Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00402/15.8BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/16/2020
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Helena Canelas
Descritores:REQUALIFICAÇÃO – REAFETAÇÃO – FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO – RECONSTITUIÇÃO
Sumário:I – Resulta do n.º 1 do artigo 257º do LGTFP que a colocação de um trabalhador em requalificação impõe um processo prévio de reafectação.

II – Nos termos do artigo 251º nº 3 da LGTFP o número de postos de trabalho necessários deve ser definido de forma fundamentada.

III – A anulação do processo de requalificação a que o trabalhador foi sujeito confere-lhe o direito à reconstituição da situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, decorrendo a falta de prestação efetiva de trabalho por parte do trabalhador precisamente dessa colocação (ilegal) em situação de requalificação.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP
Recorrido 1:M.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

O INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP réu na ação administrativa especial que contra si foi instaurada em 20/04/2015 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra por M. (devidamente identificada nos autos) – na qual esta impugnou os atos consubstanciados no despacho de 19/12/2014, da autoria do Vogal do Conselho Diretivo do réu, que determinou a sujeição da autora à situação de requalificação, bem como a deliberação de 29/12/2014, da autoria do Conselho Diretivo do réu que aprovou a lista nominativa dos trabalhadores sujeitos a este regime, na qual se inclui a autora, peticionando a condenação do réu a reconhecer a ilegalidade da sua colocação em situação de requalificação, com as legais consequências, nomeadamente procedendo à sua reintegração, mantendo-a no posto de trabalho anterior ao circunstancialismo das listas publicadas, com a mesma categoria profissional e o mesmo vencimento – inconformado com a sentença de 30/01/2019 (fls. 580 SITAF) do Tribunal a quo que julgando procedente a ação, anulou os atos impugnados e condenou o réu a proceder à reintegração da autora, mantendo-a no posto de trabalho anterior à sua colocação em situação de requalificação, com a mesma categoria profissional e o mesmo vencimento, dela interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
1. O presente recurso tem como fundamento a errónea interpretação dos arts. 251.º e segs. da Lei do Trabalho em Funções Públicas, em concreto a suposta aplicabilidade do procedimento contido no artigo n.º 7 do artigo 251º, aos trabalhadores que integravam a carreira Docente/Educador de Infância, a alegada falta de fundamentação atribuída ao estudo de avaliação organizacional e ao mapa comparativo que estearam o processo de requalificação, para efeitos do n.º 2 do artigo 245.º, bem como a forma como é interpretada a eventual reconstituição da situação que existir ia em caso de hipotético provimento do pedido de anulação dos atos administrativos que decidiram o processo de requalificação.
2. Por sentença notificada ao Recorrente em 13 de fevereiro de 2019, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra decidiu julgar procedente a ação, por parcialmente provada, em razão da alegada preterição do procedimento de reafetação, previsto pelo n.º 7 do artigo 251.º, da violação das normas constantes do n.º 2 do artigo 245.º e n.ºs 2 e 3 do artigo 251.º todos da LTFP, no que tange ao conteúdo do Estudo legalmente devido e do mapa comparativo, tendo interpretado o pedido da Autora como um pedido de condenação à prática do ato administrativo legalmente devido, que importaria uma reconstituição total da situação da trabalhadora, por readmissão com efeitos reportados à data da requalificação com direito ao lugar, remuneração, antiguidade e demais consequências legais, relativas à efetividade de funções, apesar de inexistência de sinalagma, de efetividade de funções que justifiquem o pagamento de diferenças de vencimentos – descontando o período de reinício de funções em regime de mobilidade intercarreiras noutra entidade.
3. Inexiste o apontado vício de falta de fundamentação do estudo de avaliação organizacional e do mapa comparativo, vertida nos dois documentos, bastando uma breve leitura do processo instrutor para verificar que tal fundamentação não só se verifica, como é clara como é mais que suficiente, observando escrupulosamente o preceituado no do n.º 2 do artigo 245.º e n.ºs 2 e 3 do artigo 251.º todos da LTFP.
4. No processo instrutor facilmente se constata a impossibilidade do Recorrente reafetar a Recorrida como Docente/Educadora de infância a uma das outras 19 Unidades Desconcentradas, em cumprimento do n.º 1 do art.º 257.º LTFP, pois em todas aquelas foi também identificado um excedente de trabalhadores nas várias carreiras, encontrando-se em curso processos de seleção para a carreira de assistente operacional a nível Nacional e relativamente à carreira docente em apenas em três unidades desconcentradas (Porto, Évora e Castelo Branco) iria ser aplicado, como foi.
5. De facto, quanto aos assistentes operacionais e quanto aos docentes dos Centros Distritais do Porto, Castelo Branco e Évora (onde ainda existem estabelecimentos sob gestão deste Instituto, mas cujo número de colaboradores afetos à carreira Docente, como referido, revelou-se manifestamente excessivo) aplicou-se o processo de seleção dos trabalhadores e consequente requalificação; Quanto aos docentes/educadores de infância do resto do país, deu-se o processo de colocação direta na situação de requalificação, dada a extinção total dos postos de trabalho, em virtude da cedência dos estabelecimentos integrados a entidades privadas de utilidade pública.
6. Resultando claramente do mapa comparativo constante do estudo de avaliação organizacional que as necessidades de pessoal do Recorrente se circunscreviam à carreira Técnico Superior, carreira à qual a Recorrida não pertencia.
7. A reafetação da Recorrida outra das suas Unidades Desconcentradas não constituía, pois, uma possibilidade equacionável, pois estava enquadrada numa carreira extinta em razão da falta de enquadramento prático nas atribuições do ISS.I.P e o processo de racionalização abrangia todas as carreiras do Instituto, à exceção da Técnica Superior
8. É facto que a carreira Docente/ Educador de Infância deixou de ter enquadramento prático nas atribuições do Recorrente e que efetivamente nas demais carreiras existia um excesso de trabalhadores, pelo que o Recorrente desencadeou os mecanismos legais previstos pelos artigos 251º e segs, em concreto no seu n.º3, designadamente no que tange ao “número de postos de trabalho necessários, definido de forma fundamentada” no mapa comparativo, constante do estudo de avaliação organizacional, para promover o ajustamento que se revelava necessário à adequação dos seus quadros de pessoal às necessidades existentes nos seus serviços, através do processo de racionalização de efetivos.
9. O processo de racionalização de efetivos, ao contrário do que é determinado pela sentença recorrida, compreendeu todas as operações necessárias à avaliação dos recursos humanos do serviço, para efeitos de eventual decisão sobre o reconhecimento do seu desajustamento, face a objetivos, atribuições, atividades e necessidades de funcionamento, e consequente reafetação ou colocação em situação de requalificação dos trabalhadores, previstos nos artºs 251° e seguintes da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada em anexo à Lei n ° 35/2014, de 20 de junho.
10. O estudo organizacional identificou objetivamente o número de postos de trabalho necessários, em cumprimento escrupuloso do n.º3 do art.º. 251º da LTFP.
11. O Recorrente, após ter determinado a realização de todas as diligências e operações tendentes à avaliação dos respetivos recursos humanos, face às necessidades de funcionamento dos serviços, e após ter elaborado um estudo de avaliação organizacional, concluiu que o pessoal que lhe era afeto, se encontrava manifestamente desajustado às suas necessidades permanentes e à prossecução dos seus objetivos
12. O desajuste encontrava-se expressivamente refletido no mapa comparativo, entre o número de efetivos existentes e o número de postos de trabalho necessários, para assegurar o real exercício das atribuições e competências do Instituto, (e isto muito tempo depois do que é alegado como fator exógeno do SCORE e do PRACE, ou do GOPRO, que fizeram meras reengenharias de tarefas e objetivos).
13. Foi pois perante a falta de enquadramento nas competências do ISS. I.P, da sua carreira que os Docentes/ Educadores de Infância, onde se inclui a Recorrida, afetos ao Centro Distrital de Coimbra foram diretamente colocados em situação de requalificação
14. Foi sobejamente cumprido o dever de fundamentação quanto ao mapa comparativo e ao estudo de avaliação, previsto pelos artigos 251.º e seguintes da LTFP
15. Não remanescem dúvidas, ao contrário do julgado pelo Tribunal a quo, quanto às razões que fundamentaram a passagem da Recorrente à situação de requalificação, se circunscrevem à falta de enquadramento prático da carreira que integrava nas atribuições do ISS.I.P.
16. Em suma, resultou comprovado o claro desfasamento do pessoal afeto ao ISS, I.P., tal como plasmado nos mapas comparativos, face às necessidades permanentes para a prossecução das respetivas atribuições.
17. Verificado o mapa comparativo correspondente, resulta que existem zero postos de trabalho (seja de que área, carreira, categoria for) a preencher no Centro Distrital de Coimbra, local de trabalho que a lei substantiva define como domicílio profissional e necessário da Recorrida.
18. Inexiste também qualquer vicio de violação de lei decorrente de erro nos pressupostos que determinaram a Requalificação da Recorrida, pois esta assenta numa inexistência prática do enquadramento de atribuições da sua carreira,
19. E, no que tange a eventual reintegração e reconstituição jurídico-laboral, a nossa jurisprudência e doutrina têm-se pronunciado, uniformemente, no sentido de que, na ausência de serviço efetivamente prestado, a Administração não tem o dever de pagar ao funcionário os correspondentes vencimentos ou diferenças salariais, sendo certo que devem ser salvaguardadas as fases que a lei estabeleceu para os trabalhadores em situação de requalificação.
20. Porquanto o direito à remuneração é um direito sinalagmático (que depende diretamente da prestação efetiva de trabalho, salvaguardadas as situações específicas legalmente assinaladas, como sucede no presente caso e de modo faseado).
21. O que nos levará a considerar que, por tudo o quanto foi alegado, a sentença recorrida fez uma interpretação errada da legislação que aplicou, violando-a da forma como a interpretou, pelo que deverá ser revogada.

Termina pugnando pela revogação da sentença recorrida na parte em que declarou a existência dos vícios apontados, ou pelo menos, na parte em que condenou o Réu ISS, IP. ao pagamento dos diferenciais remuneratórios, e absolvição do recorrente de todos os pedidos.

A recorrida contra-alegou defendendo a improcedência do recurso, e requerendo, subsidiariamente, a ampliação da matéria de recurso, ao abrigo do artigo 636º nº 1 do CPC, ex vi o disposto no artigo 1º do CPTA, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos:
I. O Recurso interposto não versa sobre a matéria de facto, pelo que se conclui que não merecem reparo os factos dados como provados, sendo que são esses os factos os que têm de ser tidos em conta na apreciação do mérito da causa.
II. Assim, o Tribunal a quo aplicou corretamente a Lei aos factos dados como assentes e que foram objeto da prova realizada.
III. Impunha-se ao R., a identificação tão objetiva quanto possível da existência dos trabalhadores e dos postos de trabalho, para que fosse dado o devido suporte fático aos atos e procedimentos que a lei manda praticar, incluindo na elaboração do mapa comparativo.
IV. A omissão de referência a tais realidades de acordo com os parâmetros de “avaliação dos recursos humanos do serviço para efeitos de eventual decisão sobre o reconhecimento do seu desajustamento face a objectivos, atribuições, actividades e necessidades de funcionamento, ou da desnecessidade, devidamente fundamentada, da sua desconsideração, enferma os atos administrativos do vício de falta de fundamentação.
V. Não restam dúvidas que o Tribunal a quo fez uma análise crítica e objetiva ao processo instrutor junto, pois não concluiria, como o fez, que o dever de fundamentar o número de postos de trabalho necessários não foi cumprido, porque se desconhece os critérios e procedimentos adotados pelo R. para determinar o concreto número dos postos de trabalho que foram considerados necessários em cada um dos seus serviços, por comparação com o número de postos de trabalho efetivamente existentes e ocupados, para assim se chegar ao número de postos a extinguir, por excessivos.
VI. Em momento algum do procedimento adotado pelo Apelante se perceciona porque razão foram aqueles os postos de trabalho que eram considerados necessários para a prossecução das atribuições do R. e não qualquer outro número inferior ou superior.
VII. É assumido pelo próprio Apelante que se optou por não proceder à abertura do necessário procedimento de reafectação dos docentes/educadores de infância do resto do país, “saltando” para o processo de colocação direta na situação de requalificação, em virtude da cedência dos estabelecimentos integrados a entidades privadas de entidade pública.
VIII. Como resulta da leitura atenta do preceito contido no nº1 do art. 257º da LTFP, a colocação em requalificação, exige sempre, que haja um processo prévio de reafectação, fazendo depender a situação de requalificação da impossibilidade de reafetação.
IX. É imposta uma interpretação sistemática e que se enquadre dentro do espírito normativo do instituto da requalificação, à luz do princípio constitucional da tutela da confiança.
X. É afirmado em sentença proferida pelo TAF de Coimbra, Proc. Nº 358/5.7BECBR, de 22/11/2017, que a requalificação de trabalhadores é a “ultima ratio” apenas admissível quando estiverem todos as fases procedimentais que a antecedem e que tem como objectivo primordial a reafetação daqueles.
XI. Não se viu esgotado o percurso que essa “ultima ratio” exigia, tanto que é o próprio ISS, IP. que reconhece que não foi feita qualquer diligência no sentido da reafetação da A.
XII. De acordo com a interpretação do Apelante, o Tribunal a quo errou ao decidir pela reposição dos vencimentos e outros suplementos a que a Autora teria direito caso se tivesse mantido ao serviço do Apelante.
XIII. Afirmando que a doutrina e jurisprudência se tem pronunciado, uniformemente, no sentido de que, a Administração não tem o dever de pagar ao agente ou funcionário os correspondentes vencimentos ou diferenças salariais, numa situação em que não houve prestação efetiva de trabalho.
XIV. Na verdade, o Apelante vem alegar factum proprium para se eximir ao pagamento das quantias devidas a título de diferenças salariais, parecendo esquecer que ao colocar a A. em situação de requalificação, determinou a impossibilidade do exercício efetivo das correspondentes funções.
XV. O entendimento firmado pela jurisprudência do STA inclina-se no sentido de que com a anulação dos atos praticados pela Administração, deverá esta reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o ato ilegal ou se esse ato tivesse sido praticado sem a ilegalidade que deu causa à anulação por força do princípio da reconstituição da situação hipotética atual) – vide entre outros, o Ac. do Pleno de 08/05/2003 rec. n.º 40821A.
XVI. Embora a jurisprudência do STA, tenha vindo a afastar a aplicação da chamada "teoria do vencimento" naquelas hipóteses em que, não havendo exercício efetivo de funções, surgem, por tal facto, fundadas dúvidas sobre se o interessado, nesse período de tempo, se dedicou a outras atividades remuneradas.
XVII. Certo é que tem vindo a ser acolhida, por este Tribunal Superior, a teoria da indemnização que assegura que os danos morais e patrimoniais decorrentes do afastamento ilegal de funções de que tenha sido alvo um funcionário da Administração Pública, bem como os resultantes do não pagamento dos vencimentos correspondentes ao tempo desse afastamento, têm de ser quantificados à luz desta teoria.
XVIII. Andou bem o Tribunal a quo, ao determinar que o Réu reconstrua todos os efeitos da pronúncia anulatória, compreendendo a readmissão da A. no seu posto de trabalho na mesma carreira e com as mesmas funções e que em resultado do decidido serem pagos os vencimentos e outros suplementos a que teria direito, desde a data da produção de efeitos da sua colocação em situação de requalificação até à data de produção de efeitos da sua readmissão, descontando as remunerações auferidas pela A. com o reinício de funções em regime de mobilidade intercarreiras.
XIX. Subsidiariamente, requer-se a ampliação do objeto do recurso, nos termos do art. 636º do CPC, apenas no caso do recurso interposto pelo Apelante ser julgado procedente, o que se equaciona por cautela de patrocínio, mas não se concede.
XX. Foi entendimento do Tribunal a quo, que atento o princípio da degradação das formalidades essenciais em formalidades não essenciais, nenhuma eficácia invalidante ou anulatória deve ser assacada à não observância de um prazo mais alargado para o exercício daquele direito.
XXI. Face à ausência de factualidade capaz de a justificar, o Tribunal a quo não podia ter decidido a degradação da formalidade em causa, numa formalidade não essencial.
XXII. O legislador não quis deixar à Administração o poder de fixar, casuística ou arbitrariamente, um prazo para os administrados ou outros intervenientes exercerem os seus direitos ou faculdades, sob pena de existir o risco de a Administração, na prática, eliminar ou condicionar abusivamente o exercício desses direitos ou faculdades.
XXIII. Resulta do preceito do art. 71º do anterior CPA, que a Administração apenas podia fixar prazos para os órgãos administrativos – n.º1; para os interessados, não havendo prazo especial, vale o prazo geral de 10 dias – n.º2.
XXIV. E quanto à circunstância de resultar da matéria factual descrita, que houve reuniões prévias com as associações sindicais, onde se adiantou que haveria um processo de requalificação, sendo aquelas convidadas a pronunciarem-se em fase posterior, é um argumento que se revela totalmente inócuo.
XXV. Isto porque a questão não está na necessidade de ouvir as estruturas sindicais – necessidade que o próprio Apelante reconheceu, mas no prazo concedido para o efeito.
XXVI. Não tendo sido invocada qualquer urgência nem vislumbrando nós a urgência que justificasse reduzir o prazo legal de 10 dias para menos de 2 dias, efetivamente, não foi assegurado o objetivo visado pela lei, tendo sido postergado o direito de participação concedido às associações sindicais.
XXVII. A sentença proferida pelo Tribunal a quo, violou assim, as disposições legais contidas nos arts. 101º, 102º aplicáveis ao caso ex vi o artigo 338º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.

Relativamente à requerida ampliação do objeto do recurso, e assegurado o contraditório (cfr. fls. 670 SITAF), não foram apresentadas contra-alegações.

Remetidos os autos a este Tribunal neste, notificada nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º, a Digna Magistrada do Ministério Público não emitiu Parecer.
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Com dispensa de vistos, foram os autos submetidos à Conferência.
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II. DAS QUESTÕES A DECIDIR/DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões do recurso as questões essenciais a decidir são:
- saber se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, de direito, quanto ao juízo de verificação dos dois indicados vícios em que a sentença fundou a anulação dos atos impugnados, a saber o vício de preterição do procedimento de requalificação e de falta de fundamentação, por falta de explicitação das razões que determinaram o número de postos de trabalho necessários - (vide conclusões 1ª a 18ª das suas alegações de recurso);
- saber se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, de direito, quanto à consequente condenação do réu a proceder à reintegração da autora - (vide conclusões 19ª a 21ª das suas alegações de recurso).
Importará ainda, se não se vier a mostrar prejudicado, apreciar a ampliação do objeto do recurso que a recorrida requereu subsidiariamente, para o caso de o recurso interposto do réu vir a ser julgado procedente - (vide conclusões XIX a XXVII das suas contra-alegações).
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III. FUNDAMENTAÇÃO

A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, assim vertida ipsis verbis na sentença recorrida:

1) A A. integra a carreira docente, na categoria de Educadora de Infância, e foi nomeada, por deliberação de 15/06/1999 do Conselho Diretivo do R., para exercer as funções de Educadora de Infância do Quadro de Pessoal do então Centro Regional de Segurança Social de Coimbra, tendo sido afeta, em março de 2010, à Unidade de Desenvolvimento Social e Programas (UDSP) – Núcleo de Infância e Juventude – Setor de Qualificação da Intervenção e Respostas de Acolhimento (EQIRA) para Crianças e Jovens em Perigo, desempenhando as seguintes funções:
- na Equipa de Gestão Centralizada de Vagas, assegura a receção dos pedidos e participa na análise e decisão das instituições de acolhimento e faz o devido encaminhamento;
- elabora e apresenta relatórios anuais de “Caracterização dos pedidos de acolhimento” (anos de 2010 a 2012) referentes ao Centro Distrital de Coimbra;
- no âmbito da CASA (Caracterização Anual do Sistema de Acolhimento), colabora anualmente na recolha e sistematização de dados com o carregamento dos mesmos na aplicação informática da CASA;
- desde janeiro de 2013, acompanha em termos de assessoria técnica os processos de promoção e proteção dos jovens acolhidos na Casa do Gaiato de Miranda do Corvo, nomeadamente na elaboração de relatórios sociais de execução da medida, respetivos planos de intervenção e de cessação de acordo com o Manual ATT (Assessoria Técnica aos Tribunais) no prazo legal;
- em novembro de 2013 passou a ter também funções nas áreas de intervenção do SATT (Setor de Assessoria Técnica aos Tribunais) nos processos tutelares cíveis – Fundo de Garantia de Alimentos, elaborando relatórios sociais para decisão judicial.
(acordo e cfr. doc. de fls. 49 e 50 do suporte físico do processo e doc. de fls. 117 do processo administrativo).

2) Em 04/08/2014 foi elaborado, pelo R., um “Estudo de avaliação organizacional – Processo de racionalização de efetivos”, tendente à avaliação dos respetivos recursos humanos face às necessidades de funcionamento dos serviços, ao qual foi anexo um mapa de pessoal comparativo (cfr. doc. de fls. 20 a 60 do processo administrativo).

3) Do referido estudo consta, além do mais, o seguinte:

Desde a sua criação, em 2001, até à presente data, o ISS, IP tem sofrido alterações estruturais e organizacionais, decorrentes de fatores exógenos e endógenos, com forte impacto nos seus efetivos.
Mais recentemente esses fatores verificaram-se, essencialmente, na área funcional da ação social, especificamente no que respeita aos estabelecimentos integrados, como meio de viabilização de novos caminhos para o desenvolvimento da rede de equipamentos sociais em parceria com outras entidades.
2.1 – Fatores Exógenos
2.1.1. Implementação da descentralização de competências para os municípios no domínio de Ação Social, prevista no artigo 90.º da Lei do Orçamento de estado para 2014, bem como para as IPSS, conforme previsto no Despacho n.º 12154/2013, de 24 de setembro e na Portaria n.º 188/2014, de 18 de setembro – que procede à criação da Rede Local de Intervenção Social (RLIS) – o que conduz, necessariamente, a uma reorganização de serviços, por força da redução de funções;
(…)
2.1.3. Celebração de protocolos de cedência de gestão de estabelecimentos com IPSS, a nível nacional, designadamente, nas valências de creche e jardim de infância e apoio à terceira idade. Este processo encontra-se, ainda, em fase de conclusão, na sequência de procedimento de seleção desenvolvido ao abrigo do Código da Contratação Pública, aprovado por despacho do SESSS de 18/6/2012 com implicações na mobilidade de pessoal e impactos nas necessidades de efetivos e reajustamento de funções mas que possibilitou já a transferência de 35 estabelecimentos para a rede solidária, sendo que se encontravam, à data, a desempenhar funções nos mesmos cerca de 400 trabalhadores que ficaram sem funções atribuídas no ISS porque correspondiam a áreas de trabalho/intervenção inexistentes na estrutura orgânica e na missão dos serviços central e distritais;
2.2. Fatores Endógenos
2.2.1. Assistiu-se a uma simplificação de circuitos/fluxos, face à implementação da reengenharia de processos – SCORE e GOPRO – libertando inúmeras tarefas asseguradas anteriormente por trabalhadores, maioritariamente da carreira de assistente operacional e atualmente desenvolvidas por assistentes técnicos e técnicos superiores, com recurso a aplicações informáticas;
2.2.2. Foi implementado o programa START (…).
2.2.3. Foram acrescentadas alterações tecnológicas, com aumento da informatização dos serviços (…).
2.2.4. Procedeu-se à reorganização interna de unidades orgânicas, com consequente libertação de recursos, agora desajustados. (…)
(…)
3.2. – Carreira Docente
Nos estabelecimentos sob gestão direta do Instituto encontram-se trabalhadores afetos à carreira docente – carreira de educador de infância e docente do ensino básico e secundário – cujo conteúdo funcional é o seguinte: (…).
O número de trabalhadores afetos a esta carreira, nos Centros Distritais do Porto, Castelo Branco e Évora, é manifestamente excessivo, face às atividades prosseguidas pelos únicos estabelecimentos ainda sob a alçada do Instituto.
(…)”

(cfr. doc. de fls. 20 a 35 do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

4) Do mapa de pessoal anexo ao estudo de avaliação organizacional em apreço consta, no que se refere ao Centro Distrital de Coimbra do R., a indicação de zero postos de trabalho necessários (PTN) na carreira docente, por comparação aos seis postos de trabalho ocupados nessa mesma carreira e Centro Distrital (cfr. doc. de fls. 48 do processo administrativo).
5) Em 05/08/2014 o Conselho Diretivo do R., por despacho da sua Presidente, deliberou a submissão do referido estudo à aprovação do membro do governo da tutela, nos termos do n.º 5 do art.º 251.º do anexo à Lei n.º 35/2014, de 20/06, e também à aprovação do membro do Governo responsável pela área das finanças e da administração pública, nos termos do n.º 6 do art.º 255.º do mesmo diploma legal (cfr. doc. de fls. 20 do processo administrativo).

6) Por despacho de 28/09/2014, o Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social aprovou o referido estudo e respetivo mapa comparativo (cfr. docs. de fls. 18 e 19 do processo administrativo).
7) Em outubro de 2014 foram formalmente notificados os sindicatos, em reuniões individuais, do início do processo de requalificação, tendo os mesmos sido informados de que, após obtida a autorização para a proposta do mapa de pessoal e do estudo de base que deu origem ao mesmo pelas entidades competentes, seriam formalmente convidados a pronunciarem-se sobre esta matéria (cfr. doc. de fls. 2 a 4 do processo administrativo).

8) Em 15/10/2014 a Direção-Geral da Administração e do Emprego Público deu parecer favorável acerca do processo de racionalização de efetivos constante do estudo elaborado pelo R. (cfr. doc. de fls. 13 a 17 do processo administrativo).
9) Por despacho de 24/10/2014, o Secretário de Estado da Administração Pública também aprovou o referido estudo, aderindo ao parecer favorável constante da nota n.º 108/SA/2014 (cfr. doc. de fls. 11 e 12 do processo administrativo).

10) Em 04/11/2014 o R. solicitou à Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais, à Frente Sindical da Administração Pública e à Fenprof – Federação Nacional dos Professores, ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do art.º 338.º da LGTFP, a emissão de pronúncia sobre o processo de racionalização de efetivos, as quais deveriam ser remetidas até ao dia 07/11/2014, pelas 16:00 horas, para tanto remetendo-lhes a documentação relativa ao processo em causa (cfr. docs. de fls. 189, 191 e 200 do suporte físico do processo).

11) Em 07/11/2014 a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais enviou ao R. a sua pronúncia, elaborada em 06/11/2014, rejeitando o processo de racionalização de efetivos e requerendo a sua imediata anulação (cfr. doc. de fls. 191, no verso, a 198 do suporte físico do processo).
12) Em 07/11/2014 a Fenprof – Federação Nacional dos Professores também enviou ao R. a sua pronúncia, alegando que a sua auscultação se verificou após a tomada das decisões administrativas por parte das entidades competentes, o que configurava vício de forma do procedimento por violação do princípio da participação das associações sindicais (cfr. doc. de fls. 189 do suporte físico do processo).

13) Em 07/11/2014 a Frente Sindical da Administração Pública enviou ao R. a sua pronúncia, desfavorável ao processo de racionalização de efetivos por este iniciado (cfr. doc. de fls. 200, no verso, e 201 do suporte físico do processo).
14) Em 11/11/2014 o Conselho Diretivo do R. deu início ao processo de racionalização de efetivos através da deliberação n.º 206/2014, da qual resulta, além do mais, o seguinte:

Neste contexto, delibera o Conselho Diretivo e após audição dos sindicatos nos termos do artigo 338.º da LTFP:
1. Determinar, após cumprimento dos artigos 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo, a colocação em situação de requalificação dos trabalhadores, que ocupam os 196 postos de trabalho extintos nos Serviços Centrais, no Centro Nacional de Pensões e nos Centros Distritais, nos termos do mapa comparativo aprovado, referentes às seguintes carreiras especiais e carreiras/categorias subsistentes: - carreira de Enfermagem, carreira de Educador de Infância, carreira de Docente do ensino básico e secundário, carreira de Educador Social, carreira de Técnico de Diagnóstico e Terapêutica, carreira de Técnico de Orientação Escolar, carreira de Técnico Profissional de Reinserção Social, carreira de Auxiliar Técnico de Educação, carreira Médica Hospitalar, Encarregado de Pessoal Auxiliar, Encarregado de Serviços Gerais, Encarregado de Setor e Feitor, conforme descrição constante do anexo I à presente informação.
(…)
4. Notificar os trabalhadores inseridos nas carreiras referidas no ponto 1, devidamente identificados na listagem constante do anexo II da presente deliberação, e consequente colocação em situação de requalificação, por extinção do respetivo posto de trabalho, para efeitos de audiência prévia nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 2.º, conjugado com os artigos 100.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (…)
(cfr. doc. de fls. 5 a 8 do processo administrativo).

15) Em 14/11/2014 a A. foi pessoalmente notificada do seguinte ofício, mais tendo sido informada de que poderia consultar todo o processo na área dos Recursos Humanos do Núcleo de Apoio à Direção do Centro Distrital de Coimbra:

O Instituto da Segurança Social, I.P. (ISS, I.P.) encontra-se em processo de racionalização de efetivos, nos termos dos artigos 251.º e seguintes da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, o que significa equacionar de forma sustentada a viabilidade de manter no mapa de pessoal alguns grupos profissionais que mercê de alteração estrutural substancial, podem revelar-se não necessários.
Ora, há trabalhadores integrados nas carreiras especiais (não revistas) e carreiras/categorias subsistentes, como é o caso de V. Exa., que não têm enquadramento nas atuais competências do ISS, I.P.
Depois de aturado esforço no sentido de serem esgotadas todas as possibilidades, nomeadamente, de reafetação destes trabalhadores, revela-se impraticável a manutenção dos postos de trabalho e é assim que o Conselho Diretivo, pese embora reconheça o forte impacto desta decisão, determina a sua extinção.
Dado que a carreira/categoria, onde V. Exa. se insere, integra aquelas em que se concluiu pela total impossibilidade de colocação noutra área de atuação, não há viabilidade de manter o seu posto de trabalho.
Nesta sequência, notifica-se V. Exa., nos termos e para os efeitos dos artigos 100.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, da sua passagem à situação de requalificação, mecanismo previsto nos artigos 258.º e seguintes da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho
(cfr. docs. de fls. 114 e 115 do processo administrativo).

16) Através de email enviado no dia 14/11/2014, a A. solicitou ao R. o envio do respetivo registo biográfico e cópia do processo individual, incluindo a contratualização de objetivos e avaliação do SIADAP (cfr. doc. de fls. 116 do processo administrativo).

17) Através de requerimento que deu entrada nos serviços do R. em 28/11/2014, a A. exerceu o direito de audiência prévia, requerendo, a final, que o processo de racionalização de efetivos fosse dado sem efeito, mantendo-se a A. no posto de trabalho em que se encontrava integrada (cfr. doc. de fls. 118 a 137 do processo administrativo).
18) Em 19/12/2014 foi elaborada, pelo Núcleo de Apoio Jurídico e de Contencioso do Departamento de Recursos Humanos do R., a informação n.º 1993/2014, na qual foi proposto “que o Conselho Diretivo delibere no sentido da passagem à situação de requalificação da funcionária M., da carreira de Educadora de Infância, na medida em que as alegações apresentadas em nada alteram os factos que conduziram à proposta de decisão, constante da Deliberação n.º 206/2014, de 11.11.2014, e consequentemente deverá manter-se a sua inclusão na lista de pessoal a colocar em situação de requalificação, seguindo-se os demais termos do processo” (cfr. doc. de fls. 145 a 155 do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

19) Da informação aludida no ponto anterior consta, ainda, que “por orientação da DGAEP não foram desenvolvidas as diligências previstas no supra referido artigo [art.º 255.º, n.º 5, da LGTFP], por se entender que o mesmo não era aplicável às situações de extinção de postos de trabalho, uma vez que os trabalhadores aqui enquadrados passam à situação de requalificação sem aplicação de qualquer método de seleção, após cumprimento dos artigos 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo” (cfr. doc. de fls. 145 a 155 do processo administrativo).

20) Em 19/12/2014 o Vogal do Conselho Diretivo do R., L., proferiu o seguinte despacho, exarado sob a informação que antecede: “Concordo com a proposta. Mantenha-se a deliberação de colocação em situação de requalificação” (cfr. doc. de fls. 145 do processo administrativo).
21) Em 19/12/2014 foi elaborada, pelo Departamento de Recursos Humanos do R., a informação n.º 2023/2014, da qual se extrai, além do mais, o seguinte:

(…) o Conselho Diretivo determina, após cumprimento dos artigos 100.º e 101.º do CPA, a colocação em situação de requalificação dos trabalhadores que ocupam os 196 postos de trabalho extintos nos serviços Centrais, no Centro Nacional de Pensões e nos Centros Distritais, nos termos do mapa comparativo aprovado, referentes às carreiras especiais e carreiras/categorias subsistentes de Educador de Infância, carreira Docente do Ensino Básico e Secundário, Educador Social, Técnico de Diagnóstico e Terapêutica.
Todo este universo de trabalhadores foi notificado pelas unidades desconcentradas onde estão afetos, entre o período de 13 a 24 de novembro, onde se foi dado conhecimento do processo, total disponibilidade para consulta de toda a informação existente e concessão do prazo de 10 dias úteis para se pronunciarem;
Centremo-nos na tramitação do processo referente ao pessoal docente – à carreira de Educador de Infância e à carreira de professor:
Dos 120 docentes notificados (114 educadores de infância e 6 professores):
- 115 exerceram o seu direito de pronúncia, conforme mapa anexo, que contém a identificação, por unidade desconcentrada;
- 5 não exerceram o seu direito de pronúncia, devidamente identificados em anexo, também por unidade desconcentrada.
Coube ao DRH a análise de todas essas pronúncias, processo que encerrou pedidos de
elementos para, de forma sustentada, se concluir pela improcedência das alegações proferidas, tendo sido todas elas objeto de despacho de indeferimento do Sr. Vogal do CD, Dr. L., conforme mapa anexo;
Assim, propõe-se:
1 – A aprovação, de imediato, da lista nominativa anexa elaborada nos termos do n.º 2 do artigo 257.º da LTFP, onde constam todos os trabalhadores que serão colocados em situação de requalificação e a data de efeitos;
2 – A sua divulgação quer na Intranet, quer nos locais de estilo;
3 – A notificação dos trabalhadores em conformidade;
4 – A publicitação em Diário da República

(cfr. doc. de fls. 158 a 160 do processo administrativo).

22) Em 29/12/2014 o Conselho Diretivo do R. proferiu despacho de concordância com a informação que antecede (cfr. doc. de fls. 158 do processo administrativo).

23) A A. foi notificada do despacho do Vogal do Conselho Diretivo do R. de 19/12/2014 e da informação n.º 1993/2014 através de e-mail que lhe foi enviado no dia 30/12/2014 (cfr. doc. de fls. 163 do processo administrativo).
24) Através do Aviso n.º 687/2015, publicado em Diário da República, 2.ª Série, n.º 14, de 21/01/2015, foi publicitada a lista nominativa dos trabalhadores a colocar em situação de requalificação cujo posto de trabalho foi objeto de extinção, elaborada de acordo com o n.º 2 do art.º 257.º da LGTFP e aprovada pela deliberação do Conselho Diretivo do R. de 29/12/2014, lista na qual figura a ora A., mais se determinando que a colocação em situação de requalificação produzia efeitos no dia seguinte à data da publicação, data a partir da qual os trabalhadores constantes da lista ficariam afetos ao INA, I.P., entidade gestora do sistema de requalificação, de acordo com o estabelecido no art.º 270.º da LGTFP (cfr. doc. de fls. 165 a 167 do processo administrativo).

25) A A. é associada do Sindicato dos Professores da Zona Centro, que integra a Federação Nacional de Educação (FNE), desde 09/04/2015 (cfr. docs. de fls. 214 e 236, no verso, do suporte físico do processo).
26) A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 20/04/2015 (cfr. doc. de fls. 1 do suporte físico do processo).
27) Desde 21/09/2015 que a A. tem a situação de requalificação suspensa por ter reiniciado funções, em regime de mobilidade intercarreiras, no IEFP, I.P. (cfr. doc. de fls. 220 do suporte físico do processo).
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B – De direito

1. Da decisão recorrida
A sentença recorrida em sede de apreciação de mérito o pedido anulatório dos atos impugnados, enfrentou todos e cada um dos fundamentos de invalidade apontados. Deles apenas julgou verificado o vício de preterição do procedimento de requalificação e de falta de fundamentação por falta de explicitação das razões que determinaram o número de postos de trabalho necessários face às atividades a prosseguir.
E tendo a autora peticionado também que em resultado da eliminação dos atos em crise fosse o réu condenado a proceder à sua reintegração, mantendo-a no posto de trabalho anterior ao processo de requalificação, com a mesma categoria profissional e o mesmo vencimento, também este pedido foi apreciado na sentença, que o julgou procedente, condenando o réu a proceder à reintegração da autora, mantendo-a no posto de trabalho anterior à sua colocação em situação de requalificação, com a mesma categoria profissional e o mesmo vencimento, com todas as consequências legais.

2. Da tese do recorrente
O réu imputa erro de julgamento, de direito, seja quanto ao juízo de verificação dos dois indicados vícios em que a sentença fundou a anulação dos atos impugnados (vide conclusões 1ª a 18ª das suas alegações de recurso), seja quanto à consequente condenação do réu a proceder à reintegração da autora (vide conclusões 19ª a 21ª das suas alegações de recurso), pugnando pela sua revogação, com total improcedência da ação.

3. Da análise e apreciação do recurso
3.1 Do erro de julgamento apontado ao juízo de verificação dos vícios de preterição do procedimento de requalificação e de falta de fundamentação por falta de explicitação das razões que determinaram o número de postos de trabalho
3.1.1 A sentença enfrentado o invocado vício de preterição do procedimento de requalificação, julgou-o verificado, pelos seguintes fundamentos, assim nela externados, e que se passam a transcrever:
«Da preterição do procedimento de requalificação:
Defende a A. que os art.°s 251.º e seguintes da LGTFP estabeleceram a tramitação do processo de requalificação, no qual se inclui obrigatoriamente um processo de seleção de trabalhadores através dos métodos de avaliação do desempenho e avaliação de competências profissionais, exigindo, em primeiro lugar, uma fase de reafetação, que não ocorreu no procedimento em apreço, pois que a A. transitou diretamente para a situação de requalificação.
O R. contesta no sentido de que o processo de colocação direta da A. na situação de requalificação se ficou a dever à extinção total do respetivo posto de trabalho, uma vez que a carreira docente/educador de infância deixou de ter enquadramento nas atuais competências do R. em virtude da cedência dos estabelecimentos integrados a entidades privadas de utilidade pública, tendo-se revelado impraticável a manutenção dos postos de trabalho daquelas carreiras. Conclui, por isso, que o processo de seleção previsto nos art.°s 251.º e seguintes da LGTFP constituiria um ato inútil e virtualmente impossível, dado estar em causa a total extinção dos postos de trabalho afetados, pelo que seria despiciente a promoção de um processo de seleção de colaboradores com vista à sua reafetação a postos de trabalho que deixaram de existir no R. Julgamos, porém, que a razão está do lado da A.
Vejamos, antes de mais, ainda que sucintamente, o quadro legal aplicável.
Estabelece o art.º 251.º da LGTFP que “o processo de reafetação de trabalhadores ou colocação em situação de requalificação inicia-se com a entrada em vigor do diploma orgânico do serviço integrador ou com o ato que procede à reorganização de serviços ou à racionalização de efetivos” (n.º 1). Em seguida, “o dirigente máximo do serviço, ouvido o dirigente máximo do serviço extinto por fusão ou reestruturado, nas situações aplicáveis, elabora um mapa comparativo entre o número de efetivos existentes no órgão ou serviço e o número de postos de trabalho necessários para assegurar a prossecução e o exercício das atribuições e competências e para a realização de objetivos” (n.º 2). Ora, “quando o número de postos de trabalho necessários para assegurar a prossecução e o exercício das atribuições e competências e para a realização de objetivos seja inferior ao número de efetivos existentes no órgão ou serviço, há lugar à aplicação do disposto nos artigos 252.º e seguintes, sem prejuízo do disposto no número seguinte” (n.º 8), segundo o qual, “sendo excessivo o número de trabalhadores em funções, o órgão ou serviço começa por promover as diligências legais necessárias à cessação dos vínculos de emprego público a termo de que não careça” (n.º 9) (sublinhado e negrito nosso).
Dispõe o art.º 252.º da LGTFP, sob a epígrafe “Métodos de seleção”, que, “para seleção dos trabalhadores a reafetar na sequência de qualquer dos processos de reorganização de serviços ou racionalização de efetivos, aplica-se um dos seguintes métodos: a) avaliação do desempenho; b) avaliação de competências profissionais” (n.º 1). Esta fase de seleção “é aberta por despacho do dirigente responsável pelo processo de reorganização, o qual fixa o universo de trabalhadores a serem abrangidos e o seu âmbito de aplicação por carreira e por área de atividade, nível habilitacional ou área de formação e área geográfica, bem como os prazos para a sua condução e conclusão, sendo publicitado em locais próprios do serviço onde os trabalhadores exerçam funções” (n.º 4). E, “fixados os resultados finais da aplicação dos métodos de seleção, são elaboradas listas nominativas, por ordem decrescente de resultados” (n.º 5).
Já segundo o art.º 255.º da LGTFP, “terminado o processo de seleção dos trabalhadores a reafetar ao serviço integrador, existindo postos de trabalho vagos naquele serviço integrador que não devam ser ocupados por reafetação, o dirigente responsável pelo processo procede a novo processo de seleção para a sua ocupação, de entre trabalhadores não reafetos através do processo regulado nos artigos anteriores” (n.º 1). Para este efeito, “os universos são definidos por postos de trabalho, a que corresponde uma carreira, categoria, área de atividade, bem como habilitações académicas ou profissionais, quando legalmente possível, sendo os restantes trabalhadores cuja carreira, categoria e habilitações corresponda àqueles requisitos, selecionados segundo critérios objetivos, considerando, designadamente, a experiência anterior na área de atividade prevista para o posto de trabalho e, ou, a antiguidade na categoria, carreira e exercício de funções públicas” (n.º 2). Neste cenário, “esgotadas as possibilidades de atribuição de postos de trabalho nos termos dos números anteriores, os trabalhadores que excederem os postos de trabalho disponíveis mantêm-se na correspondente lista nominativa, para efeitos do disposto no artigo 257.º” (n.º 4), sem esquecer que, “no momento que antecede a aplicação do disposto no artigo 257.º, o dirigente responsável deve desenvolver as diligências que considerar adequadas para colocação em outro órgão ou serviço do respetivo ministério dos trabalhadores a que se refere o número anterior” (n.º 5) (sublinhado nosso).
Por seu turno, prevê o art.º 256.º da LGTFP que “a reafetação consiste na integração de trabalhador noutro órgão ou serviço, a título transitório ou por tempo indeterminado” (n.º 1), a qual “segue a ordem constante das listas nominativas elaboradas na sequência dos resultados finais da seleção, quando aplicável, de forma que o número de efetivos que sejam reafetos corresponda ao número de postos de trabalho identificados” (n.º 2).
Por fim, estipula o art.º 257.º da LGTFP que “os trabalhadores não reafetos são colocados em situação de requalificação”, a qual se faz “por lista nominativa que indique a categoria, escalão, índice ou posição e nível remuneratórios detidos pelos trabalhadores, aprovada por despacho do dirigente máximo responsável pelo processo de reorganização, a publicar na 2.ª série do Diário da República” e que “produz efeitos à data da reafetação dos restantes trabalhadores ao serviço integrador” (n.ºs 1, 2 e 3). Ora, “concluído o processo de extinção, o membro do Governo responsável pela área da Administração Pública aprova, por despacho publicado na 2.ª série do Diário da República, a lista nominativa dos trabalhadores que, não tendo obtido colocação durante o período de mobilidade voluntária, nem se encontrando em situação transitória, são colocados em situação de requalificação” (n.º 4).
Na presente situação, temos que a A. foi devidamente considerada e incluída na carreira de Educadora de Infância.
Segundo alega o R., porém, não existiria qualquer posto de trabalho necessário correspondente à referida carreira, por esta ter deixado de ter enquadramento nas suas atuais competências. Por isso, na perspetiva do R., não teria de haver lugar à aplicação dos métodos de seleção para efeitos do previsto no n.º 8 do art.º 251.º e no n.º 5 do art.º 255.º da LGTFP, uma vez que não estaria em causa a existência de um excesso de pessoal para os lugares existentes, mas antes a existência de pessoal não enquadrável em qualquer lugar previsto no quadro. Assim, não teria de haver lugar a um procedimento de reafetação, podendo os efetivos não enquadráveis em qualquer quadro passar, desde logo, para a fase ulterior de requalificação (cfr. ponto 19 dos factos provados).
Esta argumentação do R., todavia, não se pode aceitar.
Isto porque a colocação em requalificação exige sempre, como resulta de uma leitura atenta do n.º 1 do art.º 257.º do LGTFP, que haja um processo prévio de reafetação. Na verdade, a apontada norma faz claramente depender a situação de requalificação da impossibilidade de reafetação, no mesmo ou em outro serviço, ou seja, sem esta não se pode dar aquela. Aliás, para além do argumento literal interpretativo daquela norma, impõe-se uma interpretação sistemática e que se enquadre dentro do espírito normativo do instituto da requalificação, à luz do princípio constitucional da tutela da confiança. Se atendermos a todo o quadro normativo aplicável, vemos que a requalificação de trabalhadores é uma medida de ultima ratio, apenas admissível quando se mostrarem esgotados os passos procedimentais que necessariamente a antecedem e que visam, sobretudo, a reafetação desses trabalhadores.
Sucede que, no caso dos autos, e como o próprio R. reconhece (cfr. ponto 19 dos factos provados), não foi feita qualquer diligência no sentido da reafetação da A. noutro serviço do R. ou até do Ministério que o tutela, tendo, pelo contrário, a A. sido imediatamente colocada em situação de requalificação, após cumprimento da formalidade de audiência prévia, ao arrepio da tramitação legalmente prevista.
Não foi, assim, esgotado o percurso que a tomada daquela medida de ultima ratio, a requalificação, sempre exigia.
Termos em que procede o vício em apreciação.»
3.1.2 E quanto ao invocado vício de falta de fundamentação por falta de explicitação das razões que determinaram o número de postos de trabalho, que a sentença igualmente julgou verificado, nela externou-se o seguinte, que se passa a transcrever:
«(…) refere a A. que não se vislumbra a explicitação das razões que permitiram a determinação do número de postos de trabalho necessários face às atividades a prosseguir, identificando cada um deles cabalmente, bem como não houve a ponderação de uns e outros com as disponibilidades orçamentais existentes, pelo que enferma o ato do vício de falta de fundamentação. Acrescenta que esta omissão de fundamentação dos postos de trabalho necessários, incluindo a falta de estabelecimento do nexo entre estes e as necessidades e disponibilidades orçamentais existentes, inquina todo o procedimento.
E tem a A. razão.
Estabelece o art.º 251.º da LGTFP (relembrando) que “o processo de reafetação de trabalhadores ou colocação em situação de requalificação inicia-se com a entrada em vigor do diploma orgânico do serviço integrador ou com o ato que procede à reorganização de serviços ou à racionalização de efetivos” (n.º 1). Em seguida, “o dirigente máximo do serviço, ouvido o dirigente máximo do serviço extinto por fusão ou reestruturado, nas situações aplicáveis, elabora um mapa comparativo entre o número de efetivos existentes no órgão ou serviço e o número de postos de trabalho necessários para assegurar a prossecução e o exercício das atribuições e competências e para a realização de objetivos” (n.º 2). Por sua vez, “o número de postos de trabalho necessários é definido de forma fundamentada e em conformidade com as disponibilidades orçamentais existentes” (n.º 3) (sublinhado e negrito nosso).
No caso em apreço, analisado o estudo de avaliação organizacional e o mapa comparativo anexo, elaborados pelo R., constata-se que, como defende a A., este dever de fundamentar o número de postos de trabalho necessários não foi cumprido, porque nada se sabe quanto aos critérios e procedimentos adotados pelo R. para determinar o concreto número dos postos de trabalho que foram considerados necessários em cada um dos seus serviços, por comparação com o número de postos de trabalho efetivamente existentes e ocupados, para assim se chegar ao número de postos a extinguir, por excessivos. De facto, compulsado o teor dos referidos documentos, dos mesmos não se retira qualquer explicação do modo como se apuraram os números dos postos de trabalho que eram considerados necessários à prossecução das atribuições do R. (cfr. pontos 2, 3 e 4 dos factos provados).
Sabe-se, apenas, quais os fatores (endógenos e exógenos) que estiveram na base da decisão de se dar início ao processo de racionalização de efetivos. No entanto, uma coisa é fundamentar o ato que procede à reorganização de serviços ou à racionalização de efetivos, outra coisa é fundamentar, como exige expressamente o n.º 3 do art.º 251.º da LGTFP, a definição do número de postos de trabalho necessários para assegurar a prossecução e o exercício das atribuições e competências e para a realização de objetivos da entidade, o que passa, naturalmente, pela explicitação dos critérios que presidiram ao apuramento desse número, por exemplo, através da aferição das concretas tarefas que em cada um dos serviços abrangidos são levadas a cabo e do volume de trabalho em cada um deles existente, em função das características de cada serviço.
Exigência que, portanto, não foi observada no caso concreto, pelo que procede o vício em análise.»
3.1.3 As questões aqui trazidas não são novas e têm vindo a ser resolvidas uniforme e reiteradamente pela jurisprudência, incluindo a deste TCA Norte, em sentido concordante com a sentença recorrida.
Seja quanto ao entendimento de que por força do disposto nos artigos 251º a 257º do LGTFP (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei nº 35/2014, de 20 de junho) que estabelecem a tramitação do processo de requalificação, a colocação de trabalhadores em requalificação exige sempre a observância do processo prévio de reafectação, nos termos ali previstos.
Seja quanto ao dever de fundamentar, nesse procedimento, o número de postos de trabalho necessários.
Entendimento jurisprudencial que se mostra refletido nos seguintes acórdãos deste TCA Norte, todos disponíveis in, www.dgsi.pt/jtcn:
- Acórdão de 30/11/2017, Proc. nº 00463/15.0BECBR, em que se sumariou, entre o demais, que: «(…) 3 – Não se mostra adequadamente fundamentada uma decisão da Administração que a propósito da escolha dos trabalhadores que integrarão a situação de requalificação, estipula o número dos trabalhadores que terão de permanecer ao serviço, sem que se percecione por que razão é aquele o número de trabalhadores necessários, e não qualquer outro, superior ou inferior. (…)»;
- Acórdão de 12/01/2018, Proc. nº 00455/15.9BECBR, em que se sumariou, entre o demais, o seguinte: «1 — Não se mostra adequadamente fundamentada decisão da Administração que no âmbito do processo de escolha dos trabalhadores que integrarão a situação de requalificação, estipula o número dos trabalhadores que terão de permanecer ao serviço, sem que se percepcione por que razão é aquele o número de trabalhadores necessários, e não qualquer outro. (…)»;
- Acórdão de 28/06/2018, Proc. nº 00358/15.7BECBR, em que se sumariou, entre o demais, o seguinte: «(…) 2 – A colocação de um trabalhador em requalificação, como resulta do n.º 1 do art.º 257.º do LGTFP, impõe que haja um processo prévio de reafectação. Com efeito, o referido normativo faz depender a requalificação da impossibilidade de reafectação, o que sempre terá de ser confirmado»;
- Acórdão de 12/07/2018, Proc. nº 01196/15.2BEPRT, em que se sumariou, entre o demais, o seguinte: «(…) 2 – A colocação de um trabalhador em requalificação, como resulta do n.º 1 do art.º 257.º do LGTFP, impõe que haja um processo prévio de reafectação. Com efeito, o referido normativo faz depender a requalificação da impossibilidade de reafectação, o que sempre terá de ser confirmado.»;
- Acórdão de 23/11/2018, Proc. nº 00473/15.7BECBR, em que se sumariou, entre o demais, o seguinte: «(…) 3 – Não se mostra adequadamente fundamentada uma decisão da Administração que a propósito da escolha dos trabalhadores que integrarão a situação de requalificação, estipula o número dos trabalhadores que terão de permanecer ao serviço, sem que se percecione por que razão é aquele o número de trabalhadores necessários, e não qualquer outro, superior ou inferior. (…)»;
- Acórdão de 07/12/2018, Proc. nº 00379/15.0BECBR, em que se sumariou, entre o demais, que: «(…) 2 – A colocação de um trabalhador em requalificação, como resulta do n.º 1 do art.º 257.º do LGTFP, impõe que haja um processo prévio de reafectação. Com efeito, o referido normativo faz depender a requalificação da impossibilidade de reafectação, o que sempre terá de ser confirmado»;
- Acórdão de 23/05/2019, Proc. nº 00462/15.1BECBR, em que se sumariou, entre o demais, o seguinte: «I - Entendeu o Tribunal a quo que os actos impugnados padecem de três vícios: violação de lei - violação dos artigos 33º/1/alínea d) e 251º/3, da LGTFP, bem como da tramitação prevista nos artigos 251º e segs. daquele diploma legal - e de um vício de forma por falta de fundamentação; I.1-começando por este último salta à vista que os actos impugnados não cumprem o dever de fundamentação que decorre do Código do Procedimento Administrativo; I.2-sobre a Administração recai o dever de, por forma clara e acessível, dar a conhecer aos destinatários dos actos administrativos os motivos por que decide num determinado sentido e não noutro; I.3-o ora Recorrente fez tábua-rasa do artigo 251º/3 da LGTFP, na medida em que não se percebe quais as razões que levam a que tenha considerado não serem necessários certos números de certas carreiras e não outros números de outras carreiras; I.4-já no que tange à violação do artigo 33º/1/alínea d) é também acertada a interpretação feita pelo Tribunal; a participação efectiva de uma associação sindical pressupõe um prazo razoável para o efeito, sendo que aquele que foi concedido - 7 dias - é manifestamente exíguo para tal propósito; I.5-já quanto à violação do artigo 257º/1 da LGTFP é notório que não houve, por parte do Recorrente, qualquer tentativa no sentido de reafectar a associada do Recorrido; (…)»;
- Acórdão de 15/11/2019, Proc. nº 00457/15.5BECBR, em que se sumariou que: «1 – Não se mostra adequadamente fundamentada uma decisão da Administração que a propósito da escolha dos trabalhadores que integrarão a situação de requalificação, estipula o número dos trabalhadores que terão de permanecer ao serviço, sem que se percecione por que razão é aquele o número de trabalhadores necessários, e não qualquer outro, superior ou inferior. 2 – A colocação de um trabalhador em requalificação, como resulta do n.º 1 do art.º 257.º do LGTFP, impõe que haja um processo prévio de reafectação.
Com efeito, o referido normativo faz depender a requalificação da impossibilidade de reafectação, o que sempre terá de ser confirmado.
»;
- Acórdão de 29/11/2019, Proc. nº 00459/15.1BECBR, em que se sumariou o seguinte: «I- O dever de fundamentação cumpre-se sempre que o discurso justificativo da decisão administrativa seja apto a realizar aquele esclarecimento. II- Dentro deste parâmetro, não se deteta nenhum erro de julgamento da sentença recorrida que julgou verificado o vício de falta de fundamentação do ato impugnado, pois fica-se sem perceber qual o critério e os elementos que serviram de base para fixar o número de 23 técnicos operacionais [dos 51 existentes] como sendo os necessários para o Centro Distrital de Aveiro, e não qualquer outro número de quaisquer outras carreiras, o que o Tribunal a quo cuidou de assinalar eficazmente com reporte para os elementos documentais postos à sua disposição»;
- Acórdão de 13/12/2019, Proc. nº 00473/15.7BEAVR, em que se sumariou, entre o demais, o seguinte: «(…) II- O instituto da requalificação previsto no artigo 251º da LFTP depende, em primeiro lugar, do despoletar de um procedimento de racionalização mediante o qual se conclua pelo irrazoabilidade na gestão da estrutura de recursos humanos [desajustamento face às necessidades da entidade pública] e, em segundo lugar, apenas quando, no âmbito desse procedimento, não tenha sido possível proceder à legal reafetação dos trabalhadores excedentários. III- A fase prévia de reafetação dos trabalhadores excedentários é uma fase obrigatória do procedimento de reafetação, não podendo ser preterida com fundamento na extinção do posto de trabalho do funcionário a requalificar»;
- Acórdão de 29/05/2020, Proc. nº 1245/15.4BEPRT, em que se sumariou, entre o demais, o seguinte: «(…) 3-Não está fundamentado o relatório que serviu de base à requalificação das associadas do autor, quando dele não constam as razões pelas quais se chegou a um concreto número de postos de trabalho necessários, indicado no mapa comparativo. 4- A anulação do processo de requalificação a que foram sujeitas as associadas do autor, confere-lhes o direito a exigir da Administração a reconstituição da situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado.»;
- Acórdão de 15/07/2020, Proc. nº 00262/15.9BEAVR, em que se sumariou o seguinte: «1 – Não se mostra adequadamente fundamentada uma decisão da Administração que a propósito da escolha dos trabalhadores que integrarão a situação de requalificação, estipula o número dos trabalhadores que terão de permanecer ao serviço, sem que se percecione por que razão é aquele o número de trabalhadores necessários, e não qualquer outro, superior ou inferior. 2 – A colocação de um trabalhador em requalificação, como resulta do n.º 1 do art.º 257.º do LGTFP, impõe que haja um processo prévio de reafectação. Com efeito, o referido normativo faz depender a requalificação da impossibilidade de reafectação, o que sempre terá de ser confirmado.».

Jurisprudência que também foi seguida nos recentes acórdãos deste TCA Norte de 02/10/2020, proferidos nos Procºs nº 456/15.7BECBR e 465/15.6BECBR (ainda inéditos).
3.1.4 E convocando a situação dos autos o mesmo quadro normativo e não existindo quaisquer motivos para dela dissentirmos, esse entendimento deve, também aqui, ser por nós reiterado.
3.1.5 Aliás, as circunstâncias dos presentes autos são em tudo idênticas, nomeadamente, às verificadas nos Procs. nº 358/15.7BECBR e nº 379/15.0BECBR e decididas nos já supra referidos acórdãos deste TCA Norte de 28/06/2018 e de 07/12/2018, respetivamente.
3.1.6 Com efeito, tal como ali, também a autora estava integrada na carreira docente, na categoria de Educadora de Infância, pertencendo ao Quadro de Pessoal do então Centro Regional de Segurança Social de Coimbra. Em março de 2010 foi à Unidade de Desenvolvimento Social e Programas (UDSP) – Núcleo de Infância e Juventude – Setor de Qualificação da Intervenção e Respostas de Acolhimento (EQIRA) para Crianças e Jovens em Perigo, desempenhando as seguintes funções: - na Equipa de Gestão Centralizada de Vagas, assegura a receção dos pedidos e participa na análise e decisão das instituições de acolhimento e faz o devido encaminhamento; - elabora e apresenta relatórios anuais de “Caracterização dos pedidos de acolhimento” (anos de 2010 a 2012) referentes ao Centro Distrital de Coimbra; - no âmbito da CASA (Caracterização Anual do Sistema de Acolhimento), colabora anualmente na recolha e sistematização de dados com o carregamento dos mesmos na aplicação informática da CASA; - desde janeiro de 2013, acompanha em termos de assessoria técnica os processos de promoção e proteção dos jovens acolhidos na Casa do Gaiato de Miranda do Corvo, nomeadamente na elaboração de relatórios sociais de execução da medida, respetivos planos de intervenção e de cessação de acordo com o Manual ATT (Assessoria Técnica aos Tribunais) no prazo legal; - em novembro de 2013 passou a ter também funções nas áreas de intervenção do SATT (Setor de Assessoria Técnica aos Tribunais) nos processos tutelares cíveis – Fundo de Garantia de Alimentos, elaborando relatórios sociais para decisão judicial.
E foi na sequência do então denominado “Estudo de avaliação organizacional – Processo de racionalização de efetivos”, tendente à avaliação dos respetivos recursos humanos face às necessidades de funcionamento dos serviços, elaborado em 04/08/2014 pelo réu INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP (vertido em 3) do probatório), em cujo mapa de pessoal anexo consta, no que se refere ao Centro Distrital de Coimbra do R., a indicação de zero postos de trabalho necessários (PTN) na carreira docente, por comparação aos seis postos de trabalho ocupados nessa mesma carreira e Centro Distrital, que veio a ser aprovado por despacho de 28/09/2014, do Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, que o Conselho Diretivo do INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP tomou a deliberação n.º 206/2014, de 11/11/2014 pela qual determinou que, após cumprimento dos artigos 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo, se procedesse à colocação em situação de requalificação dos trabalhadores, que ocupam os 196 postos de trabalho extintos nos Serviços Centrais, no Centro Nacional de Pensões e nos Centros Distritais, nos termos do mapa comparativo aprovado. E foi após as formalidades de audiência prévia dos visados, entre os quais a autora, que foi elaborada em 19/12/2014 a informação n.º 1993/2014, do Núcleo de Apoio Jurídico e de Contencioso do Departamento de Recursos Humanos do réu, na qual foi proposto que o Conselho Diretivo deliberasse no sentido da passagem à situação de requalificação da autora, mantendo-se a sua inclusão na lista de pessoal a colocar em situação de requalificação, e na qual se consignou ainda que por orientação da DGAEP não foram desenvolvidas as diligências previstas no art.º 255.º, n.º 5, da LGTFP por se entender que o mesmo não era aplicável às situações de extinção de postos de trabalho, uma vez que os trabalhadores aqui enquadrados passam à situação de requalificação sem aplicação de qualquer método de seleção, informação sobre a qual recaiu o despacho de concordância de 19/12/2014 do Vogal do Conselho Diretivo do INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP. Tendo, então, sido elaborada a informação n.º 2023/2014, de 19/12/2014 do Departamento de Recursos Humanos do réu, propondo a aprovação, de imediato da lista nominativa em que constam todos os trabalhadores que serão colocados em situação de requalificação, em que consta a autora, sobre a qual recaiu a deliberação de concordância do Conselho Diretivo do INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP de 29/12/2014.
3.1.6 Ora, já se disse no acórdão deste TCA Norte de 07/12/2018, Proc. 379/15.0BECBR, reiterando-se o acórdão de 28/06/2018, Proc. nº 358/15.7BECBR que no procedimento que conduziu àquela deliberação de 29/12/2014 do Conselho Diretivo do INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP, que colocou a autora, a par do/as demais trabalhador/as ali identificado/as, em situação de requalificação, foi ilegalmente preterida a fase de reafectação, dizendo-se a tal respeito o seguinte: “Entende o Recorrente quanto ao aspeto em análise que a atuação do ISS, IP., ao longo do processo de racionalização de efetivos, sempre se pautou pela retidão e legalidade, com o objetivo de adequar as funções efetivamente desempenhadas pelos colaboradores às suas verdadeiras carreiras e categorias e pondo, assim, cobro a situações injustas e abusivas e corrigir erros cometidos no passado, por forma a permitir a reafectação de alguns trabalhadores em organismos, onde o Estado efetivamente deles necessite. A aqui Recorrente foi considerada na carreira de Educador de Infância, sendo que, de acordo com a Recorrente inexistiria no Centro Distrital de Coimbra qualquer posto de trabalho correspondente à referida carreira, em face do que não teria que haver lugar à aplicação dos métodos de seleção previstos no n.º 8 do art.º 251.º da LGTFP. Mais entende a Recorrente que não estando em causa a existência de excesso de pessoal para os lugares existentes, mas antes a existência de pessoal não enquadrável em qualquer lugar previsto no quadro, não teria que haver lugar à fase de reafectação, podendo-se passar desde logo para a fase da requalificação. Nada mais errado. Com efeito, a colocação em requalificação, como resulta do n.º 1 do art.º 257.º do LGTFP, impõe que haja um processo prévio de reafectação.
Com efeito, o referido normativo faz depender a requalificação da impossibilidade de reafectação, o que sempre terá de ser confirmado. Atento o quadro normativo vigente, a Requalificação de trabalhadores é o fim de linha, adotável, esgotados que estejam os precedentes mecanismos procedimentais, mormente a reafectação. Aliás, é o próprio ato objeto de impugnação que reconhece que não foi feita qualquer diligência no sentido da reafectação da aqui Recorrida a qualquer noutro serviço no âmbito do Ministério em que se insere, o que desde logo se consubstancia na confissão de que não estariam esgotados os demais degraus procedimentais a percorrer.
3.1.7 Ora, a sentença recorrida fez um correto ajuizamento ao assim entender também, à luz do quadro normativo aplicável, que convocou e percorreu. Mostrando-se concordante com a jurisprudência deste Tribunal.
3.1.8 O que também se verifica quanto ao vício de falta de fundamentação, por falta de explicitação das razões que determinaram o número de postos de trabalho necessários, à luz da jurisprudência deste Tribunal já supra citada.
3.1.9 Sendo que, como resulta claramente do disposto no artigo 251º nº 3 da LGTFP que o número de postos de trabalho necessários “…é definido de forma fundamentada e em conformidade com as disponibilidades orçamentais existentes.”
3.1.10 Ora, no caso em apreço, analisado o estudo de avaliação organizacional e o mapa comparativo anexo (vide pontos 2), 3) e 4) do probatório), constata-se que este dever de fundamentar o número de postos de trabalho necessários não foi cumprido, nada se sabendo, por falta de explicitação, mínima que fosse, quanto aos critérios que conduziram à determinação do concreto número dos postos de trabalho que foram considerados necessários em cada um dos seus serviços, por comparação com o número de postos de trabalho existentes e ocupados, não se retirando qualquer explicação do modo como se apuraram os números dos postos de trabalho que eram considerados necessários à prossecução das atribuições. Sabe-se, apenas, como foi referido na sentença recorrida, quais os fatores, endógenos e exógenos, que estiveram na base da decisão de se dar início ao processo de racionalização de efetivos, mas nada é dito quanto à definição do número de postos de trabalho necessários para assegurar a prossecução e o exercício das atribuições e competências e para a realização de objetivos da entidade, o que passa, naturalmente, pela explicitação dos critérios que presidiram ao apuramento desse número. Não foi, assim, no caso, observada a exigência de fundamentação prevista no artigo 251º nº 3 da LGTFP.
3.1.11 Pelo que também neste aspeto andou bem a sentença.
Não colhe, pois, o recurso, nesta parte.
Devendo, por conseguinte, manter-se a decidida anulação dos atos impugnados com fundamento na verificação destes dois indicados vícios.
O que se decide.

3.2 Do erro de julgamento apontado à condenação do réu a proceder à reintegração da autora mantendo-a no posto de trabalho anterior à sua colocação em situação de requalificação, com a mesma categoria profissional e o mesmo vencimento
3.2.1 A sentença recorrida, enfrentando o pedido também formulado pela autora, que em resultado da eliminação dos atos impugnados fosse o réu condenado a proceder à sua reintegração, mantendo-a no posto de trabalho anterior ao processo de requalificação, com a mesma categoria profissional e o mesmo vencimento, julgou-o procedente.
3.2.2 Propugna o recorrente que no que tange a eventual reintegração e reconstituição jurídico-laboral na ausência de serviço efetivamente prestado, a Administração não tem o dever de pagar ao funcionário os correspondentes vencimentos ou diferenças salariais, sendo certo que devem ser salvaguardadas as fases que a lei estabeleceu para os trabalhadores em situação de requalificação na medida em que o direito à remuneração é um direito sinalagmático (que depende diretamente da prestação efetiva de trabalho, salvaguardadas as situações específicas legalmente assinaladas, como sucede no presente caso e de modo faseado), e que, assim, a sentença recorrida fez uma interpretação errada da legislação que aplicou, violando-a da forma como a interpretou, pelo que deverá ser revogada.
Mas sem razão.
3.2.3 A sentença recorrida assentou, quanto a este ponto, na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«A par do pedido impugnatório, e em resultado da eliminação dos atos em crise da ordem jurídica, a A. também peticiona a condenação do R. a proceder à sua reintegração, mantendo-a no posto de trabalho anterior ao processo de requalificação, com a mesma categoria profissional e o mesmo vencimento.
Como se sabe, a pronúncia anulatória do Tribunal envolve para o R. o cumprimento de deveres, como decorre do disposto no art.º 173.º, n.º 1, do CPTA, na medida em que “a anulação de um ato administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, (…) por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado”.
Ou seja, em sede de execução de decisão judicial anulatória de ato administrativo, a Administração deve praticar todos os atos que se mostrem necessários à reconstituição da situação eventual que existiria sem a ofensa da legalidade contenciosamente declarada.
O que determina que, in casu, o R. reconstrua todos os efeitos da pronúncia anulatória, compreendendo, designadamente, a readmissão da A. no seu posto de trabalho, na mesma carreira e com as mesmas funções, caso seja possível, bem como o pagamento dos vencimentos e outros suplementos a que teria direito caso se tivesse mantido ao serviço do R., desde a data da produção de efeitos da sua colocação em situação de requalificação até à data da produção de efeitos da sua readmissão por força da presente decisão (descontando, claro está, as remunerações entretanto auferidas pela A. com o reinício de funções, em regime de mobilidade intercarreiras, noutra entidade, já na pendência da presente ação, como resulta da factualidade provada). Igualmente deverá este período ser contado para todos os demais efeitos legais, nomeadamente de antiguidade, como sendo de prestação de serviço efetivo.
Note-se que, se a A. não exerceu, de modo efetivo, as funções correspondentes às remunerações ora devidas, tal situação só ao R. é imputável (cfr. os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 18/12/2014, proc. n.º 06811/10, e de 02/06/2016, proc. n.º 12417/15, publicados em www.dgsi.pt).»
3.2.4 Este entendimento deve manter-se.
3.2.5 Com efeito, decorre do artigo 173º do CPTA que “…sem prejuízo do eventual poder de praticar novo ato administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um ato administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no ato entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado” e para “…efeitos do disposto no número anterior, a Administração pode ficar constituída no dever de praticar atos dotados de eficácia retroativa que não envolvam a imposição de deveres, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos, bem como no dever de remover, reformar ou substituir atos jurídicos e alterar situações de facto que possam ter surgido na pendência do processo e cuja manutenção seja incompatível com a execução da sentença de anulação”.
O cumprimento do dever de executar (a que se refere o artigo 173º) “…é da responsabilidade do órgão que tenha praticado o ato anulado” (cfr. artigo 174º nº 1 do CPTA), sendo que de acordo com o artigo 175º do CPTA “…o dever de executar deve ser integralmente cumprido no prazo de três meses”, salvo ocorrência de causa legítima de inexecução.
Deste quadro normativo resulta desde logo que a execução duma decisão judicial anulatória de ato administrativo ilegal consiste na prática pela Administração - a quem incumbe tirar as consequências da anulação - dos atos e operações materiais necessárias à reintegração da ordem jurídica violada de molde a que seja restabelecida a situação que o interessado tinha à data do ato ilegal e a reconstituir, se for caso disso, a situação que o mesmo teria se o ato não tivesse sido praticado.
A decisão judicial anulatória possui, pois, e desde logo, um efeito constitutivo o qual, por regra, consiste na invalidação do ato impugnado, fazendo-o desaparecer do mundo jurídico desde o seu nascimento. A decisão judicial anulatória elimina, assim, “direta e imediatamente do mundo jurídico o ato administrativo anulado, repristinando automaticamente ex tunc o statu quo ante, sem que para tal fim ocorra qualquer intervenção da autoridade administrativa” (cfr. Mário Aroso de Almeida, in, “Anulação de atos administrativos e relações jurídicas emergentes”, Almedina, 2002, pág. 225). Mas, goza ainda (e para além do denominado de efeito conformativo, preclusivo ou inibitório, que proíbe a reincidência, excluindo a possibilidade da Administração reproduzir o ato com as mesmas ilegalidades individualizadas e assim declaradas pelo tribunal administrativo) de um outro efeito, que é o da reconstituição da situação hipotética atual, também chamado de efeito repristinatório, efeito reconstitutivo ou reconstrutivo, à luz do qual a Administração tem o dever de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o ato ilegal ou se o ato tivesse sido praticado sem a ilegalidade.
Assim, no âmbito da execução de decisões judiciais anulatórias a Administração deve procurar reconstituir a situação atual hipotética, ou seja, deve procurar repor a situação que existiria se o ato ilegal não tivesse sido praticado de molde a que a ordem jurídica seja reintegrada, atividade que passa pela realização, agora, do que se deveria ter realizado se a ilegalidade não tivesse inquinado o procedimento, isto é, passa pela prática dos atos jurídicos e das operações materiais necessárias à mencionada reconstituição e pela eliminação da ordem jurídica de todos os efeitos positivos ou negativos que a contrariem.
Os deveres em que a Administração pode ficar constituída por efeito da anulação de um ato administrativo podem situar-se, assim, em três planos, como resulta do citado artigo 173º nº 1 do CPTA: o da reconstituição da situação que existiria se o ato ilegal não tivesse sido praticado, mediante a execução do efeito repristinatório da anulação; o do cumprimento tardio dos deveres que a Administração não cumpriu, durante a vigência do ato ilegal, porque este ato disso a dispensava e da eventual substituição do ato ilegal, sem reincidir na ilegalidade anteriormente cometida. – vide a este respeito, Mário Aroso de Almeida, in “Sobre a autoridade do caso julgado das sentenças de anulação de atos administrativos”, Almedina, 1994; Vieira de Andrade, in, “Lições de Direito Administrativo e Fiscal”, Almedina, pág. 194; Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, in,Código do Procedimento Administrativo, comentado”, 2.ª edição, págs. 649 e 650.
Tudo isto sem prejuízo das vinculações que tenham sido desde logo plasmadas na sentença exequenda, que constitui o título executivo, designadamente quando a sentença a executar não é meramente anulatória, por através dela o Tribunal, usando da possibilidade contida no artigo 71º nºs 1 e 2 do CPTA, ter imposto a prática do ato devido ou explicitado as vinculações a observar pela Administração na emissão do ato.
3.2.6 Na situação dos autos a autora peticionou desde logo na ação administrativa especial, para além da anulação dos atos que nela impugnou, a condenação do réu a proceder à sua reintegração. Pedido que é de consubstanciar como atinente a aspetos da execução da anulação judicial dos atos objeto da ação, a que se refere o artigo 173º do CPTA.
3.2.7 Nada impedia a autora, antes o consentindo o artigo 4º nº 1 alínea a) e nº 2 alínea a) do CPTA (na versão à data em que a ação foi instaurada, isto é, a anterior à revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015, de 2 de outubro) de peticionar, logo na ação declarativa, a condenação da Administração a praticar os atos e operações necessários ao restabelecimento da situação que existiria não fora os atos a anular. Isso mesmo, já se evidenciou no acórdão deste TCA Norte de 19/06/2020, Proc. nº 00718/11.2BECBR, por nós relatado, disponível in, www.dgsi.pt/jtcn, onde, entre o demais, se sumariou que «É possível cumular o pedido de anulação ou de declaração de nulidade (ou inexistência) de um ato administrativo com o pedido de condenação da Administração ao restabelecimento da situação que existiria se o ato não tivesse sido praticado».
Sendo, certo que, como já se viu, é à Administração que incumbe, em primeira linha, retirar as consequências da decisão judicial de anulação (ou declaração de nulidade) de um ato administrativo, praticando os atos e operações materiais necessárias à reintegração da ordem jurídica violada, na medida em que tem o dever de executar espontaneamente essa mesma decisão judicial, nos termos legalmente definidos, apenas se demandando aos interessados que, perante a omissão desse dever, solicitem ao Tribunal a adoção das medidas executivas necessárias e adequadas – (vide, a este respeito, entre outros, os acórdãos do TCA Sul, de 16/02/2017, Proc. nº 08435/12; de 22/09/2016, Proc. nº 10481/13; de 14/07/2016, Proc. nº 13254/16; de 26/11/2015, Proc. nº 09840/13 e do TCA Norte de 15/03/2019, Proc. nº 00779-A/03 e de 15/03/2019, Proc. nº 00386/11.1BEBRG-A, in www.dgsi.pt, por nós relatados).
E como referiam Mário Aroso de Almeida e Carlos alberto Fernandes Cadilha, inComentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2005, pág. 38: “A alínea a) prevê, no âmbito do processo impugnatório dirigido à anulação ou declaração de nulidade ou inexistência de um ato administrativo, a possibilidade de cumulação com um pedido de condenação da Administração na prática dos atos ou operações materiais necessários à reposição da ordem jurídica violada. A mesma previsão é, aliás, reiterada na alínea b) do nº 1 do art. 47º, que se reporta especificamente à cumulação de pedidos no âmbito da ação administrativa especial.
O interessado pode cumular o pedido de anulação contenciosa com um pedido de condenação à adoção dos atos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado.
Deste modo, o lesado pode suscitar no processo declarativo, por antecipação, pretensões que, no regime anterior, e face à prolação de uma sentença anulatória, apenas poderiam ser deduzidas no processo de execução de julgado.”
3.2.8 A apreciação do pedido de condenação tal como foi formulado pela autora na ação deve, pois, ter este enquadramento. Que foi, também, e corretamente, o que lhe foi dado na sentença recorrida.
3.2.9 Ora, procedente que foi o pedido anulatório, pelos fundamentos de invalidade que lhe foram reconhecidos na sentença, também procedente tinha que ser o pedido de reconstituição da situação da autora tal como decidido.
Mostrando-se destituída de suporte a argumentação atinente à natureza sinalagmática da retribuição, desde logo porque a falta de prestação efetiva de trabalho por parte da autora só se verificou porque a ela foi impedida, porque colocada (ilegalmente), em situação de inocupação pelo réu.
Não estava, pois, na disposição da trabalhadora poder optar pela prestação de trabalho ou pela inocupação. Sendo a reconstituição da situação hipotética que a autora possuiria não fosse o ato ilegal, consequência da sua anulação.
3.2.10 Nesse mesmo sentido, já se entendeu, entre outros, nos seguintes acórdãos deste TCA Norte, todos disponíveis in, www.dgsi.pt/jtcn:
- acórdão de 09/06/2017, Proc. nº 00350/15.1BECBR-A, assim sumariado: «I- No período compreendido entre a prática do acto impugnado - 21 de janeiro de 2015 e meados de junho do mesmo ano - a associada do Recorrido não prestou funções porquanto foi colocada numa situação de requalificação não lhe sendo permitido assumir as suas funções, exactamente por se encontrar em situação de requalificação; I.1- tal equivale a dizer que não pode, agora, o executado vir alegar factum proprium para se eximir ao cumprimento da execução; I.2- é que, se é verdade que o direito ao recebimento do vencimento é um direito sinalagmático, ou seja, pressupõe a prestação efectiva de trabalho, não é menos verdade que tal só o não foi porque o executado determinou a impossibilidade da exequente prestar funções naquele período, não podendo agora vir invocar tal facto para não proceder ao pagamento dos vencimentos»;
- acórdão de 07/07/2017, Proc. nº 001138/15.5BEPRT, em que se sumariou, entre o demais: «(…) A execução da decisão anulatória do acto que determinou a requalificação traduz-se na fixação de uma quantia global que compense o trabalhador pela diferença entre as remunerações que recebeu e as que deveria ter recebido não fosse a prática do acto ilegal, de acordo com a teoria da indemnização»;
- acórdão de 23/05/2019, Proc. nº 00462/15.1BECBR, em que se sumariou, entre o demais: «(…) I.6-é de todo destituída de suporte a argumentação atinente à natureza sinalagmática da retribuição; I.7-é que, a falta de prestação efectiva de trabalho por parte desta naquele período só se verificou porque a trabalhadora foi impedida e colocada em situação de inocupação pelo Réu/Recorrente e não porque ela assim o tivesse escolhido. Não estava na disposição da trabalhadora poder optar pela prestação de trabalho ou pela inocupação, pelo que não poderá o Réu, aqui Recorrente, venire contra factum proprium, para avocar para si, beneficio quando foi ele que determinou unilateralmente a não prestação de trabalho da associada do Autor; (…)».
- acórdão de 29/05/2020, Proc. nº 01245/15.4BEPRT, em que se sumariou, entre o demais, que: «(…) 4- A anulação do processo de requalificação a que foram sujeitas as associadas do autor, confere-lhes o direito a exigir da Administração a reconstituição da situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado».
Entendimento que foi também o seguido no recente acórdão deste mesmo TCA Norte de 02/10/2020, proferido no Proc. nº 465/15.6BECBR (ainda inédito).
3.2.11 Não colhe, pois, à luz do sobredito, também nesta parte, o erro de julgamento que vem apontado pelo recorrente à decisão recorrida. A qual é, assim, de manter e confirmar.
O que se decide.

4. Da ampliação do objeto do recurso
4.1 Nas suas contra-alegações a recorrida, autora na ação, requereu a ampliação do objeto do recurso, ao abrigo do artigo 636º nº 1 do CPC, ex vi o disposto no artigo 1º do CPTA, que convocou - (vide conclusões XIX a XXVII das suas contra-alegações).
4.2 Mas fê-lo apenas subsidiariamente, para o caso de o recurso interposto do réu vir a ser julgado procedente.
4.3 Ora, tendo sido negado provimento, nos termos supra decididos, ao recurso de apelação interposto pelo réu, a ampliação do objeto de recurso, que foi requerida apenas, e expressamente, a título subsidiário, para a hipótese de aquele recurso vir a ser julgado procedente, fica prejudicada. Pelo que não se procede, com tal fundamento, ao seu conhecimento.
*
IV. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal:
- em negar provimento ao recurso do réu, confirmando-se a decisão recorrida nos segmentos impugnados;
- em não tomar conhecimento da ampliação do objeto do recurso requerida a título subsidiário pela recorrida autora, porque prejudicado.

Custas pelo Recorrente – artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
*
Notifique.
D.N.
*
Porto, 16 de outubro de 2020

M. Helena Canelas
Isabel Costa
Rogério Martins