Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02115/15.1BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/17/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Joaquim Cruzeiro
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
Sumário:I- Os atributos das propostas não se podem fixar em montante diferente do exigido nas peças de procedimento, o que a ocorrer constitui fundamento para a sua exclusão.
II- O princípio da concorrência tem como corolário assegurar que todos os concorrentes respondam aos mesmos requisitos do concurso de modo a possibilitar a plena comparabilidade das propostas.
III- Se a recorrente tem determinados custos com o fornecimento de determinados bens e não indica esses custos no local indicado para o efeito está com a sua conduta a subverter o princípio da concorrência, uma vez que torna a sua proposta não comparável com as restantes.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:E... (Portugal) - Sociedade Europeia de Restaurantes Lda
Recorrido 1:Município de Vila Nova de Gaia
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1 – RELATÓRIO
E... (Portugal) - Sociedade Europeia de Restaurantes Lda. vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 7 de Março de 2016, e que julgou improcedente a acção no âmbito do contencioso pré-contratual que intentou contra o Município de Vila Nova de Gaia com as contra-interessadas melhor identificadas nos autos, e onde era solicitado que:
a) Anulando-se a deliberação do Réu de data que a Autora não sabe precisar mas seguramente anterior a 7 de Julho de 2015, nos termos da qual se decidiu adjudicar à G... - Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação SA o Concurso Público n.º 26/2015-DCPA, para a Aquisição da Prestação de Serviços de Cantinas Escolares;

b) Em consequência, anulando-se todos os actos subsequentes ao mesmo, designadamente o contrato que entretanto tenha sido celebrado em execução daquele; e

c) Condenando-se o Réu a emitir novo Relatório Final no qual readmita a proposta da E..., e em que se avalie e classifique, fundamentadamente, as propostas dos concorrentes admitidos, propondo-se a adjudicação dos serviços à proposta da E....

Em alegações a recorrente concluiu assim:
A. O tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao decidir julgar a acção intentada pela E... improcedente. Recorde-se que a presente acção tinha em vista: i) a anulação da deliberação camarária que decidiu adjudicar à G... o Concurso n.º 26/2015-DCPA, ii) a anulação de todos os actos subsequentes à adjudicação, designadamente o contrato que veio a ser celebrado entre o Município de Vila Nova de Gaia e a G... e iii) a condenação do Reú, Município de Vila Nova de Gaia, a readmitir a proposta da E... e, consequentemente, a adjudicar a proposta de fornecimento por esta apresentada;
B. O Tribunal a quo fixou as questões a decidir em saber se, por um lado, os custos que formam o preço poderiam ser arredondados às centésimas, e se, por outro lado, a proposta poderia apresentar rubricas a custo zero;
C. Conforme se viu o Tribunal mal andou ao ter considerado que a regra do arredondamento não se aplica aos custos e encargos uma vez que resulta da própria redacção no ponto 11, alínea b.1), conjugado com o corpo normativo da alínea b) que o preço unitário da refeição e valor unitário da refeição são utilizados como sinónimos fazendo com que seja lógico aplicar-se-lhes a regra do arredondamento;
D. O Tribunal também andou mal ao ter pugnado pela impossibilidade de apresentação de custos nulos relativamente a encargos com matéria-prima não alimentar, substituição e manutenção de equipamentos, reposição de palamenta e encargos gerais e lucros enquanto componentes do custo do almoço, uma vez que as peças concursais, i.e., o Programa do Concurso e o Caderno de Encargos, não determinam valores mínimos a apresentar com estes custos, razão pela qual os concorrentes são livres de apresentar os valores que entendam;
E. Por todo o exposto, é mais do que evidente que o recurso intentada pela E... deve ser julgado procedente, devendo o respectivo erro de julgamento ser corrigido pelo Tribunal ad quem.

O Recorrido contra-alegou tendo apresentado as seguintes conclusões:

A - O arredondamento incide apenas sobre o preço unitário global da refeição, não sobre as parcelas que o decompõem;
B - A proposta da recorrente não cumpria o Programa de Concurso em matéria não sujeita a concorrência pelo que a sua exclusão se impunha;
C - Para que seja possível a comparação das propostas, estas têm que apresentar valores positivos, ainda que baixos, em todos os itens em que se decompõe o preço;
D - Não são admitidos valores nulos quando há custos efectivamente suportados e ainda que estes sejam absorvidos pela estrutura, até para evitar que haja propostas abaixo do preço de custo, o que seria ilegal;
E - Não pode este Tribunal decidira pela adjudicação do concurso à recorrente pois a sua proposta não foi avaliada quanto à qualidade;

A contra-interessada G...- Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação SA contra-alegou tendo apresentado as seguintes conclusões:

1. O ponto 11. do Programa do Concurso exige que a matéria-prima alimentar corresponda, no mínimo, a uma determinada percentagem do valor global da refeição.
2. A identificada norma concursal contém, pois, aspectos da execução do contrato a celebrar não submetidos à concorrência, aos quais a entidade adjudicante pretende que os concorrentes se vinculem (cf. artigo 57º n.º 1 al. c) do CCP).
3. A interpretação não pode ter apenas em conta a letra da norma.
4. Há que ter em conta as regras de interpretação vertidas no artigo 9º do Código Civil e, por conseguinte, não apenas o elemento literal, mas também o elemento teleológico, o elemento sistemático e o elemento histórico.
5. Atentas as necessidades específicas dos destinatários das refeições objecto do presente concurso (crianças), é particularmente premente o cumprimento escrupuloso das disposições técnicas dos documentos concursais, através da confecção e preparação de refeições de qualidade e de alto índice calórico, com respeito pelas componentes, variedade e capitações prescritas.
6. Daí que, para garantir a qualidade das refeições fornecidas, a entidade adjudicante tenha exigido o cumprimento de uma determinada percentagem de valor de matéria-prima alimentar por referência ao valor global da refeição.
7. O Programa separa, claramente, o preço unitário global por refeição, e, após discriminação dos custos da refeição, o valor global unitário desses custos.
8. «valor global» e «preço global» são conceitos diferentes.
9. «valor global» é reportado aos custos e não ao preço.
10. A permissão do arredondamento reporta-se apenas ao preço.
11. Se a matéria-prima alimentar tem que corresponder a uma determinada percentagem do valor global da refeição, então a mesma deve ser aferida em função da soma dos custos e não em função do preço global porque só assim é que se garante que as refeições tenham a qualidade pretendida pela entidade adjudicante, objectivo que seria frustrado com a sua comparação com o preço final após arredondamento redundando num valor de matéria-prima inferior ao valor mínimo exigido.
12. Pelo que, como bem concluiu o tribunal a quo, «a proposta da Autora violou o ponto 11 do programa do Concurso bem como o disposto no artigo 70º, n.º 2-b) do Código dos Contratos Públicos» (cfr., no mesmo sentido, a sentença de 3 de Março de 2016, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, no processo n.º 2090/15.2BEPRT junta sob o documento n.º 1).
13. Não padecendo, por conseguinte, a sentença recorrida do erro de julgamento que a recorrente lhe imputa.
14. Exigindo o Programa do Concurso que a matéria-prima alimentar corresponda a uma determinada percentagem mínima do somatório dos custos da refeição, os valores dos custos suportados, ainda que não venham a ser repercutidos no preço, têm que ser considerados no valor global da refeição para efeitos de apuramento do valor exigido para a matéria-prima alimentar, sob pena de se desvirtuar por completo aquela exigência concursal e comprometer a qualidade das refeições.
15. Se o Programa do Concurso exige a indicação de determinados custos, é evidente que os mesmos não podem ter o valor de zero porquanto, sendo custos, então têm que ter um valor superior a 0.
16. Conclui-se, assim, que o tribunal a quo não cometeu o erro de julgamento que lhe vem imputado pela recorrente.
O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, não se pronunciou nos autos.

As questões suscitadas e a decidir resumem-se em determinar:

— se ocorre erro de julgamento, pelo Tribunal a quo ao ter decidido que a proposta da Autora, ora recorrente, violou o disposto no artigo 70º n.º 2 b)e c) do CCP.

Cumpre decidir.

2– FUNDAMENTAÇÃO

2.1 – DE FACTO

Na decisão sob recurso ficou assente, e permanece não impugnado, o seguinte quadro factual:


A)
O Réu, mediante Anúncio de procedimento n.º 1356/2015, publicado no Diário da República, Parte L, de 6 de março de 2015, procedeu à abertura de um concurso destinado à Aquisição de Prestação de Serviços de Cantinas Escolares, sendo o critério de adjudicação o da proposta economicamente mais vantajosa.
B)
O Programa do Concurso estabelecia no seu ponto 11, o seguinte:
«11 Documentos da Proposta
Sob pena de exclusão, a proposta é constituída pelos seguintes:
a) Declaração do concorrente de aceitação do conteúdo do Caderno de Encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do Anexo A ao presente Programa do Concurso;
b) Proposta de preço unitário global por refeição, arredondado à centésima (se for o caso), indicado por algarismos e extenso, não incluindo o IVA, explicitando a taxa legal aplicável, acompanhada de nota justificativa que especifique obrigatoriamente os seguintes parâmetros:
b.1) Almoço:
a) Custo da matéria-prima alimentar – obrigatoriamente, igual ou superior a 50% do valor global da refeição;
b) Custo da matéria-prima não alimentar;
c) Encargos com pessoal dos refeitórios: salários, remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o Anexo F;
d) Encargos com a substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta;
e) Encargos gerais e lucros;
f) Valor global unitário por refeição Almoço;
g) Proposta de valor global anual refeição almoço e para o prazo total possível de execução do contrato (3 anos).
b.2) Suplemento:
a) Custo da matéria-prima alimentar – obrigatoriamente, igual ou superior a 78% do valor global do suplemento;
b) Custo da matéria-prima não alimentar;
c) Encargos com pessoal: salários, remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o Anexo F.1;
d) Encargos gerais e lucros;
e) Valor global unitário por suplemento;
f) Proposta de valor global anual suplemento e para o prazo total possível de execução do contrato (3 anos);
b.3) Complemento Lanche Manhã:
a) Custo da matéria-prima alimentar – obrigatoriamente, igual ou superior a 80% do valor global do complemento do lanche da manhã;
b) Custo da matéria-prima não alimentar;
c) Encargos com pessoal: salários, remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o Anexo F.2;
d) Encargos gerais e lucros;
e) Valor global unitário por complemento lanche manhã;
f) Proposta de valor global anual para complemento do lanche da manhã e para o prazo total possível de execução do contrato (3 anos);
b.4) Lanche da Tarde:
a) Custo da matéria-prima alimentar – obrigatoriamente, igual ou superior a 80% do valor global do Lanche da Tarde;
b) Custo da matéria-prima não alimentar;
c) Encargos com pessoal: salários, remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o Anexo F.3;
d) Encargos gerais e lucros;
e) Valor global unitário do Lanche da Tarde;
f) Proposta de valor global anual para o Lanche da Tarde e para o prazo total possível de execução do contrato (3 anos);
b.5) Preço Proposto Total Global Anual
O Preço Proposto total global anual = Preço Proposto refeição + Preço Proposto suplemento + Preço Proposto complemento lanche manhã + Preço Proposto lanche da tarde.
c) Condições de Pagamento;
d) Memória descritiva do procedimento de autocontrolo de higiene e segurança alimentar;
e) Plano de formação do pessoal (subcritério B4);
f) Plano de atividades de informação/divulgação/sensibilização da população escolar, indicando as respetivas áreas temáticas, faixa(s) etária(s) do(s) destinatários e número de ações a desenvolver por ano e tema (subcritério B3);
g) Memória descritiva pormenorizada que inclua todas as vertentes consideradas nas condições técnicas anexas ao caderno de encargos, acompanhada de um conjunto de proposta de ementas para seis semanas seguidas (subcritério B1 + B2);
h) Documento que identifique qual ou quais as certificações de qualidade de que são possuidores, indicando as respetivas Normas;
i) Fichas técnicas dos componentes da refeição, com indicação dos seguintes elementos:
i-1) Identificação dos componentes da refeição (sopa, prato e sobremesa);
i-2) Lista de ingredientes e sua capitação;
i-3) Identificação de todos os ingredientes que possam provocar alergias ou intolerâncias;
i-4) Informação nutricional que especifique, no mínimo, o valor energético e os macronutrientes (lípidos totais, ácidos gordos saturados, hidratos de carbono, açúcares, proteínas e sal).
j) Plano de gestão ambiental para as escolas (subcritério B5).
O arredondamento é feito à centésima e incidirá sobre o preço unitário global da refeição almoço, suplemento alimentar, complemento lanche manhã e lanche da tarde, observando para o efeito as regras gerais do arredondamento.».
C)
A Autora apresentou a sua proposta, nos seguintes termos:
«Proposta de preço
b) – Preço Unitário Global por Refeições sem IVA 1,82 € (um euro e oitenta e dois cêntimos)
b.1) Almoço – Nota justificativa do preço unitário global por refeição
a) Custo da matéria-prima alimentar 0,91 € (noventa e um cêntimos) Obrigatoriamente, igual ou superior a 50% do valor Global da refeição;
b) Custo da Matéria-prima não alimentar 0,00 € (zero)
Custo suportado pelo Marketing, em virtude da Publicidade utilizada nos produtos e campanhas E...;
c) Encargos com o pessoal dos refeitórios: salários, 0,91 € (noventa e um cêntimos) remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o anexo F;
d) Encargos com a substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta 0,00€ (zero)
A manutenção do equipamento é um custo central da estrutura E..., (equipa técnica) não imputado diretamente ao Município de Vila Nova de Gaia. O custo com a Palamenta e Equipamentos é suportado pelo benefício que a E... obtém junto dos fornecedores, na aquisição de palamenta/equipamento anual.
e) Encargos gerais e lucros,
Nesta rubrica a E... tem como objetivo a inclusão 0,00€ (zero) na sua lista de clientes, do Município de Vila Nova de Gaia, assim esta verba não será imputada ao Município de Vila Nova de Gaia;
f) Valor global unitário por refeição Almoço; 1,82 €
g) Valor global anual refeição Almoço; 3.734.640,00€
g) Valor global total de execução do contrato (3 anos) 11.203.920,00€
b) Preço Unitário Global por Suplemento sem IVA 0,30€ (trinta cêntimos)
b.2) Nota justificativa do preço unitário global por suplemento
a) Custo da matéria-prima alimentar 0,23€
Obrigatoriamente, igual ou superior a 78% do valor global do suplemento
b) Custo da Matéria-prima não alimentar 0,00€ (zero)
Custo suportado pelo Marketing, em virtude da Publicidade utilizada nos produtos e campanhas
E...;
c) Encargos com o pessoal dos refeitórios: salários, 0,07 € (sete cêntimos) remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o anexo F.1;
d) Encargos gerais e lucros,
Nesta rubrica a E... tem como objetivo a inclusão 0,00€ (zero) na sua lista de clientes, do Município de Vila Nova de Gaia, assim esta verba não será imputada ao Município de Vila Nova de Gaia;
e) Valor global unitário por suplemento; 0,30 € (trinta cêntimos)
f) Valor global anual suplemento; 45.600,00€
f) Valor global total de execução do contrato (3 anos) 136.800,00€
b) Preço Unitário Global Complemento Lanche Manhã sem IVA 0,08 (oito cêntimos)
b.3) Nota justificativa do preço unitário global por complemento Lanche Manhã
a) Custo da matéria-prima alimentar 0,06€ (seis cêntimos)
Obrigatoriamente, igual ou superior a 80% do valor global do complemento do lanche da manhã
b) Custo da Matéria-prima não alimentar 0,00€ (zero)
Custo suportado pelo Marketing, em virtude da Publicidade utilizada nos produtos e campanhas E...;
c) Encargos com o pessoal: salários, 0,02 € (dois cêntimos) remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o anexo F.2;
d) Encargos gerais e lucros,
Nesta rubrica a E... tem como objetivo a inclusão 0,00€ (zero) na sua lista de clientes, do Município de Vila Nova de Gaia, assim esta verba não será imputada ao Município de Vila Nova de Gaia;
e) Valor global unitário por complemento lanche manhã; 0,08 € (oito cêntimos)
f) Valor global anual complemento lanche manhã; 200.640,00€
f) Valor global total de execução do contrato (3 anos) 601.920,00€
b) Preço Unitário Global Complemento Lanche da Tarde sem IVA 0,23 (vinte e três cêntimos)
b.4) Nota justificativa do preço unitário global por Lanche da Tarde
a) Custo da matéria-prima alimentar 0,18€ (dezoito cêntimos)
Obrigatoriamente, igual ou superior a 80% do valor global do complemento do lanche da tarde
b) Custo da Matéria-prima não alimentar 0,00€ (zero)
Custo suportado pelo Marketing, em virtude da Publicidade utilizada nos produtos e campanhas
E...;
c) Encargos com o pessoal: salários, 0,05 € (cinco cêntimos) remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o anexo F.3;
d) Encargos gerais e lucros,
Nesta rubrica a E... tem como objetivo a inclusão 0,00€ (zero) na sua lista de clientes, do Município de Vila Nova de Gaia, assim esta verba não será imputada ao Município de Vila Nova de Gaia;
e) Valor global unitário do Lanche da Tarde; 0,23€ (vinte e três cêntimos)
f) Valor global anual do Lanche da Tarde; 131.100,00€
f) Valor global total de execução do contrato (3 anos) 393.300,00€
b.5) Preço Proposto Total Global Anual
Base de cálculo:
Refeições Escolares Almoço: 2.052.000 Refeições Ano x 1,82 = 3.734.640,00€;
Suplemento: 152.000 suplementos Ano x 0,30€ = 45.600,00€
Complemento Lanche Manhã: 2.508.000 Complemento Lanche Manhã x 0,08 = 200.640,00€
Lanche da Tarde: 570.000 Lanche Tarde x 0,23€ = 131.100,00€
(…)
Valor Global da Proposta
Base de Cálculo:
Refeições Escolares Almoço 3.734.640,00€ + Suplemento 45.600,00€ +
Complemento Lanche Manhã 200.640,00 € + Lanche da Tarde 131.100,00€ =
4.111.980€.»
D)
Em 1 junho de 2015, foi elaborado pelo Júri Relatório Preliminar, na qual foi proposta a exclusão da proposta apresentada pela Autora, com base no seguinte:
«O Júri propõe a exclusão das propostas dos concorrentes (…) E... (…), com fundamento legal no disposto na alínea n) do nº 2 do artigo 146º do CPP, conjugada com a alínea b) do nº 2 do artigo 70º, por violação das regras previstas no ponto 11 do Programa de Concurso.
Estipula a alínea a) do ponto b.2) – Suplemento, alínea a) do ponto b3) – Complemento Lanche Manhã e alínea) do ponto b4) – Lanche da tarde, do ponto 11 do Programa de Concurso, que a incidência da matéria-prima alimentar deverá ser obrigatoriamente igual ou superior a 78%, 80% e 80%, respetivamente, de cada preço unitário global proposto para cada refeição. (…)
Relativamente ao concorrente E... (…), verifica-se que apresenta para o custo da matéria prima do suplemento, um valor de 0,23€, correspondente a 77% (76,670%) do preço global proposto, para o complemento lanche manhã um valor de 0,06€, correspondente a 75% do preço global proposto, e para o custo da matéria-prima do lanche da tarde um valor de 0,18€, correspondente a 78% (78,261%).
Os atributos das propostas acima descritos, fixando-se em montante inferior ao exigido nas peças de procedimento, não cumprem os parâmetros base fixados no programa de Concurso, conforme referido anteriormente, o que constitui fundamento para a sua exclusão de acordo com o disposto na alínea o) do nº 2 do artigo 146º, conjugada com a alínea b) do nº 2 do artigo 70º, ambos do CCP.
No que concerne ao concorrente E... (…), refere-se ainda que o mesmo apresenta valores nulos para a incidência dos custos de matéria-prima não alimentar, encargos com a substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta e para encargos gerais e lucros, enquanto componentes do custo do almoço.
Apresenta, ainda, valores nulos para a incidência dos custos da matéria-prima não alimentar e para encargos gerais e lucros, enquanto componentes dos custos do suplemento, complemento lanche da manhã e lanche da tarde.
Apesar de ter exibido nota justificativa quanto à apresentação do valor de zero (0,00€), considerando como desprezíveis os custos referidos, e assumindo-os como absorvidos pela estrutura, entende o júri que a mesma não deverá ser considerada, dado que o concorrente deveria ter dado indicação taxativa de todos os fatores de produção, com repercussão financeira direta no serviço a prestar, tendo por objetivo e em defesa do princípio da concorrência, garantir que todos os concorrentes apresentariam a sua proposta com base nas mesmas premissas.
Se nas regras definidas quanto ao modo de apresentação do preço unitário não estivesse prevista a sua indicação detalhada, qualquer um dos demais concorrentes poderia, igualmente, afetar aqueles custos à estrutura e, consequentemente, apresentar outro preço.
Assim, com base no disposto na alínea o) do n.º 2 do artigo 146º e alínea c) do nº 2 do artigo 70º, ambos do CCP, propõe o júri a sua exclusão».
E)
A Autora pronunciou-se em sede de audição prévia, referindo que a sua proposta deveria ser readmitida, porque realizado o arredondamento à segunda casa decimal, a proposta cumpre as percentagens exigidas pelo Programa do Concurso; e que relativamente à apresentação de valores nulos, ser falso que não cumpra as peças concursais ou que represente qualquer violação do princípio da igualdade ou da concorrência, uma vez que não estão determinados valores mínimos, pelo que os concorrentes são livres de apresentarem os valores que entenderem, incluindo nulos.
F)
Em 26 de junho de 2015, foi elaborado Relatório Final, que manteve a intenção de exclusão da proposta da Autora nos seguintes termos:
«1. INTRODUÇÃO
Para efeitos de audiência prévia, em cumprimento do disposto no artigo 147º do Código dos Contratos Públicos (CCP), foi o Relatório Preliminar submetido à audiência escrita dos interessados em 2 de junho de 2015. No exercício daquele direito, registou-se a intervenção dos concorrentes E... (Portugal) - Sociedade Europeia de Restaurantes Lda e I… - Indústria e Comércio Alimentar SA, documentos que se anexam sob os n.ºs 1 e 2, e cujo teor se dá aqui por reproduzido, sem prejuízo de, por facilidade de exposição, se proceder, no presente relatório, quando julgado oportuno, a transcrições ou citações de um, ou algum, dos seus conteúdos.
Para cumprimento do disposto no artigo 148º do CCP, começou o Júri pela verificação do cumprimento dos requisitos processuais. Confirmou que as intervenções são tempestivas e se mostram reunidos todos os demais requisitos processuais, designadamente de legitimidade.
2. APRECIAÇÃO DAS OBSERVAÇÕES FORMULADAS PELOS CONCORRENTES
2.1 Intervenção da concorrente E... (PORTUGAL) - Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda
Em sede de audiência de interessados, a concorrente manifesta o seu desacordo com a intenção de exclusão da sua proposta, pugnando pela readmissão da mesma.
Alega a concorrente que a análise dos valores apresentados terá que ser feita de acordo com as regras de arredondamento, tal como exigido no Programa de Concurso.
Assim, invoca que, "num preço de € 0,30 por suplemento, temos que 78% corresponde a € 0,234, o que arredondado à segunda casa decimal corresponde aos € 0,23 apresentados pela E...", "já no que ao lanche da manhã diz respeito, tendo a E... proposto um preço de € 0,08, temos que 80% corresponderiam a € 0,064, o que arredondado à segunda casa decimal corresponde aos € 0,06 apresentados pela E...".
Finalmente, "no que concerne ao lanche da tarde, tendo a E... proposto um preço de € 0,23, temos que 80% corresponderiam a € 0,184, o que arredondado à segunda casa decimal corresponde aos € 0,18 apresentados pela E...".
Do extraído da pronúncia da concorrente, tal como consta do Relatório Preliminar, impunha-se a indicação discriminada das várias incidências no valor global da refeição, conforme consta no ponto 11 do Programa de Concurso (alínea b)). A indicação taxativa de todos os fatores de produção, com repercussões financeiras diretas no serviço a prestar, tem por objetivo, para defesa do princípio da concorrência, garantir que todos os concorrentes formulem e apresentem a sua proposta com base nas mesmas premissas, que são as que refletem os custos decorrentes da integral satisfação das prestações a executar ao abrigo do contrato.
Importa ter presente que o interesse subjacente à exigência de cumprimento de uma determinada percentagem de matéria-prima alimentar por referência ao valor global da refeição é o de assegurar que os utentes das cantinas escolares consumam refeições com a qualidade adequada às suas necessidades nutricionais.
Ora, o que decorre do teor da enunciada alínea b) é que a regra do arredondamento se aplicava exclusivamente ao preço unitário global por refeição e não a cada um dos custos que concorrem para a sua formação. Basta atentar na redação desta disposição concursal para assim se concluir: “Sob pena de exclusão, a proposta é constituída pelos seguintes documentos: a) ( ... ) b) Proposta de preço unitário global por refeição, arredondado à centésima (se for o caso), indicado por algarismos e extenso, não incluindo o IVA, explicitando a taxa legal aplicável acompanhada de nota justificativa que especifique obrigatoriamente os seguintes parâmetros: (…)”.
Com efeito, a concorrente confunde preço com custo, realidades que são absolutamente distintas e, por isso, inconfundíveis.
O preço é o valor proposto pelo concorrente como contrapartida do serviço a prestar à entidade adjudicante, ao passo que os custos correspondem aos valores das despesas em que o concorrente incorre para prestar esse serviço.
Deste modo, custo não se confunde com preço, porque o primeiro não é passível de "arredondamento", dado que corresponde ao valor efetivamente suportado com o bem/serviço a que se refere (v.g. pessoal, matéria-prima alimentar, etc.)
Pelo que, quando apresenta valores arredondados de todos os custos que compõem a proposta, como efetivamente fez, a concorrente violou o ponto 11 alínea b) do Programa de Concurso.
Mais alega a concorrente que a apresentação de valores nulos não constitui incumprimento das peças concursais, uma vez que suporta efetivamente os custos dos itens referidos, mas não os repercute no preço global da refeição.
Ora, independentemente da sua repercussão no preço proposto, o valor dos custos tem que ser considerado no valor global da refeição para efeitos de apuramento do valor exigido para a matéria-prima alimentar, sob pena de se desvirtuar por completo a exigência concursal e comprometer a qualidade das refeições.
Consideremos, como exemplo, o preço proposto para o almoço.
O custo com a matéria-prima alimentar tem, obrigatoriamente, que ser igualou superior a 50% do valor global da refeição (cf. ponto 11. Alínea b.1) a) do Programa de Concurso).
O valor global da refeição é o valor correspondente à soma de todos os custos, não se confundindo, pois, com o preço unitário da refeição.
Se a concorrente tivesse considerado para os custos com matéria-prima não alimentar, substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta, e encargos gerais e lucro, valores superiores a zero, como deveria, já que efetivamente os suporta, o valor da matéria-prima alimentar teria que ser superior ao indicado para cumprir a percentagem exigida no Programa de Concurso.
Assim, a sua proposta é inadmissível violando o ponto 11. b) do Programa de Concurso, sendo incomparável com as demais, devendo manter-se a intenção de exclusão constante do Relatório Preliminar, ao abrigo do disposto no artigo 70º n.º 2 al. c) do CCP.
(…)
3. CONCLUSÃO
Considerando o exposto, e de acordo com o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 148º do CCP, remete-se o presente relatório, constituído por 7 páginas e 2 anexos, ao qual se junta também o relatório preliminar, bem como todos os documentos que constituem o processo, para que seja proferida decisão sobre as propostas aqui contidas, nomeadamente:
- o não provimento das pronúncias/reclamações apresentadas pelos fundamentos expostos no presente relatório;
- de exclusão das propostas concorrentes E... (PORTUGAL) - Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda e I… - Indústria e Comércio Alimentar, S.A., pelos fundamentos constantes do relatório preliminar e no presente relatório;
- de admissão das propostas apresentadas pela G... - Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação, SA e pela U... - SOCIEDADE DE RESTAURANTES PÚBLICOS E PRIVADOS, S.A, que se classificam da seguinte forma, de acordo com os critérios de avaliação fixados nas peças concursais:
(…)
- seja decidida a adjudicação da aquisição da prestação de serviços de cantinas escolares (almoço), suplemento alimentar, lanche da manhã e lanche da tarde das escolas do 1º ciclo e jardins de infância do concelho de Vila nova de Gaia à 1ª classificada, G..., pelo valor total de 4.222.560,00 € + IVA.».
G)
Em 16 de julho de 2015, a Autora deduziu impugnação administrativa para o Presidente da Câmara, requerendo a revogação da decisão de adjudicação e de exclusão da sua proposta; a readmissão da sua proposta; e a reordenação das propostas admitidas, de acordo com o critério fixado no Programa do Concurso, por forma a ser-lhe adjudicado o fornecimento.
H)
A impugnação administrativa foi indeferida.

2.2 – DE DIREITO

Cumpre apreciar as questões suscitadas pela ora Recorrente, o que deverá ser efectuado dentro das balizas estabelecidas, para tal efeito pela lei processual aplicável - ver artigos 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º do C.P.C., na redacção conferida pela Lei n.º 41/2013, ex vi art.º 1.º do C.P.T.A, e ainda conforme o disposto no artigo 149º do CPTA.
O objecto do presente recurso cinge-se em saber se a proposta apresentada pela recorrente viola o disposto no artigo 70º n.º 2 alínea b) do CCP, uma vez que não cumpre com um aspecto do concurso não submetido à concorrência, e se viola ainda o disposto na alínea c) do mesmo número e artigo, por não ser possível comparar as propostas.

I- No que se refere à primeira questão verifica-se que a proposta da recorrente foi afastada porque: “verifica-se que apresenta para o custo da matéria-prima do suplemento, um valor de 0,23€, correspondente a 77% (76,670%) do preço global proposto, para o complemento lanche manhã um valor de 0,06€, correspondente a 75% do preço global proposto, e para o custo da matéria-prima do lanche da tarde um valor de 0,18€, correspondente a 78% (78,261%).
Os atributos das propostas acima descritos, fixando-se em montante inferior ao exigido nas peças de procedimento, não cumprem os parâmetros base fixados no programa de Concurso, conforme referido anteriormente, o que constitui fundamento para a sua exclusão de acordo com o disposto na alínea o) do nº 2 do artigo 146º, conjugada com a alínea b) do nº 2 do artigo 70º, ambos do CCP”.
A recorrente vem sustentar que a decisão recorrida andou mal quando decidiu que a regra do arredondamento não se aplica aos custos e encargos mas apenas ao valor global a apresentar.
Quanto a esta questão refere-se na decisão recorrida:
Então, se bem entendido, o arredondamento significa que se está a calcular um montante, desconsiderando os algarismos que forem superiores às centésimas. Daí que seja somente de aplicar o arredondamento quando haja indicação de valores às milésimas ou superior, por isso a referência, «se for o caso», pois que a proposta pode bastar-se com centésimas (ou pode apresentar os custos em milésimas, décimas de milésimas, centésimas de milésimas, milionésimas, nestes casos o preço unitário global deveria ser arredondado às centésimas). Mas os custos parcelares já não devem ser arredondados às centésimas, pois que os mesmos devem espelhar o custo efetivo, e este (tendo em conta o tipo de fornecimento em causa), muito dificilmente terão um custo por unidade de produto até à casa das centésimas. Se tais custos parcelares, em cada unidade de matéria-prima alimentar, têm um custo que pode ser mensurável em milésimas, décimas de milésima, centésimas de milésima ou milionésimas, de cêntimo, então isso corresponde ao custo efetivo daquela unidade de produto.
Ora, arredondar o custo efetivo da matéria-prima alimentar à centésima, implica desconfigurar o respetivo custo, pois que de arredondamento em arredondamento em cada unidade, o custo final não corresponderá ao custo real e efetivo. E o Réu pretende saber a exata composição dos custos, de forma a poder aferir com a certeza e segurança necessárias da qualidade das propostas; que é como quem diz, da matéria-prima alimentar. Ou seja, apenas com a referência aos custos indicados às centésimas, não é possível aferir a qualidade pretendida com as diversas refeições. Desta forma, o regime de arredondamento às centésimas não se aplica aos custos e encargos. No caso em apreço, a proposta da Autora não cumpre com as percentagens mínimas referentes a cada custo da matéria-prima alimentar, referente a cada tipo de refeição, pelo que não cumpria um aspeto do concurso não submetido à concorrência, e como tal só podia ser excluída.
Face ao exposto, a proposta da Autora violou o ponto 11 do Programa do Concurso, bem como o disposto no artigo 70.º, n.º 2 – b) do Código dos Contratos Públicos.
Vejamos o que está em causa.
A recorrente concorreu ao concurso destinado à aquisição de Prestação de Serviços de Cantinas Escolares.
No programa do concurso, que é o regulamento que define os termos a que obedece a fase de formação do contrato até à sua celebração (artigo 41º do CCP) referia-se no seu ponto 11, sob a epígrafe, Documentos da Proposta, que, sob pena de exclusão, a proposta é constituída pelos seguintes:

b) Proposta de preço unitário global por refeição, arredondado à centésima (se for o caso) …
Este ponto, referente ao preço unitário global por refeição, decompõe-se em vários alíneas, cada uma correspondendo a uma refeição ou a um serviço a prestar.
Assim:
a alínea b.1 refere-se ao almoço;
a alínea b.2 ao Suplemento;
a alínea b.3 ao Complemento do lanche da manhã;
e a Alínea b.4 ao Lanche da tarde.
Cada alínea destas é constituída por várias subalíneas, correspondendo aos custos considerados relevantes por cada serviço prestado.
a subalínea a) corresponde ao custo da matéria-prima alimentar;
a subalínea b) ao custo da matéria-prima não alimentar;
a subalínea c) aos Encargos com pessoal;
a subalínea d) aos Encargos com a substituição e manutenção dos Equipamentos e reposição da palamenta;
a subalínea d) aos Encargos gerais e lucros e
a subalínea e) deverá corresponder ao valor unitário por cada serviço prestado.
No que se refere à matéria-prima alimentar, consta de cada subalínea que esta deve ter obrigatoriamente uma determinada percentagem relativamente ao valor global do serviço prestado. Isto no sentido de se assegurar qualidade nas refeições fornecidas, devendo, assim, o valor da matéria-prima alimentar ser superior ao valor dos outros custos.
Assim, na subalínea b.2, relativa ao suplemento, e estas são as subalíneas em causa nos autos, o custo da matéria-prima alimentar deveria ser obrigatoriamente, igual ou superior a 78% do valor global do suplemento.
Nesta alínea o único custo referido pela recorrente, além do anteriormente referido, e relativo à matéria – prima alimentar, é o do encargo com o pessoal que atinge 0, 07€.
Na subalínea b.3 referente ao Complemento Lanche Manhã, o custo da matéria-prima alimentar deveria ser obrigatoriamente igual ou superior a 80% do valor global do complemento do lanche da manhã.
O único custo além do já referido e apontado pela recorrente nesta alínea é o do encargo com o pessoal que atinge 0,0 2€
Na subalínea b.4 referente ao Lanche da Tarde, o custo da matéria-prima alimentar deveria ser obrigatoriamente, igual ou superior a 80% do valor global do Lanche da Tarde.
O único custo ainda referido consta da alínea c) com pessoal que atinge os 0,05€.

O que está em causa, e o que se encontra controvertido nesta acção, é saber se os custos da matéria-prima apresentados pela recorrente cumprem ou não com a obrigatoriedade da percentagem que os mesmos devem ter relativamente a cada custo do serviço prestado.
Assim, e referente ao suplemento (alínea b.2) está em causa saber se o valor de 0, 23€ apresentado corresponde ou não aos 78% do valor global do suplemento.
O recorrente refere que sim.
Sustenta que tendo proposto o valor de 0,30€ e para o suplemento, 78% desse montante será 0,234€. O arredondamento desse montante corresponde a 0, 23€ o montante que indicou como correspondendo ao da matéria-prima, pelo que a sua proposta está dentro do legalmente exigido.
Refere o mesmo raciocínio para as outras refeições, Complemento lanche da manhã e Lanche da Tarde.
Não concordamos com tal conclusão.
Em primeiro lugar verifica-se que a recorrente parte da proposta para efectuar uma percentagem sem contar com os outos custos inerentes à mesma. Depois, como iremos referir, o arredondamento até à centésima, efectuado pela recorrente, não pode ser realizado relativamente a cada custo, mas sim apenas quando esteja em causa o preço unitário por refeição, como se refere na aliena b).
No que se refere ao cálculo efectuado, verifica-se que na subalínea b. 2 a proposta da recorrente foi de 0, 23 €. Ora, efectuando uma conta simples, conclui-se que se o custo da matéria-prima alimentar tem de ter no mínimo 78% do custo total do suplemento, então é porque os restantes custos terão de ascender a 22%. O único custo referido é o do encargo do pessoal que ascende a 0,07€ e que corresponderá assim a 22%. Ora se 0,007% corresponde a 22%, a 78% terão de corresponder, no mínimo a 0, 2481. As contas apresentadas apenas se referem aos números referidos pela recorrente (questão que a contra-interessada não concorda uma vez que refere que os custos de pessoal atingem 0,07341€ - ver artigo 45º da contestação). No entanto as conclusões são as mesmas, não alterando significativamente o resultado.
Ora, se a recorrente vem apresentar 0, 23€ na matéria-prima alimentar no ponto b.2, e se o correspondente a 78% deveria corresponde no mínimo a 0, 2481€ facilmente se conclui que a sua proposta não cumpre com o solicitado no programa do concurso. Ou seja, os 0, 23€ referidos pela recorrente não podem corresponder a 78% da matéria-prima alimentar.
E este raciocínio vale também para os outros itens. Para o complemento do lanche da manhã e do Lanche da tarde.
Contrariando esta posição vem a recorrente sustentar que apresentou € 0,30 para os suplementos sendo que 78% desde preço corresponde a €0, 234, o que arredondado dá € 0, 23, estando, assim, a sua proposta correcta. Refere ainda que o arredondamento deve ser efectuado quer nos custos quer nos encargos.
Em primeiro lugar é de referir que os 0, 23€ avançados pela recorrente, como já concluímos, não correspondem a 78% do valor global do suplemento, pelo que nunca poderia ser admitida a sua proposta.
No entanto, mesmo a sua proposta, como refere, ao atribuir 0, 234€ por custo da matéria-prima alimentar, não cumpre com o estabelecido no Programa do Concurso, uma vez que não podem ocorrer arredondamentos no valor dos custos.
Conforme se menciona no Programa do Concurso, apenas a proposta de preço unitário global por refeição será para arredondar à centésima. É o que decorre do nº 11 do concurso, alínea b) quando se refere: Proposta de preço unitário global por refeição, arredondado à centésima (se for o caso). Ou seja, só será arredondado à centésima o preço unitário global por refeição.
No final do ponto 11 vem referido expressamente que “O arredondamento é feito à centésima e incidirá sobre o preço unitário (sublinhado nosso) global da refeição almoço, suplemento alimentar, complemento lanche manhã e lanche da tarde, observando para o efeito as regras gerais do arredondamento.
No programa do concurso, ponto 11, vêm descritos os vários serviços a prestar, como já referimos.
Na alínea b.1), o Almoço;
Na alínea b.2), o Suplemento;
Na alínea b.3), o complemento lanche da manhã; e
Na alínea b.4), o Lanche da tarde.
Cada alínea, referente a cada refeição, tem os custos associados e que vão perfazer o preço global.
Ora, estes custos terão se ser apresentados sem qualquer arredondamento. Está em causa saber, relativamente a cada refeição quais os custos que cada concorrente refere irá ter. É que se relativamente a cada custo fossem apresentados arredondamentos estaríamos a que pudesse ocorrer uma distorção significativa no preço final. Um montante ainda que mínimo, num universo de milhares de refeições a fornecer iria certamente alterar o preço global a apresentar. Por outo lado, repetimos, do Programa do concurso não se pode retirar, como refere a recorrente, que os preços dos custos também são arredondados. Não resulta nem da letra da norma nem do seu espírito tal conclusão.
Refere o ponto 11.b que a proposta de preço unitário global por refeição, arredondando à centésima (se for o caso). Ora, só este será alvo de arredondamento. Não vem referido, nem seria minimamente aceitável que o fosse, como já concluímos, por distorcer a realidade, que os custos de cada serviço também fossem arredondados às centésimas.
O artigo 9.º do Código Civil refere no seu n.º 1 que o legislador não se deve cingir à letra da lei, mas deve reconstituir, a partir dela, o pensamento legislativo, pelo que a letra da lei é o seu ponto de partida (n.º 2 do artigo 9.º do Código Civil) mas também é o seu limite, na medida em que não pode a interpretação jurídica não ter um mínimo de correspondência verbal.

Por outro lado, refere o n.º 3 do mesmo artigo, que o intérprete presumirá que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados e que consagrou as soluções mais acertadas.

De acordo com a jurisprudência do Ac. do STA, de 29.11.2011, processo n.º 701/10:
«I - Interpretar a lei é atribuir-lhe um significado, determinar o seu sentido a fim de se entender a sua correcta aplicação a um caso concreto.
II - A interpretação jurídica realiza-se através de elementos, meios, factores ou critérios que devem utilizar-se harmónica e não isoladamente.
III - O primeiro são as palavras em que a lei se expressa (elemento literal); os outros a que seguidamente se recorre, constituem os elementos, geralmente, denominados lógicos (histórico, racional e teleológico).
IV - O elemento literal, também apelidado de gramatical, são as palavras em que a lei se exprime e constitui o ponto de partida do intérprete e o limite da interpretação. A letra da lei tem duas funções: a negativa (ou de exclusão) e positiva (ou de selecção). A primeira afasta qualquer interpretação que não tenha uma base de apoio na lei (teoria da alusão); a segunda privilegia, sucessivamente, de entre os vários significados possíveis, o técnico-jurídico, o especial e o fixado pelo uso geral da linguagem.
V - Mas além do elemento literal, o intérprete tem de se socorrer algumas vezes dos elementos lógicos com os quais se tenta determinar o espírito da lei, a sua racionalidade ou a sua lógica. Estes elementos lógicos agrupam-se em três categorias: a) elemento histórico que atende à história da lei (trabalhos preparatórios, elementos do preâmbulo ou relatório da lei e occasio legis [circunstâncias sociais ou políticas e económicas em que a lei foi elaborada]; b) o elemento sistemático que indica que as leis se interpretam umas pelas outras porque a ordem jurídica forma um sistema e a norma deve ser tomada como parte de um todo, parte do sistema; c) elemento racional ou teleológico que leva a atender-se ao fim ou objectivo que a norma visa realizar, qual foi a sua razão de ser (ratio legis)».
Ora, no caso em apreço, o programa do concurso quando refere que o arredondamento à centésima, se aplica à proposta de preço unitário global por refeição, não inclui neste arredondamento os custos em que se fundamenta a proposta, nem da letra da lei se pode tirar tal conclusão, como refere a recorrente.
Por outro lado, tendo em atenção o fim que se pretende atingir com a elaboração dos custos, proceder ao seu arredondamento às centésimas era estar a distorcer a realidade em quantidade significativa de euros, quando se pretendesse atingir o valor global anual por refeição.
Assim sendo, o júri do concurso ao ter concluído no seu relatório final, que “o que decorre do teor da enunciada alínea b) é que a regra do arredondamento se aplicava exclusivamente ao preço unitário global por refeição e não a cada um dos custos que concorrem para a sua formação”, não fez errada interpretação do Programa do Concurso.
Na verdade, como se refere na decisão recorrida, os atributos das propostas acima descritos, fixando-se em montante diferente ao exigido nas peças de procedimento, não cumprem os parâmetros base fixados no programa de Concurso o que constitui fundamento para a sua exclusão, de acordo com o disposto na alínea o) do nº 2 do artigo 146º, conjugada com a alínea b) do nº 2 do artigo 70º, ambos do CCP.
Improcedem assim estas conclusões.

II- Vem ainda a recorrente sustentar que não podia ser excluída por ter apresentado elementos nulos em algumas propostas.
No relatório final vem referido quanto a este aspecto: “Mais alega a concorrente que a apresentação de valores nulos não constitui incumprimento das peças concursais, uma vez que suporta efectivamente os custos dos itens referidos, mas não os repercute no preço global da refeição”.
Ora, independentemente da sua repercussão no preço proposto, o valor dos custos tem que ser considerado no valor global da refeição para efeitos de apuramento do valor exigido para a matéria-prima alimentar, sob pena de se desvirtuar por completo a exigência concursal e comprometer a qualidade das refeições.
Consideremos, como exemplo, o preço proposto para o almoço.
O custo com a matéria-prima alimentar tem, obrigatoriamente, que ser igual ou superior a 50% do valor global da refeição (cf. ponto 11. Alínea b.1) a) do Programa de Concurso).
A recorrente indica o valor da matéria – prima alimentar e apenas faz referência ao valor dos encargos de pessoal. O mesmo acontece com os restantes serviços a fornecer.
Coloca os outros custos a zero.
Se a concorrente tivesse considerado os custos com matéria-prima não alimentar, substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta, e encargos gerais e lucro, valores superiores a zero, como deveria, já que efectivamente os suporta, o valor da matéria-prima alimentar teria que ser superior ao indicado para cumprir a percentagem exigida no Programa de Concurso.
Assim sendo, a sua proposta é inadmissível violando o ponto 11. b) do Programa de Concurso, sendo incomparável com as demais, devendo manter-se a intenção de exclusão constante do Relatório Preliminar, ao abrigo do disposto no artigo 70º n.º 2 al. c) do CCP.
Quanto a este aspecto refere-se na decisão recorrida:
O Programa do Concurso mencionava que o proponente deve apresentar os custos da matéria-prima não alimentar, os encargos gerais e lucros, os encargos com a substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta.
Nestes itens a Autora apresentou o valor de zero como custo associado a tais situações. Ora, se o Programa do Concurso prevê tais custos, é porque os considera como elementos essenciais para efeitos de comparação das propostas.
A justificação dada pela Autora não é de molde a poder ser atendida, uma vez que tais custos devem estar espelhados na proposta, ainda que absorvidos pela estrutura, pois que então sempre são custos da Autora. Ora, se a Autora tem tais custos, então a proposta não está conforme os custos reais e efetivos. Ao dizer que a estrutura assume os custos, a Autora como que está a dizer que não cobra aqueles custos neste contrato. Então em que contrato é que os cobra?
De referir que o assim decidido também é para manter.
No programa do concurso vem referido, relativamente a cada item, que a matéria-prima alimentar deve ter uma determinada percentagem do valor global da refeição.
Por exemplo, no almoço (ponto b.1), a matéria-prima alimentar deve ser obrigatoriamente igual ou superior a 50% do valor global da refeição. O mesmo se passa com as outras refeições, como já vimos.
Com esta medida pretende-se que a matéria-prima alimentar tenha um custo superior aos outros custos também quantificados, isto no sentido de melhorar a qualidade dos produtos a integrar nas refeições.
A recorrente nos itens referentes ao custo da matéria-prima não alimentar (exemplo b.1.b)), nos Encargos com a substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta, (b.1.d)), e nos encargos gerais e lucros (b.1.e)), atribui o montante de 0,00€.
Refere na sua proposta que o custo da matéria-prima não alimentar é suportada pelo Marketing, em virtude da publicidade utilizada nos produtos e campanhas E.... Nos encargos com a substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta, refere que é um custo central da E.... O custo da palamenta é suportado pelo benefício que a E... tem junto dos fornecedores na aquisição da palamenta / equipamento anual. Nos encargos gerais e lucros refere que tem como objectivo a inclusão na sua lista de clientes o Município de Vila Nova de Gaia, pelo que esta verba não será imputada ao Município. Ou seja, refere que os custos destas alíneas são suportados por si ou através de publicidade. Mas são custos que a recorrente tem, como refere na fundamentação que faz de cada item. Se tem custos estes têm que ser imputados às diversas rubricas, ainda que de baixo valor, sob pena de falsear a concorrência. Se vai imputar os custos à estrutura, mesmo os resultantes de publicidade, são sempre custos.
O princípio da concorrência (artigo 1º n.º 4 do CCP) tem como corolário o facto de todos os concorrentes deverem reunir as exigência mínimas feitas pela administração para a celebração do contrato, de modo a permitir a comparabilidade das condições oferecidas (Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, in, Contratos Públicos- Direito Administrativo Geral. Tomo III, pág. 75). Está em causa assegurar que todos os concorrentes respondam aos mesmos requisitos do concurso de modo a possibilitar a plena comparação das propostas, a possibilidade de confrontá-las enquanto propostas contratuais a questões idênticas, para saber, objectiva e imparcialmente, a final, qual o melhor concorrente ou a melhor proposta que o mercado ofereceu. Se o recorrente tem determinados custos com o fornecimento de determinados bens e não indica esses custos no local indicado para o efeito está com a sua conduta a subverter o princípio da concorrência, uma vez que está a fazer com que a sua proposta não seja comparável com as outras.
Está com a sua omissão à busca de uma vantagem que não pode ser considerada legítima uma vez que oculta no lugar certo os custos que necessariamente tem com ao fornecimento de determinados bens.
Assim sendo, pelo exposto, tem se de concluir que também não podem proceder estas conclusões da recorrente.
Não procedendo as conclusões não pode proceder o presente recurso, não merecendo a decisão a censura que lhe vem assacada.

3. DECISÃO

Nestes termos, decidem os Juízes deste Tribunal Central, em conferência em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida

Custas pela recorrente

Notifique

Porto, 17 de Junho de 2016
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco