Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00440/23.7BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/12/2023
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Rosário Pais
Descritores:RAC; PRESUNÇÃO DE CITAÇÃO;
ARTIGO 192º, Nº 2, CPPT; PRESCRIÇÃO;
SUSPENSÃO LEIS COVID;
Sumário:
I – Na contagem dos prazos prescricionais de dívidas já em processo de execução fiscal, há que atender às suspensões legais, num total de 181 dias, que decorrem da Lei nº 1- A/2020, de 19 de março, e ainda das Leis nº 4-A/2020, de 06 de abril, nº 16/2020, de 29 de maio, nº 4-B/2021, 01 de fevereiro, nº 13-B/2021, de 05 de abril e do Decreto-Lei nº 6-E/2021, de 15/01.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. O Exmº Representante da Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida em 22.07.2023 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual foi julgada parcialmente procedente a reclamação contra o ato de penhora, no âmbito do processo de execução fiscal nº ...37 e apensos, de 1/2 da fração designada pela letra "X", destinada a habitação, Tipo T3, no 1.º Andar Esquerdo, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., freguesia ..., concelho ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...93, e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ...19, por considerar prescritas parte das dívidas exequendas.

1.2. O Recorrente terminou as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da sentença, datada de 22.07.2023, que julgou parcialmente procedente a reclamação de decisão do órgão de execução fiscal.
B. A sentença agora recorrida pronunciou-se relativamente à alegação de prescrição efetuada pela reclamante, motivando a discordância da Fazenda.
C. O tribunal de primeira instância deu como assente no ponto 83 do probatório que a notificação de penhora ocorreu em 14.02.2023, concluído que foi nesta data que ocorreu a citação pessoal com efeito interruptivo.
D. A Fazenda discorda do decidido.
E. Como refere a informação do órgão de execução fiscal, existe um conjunto de processos de execução fiscal com citação pessoal anterior à determinada pelo tribunal.
F. A Fazenda está em crer que o douto tribunal de primeira instância decidiu mal ao considerar a data de 14.02.2023 como data de citação para efeitos de determinação do efeito interruptivo para a globalidade dos PEFs.
G. Os PEFs ...77, ...53, ...70, ...90, ....768 ...76, ...19, ...25, ...73, ...89, ...68, ...96, ...20, ...84, ...64, ...07, ....464, ...97 foram citados em momento anterior.
H. Como refere a informação do órgão de execução fiscal e consta dos elementos juntos aos autos, existe um conjunto de PEFs já acima mencionado citados em 27.04.2021.
I. Tal é comprovado pelos documentos constantes do SITAF a páginas 660, 674 e 647.
J. Vemos por isso que a citação foi conseguida com prova de depósito por parte dos serviços postais o que de acordo com o Tribunal Central Administrativo Norte no processo 00386/15.2BECBR comprova a citação pessoal e o respetivo efeito interruptivo.
K. O douto tribunal reconhece que a reclamante já teria conhecimento da existência desse conjunto de PEFs tendo apresentado oposição em 07.06.2021 fundamentando a convicção da Fazenda relativamente à citação em 27.04.2021.
L. Assim, no entender da Fazenda a prescrição dos PEFs que a Fazenda considera citados em 27.04.2021 foi determinada com base na data de citação de 14.02.2023, motivo pelo qual se requer a revogação da decisão quanto a esta parte.
M. Quanto à decisão do tribunal em considerar prescrita as dívidas de IMI constantes dos PEFs ...58 e .....164 igualmente a Fazenda existir erro na interpretação levada a cabo pelo douto tribunal.
N. No caso estamos aqui perante dívidas de IMI de 2014, citadas em 14.02.2023.
O. As referidas dívidas têm prazo de prescrição de 8 anos contados do início do ano seguinte à ocorrência do facto tributário.
P. Tratando-se de IMI do ano de 2014, a contagem inicia-se a 01.01.2015 e finda-se a 01.01.2023.
Q. Na sentença recorrida o tribunal desconsiderou suspensões legais existentes.
R. No caso estamos a referir-nos às suspensões introduzidas pela Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março, e ainda pelas Leis n.º 4-A/2020, de 06 de abril, Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, Lei n.º 4-B/2021, 01 de fevereiro e Lei n.º 13-B/2021, de 05 de abril.
S. Tais diplomas acrescem um período suspensivo de 160 dias.
T. Tal suspensão aproveita aos prazos de prescrição dos PEFs ...58 e .....164.
U. Deste modo tais dívidas não prescreveram a 01.01.2023 e não estavam ainda prescritas aquando da interrupção levada a cabo pela citação pessoal após penhora ocorrida em 14.02.2023.
V. Tendo havido a referida interrupção de igual modo não estavam tais dívidas prescritas aquando da apresentação da reclamação judicial após citação em penhora.
W. Pelo que também quanto a este aspeto a Fazenda entende que se verificou um erro de apreciação de facto e de direito pelo que se pretende a revogação da decisão quanto à prescrição das dívidas de IMI de 2014, constantes dos PEFs ...58 e .....164.
X. Pelo exposto entende a Fazenda que, salvo melhor opinião, andou mal a decisão de primeira instância ao considerar a data de 14.02.2023 como data de citação da totalidade dos PEFs. mencionados na p.i. de reclamação, pois que se comprova que a citação ocorreu em momento anterior relativamente a um vasto conjunto de processos acima identificado, assim como andou mal relativamente à contagem do prazo de prescrição das dívidas de IMI para o ano de 2014.
Y. Face ao exposto pretende a revogação da sentença de primeira instância face a esses dois segmentos, tudo conforme acima melhor se expôs.

Como sempre farão V/ Excelências a acostumada JUSTIÇA.».

1.3. A Recorrida AA não apresentou contra-alegações.

1.4. O DMMP emitiu parecer, concluindo que o recurso merece parcial provimento, porquanto:
«(…)
Como refere a informação do órgão de execução fiscal e que consta dos elementos probatórios juntos aos autos, existe um conjunto de PEF,s já acima mencionado cujas citações foram considerados terem ocorrido em 27.04.2021 pela recorrente, concretamente os PEF,s nº ...77, ...53, ...70, ...90, ....768 ...76, ...19, ...25, ...73, ...89, ...68, ...96, ...20, ...84, ...64, ...07, ....464, ...97, os quais, porém, não concorda o tribunal a quo quando entende que as referidas citações ocorreram em momento posterior, isto é, em 14.02.2023.
Destarte, a posição da recorrente é comprovado pelos documentos constantes do SITAF a páginas 660, 674 e 647: por isso que a citação foi conseguida com prova de depósito por parte dos serviços postais o que de acordo com o Tribunal Central Administrativo Norte, processo 00386/15.2 BECBR comprova a citação pessoal e o respetivo efeito interruptivo , com exceção dos PEF,s relativos à cobrança coerciva das coimas, cujo prazo de prescrição é mais curto, isto é, de 5 (cinco) anos, o que in casu já se tinham verificado.
Quanto à decisão do tribunal recorrido em considerar prescrita as dívidas de IMI constantes dos PEF,s nº ...58 e .....164 existe erro na interpretação dos factos que determinaram erro de julgamento e de direito.
Aqui estamos perante dívidas de IMI de 2014, citadas no entendimento do tribunal a quo em 14.02.2023.
As referidas dívidas têm prazo de prescrição de 8 anos contados do início do ano seguinte à ocorrência do facto tributário.
Tratando-se de IMI do ano de 2014, a contagem inicia-se a 01.01.2015 e finda-se a 01.01.2023.
Pese embora, na sentença recorrida o tribunal desconsiderou as suspensões legais existentes no nosso ordenamento jurídico.
Assim, no caso estamos a referir-nos às suspensões introduzidas pela Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março, e ainda pelas Leis n.º 4-A/2020, de 06 de abril, Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, Lei n.º 4-B/2021, 01 de fevereiro e Lei n.º 13-B/2021, de 05 de abril.
Tais diplomas legais acrescem um período global suspensivo de 160 (cento e sessenta) dias.
Tal suspensão aproveita aos prazos de prescrição dos PEF,s nº ...58 e .....164.
Deste modo tais dívidas não prescreveram a 01.01.2023 e não estavam ainda prescritas aquando da interrupção levada a cabo pela citação pessoal após penhora ocorrida em 27.04.2021 e mesmo em 14.02.2023, porquanto tem-se que contabilizar os 160 dias do prazo de suspensão.
Ora, de acordo com o artigo 49.º, nº 1 da LGT, em vigor à data, a citação interrompe o prazo prescricional, com o efeito instantâneo de inutilizar o tempo decorrido, mas também o efeito duradouro de obstar ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo em que a citação é levada a cabo (artigos 326. °, n.º 1, e 327. °, n.º 1, do CC) – cf. Acórdão do STA de 31.03.2016, processo 0184/16, disponível em www.dgsi.pt.
O que significa que a prescrição dos referidos tributos ainda não decorreu (com exceção das execuções por coimas), por se encontrar pendente o processo de execução fiscal que visa a cobrança coerciva dos mesmos (taxas de portagens, IUC e IMI).
Em resumo, na nossa modesta opinião, entendemos que o recurso deve merecer parcialmente provimento, pelos motivos supramencionados.

III - Conclusões
Em conclusão, pelos fundamentos de facto e de direito supra expostos e de acordo com a lei, somos do entendimento que se deve considerar:
1º - O recurso interposto pela recorrente AT parcialmente procedente, pelos motivos supramencionados, devendo a sentença recorrida ser parcialmente revogada, por não estar conforme à lei e ao direito devendo ser afastada da Ordem Jurídica; e
2º - Com custas processuais a cargo da recorrida na proporção do decaimento, sem taxa de justiça por não ter produzido resposta ao recurso da AT.».

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Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 36º, nº 2, do CPTA, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
*

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma de erros de julgamento de facto (quanto à presunção de citação no conjunto de pef’s que a Recorrente identifica) e de direito, ao não considerar os períodos de suspensão dos prazos de prescrição, decorrentes das Leis Covid.
*
3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO
A decisão recorrida contém, no que agora interessa apreciar, a seguinte fundamentação de facto:
«3.1. Com interesse para a decisão a proferir, julgam-se provados os seguintes factos:
1. Contra AA, aqui reclamante, foi instaurado em 16.08.2013 e corre termos, pelo Serviço de Finanças ..., o processo de execução fiscal n.º ...37, referente a taxas de portagem no montante de 2,71 €. - cfr. fls. 1 do processo de execução fiscal apenso aos autos.
2. Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2012/...34, emitida em 22.11.2012, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. - - cfr. fls. 2 do processo de execução fiscal apenso aos autos.
3. Por apenso ao processo referido no ponto 1, correm termos, pelo mesmo órgão de execução fiscal, os seguintes processos de execução fiscal:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (cfr. informação do Serviço de Finanças a fls. 961/968 do SITAF).
4. No âmbito dos processos executivos n.ºs ...77, ...53, ...70, ...90, ....768 ...76, ...19, ...25, ...73, ...89, ...68, ...96, ...20, ...84, ...64, ...07, ....464, ...97, em 27.02.2015, através do Sistema Informático de Penhoras Eletrónicas, doravante SIPE, n.º ...49, foi penhorada a fração "X" do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... sob o n.º ...19 e descrito na Conservatória do Registo Predial n.º ...93....
5. A ora reclamante, citada nos processos m.i. no ponto que antecede, em 07.06.2021, deduziu oposição à execução, que corre termos por este Tribunal sob o n.º 1201/21.3BEBRG. - consulta do processo n.º 1201/21.3BEBRG (SITAF).
(…)
81. No âmbito do processo de execução fiscal n.º ...37 e apensos, em 30.01.2023, foi efetuada a penhora de metade da fração autónoma designada pela letra "X", do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua ..., da freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...93 e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ...19. - cfr. fls. 45/49 do SITAF.
82. A penhora referida no ponto que antecede, para garantia de pagamento da quantia exequenda de 11.901,66 € foi, através da Ap. 45 de 30.01.2023, registada na Conservatória do Registo Predial .... - cfr. fls. 58/62 do SITAF.
83. Em 14.02.2023, foi a reclamante notificada da penhora a que alude o ponto 81 supra. - cfr. fls. 63/66 do SITAF.
84. Em 24.02.2023, a reclamante remeteu via correio eletrónico o requerimento que deu origem aos presentes autos de reclamação. – cfr. fls. 4 e ss. do SITAF.
Mais se provou que,
85. A reclamante casou, em 10.12.2004, com BB. - averbamento ao assento de nascimento n.º 2165, de 1972 da Conservatória do Registo Civil ... a fls. 30/31 do SITAF.
86. O imóvel penhorado foi adquirido em 01.08.2006, por BB e mulher AA, aqui reclamante, casados no regime de separação de bens. - cfr. certidão permanente a fls. 32/36 do SITAF.
3.2. Factos não provados:
Para além dos referidos supra, não foram provados outros factos com relevância para a decisão da causa.
Motivação da matéria de facto dada como provada:
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto provada resultou do exame crítico dos documentos e informações constantes dos autos e dos processos de execução fiscal, os quais não foram impugnados, tudo conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.».

3.2. DE DIREITO
3.2.1. Do erro de julgamento de direito
O Recorrente apresentou reclamação contra o ato do órgão da execução fiscal pelo qual foi penhorada, no âmbito do processo de execução fiscal nº ...37 e apensos, 1/2 da fração designada pela letra "X", destinada a habitação, Tipo T3, no 1º Andar Esquerdo, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., freguesia ..., concelho ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...93, e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ...19.
Por ter considerado que, relativamente aos processos de execução fiscal nº ...77, ...53, ...70, ...90, ...68, ...76, ...19, ...25, ...73, ...89, ...68, ...96, ...20, ...84, ...64, ...07, ...64, ...97, já se mostrava esgotado o prazo legal para deduzir reclamação nos termos do artigo 276º do C.P.P.T., os autos prosseguiram apenas para análise da legalidade da penhora relativamente aos processos de execução fiscal nºs ...37, ...45, ...00, ...26, ...34, ...30, ...22, ...30, ...91, ...56, ...77, ...62, ...70, ...00, ...18, ...26, ...13, ...31, ...20, ...71, ...17, ...88, ...15, ...69, ...35, ...10, ...12, ...96, ...58, ...64 e ...16, dos quais 28 foram, no dispositivo, declarados prescritos.
A Recorrente Fazenda Pública começa por referir que o tribunal de 1ª instância decidiu mal ao considerar a data de 14.02.2023 como data de citação para efeitos de determinação do efeito interruptivo para a globalidade dos PEFs, pois os processo nº s ...77, ...53, ...70, ...90, ....768 ...76, ...19, ...25, ...73, ...89, ...68, ...96, ...20, ...84, ...64, ...07, ....464, e ...97 foram citados em momento anterior.
Pese embora o elevado número de processos de execução fiscal em causa nestes autos, facilmente se percebe que a Fazenda Pública labora em erro nesta sua alegação, porquanto, conforme resulta da breve exposição com que iniciámos a análise deste recurso, a sentença não se debruçou sobre o conjunto de processos a que a Recorrente se refere (na conclusão G. das suas alegações).
Com efeito, na sentença foi considerado que, quanto a estes, a reclamação era intempestiva, sendo certo que, no seu dispositivo, a reclamação foi julgada apenas parcialmente procedente e aquele conjunto de processos não está incluído no grupo de PEF’s cujas dívidas foram declaradas prescritas.
Assim, nesta parte, o recurso da Fazenda Pública carece de objeto, uma vez que, quanto aos identificados processos, a sentença recorrida não deu provimento à reclamação.
Por consequência, não conheceremos do recurso nesta parte referente ao aludido conjunto de processos.
A Recorrente Fazenda Pública também não se conforma com a sentença na parte em que julgou prescritas as dívidas de IMI constantes dos PEFs ...58 e .....164, pois, a seu ver, não foram consideradas as suspensões legais, num total de 160 dias, que decorrem da Lei nº 1- A/2020, de 19 de março, e ainda pelas Leis nº 4-A/2020, de 06 de abril, nº 16/2020, de 29 de maio, nº 4-B/2021, 01 de fevereiro e nº 13-B/2021, de 05 de abril.
Nesta parte, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo apoiou-se no seguinte discurso fundamentador:
« 4.3. Prescrição,
(…)
4.3.3. IMI,
Nos termos do artigo 48.º, n.º 1 da L.G.T., a dívida de IMI prescreve no prazo de oito anos a contar do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou o facto tributário. Assim sendo, os prazos de prescrição iniciaram-se em 01.01.2015 e 01.01.2017 e, na ausência de prazos interruptivos e suspensivos, as dívidas prescreveriam em 01.01.2023 e 01.01.2025.
Como já se referiu, a citação apenas aconteceu em 14.02.2023, pelo que a dívida relativa ao IMI de 2014, exigida nos processos de execução fiscal n.ºs ...58 e ...64 encontra-se prescrita.» - fim de transcrição.
Ressalta evidente que a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo apenas levou em conta a interrupção do prazo de prescrição decorrente da citação, ocorrida em 14/02/2023, sem considerar, porém, as suspensões dos prazos prescricionais, pelo período total de 181 dias.
Com efeito, durante o 1º confinamento todos os prazos de caducidade e de prescrição estiveram suspensos entre o dia 9 de março de 2020 e o dia 2 de junho de 2020, conforme as disposições conjugadas do artigo 7º, nº 3 da Lei nº 1-A/2020, de 19 de março e do artigo 6º da Lei nº 16/2020, de 29 de maio, perfazendo 86 dias (de 9 a 31 de março, 23 dias; de 1 a 30 de abril, 30 dias; de 1 a 31 de maio, 31 dias; de 1 a 2 de junho, 2 dias).
Por força da Lei nº 4-B/2021, de 1 de fevereiro, o prazo de prescrição esteve ainda suspenso desde o dia 22/01/2021, até ao dia 05/04/2021, perfazendo 74 dias (de 22 a 31 de janeiro, 10 dias; de 1 a 28 de fevereiro, 28 dias; de 1 a 31 de março, 31 dias e de 1 a 5 de abril, 5 dias).

A este período de suspensão, acrescem 21 (vinte e um dias), no ano de 2021, conforme previsto no artigo 6º, nº 1 e nº 4, al. a), do Decreto-Lei nº 6-E/2021, de 15 de janeiro, que determinou a suspensão dos processos de execução, entre 1 de janeiro e 31 de março de 2021, e dos prazos de prescrição relativos a todos os tipos de processos e procedimentos no âmbito das execuções em curso ou instauradas no mesmo período. Portanto, este diploma legal determinou a suspensão da prescrição também entre os dias 1 a 21 de janeiro de 2021.
Isto posto, importa considerar que prazo prescricional de 8 anos do IMI referente ao ano de 2014 iniciou-se, por força do disposto no artigo 48º, nº 1, da LGT, a partir do termo do ano a que respeita, ou seja, em 01.01.2015. Somando àqueles 8 anos o período de suspensão total de 181 dias, temos que o prazo em questão apenas se completaria em 3 de julho de 2023.
Tendo a citação da Recorrida ocorrido em 14.02.2023, resulta evidente que ainda não se mostrava esgotado o prazo de prescrição da dívida de IMI de 2014, não podendo a sentença ser mantida nesta parte.
**
Assim, preparando a decisão, formulamos a seguinte conclusão:
I – Na contagem dos prazos prescricionais de dívidas já em processo de execução fiscal, há que atender às suspensões legais, num total de 181 dias, que decorrem da Lei nº 1- A/2020, de 19 de março, e ainda das Leis nº 4-A/2020, de 06 de abril, nº 16/2020, de 29 de maio, nº 4-B/2021, 01 de fevereiro, nº 13-B/2021, de 05 de abril e do Decreto-Lei nº 6-E/2021, de 15/01.

4. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder parcial provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida na parte relativa ao IMI do ano de 2014.

Nesta instância, as custas ficam a cargo da Recorrente e da Recorrida na proporção de 91,95% e 8,05%, respetivamente, nos termos do artigo 527º, nº 1 e 2, do Código de Processo Civil, as quais não abrangem, para a Recorrida, a taxa de justiça devida nesta sede, uma vez que não contra-alegou.

Em primeira instância, acrescem à proporção fixada para a Recorrente (e não impugnada por qualquer das partes) de 5%, mais 4,52%.

Porto, 12 de outubro de 2023

Maria do Rosário Pais
Cláudia Almeida
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