audiência de julgamento foram colhidas declarações de parte do autor, as quais foram já supra analisadas, e pelas quais este procurou provar a falta de correspondência dos traçados em causa na realidade, com aqueles licenciados ao abrigo dos procedimentos levados a cabo pela EDP. No seu discurso o autor socorreu-se dos documentos 3 a 5 que juntou com a petição inicial, dos quais reconheceu a autoria, para demonstrar a diferença de traçados entre o que estaria licenciado em relação a cada linha, e aquilo que efetivamente se mostra implantado.
Todavia, tal como se deixou antedito, a prova documental junta pelos autores não foi entendida pelo Tribunal como sendo fidedigna para demonstrar a alegação em causa. Desde logo, em causa estão documentos elaborados pelo autor, parte interessada no desfecho da causa, com recurso a um computador pessoal, e com a utilização de escalas distintas daquelas usadas nas plantas de localização de ambas as linhas.
O autor, a quem cabia a prova da alegação que trouxe aos autos (cfr. artigo 342.º do C.C.), não requereu também, nomeadamente, a realização de prova pericial que tivesse procedido ao um levantamento topográfico que confrontasse a implantação constante do processo de licenciamento, e aquela que se encontra efetivamente implantada.
Não obstante o que se acabou de deixar dito, refira-se que, mesmo que o autor tivesse logrado demonstrar que a implantação das linhas não corresponde em absoluto à implantação constante da planta geral, tal não importaria necessariamente que se considerasse que as linhas não estavam estabelecidas de acordo com o projeto aprovado.
Consoante o enquadramento legal realizado supra quanto ao licenciamento das instalações elétricas, a instrução do pedido de licenciamento está sujeita à entrega dos elementos previstos no artigo 1.º da Portaria n.º 401/76.
Assim, no cumprimento do aludido dispositivo legal, pela EDP, em ambos os casos, entre outros elementos, foram entregues uma planta de localização e o perfil da linha.
Analisando as plantas de localização, o único elemento referido pelos autores, constata-se que as mesmas se encontram elaboradas à escala de 1:25000. A escala em causa não permite uma definição com pormenor do traçado constante da mesma, comportando uma margem de erro significativa. Com efeito, está-se perante uma escala em que cada centímetro corresponde a 250 metros, e onde o risco do lápis, corresponderá, aproximadamente, a 25 metros. Simultaneamente, à data em que as pelas desenhadas em causa eram feitas, não existia ainda computador com sistema de georreferenciação capaz de elaborar os documentos, sendo os mesmos, ao invés, feitos à mão, a lápis.
Por sua vez, no que concerne ao perfil da linha, também ela uma peça desenhada que instruía os processos de licenciamento, este estava já elaborado a uma escala de 1:500 e 1:2500. Está assim em causa uma escala de maior pormenor, em que, no caso da escala 1:500, cada centímetro corresponde já, apenas, a 50 metros.
A planta de perfil contém em si igualmente um conjunto de informação de maior rigor, nomeadamente, as cotas do terreno, a identificação dos apoios da linha e a distância entre os mesmos, bem como os ângulos que estes deverão observar.
No que se refere aos ângulos, estes terão de ser cumpridos com rigor, sob pena de, em percursos como aqueles que estão em causa nos autos, de 7000 e 8000 metros de extensão de linha, um desvio inicial de alguns graus, poder importar, no fim da linha, um desvio de várias dezenas de metros.
Por último, consta ainda da informação disponibilizada na planta de perfil, o nome dos proprietários que vêm os seus prédios atravessados pela linha.
Assim, a planta de perfil, considerando os elementos que reúne e que deverão ser observados no estabelecimento da linha, permite estabelecer com maior exatidão o alinhamento a seguir e a observar na implantação daquela.
Relativamente aos perfis de ambas as linhas, e constantes dos processos de licenciamento, conforme resultou provado nas als. PP) e QQ) do probatório, os mesmos estão de acordo com a realidade existente no local.
Tal resulta igualmente do facto de, tendo sido sujeitas ambas as instalações elétricas a vistoria, a qual nos termos dos citados artigos 43.º, 45.º e 48.º do regime de estabelecimento de instalações elétricas, aprovado pelo Decreto-lei n.º 26852, tinham como objeto aferir, nomeadamente, do cumprimento do projeto aprovado, ter sido emitido parecer favorável à atribuição da consequente licença de exploração [cfr. als. Q) e AA) do probatório].
Concluiu pois aquela vistoria pelo cumprimento do projeto aprovado o qual, conforme se verificou, no que concerne ao alinhamento da instalação, não está sujeito apenas à planta geral a qual, considerando a escala utilizada, não poderá ser mais que meramente indicativa, por aproximação, do local por onde passará a instalação elétrica. Outrossim, a sua leitura deverá ser complementada com a da planta de perfil, daí resultando o alinhamento a observar in casu.
A tal não obsta o facto de, posteriormente, em 2000, ter havido uma alteração na implantação da linha porquanto, esta alteração, que foi submetida a licenciamento prévio, incidiu sobre os apoios n.º 33 e 36, contendendo assim com a implantação relativa às linhas na parte em que estas atravessam a propriedade dos autores, e que ocorre entre os apoios n.ºs 23 e 24.
Por tudo se deixou dito, concatenada a prova produzida, e analisada a mesma ao abrigo das normas aplicáveis, não se poderá concluir pelo não cumprimento pelas linhas em causa do alinhamento licenciando no âmbito do processo de licenciamento de estabelecimento e exploração. Assim sendo, não se poderá igualmente concluir estarem as aludidas linhas em situação de ilegalidade.
Improcedendo a alegação dos autores, não poderão os mesmos, com o fundamento em causa, lograr a condenação dos réus a colocar as linhas de 15kv e 60kv no seu traçado original, o qual se mostra cumprido.»
O julgamento realizado pelo Tribunal a quo não merece censura, tendo o mesmo efetuado uma cuidadosa e detalhada subsunção jurídica da factualidade assente. Perante o quadro fático apurado e o regime legal aplicável, não podia o Tribunal a quo ter decidido como pretendem os recorrentes, não enfermando a referida decisão do erro de julgamento que lhe vem assacado.
Os recorrentes não têm razão quando pretendem que o Tribunal a quo devia ter condenado a Ré EDP a recolocar os apoios instalados no prédio dos mesmos e em que as referidas linhas elétricas assentam, conforme pretendiam, na medida em que não provaram que a sua localização não respeitasse a planta geral e/ou a planta de perfis.
No presente recurso, os autores não impugnam o julgamento da matéria de facto realizado pelo Tribunal a quo, quer em relação aos factos assentes, quer em relação aos factos dados como não provados, pelo que tal julgamento se tem de haver como correto e estabilizado o quadro factual apurado.
Quanto ao julgamento da matéria de facto consta da sentença recorrida que:
«1. Não se provou que a linha aérea a 60kv esteja deslocada em 140 metros do alinhamento constante da planta de localização que instrui o processo de licenciamento da mesma;
2. Não se provou que a linha aérea a 15kv esteja deslocada em 30 metros do alinhamento constante da planta de localização que instrui o processo de licenciamento da mesma».

Perante a prova que foi produzida, os autores não lograram demonstrar perante o Tribunal a quo, como era seu ónus, que as ditas linhas elétricas não se encontram instaladas no local licenciado, não tendo provado que a planta geral ou/e a planta de perfis estivesse errada.
Quanto à planta de perfil, veja-se, na motivação da fundamentação do julgamento de facto, o que foi dito pela testemunha A., engenheiro eletrotécnico da EDP, que «explicou como funciona o processo de licenciamento das linhas elétricas», segundo o qual é a planta de perfil «que define efetivamente o alinhamento da linha», sendo da mesma que «constam os ângulos e implantação dos apoios da linha, bem como os proprietários dos prédios atravessados pela mesma. Referiu ainda a testemunha que a implantação da linha deverá observar de forma estrita a planta de perfil porquanto, um pequeno desvio nos ângulos ali definidos, poderá importar um grande desvio na implantação».
Também a testemunha R., engenheiro eletrotécnico junto da EDP Distribuição, que em 2010 tinha como funções a projeção da construção da rede de média e alta tensão da EDP, referiu igualmente que, munido com as plantas de perfil, verificou a implantação das identificadas linhas, existente in loco, tendo concluído que esta está de acordo com o projetado.
Já os autores, para a prova da sua tese- desfasamento da implantação de ambas as linhas em relação ao alinhamento licenciado- como bem se refere na sentença recorrida, ofereceram as declarações de parte do autor J. ( parte interessada), e por outro os documentos 3 a 5 com que instruíram a sua petição, que o Tribunal a quo não considerou suficiente para demonstrar a sua tese, sublinhando que estando sob apreciação a prova do traçado de duas linhas elétricas, a prova adequada para aferir das mesmas será necessariamente documental ou pericial, afirmando concretamente, que:
«Como se deixou dito, juntamente com a petição inicial, os autores juntaram 3 documentos, compostos de plantas de onde constam quer o alinhamento das linhas em causa conforme consta da planta de localização de cada um dos processos de licenciamento daquelas linhas, quer o alinhamento que, para os autores, estas têm de facto. Destes documentos socorreu-se o autor em sede de declarações de parte.
Todavia, para que aos documentos se mostrem aptos a provar os factos alegados, estes têm de ter sido elaborados de forma idónea a tal. Ouvido sobre os referidos documentos, o autor explicou que os mesmos resultam de uma construção sua, sendo compostos pela planta de localização de cada uma das linhas e constante do processo de licenciamento, sendo sobreposta à mesma a implantação efetiva das linhas.
Confrontadas as plantas de localização de cada uma das linhas existentes em cada um dos processos administrativos de licenciamento das mesmas, verifica-se que estas foram elaboradas com recurso a uma escala de 1:25000. Diferentemente, os documentos juntos pelos autores e da responsabilidade do autor J,, estão já a uma escala diferente, a escala de 1:5000. A diferença entre as escalas utilizadas pelos autores, num documento composto por um deles no seu computador, conforme referiu, infirma a credibilidade do documento.
Ao invés, mostrar-se-ia sim adequado o recurso à realização de prova pericial que, de forma isenta e feita por peritos na área, permitisse confrontar o trajeto das linhas conforme resulta da planta de síntese, com aquele que se verifica na prática.».
Logo, não estando provado que exista um desfasamento na localização das referidas linhas sobre o prédio dos autores face ao que devia ser por referência à planta geral e à planta de perfis, não se vê como poderia este tribunal ad quem revogar a decisão recorrida, designadamente, dando como certa a tese dos autores sobre a existência desse desfasamento.
Assim sendo, é manifesta a improcedência do presente recurso, impondo-se confirmar a sentença recorrida.
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IV-DECISÃO

Nestes termos,
acordam, em conferência, os juízes desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
*
Custas pelo apelante, sem prejuízo da isenção de que beneficia (art.º 4º, n.º 1, h) do RCP).
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Notifique.
Porto, 22 de janeiro de 2021.

Helena Ribeiro
Conceição Silvestre
Alexandra Alendouro