Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01214/06.5BEBRG-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/08/2016
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Luís Migueis Garcia
Descritores:EXECUÇÃO. CAUSA LEGÍTIMA DE INEXECUÇÃO. INDEMNIZAÇÃO. EQUIDADE.
Sumário:I) – Se a quantia arbitrada em indemnização por causa legítima de inexecução respeita os parâmetros de equidade, não há erro de julgamento e é de confirmar a decisão recorrida.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:MJMG
Recorrido 1:Universidade do Minho e Outro(s)...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Execução de Sentença
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:
MJMG interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Braga, que, em execução de sentença intentada contra a Universidade do Minho e outro, fixou indemnização por causa legítima de inexecução.
Conclui da seguinte forma:
A) Da motivação da douta decisão recorrida ressalta que o M.° Juiz a quo deu como provados danos e recorreu à equidade para fixar o montante indemnizatório;
B) Porém, não está determinado na douta sentença recorrida quais os danos provados e dos quais resultou ao quantum indemnizatório;
C) O art. 566, n° 3, do Código Civil, pressupõe a existência de um dano, cujo valor exacto não é possível averiguar e para aferir dos danos causados, em sede de indemnização por causa legítima de inexecução, manda o art. 178°, n.° 2, do CPTA que se sigam os trâmites previstos no art. 166* do mesmo diploma;
D) Na falta de acordo o tribunal deve ordenar as diligências instrutórias que considere necessárias;
E) Sucede porém, que o M°. Juiz a quo não ordenou quaisquer diligências instrutórias nem se pronunciou ou fundamentou a sua desnecessidade, ficando assim sem se saber a que demais danos se refere a douta sentença recorrida que fundamentaram o direito ao ressarcimento pela "Perda de chance" contabilizados equitativamente em 4.000,00€;
G) Esta omissão sobre os danos verificados como existentes pela inexecução da sentença que levaram ao valor indemnizatório fixado na douta sentença, conduziu a douta decisão recorrida a um erro de julgamento por falta de equidade;
H) O dever de indemnização por inexecução (legítima) do julgado exequendo funda-se no dever objectivo de indemnizar, com base na percepção de que, quando as circunstâncias vão ao ponto de nem sequer permitir que o recorrente obtenha aquela utilidade que, em princípio, a anulação lhe deveria proporcionar, tal indemnização destina-se a reparar os danos resultantes da execução se ter frustrado, ressarcindo aquilo que vem sendo chamado de expropriação do direito à exedução ou de perda de uma oportunidade;
I) Além da anulação da decisão final concurso ilegal, a inexecução do julgado prejudicou, também, a nulidade dos actos de provimento e de nomeação provisória do contra-interessado, o qual, apesar de ter sido graduado em primeiro lugar num concurso ilegal, manteve, apesar da sentença anulatória, o seu lugar como professor catedrático desde 12 de Março de 2006;
J) A recorrente, provida, na categoria de professor catedrático, a partir de 5 de Julho de 2007; ou seja, ficou em termos de precedência acadérnica atrás do seu colega contra interessado;
K) A precedéncia na categoria, além do valor simbólico associado à antiguidade, ao prestigio (a ideia do decano), tem também consequências jurídicas que estão plasmadas no art. 82° do Estatuto de Carreira Docente Universitária, na versão do Decreto-lei n.° 205/2009, de 31/8, que remete a sua regulamentação para as instituições;
L) A precedência releva na categoria para efeitos protocolares ou relacionados com a antiguidade, e implica também que caiba ao professor catedrático mais antigo a convocação e presidência das reuniões do departamento;
M) A expropriação do direito de execução eliminou a oportunidade, a chance que se almejava com a impugnação do concurso que foi considerada procedente e consequentemente beneficiar em termos protocolares e de antiguidade nos seus múltiplos efeitos;
N) O valor justo e equitativo é o que foi apresentado na proposta de acordo e que se reitera nos autos: € 25.500,00, dando-se por demonstrado o erro de julgamento por falta de equidade da douta sentença recorrida.
Termos em, que com o douto suprimento de V. Ex.as, se requer que, considerado procedente o presente recurso, seja revogada a douta sentença recorrida e consequentemente fixado o valor justo e equitativo peticionado, como compensação da expropriação do direito de execução julgado.

A recorrida Universidade contra-alegou, concluindo:
A) Vem o presente Recurso Jurisdicional interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 30 de novembro de 2012, que em virtude da falta de acordo entre as partes, condenou a Universidade do Minho a pagar à ora Recorrente "uma indemnização pela inexecução da sentença proferida nos autos principais, no valor de 4.000.00€ [quatro mil euros], acrescida de juros de mora desde a data do trânsito em julgado", sendo peticionada a sua revogação, por alegado "erro de fuigamento por falta de equidade";
B) Porém, ao contrário do que a Recorrente alega, bem decidiu a douta sentença recorrida, na fixação do montante indemnizatório, tendo para o efeito ponderado todas as circunstâncias relevantes, dentro dos limites do julgado anulatório;
C) Como mencionado na sentença recorrida, trata-se, neste processo, apenas de assegurar uma compensação pelo facto da inexecução;
D) Com efeito, neste processo declarativo simplificado, em que o cálculo do dano a compensar se faz no próprio processo de execução, através de meios sumários e expeditos, apenas é aberta instrução "no caso de o tribunal a considerar necessária";
E) Na situação sub judice, é evidente a desnecessidade de novas diligências, visto que resulta claramente dos documentos juntos aos autos, e da douta sentença proferida no processo principal, quais as circunstâncias a atender no montante indemnizatório;
F) O processo executivo não visa proporcionar ao exequente a reparação de todos os possíveis danos que a atuação ilegal da Administração lhe possa ter causado, mas apenas compensar o exequente pelo facto de o processo executivo se ter frustrado, pelo que se impõe distinguir, neste domínio, entre a indemnização devida pelo facto da inexecução e aquela que se destina a reparar todos os danos causados pelo ato ilegal, sendo que esta última deve ser objeto de ação autónoma de responsabilidade;
G) No caso sub judice, como evidenciado pelo Tribunal "a quo", o direito ao ressarcimento com fundamento em "perda de chance" depende da avaliação que se faça da probabilidade que o lesado teria, "atendendo a que foram admitidos 3 candidatos, que o contrainteressado foi nomeado professor catedrático, em 12 de Março de 2005 e a Exequente provida no lugar de professora catedrática no grupo disciplinar de Física, em 5 de Julho de 2007.";
H) A douta Sentença recorrida não só analisou e ponderou, detalhadamente, todas as circunstâncias relevantes para determinar a indemnização devida pela impossibilidade de execução, como fixou, com base nas mesmas, um montante "equitativo", em conformidade com o disposto no n.° 2 do art.° 166.º do CPTA (por remissão do art.º 178., n.2 do CPTA), tudo devidamente enquadrado na jurisprudência e na doutrina aplicáveis;
I) O Tribunal "a quo" atendeu aos elementos factuais apurados, e pertinentes, conectando os vícios determinantes da anulação do concurso com o grau de probabilidade da Exequente ter nele vencimento, e teve em conta a posição que entretanto lhe foi conferida pelo posterior provimento como professora catedrática;
J) Acresce que o dano alegadamente sofrido pela Recorrente de estar "em lugar menos graduado face ao contra interessado", em termos de precedência académica, é um dano moral, como aliás consta expressamente da proposta pela mesma apresentada em sede de acordo, que vem transcrita no art.° 17.º do petitório;
K) Porém, a indemnização devida pelo facto da inexecução prevista no art.º 178.º, n.° 1 do CPTA "não se confunde com danos morais, cuja tutela jurídica depende de uma avaliação em termos de gravidade e cuja indemnização se faz segundo a equidade" (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 30-11-2012. Proc.º n.º 00682-A/2002);
L) Ora, o meio próprio para se apurar o efetivo prejuízo sofrido e para se lhe proporcionar a correspondente indemnização em resultado da prática do ato anulado não é este, mas antes a ação a que alude o art.° 45,º, n.° 5, do CPTA, pelo que deve improceder o pedido nestes autos formulado, visando o ressarcimento do dano moral invocado pela Recorrente, decorrente de estar ordenada numa lista de "precedências" do Departamento de Física, da Escola de Ciências, em lugar subsequente ao do contrainteressado;
M) Os danos "morais", ou não patrimoniais, por serem insuscetíveis de avaliação pecuniária (o que implica que os respetivos montantes sejam calculado segundo critérios de equidade) devem ser de tal modo graves que mereçam a tutela do direito, justificando, por isso, a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.
N) A gravidade de um dano deve medir-se por um padrão objetivo, "e não à luz de fatores subjetivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada) "(Pires de Lima e Antunes Varela, anotação ao artigo 4969, in Código Civil Anotado); ou, dito de outro modo, "só são indemnizáveis os danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito e é sabido que a gravidade do dano se mede por um padrão objectivo e não à luz da mera subjetividade ofendida, e situações de simples desconforto moral, de incómodo e contrariedade não atingem profundidade e sofrimento justificativa de uma compensação monetária" (cfr. Antunes Varela, “Das Obrigaçôes em Geral”, Volume I);
O) A questão da "precedência académica", na qual a Recorrente alicerça e fundamenta a sua discordância com os montantes fixados na douta sentença recorrida, podendo ser suscetível, porventura, de lhe causar algum desconforto, não configura, de modo algum, um "prejuízo" digno de uma compensação indemnizatória;
P) A referida "precedência académica" entre o contrainteressado e a Recorrente, na lista de antiguidade do Departamento de Física, não tem o relevo e os efeitos que lhe vêm atribuídos;
Q) Na verdade, as reuniões dos departamentos - que são subunidades orgânicas das unidades de ensino e investigação (Escolas) - são convocadas e presididas, como a Recorrente bem sabe, pelo diretor do departamento, nos termos do disposto na alínea c) do n.° 3 do art.° 98.0 dos Estatutos da Universidade do Minho.
R) No que especificamente concerne à Escola de Ciências (à qual pertence o Departamento de Física) é o Diretor de Departamento, eleito pelo conselho do departamento de entre os seus membros doutorados, em regime de tempo integral, que preside ao conselho de departamento e às suas comissões, designadamente, à comissão diretiva;
S) Ora, no período que decorreu de 5 de junho de 2007 até 7 de abril de 2010, foi precisamente a Recorrente que exerceu as funções da Diretora do Departamento de Física, tendo, consequentemente, nessa qualidade, convocado e presidido às reuniões do conselho do departamento e das suas comissões; e nessas reuniões participou, entre outros docentes do Departamento, o contrainteressado, mas enquanto vogal;
T) Não obstante, tendo o n.° 2 do art.° 103.º da Lei n.° 62/2007, de 10 de setembro, estabelecido um impedimento funcional, para os membros do conselho científico das instituições de ensino superior, que não podem pronunciar-se sobre assuntos referentes "a actos relacionados com a carreira de docente com a categoria superior à sua", e devendo os departamentos, segundo a orgânica da Universidade do Minho, pronunciar-se sobre um conjunto de matérias, antes das deliberações a tomar pelos conselhos científicos da Escola a que pertencem, quando estão em causa atos relacionados com certas categorias, como a de catedrático, são os mesmos tratados em reuniões restritas a um número muito reduzido de professores, sendo, nestas especificas circunstâncias, geralmente presididas pelo "mais antigo".
U) Todavia, ao invés, por regra, é o Diretor, como referido supra, quem convoca e preside à generalidade das reuniões do Departamento; e quando assim não acontece essa função é exercida por um dos dois professores catedráticos mais antigos.
Logo, com ou sem a execução do julgado anulatório, a presidência das ditas reuniões, no que depende da precedência académica, não coube nem caberá, ao contrainteressado ou à Recorrente;
V) Sendo certo que tudo o demais invocado pela Recorrente, em prol da sua pretensão, não tem valor ou dignidade que mereça qualquer tutela jurídica.
W) Como é evidente, o alegado "dano moral" da Recorrente, derivado da sua ordenação na "lista de antiguidade" do Departamento de Física, face ao contrainteressado (estando em causa o terceiro ou o quarto lugar na lista) não se reveste de qualquer gravidade, para efeitos de atribuição de uma indemnização compensatória, nos termos expressos no art.° 496.º do Código Civil.
X) Em face do que antecede, e na falta de outra substanciação para além da alegada, não revelando o dano invocado, medido por um padrão objetivo, dignidade indemnizatória, bem andou a douta sentença recorrida, na fixação do quantum indemnizatório;
Y) Tendo em conta que o único dano visado pela indemnização prevista no n.° 2 do artigo 166.° do C.P.T.A., é a perda do direito à execução do julgado anulatório, face à existência de causa legítima de inexecução, e não se tratando aqui de ressarcir outros danos, morais ou não, além desse, forçoso é de concluir que o juízo de equidade realizado na sentença sub judice, e o montante em conformidade nela fixada, não merecem qualquer censura.
Nestes termos e nos melhores de Direito, deve ser negado provimento ao presente Recurso, mantendo-se a douta Sentença Recorrida.

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O Exmº Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal, notificado nos termos e para os efeitos previstos no art.º 146º, nº 1, do CPTA, não emitiu parecer.
*
Cumpre decidir, dispensando vistos, incidindo o recurso sobre imputado erro de julgamento no modo como o tribunal “a quo” arbitrou indemnização por equidade, perante causa legítima de inexecução.
*
Os factos:
1º) - Por decisão de 29 de Março de 2012 o tribunal “a quo” julgou verificada a
existência de causa legítima de inexecução, ponderando nos seguintes termos:
«(…)
Para fundar a existência de causa legítima para a inexecução, invoca a Universidade do Minho, em síntese, e, em primeiro lugar, a circunstância de a Exequente se encontrar entretanto sido provida, desde 5 de Julho de 2007, no lugar de professora catedrática encontrando-se assim no topo da carreira universitária, o que, desde logo, inviabilizaria a que a mesma pudesse continuar como opositora no concurso cujos actos foram anulados pela sentença dada à execução.
Invoca depois as gravosas consequências para o interesse público do retomar do concurso (e da eventual anulação dos actos entretanto praticados pelo Prof. MIV), atendendo ao elevado mérito demonstrado pelo contra-interessado enquanto professor universitário (e no âmbito das diversas funções desempenhadas pelo mesmo) e o interesse da Universidade de preservar o seu corpo docente mais qualificado, mediante um quadro permanente de professores beneficiários de um estatuto reforçado de estabilidade.

Apreciando.
No que tange ao primeiro dos fundamentos em que a Universidade do Minho ancora a invocação de causa legítima de inexecução e, tendo por referente a matéria de facto dada como provada, resulta que está em causa a execução de julgado anulatório que anulou a decisão final de procedimento concursal tendente ao provimento de um lugar de professor catedrático, no grupo disciplinar de Física, da Escola de Ciências da Universidade do Minho.
Na data da abertura do procedimento concursal, determinava o art. 40.º do Estatuto da Carreira Docente Universitária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de Novembro, e na redacção então vigente, que poderiam ser opositores a concurso para professor catedrático: "a) Os professores catedráticos do mesmo grupo ou disciplina de outra Universidade ou de análogo grupo ou disciplina de outra escola da mesma ou de diferente Universidade; b) Os professores associados do mesmo grupo ou disciplina ou de análogo grupo ou disciplina de qualquer escola ou departamento da mesma ou de diferente Universidade que tenham sido aprovados em provas públicas de agregação e contem, pelo menos, três anos de efectivo serviço docente na categoria de professor associado ou na qualidade de professor convidado, catedrático ou associado; c) Os professores convidados, catedráticos ou associados, do mesmo grupo ou disciplina ou de análogo grupo ou disciplina de qualquer escola ou departamento da mesma ou de diferente Universidade que tenham sido aprovados em provas públicas de agregação e contem, pelo menos, três anos de efectivo serviço docente como professores ou professores convidados daquelas categorias."
Portanto, à luz das regras de acesso ao procedimento concursal, não se permite que um professor catedrático, do mesmo grupo e disciplina e que leccione na mesma Escola da mesma Universidade concursante se apresente a concurso.
Na situação sob escrutínio, detecta-se que a Exequente, após a abertura de procedimento concursal ocorrida no mesmo mês em que ocorreu a nomeação do Contra-Interessado (Março de 2006), veio a ser provida, mediante Despacho de 5 de Julho de 2007, no lugar de Professora Catedrática no grupo disciplinar de Física da Escola de Ciências da Universidade do Minho.
Em face dessa nomeação, deixou a Exequente de reunir os pressupostos legais que lhe permitiriam ser opositora ao concurso anulado pela sentença em execução e porquanto já se encontrar provida no lugar concursado, lugar este que representa o ponto máximo da carreira de docente universitário.
Nesta medida, o interesse último da Executada derivado da execução do julgado, e que se traduziria na possibilidade de, uma vez retomado o procedimento de concurso, ser provida no lugar de professora catedrática no grupo de Física da Escola de Ciências da Universidade do Minho, já se encontra, nesta medida, satisfeito, por no hiato de tempo entretanto transcorrido, já ter a Autora sido nomeada como professora catedrática nesse exacto grupo disciplinar e estabelecimento de ensino superior.
Tal circunstanciaiismo configura, uma impossibilidade de, no plano dos factos, ser reconstituída a situação que existiria se o procedimento administrativo inicialmente realizado não se mostrasse inquinado pelos vícios que lhe foram detectados e julgados verificados na sentença sob execução.
Efectivamente, e implicando o julgado anulatório o retomar do procedimento de concurso por forma a reconstituir o júri, resultando também da sentença em execução a obrigatoriedade de divulgação atempada dos critérios que servem de parametrização da avaliação dos eventuais concorrentes, dele decorre, no plano prático, o reiniciar de quase todo o procedimento concursal.
Ora, a Autora, por entretanto ter sido provida na categoria de Professora Catedrática, que constitui objecto concurso em causa nos presentes autos, deixou de reunir os requisitos legais que lhe permitiriam apresentar-se como opositora, o que inviabiliza a plena reconstituição da situação que existiria, podendo até, e porventura, equacionar-se a eventual inexistência de um interesse pessoal, directo e legítimo da Autora na integral reconstituição do procedimento concursal, em momento anterior ao do cometimento das ilegalidades declaradas na sentença exequenda.
Nesta última vertente, há que ter em conta que a decisão anulatória que foi proferida absolveu a Executada do pedido de da Autora de ser graduada em primeiro lugar do concurso, pelo que da mesma não emergiu um qualquer direito à nomeação da Autora como professora catedrática, resultando somente a anulação de grande parte do itinerário procedimental, do qual emergiria, para a Autora, a legitima expectativa de, retomado o concurso sem as ilegalidades que lhe foram assinaladas, poder ser nomeada na categoria em causa, tudo num contexto de incerteza derivado do natural mérito e valor em que tradicionalmente se encontram investidos os opositores admitidos a concurso para professor catedrático.
Assim, tendo a Autora porfiado e alcançado a sua nomeação como catedrática da mesma Escola e ramo de saber, pouco mais de um ano volvido do final do procedimento concursal parcialmente anulado, o interesse da Autora na reconstituição in natura do procedimento de concurso resulta, senão prejudicado, pelo menos, em grande medida, mitigado pela nomeação entretanto ocorrida.
(…)»
cfr. decisão de fls. 124 e ss. proc. físico.
2º) - Foram as partes notificadas para, no prazo de 20 dias, acordarem no montante da indemnização devida pelo facto da inexecução – cfr. despacho de fls. 151 proc. físico e ofícios subsequentes.
3º) - A Exequente informou que não ter sido alcançado qualquer acordo, requerendo o prosseguimento dos autos, nos termos e para os efeitos do “disposto no art. 166.º, n.º 2, por remissão do art. 178.º, n.º 2, ambos do C.P.T.A.”, do mesmo passo dando a conhecer a proposta sobre a qual não tinha sido alcançado acordo, feita nos seguinte termos – cfr. fls. 158 proc. físico:
«(…)
Cumpre assim discriminar e fundamentar (sumariamente) as parcelas que devem compor o valor indemnizatório proposto
a) custas de parte (taxas de justiça pagas e honorário)): €5.000,00
b) danos morais: pelos incómoaos resultantes para a a/constituinte de ter que se opor a novo concurso e da perda da chance de naquele concurso puder ter sido provida na categoria pretendida, a que acrescem os efeitos directos académicos no que à precedência /antiguidade (na categoria de professor catedrático) dizem respeito, face a um docente, o candidato provido no concurso impugnado; o julgado anulatório originou a potencial consequência directa da sua nomeação nessa categoria ser nula e sem efeito, e que poderia conduzir na execução do julgado (reconstituição do concurso) à inversão da precedência.
Prospectando, para os anos de vida activa académica da n/ constituinte em que tal precedência (se verificou) se verificará, um dano moral que se quantifica (simbolicamente) em 1500,00/ano*17=€25.500,00
Configura-se assim um valor indemnizatório justo no valor global de €30.500,00 que se propõe à V. superior consideração.
(…)».

4º) - A decisão recorrida atribuiu indemnização por causa legítima de inexecução, considerando que – cfr. fls. 176 e ss. proc. físico:
«(…)
Para este efeito, são as seguintes as circunstâncias que se consideram relevantes para a fixação da indemnização devida pela inexecução da sentença proferida nos autos principais e que resultam do conteúdo da própria sentença:
- Por edital n.º 6/2005, publicado no D.R., II.ª Série de 5 de Janeiro de 2005 foi aberto, pelo reitor da Universidade do Minho, concurso documental para provimento de um lugar de professor catedrático no grupo disciplinar de Física da Escola de Ciências da Universidade do Minho;
- Ao referido concurso foram admitidos todos os candidatos [três], tendo a Autora, ora Exequente, ficado classificada em terceiro lugar;
- Após conclusão do procedimento concursal, o Contrainteressado MIV foi nomeado professor catedrático, por despacho do reitor da Universidade do Minho, datado de 12 de Março de 2006;
- Por despacho do Reitor da Universidade do Minho, datado de 5 de Julho de 2007, e na sequência de concurso, a Exequente foi provida no lugar de professora catedrática no grupo disciplinar de Física, da Escola de Ciências da Universidade do Minho;
No que tange ao montante peticionado pela Exequente a título de custas de parte [taxas de justiça e honorários], no montante de 5.000,00 €, podemos desde já avançar que o mesmo não é devido. Com efeito, como já se referiu supra, no caso de a execução da sentença ser impossível, a indemnização apenas abrange o ressarcimento daqueles danos que, na esfera jurídica do exequente, se produzem em consequência da impossibilidade de obter o cumprimento de tais deveres e que, portanto, não existiriam se eles pudessem ter sido cumpridos; não cobrindo já os eventuais danos que o ato ilegal possa ter causado e que, pela sua natureza, a execução da sentença não teria sido, em qualquer caso, apta a remover, pelo que teriam subsistido mesmo que ela tivesse podido ter lugar [cfr. Mário Aroso de Almeida, Anulação de Actos Administrativo e Relações Jurídicas Emergentes, 2002, pág. 816].
Uma vez que o dano peticionado se verificaria ainda que a sentença pudesse ser integralmente executada, não sendo a respectiva execução apta a removê-los, não pode o mesmo ser incluído na indemnização devida pela inexecução. Neste sentido vide o já citado Acórdão do TCA Sul de 08.09.2011, processo n.º 06762/10.
No que concerne aos demais danos, tendo presente que o direito ao ressarcimento com fundamento em “perda de chance” depende da avaliação que se faça da probabilidade que o lesado teria de alcançar a vantagem económica final que poderia ter sido obtida e atendendo a que foram admitidos 3 candidatos, que o contrainteressado foi nomeado professor catedrático, em 12 de Março de 2006 e a Exequente provida no lugar de professora catedrática no grupo disciplinar de Física, em 5 de Julho de 2007, julga-se equitativa a fixação de indemnização no valor de 4.000,00 € [quatro mil euros].
Em face do exposto condena-se a Universidade do Minho a pagar a MJMG, uma indemnização pela inexecução da sentença proferida nos autos principais no valor de 4.000,00 € [quatro mil euros], acrescida de juros de mora desde a data do trânsito em julgado desta decisão.
(…)».

*
O mérito da apelação
Após processamento que implicou subida dos presentes autos ao STA, baixam agora para decisão do recurso interposto.
Tem por objecto a decisão supra referenciada em 4º) do probatório.
Assente que ocorria causa legítima de inexecução indemnização, e não obtido acordo entre as partes, abalançou-se o tribunal a determinar uma indemnização por equidade.
Nada merece desacordo, salvo o “quantum” alcançado, que a recorrente entende não realizar equidade, e que antes a seu ver melhor obteria tradução compensação em valor de € 25.000, 00.
Vejamos.
Frustrados os fins prosseguidos com execução da sentença de anulação, tal compensação destina-se a ressarcir o exequente apenas do dano que importa essa impossibilidade ou da “expropriação” do direito à execução.
Sob essa égide se percebe que - por fora do círculo de interesses tutelados -, nada a recorrente impugne do decidido quanto à sua pretensão relativamente a custas de parte [taxas de justiça e honorários], no montante de 5.000,00 €, reservando a sua discordância para com a parcela no valor de € 25.000,00, para compensação do que mais serviu à proposta que apresentou e deu a conhecer, resultando muito claramente que o tribunal “a quo” discorreu nessa base, não se compreendendo que agora a recorrente arvore desconhecimento quanto ao que sejam “demais danos”.
E nessa parte, quanto ao que poderia advir de “demais danos”, ponderou o tribunal a “probabilidade que o lesado teria de alcançar a vantagem económica final que poderia ter sido obtida e atendendo a que foram admitidos 3 candidatos, que o contrainteressado foi nomeado professor catedrático, em 12 de Março de 2006 e a Exequente provida no lugar de professora catedrática no grupo disciplinar de Física, em 5 de Julho de 2007”.
O tribunal poderá ter sido “curto” no discurso quanto a esse juízo de probabilidade, mas logo disse ao que atendia, desfilando um elenco de quatro circunstâncias, e já antes tinha avançado atinentes razões – supra transcritas -, aquando do reconhecimento de causa legítima de inexecução, no próprio discurso expressando tratar-se de reafirmação de enunciado aí tido em conta, permitindo estabelecer claro fio de lógica e percepção quanto ao modo como avaliou a probabilidade que cuidou.
Evidencia-se o que o tribunal teve como pressuposto e reflectiu quanto à dita probabilidade, sendo que tal juízo sempre reverte sobre a consequencial e arvorada “precedência académica” em que a recorrente agora coloca acento tónico.
Sem qualquer razão para diferente sentido.
Pois em sede indemnizatória, neste segundo passo, e pese o dever oficioso de impulso, vale princípio do dispositivo, revertendo sobre o interessado, em defesa da pretensão a que entenda ter direito, ónus de alegação e prova dos factos que em prova directa favoravelmente sirvam a extrapolação da conjectura.
E, no caso, na falta de factos índice que diferenciadamente pudessem servir, não se pode apontar uma falta de instrução e prova; e uma que pudesse conduzir a diferente julgamento.
O “barro” que temos em mãos é o que há-de servir.
A lei prevê (art.º 178º do CPTA) um dever objectivo de compensar a perda do efeito repristinatório da sentença anulatória - que implicaria a remoção da situação criada pelo acto anulado (Folgenbeseitigungsanspruch) -, a perda de reconstituição do “status quo ante” com o que isso importaria de vantagem de posição.
Ainda recentemente reafirmou este TCAN, “o entendimento de que se pretende por esta via legal assegurar ao exequente, no âmbito de um processo declarativo simplificado, uma compensação “pelo facto da inexecução”, e apenas por este facto (Ac. TCAN, de 18-03-2016, proc. nº 2567/07.3BEPRT-A).
Não se trata exactamente de uma «indemnização por perda da chance», tal qual a designação surgiu e tem vindo a ser conceptualizada no campo civilístico.
Como refere Vera Eiró, “a «teoria da perda de chance» (nas suas diversas formulações) é a resposta dada, nalguns ordenamentos jurídicos e fundada essencialmente no labor da doutrina e da jurisprudência, aos casos em que, por força de um especial contexto da prática do ato lesivo, não é possível afirmar que os danos verificados não teriam ocorrido não fora a ilegalidade praticada[Responsabilidade civil extracontratual e danos de perda de chancein: “Novos temas da responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas”, ICJP - 05 de Dezembro de 2012 - Coordenação: Carla Amado Gomes e Miguel Assis Raimundo, consultável em versão e-book no sítio «http:// www.icjp.pt/sites/default/files/publicacoes/»].
E, na hipótese, o que há é uma impossibilidade ou “expropriação” do direito, que constitui, de per si, um dano real, autónomo e diferenciado, que importa ser reparado por via indemnizatória e que é uma consequência directa e automática do reconhecimento da existência de causa legítima de inexecução [já no regime do DL n.º 256-A/77, de 17/06, se consagrava preocupação com a existência de “meios adequados a assegurar o perfeito cumprimento dos julgados ou, pelo menos, a efectivar o direito a indemnização substitutiva”, prevendo-se a fixação de indemnização dos prejuízos resultantes do acto anulado pela sentença e da inexecução desta por causa legítima (cfr. artºs. 7º, nº 1, e 10º, nº 1)].
Sem embargo, há uma perda resultante da impossibilidade de extrair as devidas consequências da sentença de anulação, por via da execução, que lhe reporia a “chance”.
Nesse sentido e contexto, ficou a oportunidade perdida, e daí também aqui se falar numa «perda da chance», expressão que tem tido lugar em doutrina e jurisprudência administrativas, e que, embora tenha em dados de equação diferente fenomenologia daquela que tem no direito privado, ganha justificada simpatia de uso.
As características da situação concreta, formatando em que medida se goraram as utilidades que poderiam advir da execução, projectam repercussão na definição da gravidade do dano, contribuindo para a formulação de um juízo de equidade - dentro dos limites do que houver provado -, visto a lei prever essa forma de cálculo da indemnização sempre que não for possível averiguar o valor exacto dos danos (art. 566º/3 do CC).
Sendo feito julgamento segundo a equidade, o tribunal de recurso deve limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, «as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida (cfr. Ac. do STJ, de 17-09-2014, proc. nº 158/05.2PTFUN.L2.S2).
A esta luz, e no que foi ponderação do tribunal “a quo”, não esquecendo o que tem sido jurisprudência desta instância em situações com contornos de similitude, o valor fixado pela primeira instância, afigura-se adequado.
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Pelo exposto, acordam em conferência os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas: pela recorrente.

Porto, 8 de Abril de 2016.
Ass.: Luís Migueis Garcia
Ass.: Esperança Mealha
Ass.: Rogério Martins