Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02782/11.5BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/21/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:DANO MORTE, ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO; QUEDA DE ÁRVORE;
PRESUNÇÃO DE CULPA; ARTº 493º, Nº 1, DO CÓDIGO CIVIL;
Sumário:1. O tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se assim a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova e à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto.
2. Tendo ficado provado que o sinistro com veículo automóvel resultou da queda de uma árvore de grande porte, adjacente à faixa de rodagem de uma via municipal e não se provando como suficiente e adequado o modo do controlo, vigilância e fiscalização dos serviços municipais nessa via e nas árvores adjacentes, para se aferir da eficácia e eficiência no cumprimento do respetivo dever, a circunstância de se terem verificado durante a tarde e noite ventos que atingiram a intensidade máxima instantânea de 80 a 90 km/hora, não ilide essa presunção de culpa, a que alude o artigo 493º, nº 1, do Código Civil.
Para se considerar ilidida a presunção necessário se tornava alegar e provar o modo, profundidade e adequação desse controlo, vigilância e fiscalização para se aferir da eficácia e eficiência no cumprimento do respetivo dever, bem como para desvalorizar a circunstância de não ter sido detetado pelos serviços qualquer motivo a justificar a sua intervenção.
3 - A fixação da indemnização referente à perda da vida, bem como a respeitante aos danos não patrimoniais próprios dos Autores, deve ser feita com recurso à equidade, mas com consideração dos critérios constantes do artº 494º do Cód. Civil, relevando a gravidade do dano causado, o grau de culpa do agente, a situação económica deste e dos lesados e as demais circunstâncias do caso, apontando estes fatores, no seu conjunto, para um duplo objetivo: o da reparação dos danos causados e o da sanção ou reprovação do agente. Tal indemnização deve ser adequada e não meramente simbólica, não se pautando por critérios miserabilistas.
5 - O julgador, para a decisão a proferir no que respeita à valoração pecuniária dos danos não patrimoniais, em cumprimento do normativo legal que o manda julgar de harmonia com a equidade, deverá atender aos fatores expressamente referidos na lei e, bem assim, a outras circunstâncias que emergem da factualidade provada. Tudo com o objetivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar os lesados pelos danos não patrimoniais que sofreu.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:JBL, MFBR e JJBR
Recorrido 1:Município do Porto
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I Relatório
JBL, MFBR e JJBR, devidamente identificados nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada contra o Município do Porto, na qual peticionaram a atribuição de uma indemnização global de 160.000€ (90.000€ + 35.000€ + 35.000€), em resultado da queda de árvore na via pública que determinou a morte do seu marido (1ª Recorrente) e pai (Restantes Recorrentes), inconformados com a Sentença proferida em 26 de agosto de 2015, no TAF do Porto, na qual a ação foi julgada “improcedente”, vieram interpor recurso jurisdicional da mesma, em 8 de outubro de 2015 (Cfr. fls. 513v a 540 Procº físico).

Formulam os aqui Recorrentes nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões (Cfr. fls. 535v a 540 Procº físico).

“1 – O tribunal a quo incorreu em erro na apreciação da prova.

2 – A Recorrente considera incorretamente julgados os itens 7, 21, 22, 23, 24, 25 e 26 dos factos provados, bem como o constante nas alíneas a) e c) dos factos não provados.

3 – O tribunal a quo motivou da seguinte forma a sua convicção no que respeita àquela factualidade:
a) Item 7 dos factos provados - no depoimento de CMSAS e no documento de fl. 90.
b) Itens 21, 22, 23 e 26 – no depoimento de CMSAS e de CFFE, em conjunto com os documentos de fl. 80, 81 e 83 e ss.
c) Item 24 – na certidão de fl. 94.
d) Item 25 – no documento de fl. 408 a 410
e) As alíneas a), e c) dos factos não provados – por não se ter produzido qualquer prova minimamente credível.

4 – Andou mal o Tribunal a quo ao ter conferido credibilidade ao depoimento de CMSAS e de CFFE e ao não ter atribuído qualquer valoração ao depoimento de AJS e de MOOMLA.

5 – No que respeita ao item 7 dos factos provados o Tribunal deu por provado que: “A árvore em causa tinha 30 metros de altura e tinha uma idade de cerca de 35 anos.”.

6 – Acontece que o documento de fl. 90, datado de 10/11/2003, atribui à árvore n.º 6 a idade de mais ou menos 30 anos.

7 – Assim, se aquela árvore identificada como a n.º 6 for efetivamente aquela que vitimou o malogrado CMR, o que se desconhece, então a árvore tinha cerca de 38 anos e não 35 (ou seja, mais perto dos 40 do que dos 35).

8 – Desse modo, deverá ser alterada a resposta ao item 7.º dos factos provados para uma das seguintes formas:
Hipótese A – “A árvore em causa tinha cerca de 20 metros de altura e uma idade desconhecida”.
Hipótese B – “A árvore em causa tinha cerca de 20 metros de altura e uma idade de cerca de 38 anos”.

9 – Relativamente ao item 24, não consta da matéria provada a referência à cidade do Porto.

10 – Ora, se a convicção da resposta ao item 24 é a certidão de fls. 94, e constando desta a referência à cidade do Porto, impõe-se a alteração da resposta para os termos seguintes:

“Na zona da cidade do Porto, no dia 16 de Fevereiro de 2011 o vento soprou forte (36 a 45 km/h.) a partir da tarde, tendo atingido a intensidade máxima instantânea de 80 a 90 km/hora durante a tarde e noite e ocorreu trovoada.”.

11 – Quanto ao item 25, impõe-se dizer que o documento de fls. 408 a 410 foi impugnado pelos Recorrentes, não tendo sido produzida qualquer prova relativamente ao seu teor.

12 – Independentemente disso, do mesmo resulta a referência a 14 (catorze) ocorrências no dia 16/02/2011, sem qualquer esclarecimento sobre o tipo de ocorrência, as suas causas, a hora e local dos pretensos incidentes.

13 – Ou seja, nada do documento se colhe que nos permita afirmar que essas ocorrências se prendem com árvores.

14 – Pode ter-se tratado de queda de vidros, painéis publicitários ou outros objetos metálicos ou de madeira ou vidro. Pode ter-se tratado de intervenções na sequência de acidentes de viação, para remoção de objetos ou de combustível ou óleo. Podem ter sido ocorrências na cidade do Porto ou fora desta circunscrição territorial.

15 – É, assim, gratuita e temerária a afirmação feita na resposta ao item 25 que as ocorrências estão relacionadas com árvores.

16 – Sendo assim, deve ser alterada a resposta ao item 25 a qual deve passar a ser a seguinte:

“No dia 16 de Fevereiro de 2011 o Batalhão de Sapadores do Porto registou 14 ocorrências, não concretamente apuradas.”.

17 – No que concerne às respostas aos itens 21, 22, 23 e 26 dos factos provados, o tribunal, como vimos, alicerçou a sua convicção no depoimento das testemunhas CMSAS e CFFE, nomeadamente na primeira a qual alegadamente terá prestado o depoimento de forma séria, precisa, coerente, com conhecimentos direto e seguro dos factos.

18 – Pelo oposto, a testemunha AJS foi qualificada como limitando-se a tecer suposições, não revelando um conhecimento sério e credível, ao passo que MOOMLA foi interpretada como tendo prestado um depoimento vago e impreciso, não revelando um conhecimento sério e credível dos factos em discussão.

19 – A Recorrente não pode estar mais em desacordo, o que procurará demonstrar mediante a reapreciação da seguinte prova testemunhal:
a) CMSAS disponível no sistema integrado de gravação (início 00:07:21 a 01:26:40, parte III), prestado na audiência de julgamento de 3/06/2015;
b) CFFE, disponível no sistema integrado de gravação (início 01:27:06 a 02:12:55 parte III), prestado na audiência de julgamento de 3/06/2015;
c) AJS, disponível no sistema integrado de gravação (início 00:40:56 a 01:16:40, parte II), prestado na audiência de julgamento de 3/06/2015;
d) MOOMLA, disponível no sistema integrado de gravação (início 00:00:01 a 00:17:51) prestado na audiência de julgamento de 8/07/2015.

20 – Da audição da testemunha CMSAS colhe-se em vários momentos que a mesma não foi nem imparcial, nem coerente, nem credível:

a) Afirma que na cidade do Porto caíram 40 árvores no dia do sinistro, o que é absolutamente falso, pois de acordo com a informação do BSB de fls. 408 a 410 aconteceram apenas 14 (catorze) ocorrências, desconhecendo-se em absoluto se as mesmas se relacionam com árvores.

b) Apesar de ter afirmado que não se encontrava no local do sinistro, à hora em que este se deu, não se coibiu de dizer que nesse período caíram imensas árvores na cidade, o que já vimos é falso.

c) Apesar de reconhecer que o habitat natural dos choupos é junto de margens de linhas de água, afirma não ter dúvidas de que o jardim se encontrava saturado de água, o que no seu entender terá provocado o desprendimento do sistema radicular da árvore. Chegou ao cúmulo de dizer que naquele local caíram 30 ml. de precipitação em 30 minutos, secundando-se na certidão meteorológica junta aos autos. Ora, isso é falso pois o que a certidão nos diz é que no dia 16/02/2011 (todo o dia) a quantidade de precipitação tenha atingido valores da ordem dos 30 ml. e que de madrugada (do dia 15 para o dia 16) pode ter atingido valores de 6 a 8 ml. em 10 minutos. De resto reconheceu ainda não ter realizado qualquer exame para determinação do nível de saturação do solo, devendo-se ainda levar em conta que foi dado por provado (e bem) que o piso da estrada estava seco na altura do sinistro. O que tudo desabona a referida testemunha.

d) Perguntada sobre a longevidade do choupo, disse que em contexto urbano vive 30, 40, 50 ou 60 anos por causa das condicionantes citadinas. Nessa altura, sendo confrontada com o facto de o choupo em causa ter 38 anos, percebeu que o que antes tinha dito prejudicava a tese do R. Município e emendou atabalhoadamente a mão, dizendo que afinal vivem 50, 60 anos.

e) Perguntada do porquê de só aquela árvore ter caído, referiu que a mesma se encontrava desprotegida (de outras árvores e edifícios). Acontece que esta alegação é falsa, pois foi contrariada pela outra testemunha do Município CA.. e também pela testemunha MOOMLA, que afirmaram que a praça/parque onde se encontrava implantada a árvore tinha outras árvores a toda a largura, bem como no seu interior, sendo que a toda a volta se encontravam edifícios.

21 – Em todo o caso, a testemunha CMSAS assumiu factualidade deveras interessante para o presente recurso:
a) Reconheceu que nunca tinha estado em contacto com a árvore, ou seja que nunca a tinha visualizado.
b) Reconheceu que o choupo é uma madeira branda e leve, com menor flexibilidade.
c) Que os BSB chegados ao local cortaram a árvore e a raiz e a conduziram para um vazadouro na Lipor, onde foi triturada e reciclada.
d) Admitiu não ter feito uma análise à quantidade de água infiltrada no solo, bem como não ter realizado qualquer exame laboratorial à árvore, mesmo depois da sua queda e mesmo depois desta ter causado a morte de uma pessoa.
e) Assumiu que a árvore em causa nunca teve qualquer intervenção.
f) Declarou que consta do manual de procedimentos do R. Município fazer-se uma análise visual às árvores, sendo certo que desconhece se os funcionários camarários o fazem e em que termos, sendo pertinente a este respeito dizer que o R. Município apenas juntou aos autos fichas de intervenção da zona do sinistro correspondentes à semana 35 do ano 2010 e à semana 6 do ano de 2011.

22 – Assim, a Sra. Juiz a quo foi lamentavelmente seduzida pela categoria profissional ostentada pela testemunha CMSAS e confiou a esta (e mal) a sorte da presente ação, o que nem se compreende pois a mesma é engenheira agrícola e não florestal.

23 – Malogradamente, a Sra. Juiz não vislumbrou a falta de imparcialidade, nem as incoerências da testemunha (descritas em 20) e não atribuiu qualquer relevância ao facto de essa testemunha nunca ter visualizado a árvore, nunca ter estado no local na hora do sinistro e não ter realizado testes à árvore e ao nível de saturação do solo (descritos em 21).

24 – Do depoimento da testemunha CFFE colhe-se algumas das falsidades ditas pela testemunha CMSAS, quais sejam que caíram muitas árvores na altura e que a raiz se soltou.

25 – Relativamente à raiz, impõe-se referir que de todos os elementos fotográficos juntos aos autos, particularmente o documento n.º 3 da p.i. e as fotografias n.º 3 e 7, juntas na audiência de julgamento de 3/06/2015, não se colhe que as raízes se encontravam levantadas.

26 – Em todo o caso, a testemunha CA.. reconheceu que:
a) Foi colocado na zona do acidente no decurso do mês de Janeiro de 2011 e só tinha realizado uma intervenção naquele parque.
b) Perguntado se em todas as visitas observa todas as árvores, reconheceu que não.
c) Desconhece se a equipa de jardinagem daquela zona executava anteriormente o trabalho de visualização das árvores bem como desconhece como o faziam.
d) Reconheceu que quando chegou ao local não chovia.
e) Reconheceu que no interior e no perímetro exterior do parque existiam choupos.
f) Reconheceu que o choupo é uma madeira macia, com cerne mais mole.

27 – O depoimento de MOOMLA não deixou de ser objetivo nos pontos seguintes:
a) Declarou a existência de árvores à volta da praça e no interior do jardim, evidenciando a mentira da testemunha CMSAS.
b) Disse que na altura do sinistro, aproximou-se do local e disse a outros presentes que tinha feito telefonemas à Câmara a alertar para o perigo das árvores, o que é confirmado pela testemunha AJS.
c) Declarou ter ligado por duas a três vezes para um departamento da Câmara, dizendo inicialmente que para se queixar do estado das árvores e depois dizendo para se queixar do estado do jardim (o que, mesmo assim, não preclude que se estivesse a referir também ao estado das árvores).
d) Negou que os funcionários camarários fossem tratar do jardim de 15 em 15 dias, afirmando que na altura do sinistro estava mal tratado.
28 – A testemunha AJS, entendida pelo tribunal recorrido como tendo tecido suposições e não revelando um conhecimento sério e credível, disse que:
a) A árvore estava oca, que o tronco tinha pouca madeira, que parecia existir um buraco, o que tudo é corroborado pelas fotografias 2, 3 e 7 juntas na audiência de julgamento de 3/06/2015.
b) Que uma senhora na altura do sinistro disse aos presentes que a manutenção das árvores não era feita desde 2003 e que estava farta de avisar, o que como vimos resulta também do depoimento da testemunha MOOMLA.

29 – Ou seja, para o tribunal a quo mau grado a evidência das fotografias referidas em 28) não permitiu conferir credibilidade ao depoimento da testemunha AJS, o que é no mínimo estranho.

30 – Deste modo, impõe-se a alteração à resposta dada aos itens 21, 22, 23 e 26 para os termos seguintes:
- Item 21, 22 e 23 – não provados
- Item 26 – “A árvore fraturou a 1.50 mt., tombando para a rua”.
31 – No que respeita aos itens a) e c) da matéria não provada, dever-se-á alterar a resposta para os termos seguinte:
a) A árvore apresentava o cerne ou veio seco e oco.
b) Uma moradora do local contactou telefonicamente, por duas a três vezes, um departamento do Município do Porto, em datas não concretamente apuradas mas anteriores à data do sinistro, a chamar a atenção para o mau estado do parque.

32 – Em face das alterações à resposta à matéria de facto, resta concluir que os RR. não lograram ilidir a presunção de culpa com que se encontravam onerados.

33 – O R. Município nunca realizou exames laboratoriais à árvore, nem recorreu a técnicas adequadas, como o martelo de borracha (cujo teste permite a avaliação do som produzido por várias pancadas secas em diferentes posições dos ramos, tronco e colo, tendo em vista a determinação de potenciais defeitos internos), ou resistógrafo F400-S, (o qual permite quantificar a gravidade de um determinado defeito, através da resistência imposta pelo lenho à entrada de uma agulha a uma velocidade constante, que é regulada em função da espécie arbórea), nem sequer demonstrou como lhe competia que efetivamente efetuava com regularidade e com rigor a avaliação visual da árvore.

34 – Como se lê no Ac. do STA, de 27/05/2009 (proc. n.º 566/08), in www.dgsi.pt, “... a análise visual é marcadamente insuficiente para poder afirmar-se se a árvore está ou não de boa saúde, pois, para tanto seria necessário proceder a exames laboratoriais específicos, tal como o reconheceu um dos técnicos responsáveis pela manutenção do parque ouvido no tribunal.”.

35 – De acordo com esse aresto: “ Na realidade, a exemplo do já decidido no STA, a prova do registo de período de chuva, por vezes intensa, e vento moderado a forte com rajadas é insuficiente para atribuir a queda da árvore a um caso de força maior ou fortuito, em sobreposição dos deveres da fiscalização a que a administração, está adstrita (cfr. Ac. STA 11/03 de 15.10.2003). Aliás, as condições climatéricas registadas de chuva intensa e vento forte são plenamente normais e previsíveis, no Inverno, o que exigia por parte da Administração uma atenção redobrada, ou melhor, uma atuação adequada às adversidades previsíveis do tempo invernoso, eventualmente, até o corte pontual do trânsito nas artérias de maior densidade florestal do parque, face ao comunicado do Serviço Nacional de Proteção Civil, que entrou em alerta amarelo a partir das 14 horas (tendo o acidente ocorrido sete horas depois), e o comunicado da previsibilidade da queda de árvores”.

36 – Ainda com relevo para a boa decisão da causa, leva-se em conta o Ac. do TCAN, de 15/10/2009 (proc. 2090/06.3BEPRT).

37 – Termos em que o tribunal a quo incorreu em erro na apreciação da prova e violou as regras legais sobre a presunção de culpa, particularmente a Lei n.º 67/2007, de 31/12.

38 – Pelo que deverá ser revogada a sentença, a qual deve ser substituída por outra que condene os RR. no pedido.

Termos em que na reapreciação da prova deverá ser alterada a resposta à matéria de facto nos termos propostos, e, consequentemente, ser revogada a sentença, condenando-se os RR. no pedido, Assim se fazendo, SÃ E INTEIRA JUSTIÇA”

O Recurso Jurisdicional foi admitido por Despacho de 13 de Outubro de 2015 (Cfr. fls. 545 Procº físico).

O interveniente Instituto da Segurança Social IP veio em 6 de Novembro de 2015 afirmar, designadamente, “que adere ao recurso interposto pelos Autores, fazendo suas as alegações apresentadas nos presentes Autos” (Cfr. Fls. 553 Procº físico).

O Recorrido/Município, veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 4 de Dezembro de 2015, nas quais concluiu (Cfr. Fls. 561 a 473 Procº físico):

“A. A douta decisão judicial proferida pelo tribunal a quo e ora colocada em crise pelos Recorrentes é, a nosso ver, justa, bem fundamentada e inatacável, demonstrando uma correta análise factual da prova produzida e uma aplicação exemplar das normas jurídicas, pelo que deverá ser proferido Acórdão que confirme a sentença.

B. Com a presente ação administrativa comum, peticionam os Recorrentes a condenação do Recorrido no pagamento da quantia global de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros), sendo €90.000,00 (noventa euros) para a primeira Recorrente e €35.000,00 (trinta e cinco mil euros) para o segundo e para o terceiro Recorrentes, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais causados pela alegada conduta omissa ilícita do Recorrido, a que deverão ser acrescidos juros de mora legais desde a citação até integral e efetivo pagamento.

C. É apodítico que a queda de uma árvore, no dia 16/02/2011, na Rua Eng.º EC, nesta cidade do Porto, causou infelizmente a morte do cidadão CMR, marido da primeira Recorrente e pai dos outros dois Recorrentes.

D. O cerne da questão neste pleito é o de saber se o Recorrido, atentas as atribuições e competências que lhe estão legalmente cometidas, cumpriu com todos os seus deveres em relação à referida árvore ou se ocorreu alguma conduta omissa ou defeituosa que permita fundamentar com substância a pretensão indemnizatória dos Recorrentes.

E. Sustentam os Recorrentes que a sentença proferida pelo tribunal a quo, para além de não ter julgado corretamente os itens 7, 21, 22, 23, 24, 25 e 26 dos factos provados, entendeu, erradamente do seu ponto de vista, que o Recorrido tinha logrado ilidir a presunção legal de culpa, fazendo por conseguinte uma errada interpretação das normas constantes da Lei nº 67/2007, de 1 de Dezembro. Sem razão!

F. No que concerne ao recurso da matéria de facto, importa desde logo sublinhar que o recurso se atém a uma exagerada e hiperbólica consideração e valoração da prova testemunhal produzida pelas testemunhas arroladas pelos Recorrentes e a uma conveniente desvalorização e até deturpação (por via da utilização de expressões descontextualizadas) dos depoimentos sérios, isentos, imparciais e tecnicamente competentes produzidos pelas testemunhas Engª CMSAS e pelo Sr. CFFE.

G. A sentença recorrida fez uma correta interpretação e valoração da prova testemunhal, conjugando-a com os documentos juntos aos autos e com as regras da experiência comum, brotando desse conjunto uma decisão sem mácula quanto aos factos dados como provados e como não provados.

H. Ao contrário do que vem propugnado pelos Recorrentes, os depoimentos dos funcionários do Recorrido não são nem nunca serão condicionados pelo seu vínculo laboral. Pelo contrário, neste caso em particular, o depoimento de dois funcionários do Recorrido, suportado por documentos que confirmam as suas palavras, foi esclarecedor para que o tribunal entendesse de forma clara o modus operandi desta área de atuação municipal.

I. A Engª. CMSAS explicou como se processavam os trabalhos de manutenção e de monitorização do património arbóreo na cidade do Porto.

J. Decorre do depoimento da referida testemunha que estava elaborado um plano de cumprimento quinzenal, com vista à limpeza e análise do arvoredo, de modo a aferir se alguma árvore demonstrava sinais de alerta e, em caso positivo, é elaborada uma ficha de alerta a fim de fazer o respetivo diagnóstico e ulterior atuação – cf. fls. 83, 87, 88 e 90 dos autos.

K. Esta vigilância quinzenal foi aliás confirmada pelo Sr. CFFE, encarregado da Divisão Municipal de Jardins, que era um funcionários do Recorrido que realizava estes trabalhos no terreno e que confirmou e explicou que observava as árvores e em caso de ser detetada alguma fragilidade, de imediato era preenchida uma ficha de alerta para posterior intervenção.

L. Estes dois depoimentos são essenciais para questão de direito suscitada pelos Recorrente, porquanto o teor dos mesmos ilide avassaladoramente a presunção legal de culpa que recai sobre o Recorrido nestes casos, caindo assim por terra os argumentos dos Recorrentes quanto à aplicação das normas jurídicas.

M. Acresce que, da informação com a referência I/44451/11/CMP, de 18/03/2011, elaborada pela Engª CMSAS – cfr. documento nº1 junto com a Contestação - se pode extrair que a última intervenção na área verde em questão ocorreu em 09/02/2011, isto é, 7 dias antes do sinistro em apreço.

N. E que no dia 09/02/2011, da avaliação visual das árvores daquela área, não foram detetados sinais exteriores de debilidade.

O. Daí não ter sido elaborada nenhuma ficha de alerta, pois não foi detetado qualquer tipo de sintoma ou fragilidade da árvore em causa. Caso tivesse sido detetada qualquer indício de debilidade fitossanitária, como acima se referiu, teria sido de imediato remetida para análise de uma Engenheira Florestal.

P. Resulta em abundância da prova testemunhal e documental produzida que os procedimentos dos serviços municipais, no que concerne ao estado das árvores que fazem parte do seu património, funcionam com grande eficácia e estão muito bem articulados.

Q. A título de exemplo, recorde-se que a ficha semanal de trabalhos efetuados nos dias 01/09/2010 e 02/09/2010 – vide anexo 3 do documento nº 1 junto com a Contestação – vem comprovar uma intervenção de podas no arvoredo existente na área verde em causa.

R. Resulta igualmente da prova produzida que no dia 16/02/2011, entre outros fatores, o vento soprou forte a partir da tarde, tendo atingido a intensidade máxima de 80 a 90 Km/hora durante a tarde e noite e ocorreu trovoada - cfr. documento nº 2 junto com a Contestação.

S. Foi um dia de tempestade e com vento forte que provocou inúmeras ocorrências de quedas de árvores em situações similares de gestão municipal e privada - vide documento nº 1 junto com a Contestação e o depoimento da Engª CMSAS.

T. A este propósito, e salvo melhor opinião, não e importante saber com rigor se foram 40 ou 20 ou 30 ocorrências na cidade do Porto que implicaram quedas de árvores naquele fatídico dia, ma antes que elas efetivamente existiram e que se ficaram a dever a uma causa de força maior: condições climatéricas adversas.

U. Tal é aliás a conclusão de vários processos judiciais onde esta a mesma questão foi discutida, para efeitos e com causas de pedir distintos…

V. No próprio registo de ocorrências, registada como o nº 18842/11/CMP, de 18/02/2011, subscrita pelo Encarregado CFFE, é referido que “derivado ao temporal que se fazia sentir naquele dia por volta das 14:15 caiu uma árvore (choupo) de grande porte para a via pública. O choupo em questão deveria ter uns 30 anos mas apresentava-se em boas condições sanitárias mas com vento forte que se fazia sentir naquele momento o choupo foi arrancado pela raiz causando também estragos materiais e pessoais (…)”.

W. Numa palavra: a queda da árvore sub judice não se ficou a dever a nenhum omissão do Recorrido, mas antes a fatores externos que caem fora do seu controlo, como é o caso das condições climatéricas.

X. Pelo exposto, a decisão judicial do tribunal a quo não merece qualquer reparo, devendo ser confirmada por V. Exas.

Termos em que, Confirmando o sentido da decisão judicial recorrida, farão V. Exas. a Costumeira e Sã JUSTIÇA.”

A Interveniente/Recorrida F... – Companhia de Seguros SA, não veio a apresentar contra-alegações de Recurso.

O Ministério Público junto deste Tribunal, tendo sido notificado em 20 de Janeiro de 2016 (Cfr. fls. 593 Procº físico), nada veio dizer, requerer ou promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
As principais questões a apreciar resultam predominantemente do invocado “erro na apreciação da prova” e “violação das regras legais sobre a presunção de culpa”, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto

O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade, como provada e não provada, a qual aqui se reproduz:

“1) No dia 16 de fevereiro de 2011, pelas 14h15m, CMR conduzia o veículo ligeiro de mercadorias de marca R..., modelo Express, com a matrícula **-**-IF pela Rua Engenheiro EC no sentido Norte-Sul na respetiva hemifaixa de rodagem da direita.

2) Parou momentaneamente no entroncamento com a Rua DF, para onde pretendia mudar de direção à esquerda.

3) Nesse momento, em que não chovia, o veículo foi atingido por uma árvore de grande porte, que se encontrava plantada num jardim contíguo, adjacente ao entroncamento.

4) A faixa de rodagem no local tem uma largura de cerca de 5 metros e comporta duas vias de trânsito, uma em cada sentido.

5) O piso era empedrado e encontrava-se seco e em estado regular de conservação.

6) Como consequência do abatimento da árvore sobre o **-**-IF, esta atingiu o CMR, o que lhe provocou lesões corporais que lhe causaram a morte.

7) A árvore em causa tinha 20 metros de altura e tinha uma idade de cerca de 35 anos

8) Junto à árvore existiam duas grelhas em betão armado.

9) À data de 16 de fevereiro de 2011, o CMR exercia atividade de sócio-gerente da sociedade comercial M... – Máquinas e Equipamentos, Lda. auferindo uma remuneração liquida o valor de €997,60.

10) Auferia ainda uma pensão mensal no valor de €918,95.

11) O CMR nasceu em 16 de setembro de 1939.

12) Era casado com a A. JL e pai dos AA. MFBR e JJR.

13) Em consequência do acidente, o CMR sofreu dores físicas e aflição atrozes e angustia pela morte que previa vir a suceder e pela consequente separação dos seus entes queridos.

14) À data de 16.02.2011, o CMR possuía boa saúde, era trabalhador, pessoa alegre, estremado marido e pai, sendo de esperar que vivesse e trabalhasse ainda vários anos.

15) Os AA. sofreram, sofrem e sofrerão profunda dor e angústia pela perda de CMR.

16) O CMR era casado há quase cinquenta anos com a A. JBL, sempre tendo dado e recebido muito amor e afeto.

17) O mesmo sucedendo com os demais AA, seus filhos.

18) Os AA, especialmente a A. JBL, perderam muita da alegria de viver, continuando angustiados e sobressaltados pela ausência do CMR.

19) A A. JBL vivia sozinha com o CMR.

20) A última intervenção da Direção Municipal de Ambiente e Serviços Urbanos/Departamento Municipal de Espaços Verdes e Higiene Pública/Divisão Municipal de Jardins na área verde em questão tinha ocorrido no dia 9 de fevereiro de 2011, tendo-se procedido à limpeza da área e ao corte do relvado.

21) Nessa data foi avaliado visualmente o estado da árvore não tendo sido detetado qualquer sintoma de fragilidade.

22) Em setembro de 2010 havia sido efetuada poda no arvoredo existente no local.

23) A queda da árvore deveu-se a uma ação conjunta de vários fatores: a) as características do lenho desta espécie, tendencialmente brando; b) as vicissitudes aliadas ao desenvolvimento destas árvores refletidas pela grande quantidade de fatores limitantes ao seu desenvolvimento, inevitavelmente associado ao espaço urbano, suas utilizações e vivências; c) a verificação de condições climatéricas difíceis (vento e chuva forte).

24) No dia 16 de fevereiro de 2011 o vento soprou forte (36 a 45 km/h) a partir da tarde, tendo atingido a intensidade máxima instantânea de 80 a 90 km/hora durante a tarde e noite e ocorreu trovoada.

25) No dia 16 de fevereiro de 2011, na cidade do Porto, foi solicitada a intervenção do Batalhão de Sapadores Bombeiros do Porto em 14 ocorrências relativas a sinistros relacionados com árvores.

26) A raiz da árvore em causa tombou e, depois, uma parte da árvore, fraturou.

27) O Réu, mediante contrato de seguro, titulado pela apólice n.º RC820… transferiu a responsabilidade civil para a companhia de Seguros I..B..., Companhia de Seguros, SA que foi incorporada na atualmente denominada F...-Companhia de Seguros, SA.

28) A responsabilidade emergente de acidentes de trabalho ocorrido com o CMR ao serviço da M... – Máquinas e Equipamentos, Lda., encontrava-se transferida para a Mf... Seguros Gerais, SA, através de contrato de seguro titulado pela apólice n.º 1600…/3.

29) Correu termos no Tribunal de Trabalho de Gondomar o processo n.º 87/11.0TTGDM (ação emergente de acidente de trabalho) intentado pela A. JL e pelo Instituto de Segurança Social, IP contra a Mf...-Seguros Gerais, SA e a M…- Máquinas e Equipamentos, Lda.

30) Tal ação foi julgada improcedente por sentença de 09.12.2013, que foi confirmada por acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 30.06.2014, tendo transitado em julgado, decisões que constam de fls. 368 a 387 do suporte físico deste processo e que aqui se consideram reproduzidas.

31) Os AA. intentaram uma ação cível contra a Mf...-Seguros Gerais, SA com base na responsabilidade civil relativa à circulação do veículo automóvel .

32) Tal ação coreu termos no extinto 3.º juízo cível do Porto sob o n.º 776/12.2TBGDM tendo sido julgada parcialmente procedente e portanto, tendo sido a R. condenada a pagar-lhes a quantia de €13.000 nos termos constantes de fls 418 a 429 cujo teor se considera reproduzido.

33) A A. JL, na qualidade de cabeça de casal, recebeu da Mf... a quantia de €13.000,00 acrescida de juros legais, conforme determinado no âmbito do processo referido em 32).
34) O Instituto da Segurança Social, IP pagou à A. JL o subsídio de morte no valor de € 7.445,70.

35) O Instituto da Segurança Social, IP deferiu ainda o pagamento de uma pensão de sobrevivência à A. JL no valor mensal de €551,37, tendo iniciado o pagamento em março de 2011.

Não se provaram, os seguintes factos:
a) A árvore em causa apresentava evidentes e notórios sinais de degradação.
b) As grelhas referidas em 9 contribuíram para a acelerada degradação da árvore, nomeadamente ao nível das raízes.
c) O R. encontrava-se avisada por moradores da zona para o perigo da referida árvore sem que, contudo, tivesse intervindo em tempo útil.
d) No dia 16 de fevereiro de 2011, na cidade do Porto, caíram cerca de 40 árvores.
e) Nesse dia a zona da cidade do Porto em que o acidente ocorreu e todo o país em geral esteve debaixo de uma intempérie que foi objeto de alertas dos serviços de proteção civil e de notícia de primeira página em todos os órgãos de comunicação social.”

IV – Do Direito
Importa agora analisar e decidir o suscitado.
Desde logo importa sublinhar que tendo-se o acidente objeto da presente Ação verificado em 16 de Fevereiro de 2011, o diploma relativamente à Responsabilidade Civil aplicável será a Lei nº 67/2007, no qual assenta a decisão recorrida.

Diz o art.º 7º deste diploma, sob a epígrafe “Responsabilidade exclusiva do Estado e demais pessoas coletivas de direito público”, que:
“1 - O Estado e as demais pessoas coletivas de direito público são exclusivamente responsáveis pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas, cometidas com culpa leve, pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício.
(...)
3 - O Estado e as demais pessoas coletivas de direito público são ainda responsáveis quando os danos não tenham resultado do comportamento concreto de um titular de órgão, funcionário ou agente determinado, ou não seja possível provar a autoria pessoal da ação ou omissão, mas devam ser atribuídos a um funcionamento anormal do serviço.
4 - Existe funcionamento anormal do serviço quando, atendendo às circunstâncias e a padrões médios de resultado, fosse razoavelmente exigível ao serviço uma atuação suscetível de evitar os danos produzidos.
(...)”

Ainda na pendência do anterior regime, no âmbito do regime do DL nº 48.051, o colendo STA entendia que a responsabilidade civil da Administração por atos de gestão pública assentava em pressupostos idênticos aos enunciados no artigo 483.º do Código Civil:
O facto
A ilicitude
A culpa
O dano
O nexo de causalidade entre o facto e dano

São assim pressupostos deste tipo de responsabilidade civil:
a) o facto, comportamento ativo ou omissivo voluntário;
b) a ilicitude, traduzida na ofensa de direitos de terceiros ou disposições legais destinadas a proteger interesses alheios;
c) a culpa, nexo de imputação ético - jurídica do facto ao agente ou juízo de censura pela falta de diligência exigida de um homem médio ou de um funcionário ou agente típico;
d) a existência de um dano, ou seja, a lesão de ordem patrimonial ou moral, esta quando relevante;
e) o nexo de causalidade entre a conduta e o dano, segundo a teoria da causalidade adequada (cf. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27.01.1987, de 12.12.1989 e de 29.01.1991, in Ac. Dout. n.º 311, p. 1384, n.º 363, p. 323 e n.º 359, p. 1231).

Esta responsabilidade corresponde pois, no essencial, ao conceito civilístico de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos que tem consagração legal no artigo 483º, nº1, do Código Civil (acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 10.10.2000, recurso n.º 40576, de 12.12.2002, recurso n.º 1226/02 e de 06.11.2002, recurso n.º 1311/02).

Efetivamente, a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas por atos ilícitos e culposos, pressupõe a existência de um facto ilícito, imputável a um órgão ou agente e a existência de danos que tenham resultado como consequência direta e necessária daquele.

No atual regime, estatui ainda o art.º 9º da Lei nº 67/2007, relativamente à “ilicitude”:
“1 - Consideram-se ilícitas as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objetivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.
2 - Também existe ilicitude quando a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos resulte do funcionamento anormal do serviço, segundo o disposto no n.º 3 do artigo 7.º”

Refira-se desde já que se acompanhará no presente aresto muito do invocado e fundamentado no recente acórdão deste TCAN nº 219/08BEMDL de 22-10-2015, que por sua vez tem suporte em inúmera jurisprudência do Colendo STA, que cita.

As questões aqui a decidir resumem-se a saber:
1ª – Se ocorreu erro na apreciação da prova;
2ª – Se existe presunção de culpa que onere o Município;
3ª - Se o Município ilidiu ou não essa presunção;
4ª – Quais os danos a indemnizar e o valor da indemnização.

Do Erro na apreciação da prova
Invocam os Recorrentes desenvolvidamente que ocorreu erro na apreciação da prova, com indicação de diversos factos que terão sido indevidamente julgados pelo tribunal a quo.

Refira-se desde já que a prova produzida e fixada nos parece suficiente por, como lhe competia, se ter limitado a fixar a factualidade demonstrada, sem entrar em considerações de caráter conclusivo ou opinativo, permitindo até, como se verá, que se tirem ilações e conclusões divergentes das adotadas, sem beliscar a prova produzida.

Efetivamente, o tribunal não pode substituir-se às partes no seu ónus de alegar e provar os factos que interessam a cada uma, porquanto o dever de investigação que a lei processual comete ao juiz, apenas abarca a matéria de facto trazida ao processo os factos notórios ou de conhecimento geral (cf. artigos 5º, n.ºs 2 e 3, e 412º do Código de Processo Civil 2013 - artigos 264º, 514º e 664.º, 2.ª parte, do Código de Processo Civil 1995).
Na realidade, não obstante a tentativa dos Recorrentes em destacar e evidenciar as declarações prestadas por algumas testemunhas, por forma a procurar validar o seu ponto de vista, o que é facto é que, em qualquer caso, não se mostra censurável a factualidade fixada.

Em qualquer caso, sempre se dirá que, pretendendo os recorrentes que o tribunal ad quem procedesse à alteração da decisão do tribunal de 1 ª instância sobre a matéria de facto, sempre teriam de indicar, além dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, quais os concretos meios de prova que impunham decisão divergente da adotada, sendo que as questões suscitadas se mostrariam predominantemente redundantes, sem acrescentar nada de substancial à factualidade provada, dando-lhe porventura apenas uma, não necessária, acrescida enfase (cfr. artº 685º-B, nº1, do CPC então aplicável).

Como se diz no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.09.2011, no processo 1079/07.0 TVPRT.P1.S1:
“A lei impõe ao recorrente que indique (concretamente) os depoimentos em que se funda, não sendo suficiente indicar um conjunto de testemunhas que depuseram a determinado facto (mesmo que venham devidamente identificadas pelos nomes e outras referências), para depois se concluir, sem mais, que ouvidos os seus depoimentos se deveria decidir diferentemente. Importa alegar o porquê da discordância, isto é, em que é tais depoimentos contrariam a conclusão factual do tribunal recorrido, por outras palavras, importa apontar a divergência concreta entre o decidido e o que consta do depoimento ou parte dele.” E acrescenta “(…) trata-se da imposição de um ónus perfeitamente lógico e necessário, em primeiro lugar, porque ninguém está em melhor posição do que o recorrente para indicar os concretos pontos da sua discordância relativamente ao apuramento da matéria de facto indicando os concretos meios de prova constantes do registo sonoro que, em seu entendimento, fundamentam tal discordância e qual a concreta divergência detetada. Em segundo lugar, para permitir que a parte contrária conheça os argumentos concretos e devidamente delimitados do impugnante, para os poder contrariar cabalmente, assim se garantindo o devido cumprimento do princípio do contraditório”

Determinava o então aplicável artigo 712º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, no seu n.º 1, por força do disposto no artigo 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que:
“A decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685.º-B, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insuscetível de ser destruída por quaisquer outras provas;
(…)”

Na interpretação deste preceito tem sido pacífico o entendimento segundo o qual em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida (neste sentido os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.10.05, processo n.º 394/05, de 19.11.2008, processo n.º 601/07, de 02.06.2010, processo n.º 0161/10 e de 21.09.2010, processo n.º 01010/09; e acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 06.05.2010, processo n.º 00205/07BEPNF, e de 14.09.2012, processo n.º 00849/05BEVIS).

Isto porque o Tribunal de recurso está privado da oralidade e da imediação que determinaram a decisão de primeira instância: a gravação da prova, por sua natureza, não fornece todos os elementos que foram diretamente percecionados por quem julgou em primeira instância e que ajuda na formação da convicção sobre a credibilidade do testemunho.

Como defende Antunes Varela, no Manual de Processo Civil, 2ª edição, página 657:
“Esse contacto direto, imediato, principalmente entre o juiz e a testemunha, permite ao responsável pelo julgamento captar uma série valiosa de elementos (através do que pode perguntar, observar e depreender do depoimento, da pessoa e das reações do inquirido) sobre a realidade dos factos que a mera leitura do relato escrito do depoimento não pode facultar”.

Por outro lado, o respeito pela livre apreciação da prova por parte do tribunal de primeira instância, impõe um especial cuidado no uso dos seus poderes de reapreciação da decisão de facto, e reservar as alterações da mesma para os casos em que ela se apresente como arbitrária, por não estar racionalmente fundada, ou em que seja seguro, de acordo com as regras da lógica ou da experiência comum, que a decisão não é razoável.

A prova fixada nos autos não impõe, no entanto, respostas diversas das que foram dadas pelo Tribunal a quo, não se evidenciando qualquer erro grosseiro na apreciação da prova.

Não existiu assim, face ao exposto, qualquer erro no julgamento da matéria de facto, menos ainda evidente e grosseiro, que impusesse a sua alteração.

Da presunção de Culpa
Desde logo, e tal como se enunciou já supra, o ato ilícito pode integrar quer um ato jurídico quer um ato material, podendo consistir um comportamento ativo ou omissivo, sendo que, neste último caso, a ilicitude apenas se verifica quando exista, por parte da Administração, a obrigação, o dever de praticar o ato que foi omitido.

De qualquer forma, conforme se dispõe na parte final o nº 1 do artº 9º da Lei nº 67/2007, acima transcrito, a verificação de um facto ilícito pressupõe sempre uma ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.

Assim, o ato ilícito pode integrar quer um ato jurídico quer um ato material, podendo consistir um comportamento ativo ou omissivo, sendo que, neste último caso, a ilicitude apenas se verifica quando exista, por parte da Administração, a obrigação, o dever de praticar o ato que foi omitido.

De qualquer forma, conforme se dispõe na parte final o nº 1 do artº 9º, acima transcrito, a verificação de um facto ilícito pressupõe sempre uma ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.

In casu, importará verificar o cumprimento por parte do Município dos seus deveres de promover as condições de conservação do património arbóreo municipal.

O conceito de ilicitude consagrado naquele preceito é, pois, mais amplo que o consagrado na lei civil (vd. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10º ed., vol. II, p. 1125; acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10.05.1987, in Ac. Dout. 310, p. 1243 e segs.).

A propósito do requisito da ilicitude refere aquele Professor na citada obra, ainda que, e naturalmente, face ao DL nº 48.051 que: “É necessário, em primeiro lugar, que tenha sido praticado um facto ilícito. Este facto tanto pode ter consistido num ato jurídico, nomeadamente um ato administrativo, como num facto material, simples conduta despida do carácter de ato jurídico. O ato jurídico provém por via de regra de um órgão que exprime a vontade imputável à pessoa coletiva de que é elemento essencial. O facto material é normalmente obra dos agentes que executam ordens ou fazem trabalhos ao serviço da Administração. O artigo 6º do Decreto-lei n.º 48 051 contém, para os efeitos de que trata o diploma, uma noção de ilicitude. Quanto aos atos jurídicos, incluindo portanto os atos administrativos, consideram-se ilícitos “os que violem as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis”: quer dizer, a ilicitude coincide com a ilegalidade do ato e apura-se nos termos gerais em que se analisam os respetivos vícios. Quanto aos factos materiais, por isso mesmo que correspondem tantas vezes ao desempenho de funções técnicas, que escapam às malhas da ilegalidade estrita e se exercem de acordo com as regras de certa ciência ou arte, dispõe a lei que serão ilícitos, não apenas quando infrinjam as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis, mas ainda quando violem as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração”.

No mesmo sentido Jean Rivero, Direito Administrativo, pág. 320, e Margarida Cortez, Responsabilidade Civil da Administração por Atos Administrativos Ilegais e Concurso de Omissão Culposa do Lesado, página 96.

No que toca à culpa "Agir com culpa significa atuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo" – Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 6ª edição, p. 531).

É também jurisprudência firme e reiterada que à responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos por facto ilícito de gestão pública é aplicável a presunção de culpa prevista no artigo 493.°, n.º1, do Código Civil, decorrente da propriedade de coisas (por todos, ver os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 25.10.2000 (Pleno), recurso n.º 37 510, de 20.03.2002, recurso n° 45 831, e de 03.10.2002, recurso n° 45 621).

Este regime radica nas seguintes razões: 1ª - nas regras da experiência comum, segundo as quais normalmente os danos provocados por coisas procedem de falta de adequada vigilância; 2ª- na necessidade de acautelar o direito de indemnização do lesado contra a extrema dificuldade de provar, neste tipo de casos, os factos negativos que consubstanciam a violação do dever objetivo de cuidado; 3ª na conveniência de estimular o cumprimento dos deveres de vigilância que recaem sobre o detentor da coisa (Antunes Varela, "Das Obrigações Em Geral" volume I, páginas 590-591; acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16.05.1996, Apêndices ao D.R., de 23.10.1998, p. 3697).

Assim como é pacífico o entendimento de que, por beneficiar dessa presunção, o autor só tem que demonstrar a realidade dos factos causais que servem de base àquela para que se dê como provada a culpa do réu, cabendo a este ilidir a presunção (artigos 349º e 350.° n.ºs 1 e 2, do Código Civil; Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 20.03.2002, recurso n° 45 831, e de 03.10.2002, recurso n° 45 621).

A elisão de uma presunção (iuris tantum) só é feita com a prova do contrário, não sendo bastante a mera contraprova (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 09.02.2005, proc. n.º 1758/03).

Face ao supra explanado, dúvidas não subsistem de que no caso em apreciação nos autos e face à matéria factual dada como provada, estão verificados factos que permitem concluir que foi praticado um facto ilícito e danoso e que esse facto ilícito foi a causa adequada da produção dos danos que determinaram o sofrimento e morte do familiar dos aqui Recorrentes.

Tanto basta para que funcione a presunção de culpa do Município, nos termos do art. 493º nº 1 do Código Civil.

Reproduz-se, parcialmente o teor do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no proc. nº 0373/10, datado de 22/06/2010, relatado por São Pedro, com o qual, naturalmente, se concorda:
“O art. 493º, 1, do C. Civil consagra a responsabilidade civil das pessoas com o dever de vigiar coisas ou animais, impondo uma presunção legal de culpa, desde que se prove que o dano foi causado «pela coisa ou animais». Com efeito, diz-nos concretamente o art. 493º, 1 do C. Civil que a pessoa com o encargo de vigiar a coisa «responde pelos danos que a coisa causar…»”.
O recorrente não põe em causa que tenha o dever de vigiar a Estrada e as árvores “implantadas” junto à sua berma. O que põe em causa é a prova dos factos que justificam a presunção, ou como diz a fls. 222: cabia ao autor provar “a base de presunção, ou seja, da ocorrência do facto causal e dos danos, que, em nossa opinião não logrou demonstrar”.
Todavia, no caso dos autos tal nexo de causalidade verifica-se de modo muito claro.
O dano foi causado pela queda de árvore na estrada, que o réu tinha o dever de vigiar.
Há, neste caso, um nexo de causalidade adequada evidente entre a queda da árvore na estrada (coisa vigiada) o embate do veículo com a árvore e o dano que este embate provocou no veículo. Na verdade para além da causalidade naturalística (a queda da árvore ser uma condição do dano) é evidente que essa condição só deixaria de poder como tal considerar-se se fosse de todo indiferente para a produção do dano e só se tivesse tornado condição dele, em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, o que não sucede em geral, uma vez que uma árvore a beira da estrada, pode sempre cair sobre um carro.
Estabelecido esse nexo de causalidade adequada entre a “coisa” e o “dano” (base da presunção) o réu para afastar a responsabilidade civil deveria provar (art. 493º, 1, 2º parte) que (i) não teve culpa ou (ii) que – tendo culpa - o dano se verificaria mesmo que a não tivesse. O “non liquet” sobre qualquer destes aspetos (falta de culpa, ou relevância negativa da causa virtual) é decidido contra o réu.
Dos factos não resulta que o réu tenha cumprido todas as regras de prudência exigíveis na vigilância da estrada e, sobretudo, no estado das árvores que a circundem de modo a evitar que, em casos de chuva intensa e persistente as mesmas não caíssem na faixa de rodagem. Em boa verdade sobre modo como esse dever de vigilância, em concreto, foi exercido nada se provou. Há, nesta medida, um claro “non liquet”.
O réu sustenta ainda a tese, segundo a qual a queda da árvore foi devida a um caso de força maior, imprevisível e, portanto, inevitável. Mas, em boa verdade os factos provados não permitem essa conclusão.
Provou-se, é certo, que estava mau tempo, com chuva intensa e persistente e que o pinheiro foi arrancado pela raiz.
Mas não se alegou que, naquela ocasião e local, todos os pinheiros (ou a maioria deles) tenham sido arrancados pela raiz e, embora tal tenha sido tenha sido alegado não se provou que o pinheiro que caiu estava viçoso “nada fazendo prever a sua queda” (al. b) dos factos não provados).
Ora, mesmo perante o mau estado do tempo (chuva intensa e persistente) fica de pé a possibilidade de aquela concreta árvore não estar nas condições que lhe assegurassem a devida estabilidade e, por isso, não ter resistido ao mau tempo. Daí que, não existam factos provados suficientes para podermos concluir que ocorreu um caso de calamidade impossível de prever e desse modo evitar o dano (força maior).
Ou seja, a matéria de facto dada como assente não permite, de modo algum, considerar provado que “nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua”.

Em concreto, o recorrido Município, não põe em causa que tenha o dever de vigiar o seu património arbóreo, invocando, no entanto, por assim dizer, a verificação de caso de força maior, para ilidir a presunção de culpa que sobre ele recai, mais aduzindo que farão uma avaliação visual quinzenal do mesmo.

Não há dúvida de que os danos foram causados pela queda de árvore em cima do veículo automóvel do familiar dos Recorrentes, quando este circulava no local indicado.

Também é indubitável que o Município tinha o dever de vigiar essa árvore e as demais existentes na referida artéria, independentemente da factualidade dada por provada no facto 23.

Os recorridos provaram que os seus serviços, haviam feito dias antes (9 de Fevereiro) a “limpeza da área e o corte do relvado”, mais tendo sido “avaliado visualmente o estado da árvore”, o que não permite desresponsabilizar o município pelo ocorrido.

Para se considerar ilidida a presunção necessário se tornava alegar e provar o modo, profundidade e adequação desse controlo, vigilância e fiscalização para se aferir da eficácia e eficiência no cumprimento do respetivo dever, bem como para desvalorizar a circunstância de não ter sido detetado pelos serviços qualquer motivo a justificar a sua intervenção (neste sentido se pronuncia o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no proc. nº 0566/08, o de 27-05-2009).

Pela sua relevância, reproduz-se, igualmente, parte deste último Acórdão referenciado, aqui aplicável, mutatis mutandis:
“Com efeito integrando-se a árvore caída no Parque Florestal de Monsanto, e sendo este património arbóreo da responsabilidade do Município de Lisboa, sobre este impendia o correspondente dever de vigiar e fiscalizar de forma sistemática, adequada e eficaz as condições de implantação, desenvolvimento e estado fitossanitário das suas árvores, em particular, as existentes junto das vias, de modo a prevenir a queda das mesmas e consequentes danos aos utentes. Tal prova não foi, porém, produzida, de modo cabal e suficientemente persuasivo, pelo Réu. Não obstante ter alegado, o Réu não logrou provar que a fiscalização, patrulhamento e manutenção do Parque de Monsanto levado a efeito é executado de modo regular, periódico e adequado. A mera execução de tal atividade de fiscalização e manutenção, sem qualquer referência ao modo e à respetiva periodicidade média, afigura-se marcadamente insuficiente para aferir da eficácia e eficiência no cumprimento no respetivo dever, bem como desvaloriza a circunstância de não ter sido detetado pelos Serviços motivo algum a justificar a sua intervenção. Por outro lado, a demonstração feita em julgamento que a análise visual aos cepos de duas acácias caídas na zona do acidente não evidenciou doença ou podridão pouco releva para se concluir pela licitude da conduta do Réu desde logo, porque não se provou que a árvore tombada na viatura fosse uma das acácias visualizadas, e, mesmo que o fosse, a análise visual é marcadamente insuficiente para se poder afirmar se a árvore está ou não de boa saúde, pois, para tanto seria necessário proceder a exames laboratoriais específicos, tal como o reconheceu um dos técnicos responsáveis pela manutenção do Parque ouvido em Tribunal.
Assim sendo, face à matéria fáctica demonstrada, é forçoso concluir pela ilicitude da conduta do Réu por omissão do dever de vigilância e fiscalização sistemática, adequada e eficaz das condições de implantação, desenvolvimento e estado fitossanitário da árvore caída.
Por outro lado, no que tange à culpa, o Réu não logrou ilidir a presunção legal que sobre ele impende, pois, não provou ter cumprido com eficácia o referido dever de fiscalização da árvore em causa, em obediência às regras técnicas e de prudência comum exigíveis naquela situação concreta, nem que a mencionada queda do elemento arbóreo se ficou a dever em exclusivo a circunstâncias anormais e imprevisíveis, a causa alheia e estranha ao controlo do Réu. Na realidade, a exemplo do já decidido no STA, a prova do registo de período de chuva, por vezes intensa, e vento moderado a forte com rajadas é insuficiente para atribuir a queda da árvore a um caso de força maior ou fortuito, em sobreposição dos deveres de fiscalização a que a Administração está adstrita (cfr Ac. STA 11/03 de 15.10.2003). Aliás, as condições climatéricas registadas de chuva intensa e vento forte são, plenamente, normais e previsíveis no Inverno, o que exigia por parte da Administração uma atenção redobrada, ou melhor, uma atuação adequada às adversidades previsíveis do tempo invernoso, eventualmente, até o corte pontual do trânsito nas artérias de maior densidade florestal do Parque, face ao comunicado do Serviço Nacional de Proteção Civil, que entrou em alerta amarelo a partir das 14 horas (tendo o acidente ocorrido sete horas depois), e o comunicado da previsibilidade de queda de árvores.
Portanto, a atuação do Réu é ilícita e culposa.”
Não se vê razão para censurar esta ponderação da sentença recorrida, que a argumentação do Réu, a que acima se fez referência, não é suficiente para pôr em causa.
Efetivamente, por um lado, apesar de ser incluído na base instrutória, um quesito (23º) onde se indagava se no dia 6.12.2000 a queda da árvore teve origem em chuvadas e ventos anómalos que assolaram Lisboa, apenas se provou que, nesse dia, na região de Lisboa, ocorreram períodos de chuva, por vezes forte, e o vento tornou-se moderado e forte com rajadas. (cfr. fls. 123 e resposta ao quesito 23, a que corresponde o item 22 dos factos provados).
Ou seja, não se provou uma relação de causalidade entre as condições climatéricas do dia em que ocorreu o acidente – a que o Recorrente faz apelo na sua argumentação – e a queda da árvore que provocou os danos.
E, assim sendo, o Réu não logrou provar que a aludida queda se verificou devido a caso de força maior.
Por outro lado, embora o Réu, ora Recorrente, tenha alegado que, “através dos seus serviços, e agindo no âmbito das suas legais atribuições procedeu à fiscalização de todo o Parque Florestal de Monsanto incluindo os elementos arbóreos sitos no local referenciado nos autos, por forma regular e periódica, não detetando no decurso das mesmas qualquer motivo atinente aos exemplares existentes, que justificassem a sua intervenção ao nível de prevenção ou tratamento”, e tenha sido incluído, na base instrutória, um quesito (19º) com esse exato conteúdo, apenas se provou que “os serviços da Ré fiscalizam o Parque Florestal de Monsanto, incluindo os elementos arbóreos existentes, patrulham e procedem à sua manutenção, não tendo detetado no decurso das mesmas qualquer motivo que justificasse a sua intervenção” (resposta ao quesito 19º; 18 dos factos provados).
Não se provou, assim, designadamente, ao invés do invocado na contestação, que a fiscalização do Parque de Monsanto pelos serviços do Réu, fosse efetuada “de forma regular e periódica”.
Como a sentença recorrida considerou e bem, sobre o Réu, em cujo património se integrava a árvore causadora do acidente, “impendia o correspondente dever de vigiar e fiscalizar de forma sistemática, adequada e eficaz as condições de implantação, desenvolvimento e estado fitossanitário das suas árvores, em particular, as existentes junto das vias, de modo a prevenir a queda das mesmas e consequentes danos aos utentes”.
O Autor tinha, neste caso, a seu favor a presunção legal de culpa a que se refere o artº. 493º, nº 1 do Código Civil, conforme é, a este propósito, jurisprudência generalizada do Supremo Tribunal Administrativo (v. entre muitos outros, acs. do Pleno de 29.4.98, p. 36463; de 3.10.02, p. 45160; de 20.3.2002, p. 45831).
Para ilidir essa presunção, é insuficiente a simples prova em abstrato, de que “Os serviços do Réu fiscalizam o parque florestal de Monsanto, incluindo os elementos arbóreos existentes na zona do acidente, patrulham e procedem à sua manutenção, não tendo detetado no decurso das mesmas qualquer motivo que justificasse a sua intervenção”.
Como a sentença recorrida considerou e bem, “a mera execução de tal atividade de fiscalização e manutenção, sem qualquer referência ao modo e à respetiva periodicidade média, afigura-se marcadamente insuficiente para aferir da eficácia e eficiência no cumprimento do respetivo dever, bem como desvaloriza a circunstância de não ter sido detetado pelos Serviços motivo algum a justificar a sua intervenção”.
Conforme este Supremo Tribunal repetidamente tem afirmado, a alegação e consequente possibilidade de prova da inexistência de “faute de service” tem de ser feita a partir de factos que esclareçam o Tribunal sobre as providências que em concreto foram tomadas pelos serviços do Réu para obviar a eventos danosos como o que ocorreu (v. entre outros acs. do STA de 14.4.05, p. 86/04; de 5.5.04, p. 1203/03; de 12.7.07, p. 321/07), prova que, como a sentença corretamente considerou, não foi feita.”

Reproduz-se ainda parcialmente, igualmente pela sua relevância e aplicabilidade à situação aqui controvertida, o acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no proc. nº 0566/08, datado de 14-01-2010, relatado por Pires Esteves:
“(…) um caso de força maior é todo o acontecimento natural ou ação humana que, embora, previsível ou até prevenida, não se pode evitar, nem em si mesmo nem nas suas consequências (Acs. do STJ de 9/1/1970-proc. nº62941, de 10/12/85-proc. nº73169, de 26/5/1988-proc. nº75721, de 27/9/1994-Proc. nº85089, de 10/2/2005-proc. nº4B2192 e de 29/11/2005-proc. nº05B3678).
Na hipótese do caso de força maior fica prejudicado qualquer juízo de culpa sobre o potencial lesante, dado que em nada contribuiu para o evento.”

No caso concreto aqui em apreciação, designadamente os factos fixados 20, 21, 22, 23, 24 e 25 não são suficientes pelas supra aludidas razões, para ilidir a presunção de culpa do art. 493º nº 1 do Cód. Civil.

Com efeito, não se alegou e, como tal, não se provou, quais as providências concretas desencadeadas em relação á árvore que caiu no veículo automóvel em questão, para que se pudesse concluir que o seu controlo, vigilância e fiscalização foram adequados, sistemáticos e continuados, e assim permitir ao Tribunal poder aferir se o Município «organizou os seus serviços de modo a assegurar um eficiente sistema de prevenção e vigilância de anomalias previsíveis», exercendo uma adequada, sistemática e contínua fiscalização técnica (no sentido de que só a alegação e prova desses requisitos ilide a presunção de culpa em caso de queda de árvore causadora de danos se pronunciam os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 15.10.2009, p. 02090/06.3BEPRT, de 17.12.2003, p. 01499/03, de 15-10-2003, p. 011/03, de 22-10-1998 p. 043616, de 11.01.1994, p. 034034, de 11-01-1994, p. 031468, de 20.02.1990, p. 027844, de 13-02-1997, p. 37290, e de 07.11.1989, p. 027240).

O que tem de similar a situação dos autos com as situações descritas nos acórdãos ora citados, de decisivamente comum, é a circunstância de não ter ficado provado que a entidade demandada procedeu a uma vigilância cuidada da árvore que veio a vitimar mortalmente o familiar dos aqui Recorrentes, de forma sistemática, adequada e continuada.

Pelo exposto, impõe-se revogar a decisão da 1ª instância e decidir do mérito da ação, por não terem sido alegados factos suficientes para a elisão da presunção de culpa prevista no artigo 493º nº 1 do Cód. Civil.

Preenchidos que estão, conforme supra se demonstrou, todos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual dos recorridos, por força do contrato de seguro celebrado entre o Município e a Seguradora F... – Companhia de Seguros SA (facto 27) deverá a responsabilidade arbitrada ser imputada à seguradora, até ao limite da sua responsabilidade contratual disponível, cabendo ao Município, em qualquer caso, suportar o valor remanescente, sem prejuízo de, em qualquer caso, dever suportar o valor correspondente à franquia convencionada, de 3.750€.

Do Valor da Indemnização
A última questão a decidir consiste na determinação do valor dos danos indemnizáveis.

Nos termos do artigo 562º do Código Civil, “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”. Tal obrigação só existe em relação aos danos que o lesado não teria sofrido se não fosse a lesão (artigo 563º do Código Civil), compreendendo o “prejuízo causado” e “benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão” – nº 1 do artigo 564º do Código Civil.

Na fixação da indemnização o tribunal pode atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis (artigo 564º nº 2 do Código Civil). Em princípio a indemnização visaria a reconstituição natural, sendo fixada em dinheiro quando a reconstituição natural não for possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor (nº 1 do artigo 566º do Código Civil).

Não sendo possível averiguar o valor exato dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (nº 3 do artigo 566º).

Analisemos os danos reclamados pelos autores/recorrentes:
Esquematicamente foram originariamente peticionadas as seguintes indemnizações:
Dano Morte
Não Patrimoniais próprios
Não Patrimoniais transmitidos
Salário
Total
Mulher
15.000€
20.000€
5.000€
50.000€
90.000€
Filha
15.000€
15.000€
5.000€
-
35.000€
Filho
15.000€
15.000€
5.000€
-
35.000€
160.000€

O art. 496.º do Código Civil, na redação vigente à data do acidente estabelece, no que aqui interessa, que:
1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos número anterior.

Em linha com o sumariado no Acórdão do Colendo STA nº 0562/03, de 02/07/2003, “A fixação da indemnização referente à perda da vida bem como a respeitante aos danos não patrimoniais próprios dos AA., deve ser feita com recurso à equidade, mas com consideração dos critérios constantes do artº 494º do Cód. Civil, relevando a gravidade do dano causado, o grau de culpa do agente, a situação económica deste e dos lesados e as demais circunstâncias do caso, apontando estes fatores, no seu conjunto, para um duplo objetivo: o da reparação dos danos causados e o da sanção ou reprovação do agente. Tal indemnização deve ser significativa e não meramente simbólica, não se pautando por critérios miserabilistas.”

Há que distinguir a indemnização referente à perda do direito à vida e a que compete aos ora recorridos e respeitante aos seus danos não patrimoniais próprios.

Tanto num como no outro caso, a fixação deve ser feita com recurso à equidade, mas com consideração dos critérios constantes do artº 494º do Cód. Civil, relevando a gravidade do dano causado, o grau de culpa do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, apontando estes fatores, no seu conjunto, para um duplo objetivo: o da reparação dos danos causados e o da sanção ou reprovação do agente – cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, p. 630.

A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça lembra, sistematicamente, a necessidade de serem abandonadas as indemnizações miserabilistas, em matéria de danos não patrimoniais, sustentando que a compensação por tais danos, deve ter um alcance significativo e não meramente simbólico.

Neste plano, e como se refere no acórdão do STJ de 17.11.98, p.98A 990, tem sido notada uma constante tendência para a subida das indemnizações a arbitrar em casos similares, por forma a superar a timidez que começou por se revelar na prática judiciária.

Tendo em conta estes parâmetros e a matéria de facto dada como provada, designadamente, que a vítima tinha à data do acidente perto de 72 anos de idade, “possuía boa saúde, era trabalhador, pessoa alegre, estremado marido e pai” (Facto 14) impõe-se concluir que o valor peticionado pelo “dano morte” se considera equitativamente razoável e aceitável (15.000€ para cada um dos Recorrentes).

Vejamos agora, conjuntamente, os restantes danos não patrimoniais invocados.
Os Autores originariamente invocaram que “perderam muita da alegria de viver, continuando angustiados e sobressaltados pela ausência do CMR.
Esses danos devem sem compensados em valor não inferior a €20.000,00 para a A. JBL e €15.000,00 para cada uma dos AA. Maria Fátima e João José.”

A estes factos acresce a circunstância do falecido CMR ter “sofrido dores físicas atrozes e uma incomensurável aflição e angústia, não só pelas lesões sofridas, como também pela morte que previa vir a suceder e pela consequente separação dos seus entes queridos”, cujo dano não patrimonial será transmitido “aos seus herdeiros o correspondente dano não patrimonial sofrido pela vítima, ao qual deve ser atribuída e fixada a importância de €15.000,00, a que correspondente a cada A. a quantia de €5.000”.
Como se disse já, decorre do artigo 496º do CC que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (n.º 1), sendo o montante fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º, isto é, tomando em consideração o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (n.º 3).

Tal como refere Mota Pinto, in "Teoria Geral do Direito Civil", 3ª Ed., pág. 115, “Estes danos não patrimoniais (…) resultam da lesão de bens estranhos ao património do lesado (…).
A sua verificação tem lugar quando são causados sofrimentos físicos ou morais, perdas de consideração social, inibições ou complexos de ordem psicológica (…) Não sendo estes prejuízos avaliáveis em dinheiro, a atribuição de uma soma pecuniária correspondente legitima-se, não pela ideia de indemnização ou restituição, mas pela de compensação.// os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis; não podem ser reintegrados mesmo por equivalente. Mas é possível, em certa medida contrabalançar o dano, compensá-lo mediante satisfações derivadas da utilização do dinheiro. Não se trata, portanto, de atribuir ao lesado um "preço de dor" ou um "preço de sangue", mas de proporcionar uma satisfação em virtude da aptidão do dinheiro para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir mesmo interesses de ordem ideal”.

Não enumerando a lei os casos de danos não patrimoniais que justificam uma indemnização, caberá ao tribunal, em cada caso, dizer se o dano é ou não merecedor da tutela jurídica (Neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, in CC anotado, 4.º edição, pág. 499).

Assim sendo, nos termos do art.º 496.º, n.º 3 e como supra se disse, o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em conta as circunstâncias referidas no art.º 494.º do CC.

O julgador, para a decisão a proferir no que respeita à valoração pecuniária dos danos não patrimoniais, em cumprimento do normativo legal que o manda julgar de harmonia com a equidade, deverá atender aos fatores expressamente referidos na lei e, bem assim, a outras circunstâncias que emergem da factualidade provada. Tudo com o objetivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado pelos danos não patrimoniais que sofreu. (Cfr. Ac. do TCA Norte de 18/1/2007, rec. N.º 00348/04.5BEPRT)

A indemnização dos danos não patrimoniais é pois limitada àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art. 496° do CC), medindo-se tal gravidade através de um padrão objetivo.

Como se viu, as circunstâncias em que ocorreu o falecimento do familiar dos aqui Recorrentes, compreensivelmente geraram os invocados e dados como provados sofrimentos, profunda dor e angústia, sendo assim dignos de reparação.

As referidas circunstâncias mostram-se pois atendíveis e suscetíveis de merecerem a tutela do direito, sendo que a ressarcibilidade dos danos não patrimoniais depende da gravidade dos danos, aferida por padrões objetivos e tendo em conta as circunstâncias do caso.

A indemnização por danos não patrimoniais tem uma natureza mista, visando por um lado reparar, mais do que indemnizar e por outro reprovar ou castigar a conduta do lesante.

Constituem danos não patrimoniais, relevantes para efeitos de reparação, nos termos do art° 496° do Código Civil, designadamente a instabilidade psicológica e perturbação que os Recorrentes compreensivelmente sofreram, em virtude do falecimento do seu familiar, em termos de razoabilidade.

Na fixação da indemnização por danos não patrimoniais, há que atender pois, entre outros fatores, à culpa do Réu (arts. 496.º, n.º 3, e 494.º do Código Civil).

No âmbito da responsabilidade civil extracontratual, o montante da indemnização por danos não patrimoniais deve ser fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpa do agente, a situação económica do lesante e do lesado, e as demais circunstâncias do caso (arts. 494º e 496º, nº 3 do C.Civil), até ao limite do pedido globalmente formulado pelos Autores.

Neste enquadramento legal, cabe ao julgador, ao fixar a indemnização por tais danos, guiar-se por critérios de equidade, sendo que a gravidade daqueles danos há de aferir-se por um padrão objetivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias do caso) e não à luz de fatores subjetivos.

Danos não patrimoniais são pois prejuízos que, sendo insuscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização.

Justifica-se que o quantum indemnizatório fixado para os danos não patrimoniais atente nessas circunstâncias, de modo equitativo.

Assim, à luz dos critérios legalmente definidos nos artigos 494º e 496º, número 3 do Código Civil, entende-se como adequado e suficiente a atribuição global pelos danos não patrimoniais sofridos, com exclusão dos resultantes do “dano morte”, de 10.000€ para a mulher e 5.000€ para cada um dos filhos.

Quanto aos peticionados 50.000€ a titulo “perda de salários decorrente do falecimento”, atenta a idade do falecido, que perfazia no ano do acidente 72 anos, não sendo já expectável que a sua vida profissional se prolongasse para além de mais 3 anos (75 anos), mostra-se suficiente e adequado em termos equitativos e reportadamente ao valor da pensão atribuída pelo ISS IP (551,37€), fixar a correspondente indemnização em 20.000€.

Finalmente, a atentas as conclusões a que se chegou, mais deverão os Recorridos ser condenados a pagar ao ISS IP a quantia reclamada de 29.068,85€, acrescidas das pensões que tiverem sido pagas na pendência da ação e respetivos juros de mora legais, desde a data da citação até integral e efetivo pagamento, nos termos do Artº 70º da Lei nº 4/2007, de 16 de Janeiro (versão original) e DL nº 59/89, de 22 de Fevereiro.

* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte em julgar parcialmente procedente o presente Recurso, pelo que:
1) Revogam a sentença recorrida.
2) Julgam a ação parcialmente procedente, e, em consequência:
Condenam:
A F... – Companhia de Seguros SA e o Município do Porto a pagar as seguintes indemnizações:
a) À Recorrente JBL: O valor total de 45.000€, acrescido de juros, à taxa legal, contados da citação e até integral e efetivo pagamento.
b) À Recorrente MFBR: O valor total de 20.000€, acrescido de juros, à taxa legal, contados da citação e até integral e efetivo pagamento.
c) Ao Recorrente JJBR: O valor total de 20.000€, acrescido de juros, à taxa legal, contados da citação e até integral e efetivo pagamento.
d) Ao Instituto da Segurança Social IP: O valor de 29.068,85€, acrescido das pensões que tiverem sido pagas na pendência da ação e respetivos juros de mora, à taxa legal, contados da citação e até integral e efetivo pagamento.
3 - A F... – Companhia de Seguros SA será responsável pelo pagamento até ao limite disponível do capital coberto, ficando o Município do Porto responsável pelo pagamento do valor remanescente, sem prejuízo de, em qualquer caso, ficar responsável pelo montante correspondente à franquia contratualmente estabelecida – 3.750€.

Custas pelas partes na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam os Autores.

Porto, 21 de Abril de 2016
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Fernanda Brandão