Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02820/08.9BELSB
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/08/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Cristina da Nova
Descritores:ILEGITIMIDADE PASSIVA, DESPACHO SANEADOR, PRETERIÇÃO DE FORMALIDADE LEGAL;
RECURSO OU RECLAMAÇÃO, FALTA DE CONCLUSÕES DE RECURSO, INTERPRETAÇÃO DO ART. 4.º, N.º 4, DO DL N.º 216/92;
PROPINAS E ISENÇÃO DOS DOCENTES DO ENSINO SUPERIOR NA FREQUÊNCIA DE DOUTORAMENTO;
Sumário:
1. A omissão absoluta de conclusões conduz, inelutavelmente, ao não conhecimento do recurso pelo Tribunal Superior, o qual não deve formular qualquer convite ao aperfeiçoamento das conclusões porque não pode ser aperfeiçoado o que não existe.

2. De acordo com o art.88.º do CPTA, o despacho, logo que transite, constitui caso julgado formal no caso da al. a). Perante uma situação em que nos respetivos articulados não foi arguida pelos demandados concreta matéria de defesa por exceção, ilegitimidade passiva, em sede própria para esse efeito, e, em que a decisão de saneamento do processo se haja limitado a emitir juízo tabular sobre os pressupostos e a regularidade da instância, tem o valor de decisão não impugnável.

3. Preterição de formalidade legal no processo, nulidade processual, decorrente de as demandadas haverem sido absolvidas da instância por incompetência absoluta em razão da matéria e não ter sido notificada da remessa do processo para o TAF de Braga, atendendo ao art. 105.º n.º 2, do CPC, constitui uma nulidade secundária [art. 195.º do CPC], ou seja, nulidade que não é do conhecimento oficioso [art 196.º do CPC], a nulidade tem de ser arguida pelo interessado perante o tribunal que a cometeu [art.197.º, n.º1, in fine], o recurso não é o meio de arguir a referida nulidade processual.

4. O direito previsto no artigo 4.º, n.º4, do D.L. n.º 216/92 é um direito de isenção do pagamento das propinas, sendo certo que estas propinas consubstanciam uma taxa [contrapartida do serviço de ensino] que constitui receita própria das instituições de ensino superior [cfr. artigo 115.º, n.º1, al. b) do atual Regime jurídico das instituições de ensino superior, na linha do que já previa a revogada Lei de Autonomia das Universidades].
Na relação jurídico-tributária que opõe o Autor, Sindicato Nacional do Ensino Superior e Universidade de Lisboa e Faculdade de Ciências da U.L., o associado do Autor, é titular de um direito de isenção do pagamento das propinas.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, a Subsecção Comum, da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
UNIVERSIDADE 1 e FACULDADE DE CIÊNCIAS da UNIVERSIDADE 1, devidamente identificadas nos autos, inconformadas, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Braga que as condenou a pagar ao associado do recorrido a quantia de €10.074,96€ despendida a título de propinas e conclusão de doutoramento.
*
Formula nas respetivas alegações, a UNIVERSIDADE 1, as seguintes conclusões que se reproduzem:
«I.A douta Sentença recorrida não fez uma correta aplicação do regime legal pelo que deve ser revogada;
II.A UNIVERSIDADE 1 e a Faculdade de Ciências onde o associado do Autor realizou o doutoramento são duas pessoas colectivas de direito público distintas, como decorre do n.º 3 do artigo 10.º dos Estatutos da UNIVERSIDADE 1;
III. Tendo o doutoramento sido realizado na Faculdade de Ciências, a quem o Autor terá pago as propinas, é esta a contraparte da relação material controvertida objeto dos autos;
IV.Devendo, de acordo com o nº 1 do artigo 10º do CPTA, ação ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida, a UNIVERSIDADE 1 não é parte legítima na presente acção, devendo ser absolvida da instância;
V. Ademais somente dois anos após a absolvição da instância por sentença proferida a 25 de março de 2010, com fundamento na incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, as Rés tomaram conhecimento, por via da notificação para alegar, da remessa dos autos para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.
VI.A falta de notificação que impediu a Ré, de manifestar a sua oposição a tal remessa constitui violação do disposto no nº 2 do artigo 105º do CPC (anterior ao CPC novo aprovado pela Lei nº 41/2013], obstando ao exercício do contraditório.
VII. Ora, nos termos do art. 615º, nº. 1, al. d) do CPC, é nula, a decisão que, " (...) na sequência de anterior decisão na qual o tribunal foi julgado incompetente em razão da matéria, ordena a remessa dos autos ao tribunal administrativo competente, requerida pela autora, sem apreciar a oposição (e respectivos fundamentos) a tal remessa deduzida pela parte contrária."
VIII. Por outro lado, sendo o associado do Autor docente da UNIVERSIDADE 2, caberá à sua Universidade suportar o encargo com as propinas, e não às outras Universidades, por tal não decorrer do nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 216/92, que apenas se refere à isenção.
IX.E tanto assim é que quer o Decreto-Lei nº 205/2009, de 31/8, que alterou o Estatuto da Carreira Docente Universitária, quer o Decreto-Lei nº 207/2009 de 31/8, que alterou o Estatuto da Carreira Docente do Pessoal do Ensino Superior Politécnico, determinam, respectivamente, nos artigos 19º e 15º que as instituições de ensino superior devem promover a criação de condições para apoiar o processo de qualificação dos seus docentes integrados em programas de doutoramento;
X. Com efeito esta norma refere-se, expressamente, ao dever das instituições para com os seus próprios docentes, responsabilizando assim cada entidade pela criação de condições que visem apoiar o seu corpo docente, no processo de obtenção do referido grau;
XI. Seria absurdo pretender que o legislador impusesse a uma Faculdade isenção de propinas de todos os docentes do ensino superior (universitário, politécnico, publico e privado), como decorre da Sentença recorrida, tornando impraticável e financeiramente inviável a realização dos cursos como o dos autos;
XII. Tal obrigação, ao atacar o interesse público que as Universidades visam prosseguir afecta, inevitavelmente, o regular funcionamento das instituições, configurando uma manifesta violação dos princípios de justiça e proporcionalidade, constitucionalmente consagrados, e também da autonomia das Universidades.
Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve ser considerado procedente o presente recurso e:
a) Ser a UNIVERSIDADE 1 declarada parte ilegítima nos autos e, consequentemente, absolvida da instância;
E, em qualquer caso,
b) Ser revogada a Sentença recorrida e consequentemente serem a UNIVERSIDADE 1 absolvida do pedido, como que farão a costumada
JUSTIÇA»
*
O Recorrido, SINDICATO NACIONAL do ENSINO SUPERIOR, apresentou contra-alegações, onde formula as seguintes conclusões:
«a)É totalmente improcedente a arguição das nulidades: (i) falta de apreciação no despacho saneador de alegada exceção de ilegitimidade passiva da UNIVERSIDADE 1 e (ii) falta de notificação da remessa dos autos do TAC de Lisboa para o TAF de Braga (secção tributário).
b)Porquanto, pode a Recorrente discordar da decisão sobre a sua
legitimidade passiva nos autos, o que não pode é dizer que o M° Juiz a quo não conheceu, apreciou e decidiu a questão;
c) Em nome de boa-fé processual, atendendo ao art.° 105°, n.°2, do CPC vigente ao tempo, o silencia, após notificação do requerimento de remessa dos autos, só pode presumir-se como de aceitação para aproveitamento dos articulados, bem como aceitação da remessa dos autos requerida;
d) As suscitadas nulidades, nulidades gerais previstas no art.° 201° do CPC, deveriam ter sido arguidas, nos termos do art.° 205°, n.°1, 2a parte, no prazo de 10 dias após a notificação da parte para alegacões (art.° 91°,4, do CPTA), para que foi notificada; não tendo agido com diligencia, é intempestiva agora em sede de recurso arguir tais nulidades;
e) A Recorrente e parte legitima;
f) A norma do artigo 4.°/4 do citado Decreto-Lei n.° 216/92, de 13 de outubro, mantida em vigor pelo artigo 35.°/1-e) da Lei n.° 37/2003, confere o direito de isenção do pagamento de propinas a qualquer docente do ensino superior que, nos termos do respetivo estatuto, esteja obrigado a obtenção do grau de mestre ou de doutor, ainda que a instituição de ensino superior onde frequente tal curso não coincida com aquela onde presta serviço docente.»
*

A recorrente FACULDADE DE CIÊNCIAS da UNIVERSIDADE 1, recorreu, apresentando as alegações sem conclusões, como decorre do seu articulado:
«QUESTÃ0 PREVIA
1.º
A anterior mandatária da recorrente, Dra. «AA», renunciou ao mandato a 30 de maio de 2012.
2.º
A atual mandatária da recorrente juntou aos autos despacho de designação a 15 de junho de 2012.
3.9
A 17 de marco de 2016, foi notificada da douta sentença a anterior mandatária da recorrente, determinando o lapso que a presente mandatária apenas tivesse silo notificada a 21 de marco de 2016 da referida decisão judicial
ALEGAÇÕES
4.º
No presente recurso o que está em cause é o entendimento perfilhado pela sentença recorrida de que as “Entidades Demandadas ao terem indeferido a pretensão do sócio do Auto, em beneficiar da isenção de propinas para a frequência do Doutoramento em que se encontrava inscrito no Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1, fez errado interpretação do n.9 4 do art. s 4.º do D. L n.º 216/92, de 13/10 pelo que tem que proceder a presente ação.”
5.º
Mais condena "as Entidades Demandadas o pagarem ao sócio do Autor, «BB», a quantia de €10.074,96 (dez mil e setenta e quatro euros e noventa e seis cêntimos)”, valor por este despendido a titulo das propinas devidas pelo curso que frequentou.
6.º
Não se conforma a recorrente com a douta sentença, pelos fundamentos expostos de seguida.
7.º
O sócio do recorrido frequentou na Faculdade de Ciências da Universidade 1 o curso conducente ao grau de doutor no ramo de Educação, especialidade em Didática da Matemática, tendo efetuado o registo provis6rio do tema da tese a 30 de setembro de 2004 e solicitado a admissão a provas de Doutoramento a 4 de abril de 2008.
8.º
Pela frequência do referido curso, o sócio do recorrido constituiu-se devedor das inerentes propinas, de acordo com o Regulamento de propinas dos Programas de Estudos Pós-graduados da Faculdade de Ciências da Universidade 1, em vigor na altura dos factos (Doc. 1 junto ao recurso).
9.º
O montante devido ascendia a € 10,074,96 (dez mil e setenta e quatro euros e noventa e seis cêntimos).
10.º
Por considerar estar isento do pagamento de propinas, instaurou o sócio do recorrido uma ação administrativa comum contra as rés Faculdade de Ciências da Universidade 1 e UNIVERSIDADE 1 no Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa.
11.°
Pretendia o recorrido com a referida ação ser o seu sócio reembolsado, par parte das rés, das propinas entretanto pagas.
12.º
O sócio do recorrido, na altura em que frequentava o referido curso na Faculdade de Ciências da Universidade 1, era Assistente no Departamento de Metodologias da Educação do Instituto de Educação e Psicologia da UNIVERSIDADE 2, optando per frequentar o já mencionado curso na Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1.
13.º
O sócio do recorrido declarou pretender ingressar na carreira docente, por recrutamento, para a categoria de professor auxiliar,
14.º
Para o efeito, estipulava a artigo 11.º do Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU), aprovado pelo Decreto-Lei n. 446/79, de 13 de novembro, que os candidatos a professores auxiliares teriam que deter grau de Doutor, requisito mantido na nova redação do ECDU, através do Decreto-Lei n.º 205/2009, de 31 de agosto, no seu artigo 41.º-A.
15.º
Por sentença proferida a 25 de março de 2010, vieram as rés a ser absolvidas da instância, com fundamento na incompetência absoluta do Tribunal, em razão da matéria, conforme dispõe o artigo 101º e n.º 1 do artigo 105.º, ambas do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigo 1. ° do CPTA.
16.º
No entanto, a 25 de maio de 2012, a então mandataria da ré recebeu a notificação do despacho saneador proferido pelo Meritíssimo Juiz de Direito da 3.a Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.
17.º
Em conformidade com o teor do mesmo, apresentou a recorrente as suas alegações.
18.º
A 21 de março de 2016, foi a presente mandataria notificada da respetiva sentença, nos termos da qual foi a recorrente condenada ao pagamento da quantia paga pelo recorrido a titulo de propinas.
19.9
Ora, não concorda a recorrente com a citada decisão judicial par entender que quanto ao peticionado pelo recorrido, ao mesmo não assiste razão, atento o artigo 6.º do Regulamento de Propinas dos Programas de Estudos Pós-graduados da Faculdade de Ciências da Universidade 1, em vigor na altura.
20.º
O n.º 3 do referido artigo expressamente determinava a não concessão de isenção de propinas aos docentes de outras instituições de ensino superior que frequentassem cursos conducentes aos graus de mestre ou de doutor na Faculdade de Ciências da Universidade 1, configurando precisamente a situação do sócio do recorrido.
21.º
O referido Regulamento, redigido no âmbito das competências que a recorrente detém, (cf. O n.º 2 do Artigo 1º dos seus Estatutos) em nada contraria o preceituado na lei geral, concretamente o n.º 4 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.º 216/92, de 13 de outubro, o qual consagra que:
“Estão isentos do pagamento de propinas os docentes do ensino superior que, nos termos do respetivo estatuto, estejam obrigados a obtenção dos graus de /mestre e de doutor.”
22.º
Ora, não pondo em causa o caráter Imperativo da mencionada norma, na sua redação não há especificação que clarifique se é a instituição que conferira o grau de doutor ou aquela em que o aluno presto Serviço docente que tem que suportar o encargo financeiro relativo a frequência do curso e foi precisamente com o intuito de esclarecer esta questão que foi redigida a parte final do n.º 3 do artigo 6.º do referido Regulamento.
23.º
A este propósito, acresce a Recomendação do ano de 2002 do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), da qual se retira que “… o atendimento da situação dos docentes do ensino superior deve conduzir a que estes paguem a propina e sejam reembolsados pela instituição de origem, a qual diligenciará pelo pagamento devido junto do Ministério da Educação” e um parecer do Gabinete da então Senhora Ministra da Ciência, Inovação e Ensino Superior dispõe no mesmo sentido.
24.º
Mais recentemente, e versando sabre a questão do pagamento de propinas dos 2.º e 3º ciclos relativamente aos docentes do ensino superior, reiterou novamente o CRUP o mesmo entendimento adotado anteriormente, em reunião de 12 de outubro de 2010.
25.º
Emitiu aquele Conselho a Recomendação n.º0 03/2010/CRUP, da qual se transcreve o essencial para a decisão em causa;
“No seguimento do debate sobre a matéria em caus foi realizado em sessão plenária deste conselho e, também na sequencia do consenso então verificado sobre o mesmo assunto, o CRUP (…) decidiu recomendar o seguinte, sem prejuízo de considerar que deve permanecer ao critério de cada universidade a resolução de tais casos:
• O pagamento de propinas de segundos e terceiros ciclos por parte de docentes vinculados a instituições de ensino superior publicas, cuja progressão na carreira esteja dependente da realização destes cursos, deve competir preferencialmente às entidades a quem os mesmos se encontrem vinculados;
• As instituições envolvidas, bem como os respectivos interessados, poderão procurar financiamento por estes cursos através de programas próprios, nomeadamente o Programa PROTEC.”
26.º
Não pode, pois, ignorar-se que, para a instituição de ensino superior que ministra o curso, não é indiferente que o aluno, a quem a lei concede uma isenção de propinas, seja seu docente ou seja docente de outra instituição de ensino superior.
27.º
Se a interpretação correta fosse que a instituição que ministra o curso tem que suportar os custos da referida isenção ainda que se trate de um docente de outra instituição de ensino superior, então tal equivaleria a não receber qualquer tipo de reembolso, já que o docente não presta aí serviço e a sua qualificação académica não se irá refletir no seu próprio corpo docente.
28.º
Já se um docente da própria instituição for mais qualificado, esse incremento vai-se refletir claramente na qualidade académica do corpo docente da instituição e igualmente no seu financiamento considerando que no respetivo calculo são consideradas tanto a qualidade do corpo docente, como os estímulos para o aumento dessa qualidade (cfr. dispõe no artigo 4.º da Lei n.9 37/2003, de 22 de agosto, que estabelece as bases do financiamento do ensino superior).
29.º
Mais, no que se refere ao pagamento de propinas, nas "situações especiais" contempladas no artigo 35º da citada Lei n.º 37/2003, nas quais se incluem as constantes do já referido n.º 4 do artigo 4º do Decreto-Lei 216/92, estabeleceu-se a concessão de um apoio a prestar pelo Estado, consistindo na atribuição “as instituições de ensino superior da adequada comparticipação financeira, sendo os correspondentes encargos suportados por verbos inscritos no orçamento do Ministério do Educação".
30.º
No entanto, tal compensação nunca foi regulamentada, nem aplicada por parte do Ministério, o que implica inexistência de regulamentação que permita dar exequibilidade à alínea b) do n.º 2 do artigo 35.º da Lei supra mencionada.
31.º
E a leitura da norma do n.º 4 do referido artigo 4º tem que ser feita à luz da unidade do sistema jurídico em que esta inserida, nomeadamente, a Lei n.º 37/2003, já que é neste diploma que se impõe a comparticipação por parte dos alunos nos custos que a sua formação acarreta, através do pagamento de propinas (vide artigos 16.2 e 17).
32.º
Logo, a viabilidade da isenção do pagamento das propinas depende da citada comparticipação financeira a ser atribuída a instituição, por forma a permitir essa concessão.
33.º
Concluindo, inexistindo a regulamentação dessa comparticipação, não é exigível às instituições de ensino superior e, no caso em apreço, a recorrente, isentar de propinas os estudantes que são docentes noutras instituições de ensino superior, nem seria comportável,
34.º
Do exposto, verifica-se que a recorrente não incumpriu qualquer preceito legal ao não isentar o sócio do recorrido, existindo sim um incumprimento do legislador na regulação do aludido apoio, não podendo, contudo, ser imputada qualquer responsabilidade a recorrente pelo mesmo, já que não detém competência para regular a comparticipação aí prevista.
35.º
Este entendimento é acolhido também no n.º 1 do artigo 19.º do ECDU, na sua atual redação, onde se prevê que "As instituições de ensino superior devem promover a criação de condições para apoiar o processo de qualificação dos seus docentes integrados em Programas de doutoramento,' (sublinhado nosso).
36.º
Pelo que, recorrendo a uma interpretação teleológica da norma referida no artigo anterior, deve entender-se que são as instituições onde os docentes lecionam que devem criar as condições que proporcionem a frequência de cursos de 3.º ciclo, já que serão os interessados diretos na obtenção do grau de doutor e no consequente ingresso na carreira docente universitária, por parte dos seus docentes.
37.º
Do exposto, mantendo o sócio do recorrido a intenção de ser reembolsado no que se refere ao valor correspondente às propinas devidas e pagas pelo curso de 3.º ciclo ministrado pela recorrente, devera efetuar o respetivo pedido ao Instituto de Educação e Psicologia da UNIVERSIDADE 2 que, por sua vez, poderá exigir a respetiva comparticipação ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Nestes termos e nos demais de Direito,
Deve o presente recurso, ser julgado procedente, por provado, não tendo a recorrente que proceder ao peticionado reembolso das propinas já pagas pelo recorrido, com todas as demais legais consequências.»

Apreciando.
Como resulta do disposto no art. 639º, n.º 1 do CPC, quando o recorrente interpõe recurso de uma decisão judicial passível de apelação fica automaticamente vinculado à observância de dois ónus se pretender prosseguir com a impugnação de forma válida e regular: tem o ónus de alegar, fazendo uma análise crítica da sentença recorrida, identificando os erros, de facto e/ou de direito, de que enferma essa decisão, expondo os seus argumentos e razões que poderão conduzir à revogação ou alteração da sentença recorrida.

De seguida, tem o ónus de formular conclusões, devendo finalizar as alegações recursivas com a formulação sintética de conclusões, em que resume os fundamentos pelos quais pretende que o tribunal Superior anule, modifique ou revogue a decisão recorrida.
De acordo com o n.º 2 al. b) do artigo 641º do mesmo Código, a falta absoluta de alegações ou de conclusões gera o indeferimento do recurso.
Com efeito, com a reforma do regime de recursos introduzida pelo DL n.º 303/2007 de 27.08, a falta de conclusões passou, a par com a ausência de alegações, a constituir motivo de rejeição de recurso [art. 685º-C, n.º 2 al. b) do CPC, na redação anterior].

Assim, onde anteriormente se admitia o convite ao recorrente para suprimento daquela falta de conclusões, agora tal convite só ocorre quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou quando nelas não se tenha procedido às especificações previstas no n.º 2 do art. 639º do CPC.

Neste conspecto, afirma Abrantes Geraldes: A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2.ª Edição, 2014. «Estabelecendo o paralelismo com a petição inicial, tal esta está ferida de ineptidão quando falta a indicação do pedido, também as alegações destituídas em absoluto de conclusões são “ ineptas “, determinando a rejeição do recurso (art. 641º, n.º 2 al. b), sem que se justifique a prolação de qualquer despacho de convite à sua apresentação.»
Também como ensina Alberto dos Reis, A. Reis, Código do Processo Civil Anotado, Volume V, 1984, pág. 359.
a palavra conclusões é expressiva. No contexto da alegação o recorrente procura demonstrar esta tese: Que o despacho ou sentença deve ser revogado, no todo ou em parte. É claro que a demonstração desta tese implica a produção de razões ou fundamentos. Pois bem: essas razões ou fundamentos são primeiro expostos, explicados e desenvolvidos no curso da alegação; hão-de ser, depois, enunciados e resumidos, sob a forma de conclusões, no final da minuta.”
Todavia, como salienta ainda, o mesmo Ilustre Professor, “para serem legítimas e razoáveis, as conclusões devem emergir do arrazoado feito na alegação.
Aliás vem sendo este o entendimento jurisprudência, maxime no STJ Ac do STJ de 06-12-2012, relator Lopes do Rego, bem como os acórdãos da Relação de Lisboa e do Porto de 24-02-2022 proc. 185/21BESBL1 e 9-11-2020 proc. 18625/18.6T8BEPRT, Acórdãos do STJ de 19-10-2021 no proc. 3657/18.2LRS e de 9-11-2022 no processo 539/22.7T8BESTS, Ac. do TCA Sul de 24-05-2018, no processo 989/17.0BESNT e Ac. do STA de 29-04-2021, no processo 079/19.1BALSB, disponíveis em www.dgsi.pt
As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação.” [sublinhado nosso].

De salientar que a circunstância de o recurso ter sido admitido pelo Tribunal de 1ª instância, não vincula este Tribunal de recurso, como emerge do preceituado no artigo 641º, n.º 5 do CPC. Na senda da Jurisprudência e Doutrina praticamente unânime nesta matéria, acima indicada, a omissão absoluta de conclusões conduz, inelutavelmente, ao não conhecimento do recurso pelo Tribunal Superior, o qual não deve formular qualquer convite ao aperfeiçoamento das conclusões porque não pode ser aperfeiçoado o que não existe.
Assim, rejeita-se o recurso da Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1.
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Com dispensa dos vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo à Conferência para julgamento.

*

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a 1.ª questão suscitada a ilegitimiddae passiva, por ser a respetiva Faculdade de Ciências a contraparte na relação material controvertida, a UNIVERSIDADE 1 não é parte legitima na ação; a 2.ª questão violação do art. 105.º, n.º2, do CPC por não ter sido ouvida previamente à remessa do processo para o tribunal competente em razão da matéria.

Por fim, saber se a sentença incorreu em erro de julgamento de direito, ao sancionar o entendimento que desonera a UNIVERSIDADE 2 de suportar o encargo com as propinas em que incorreu o seu docente ao frequentar o doutoramento na UNIVERSIDADE 1
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3. FUNDAMENTOS DE FACTO.

Em sede de probatório a 1ª Instância, fixou os seguintes factos:
1) No período compreendido entre 1 de setembro de 2001 e 31 de agosto de 2008, «BB» exerceu funções de Assistente no Departamento de Metodologias da Educação da UNIVERSIDADE 2 – cfr. documento n.º 7 junto com a petição inicial;
2) No período compreendido entre 2004 e 2008, «BB» tinha o seguinte vínculo laboral com a UNIVERSIDADE 2: de 01/01/2004 a 25/10/2007 em regime de comissão de serviço extraordinária e de 26/10/2007 a 31/08/2008 em regime de requisição – cfr. documento a fls. 183 do SITAF;
3) Em 19 de novembro de 2008, «BB» e a UNIVERSIDADE 2 outorgaram o documento a que denominaram contrato administrativo de provimento, com efeitos reportados a 01 de setembro de 2008 e termo a 31 de agosto de 2013, com a categoria de professor auxiliar - cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial;
4) Por despacho do Conselho Científico da Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1, de 28 de julho de 2004, foi aceite a candidatura de «BB» a frequentar o Doutoramento em educação/didática de matemática, – cfr. documento n.º 3 junto com a petição inicial;
5) Em 09 de abril de 2008, «BB» apresentou ao Presidente do Conselho Diretivo e Científico da Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1, requerimento do seguinte teor:
“Eu, «BB», assistente no Instituto de Educação e Psicologia da UNIVERSIDADE 2 desde 1 de Setembro de 2001, inscrevi o meu projecto de Doutoramento no Gabinete de Estudos de Pós-Graduação da Faculdade de Ciências da Universidade 1, em Setembro de 2004 (…). Nessa altura fui informado de que ficaria isento do pagamento de propinas por ser docente de uma instituição universitária (…). Desde 2004 até à presente data nunca me foi pedido qualquer pagamento de propinas nem me foi dado conhecimento de qualquer alteração nas regras da Faculdade. No dia 4 de Abril de 2008, ao entregar os exemplares da minha tese, entretanto concluída, para desencadear o processo de realização das respectivas provas fui informado da necessidade do pagamento de propinas para que o processo pudesse seguir os seus trâmites. Atendendo à informação que me foi prestada no momento em que fiz o registo provisório da tese, de que estaria isento de pagamento de propinas, não dispondo presentemente de quaisquer meios para fazer face a tal situação, e perante a possibilidade de a muito curto prazo perder o direito de ingressar na categoria de professor auxiliar, venho por este meio solicitar a V. Ex.ª que me seja concedida esta isenção” – cfr. documento n.º 4 junto com a petição inicial;
6) O requerimento referido em 5) foi objeto de despacho de indeferimento proferido em 10 de abril de 2008 – cfr. documento n.º 1 junto com a contestação apresentada pela Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1;
7) Em 15 de abril de 2008, «BB» apresentou requerimento ao Presidente do Conselho Diretivo e Científico da Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1, solicitando a reapreciação do seu pedido de isenção de propinas de Doutoramento – cfr. documento n.º 5 junto com a petição inicial;
8) O requerimento referido em 7) foi objeto de despacho de indeferimento proferido em 17 de abril de 2008 – cfr. documento n.º 2 junto com a contestação apresentada pela Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1;
9) Em 28 de abril de 2008, «BB» pagou a quantia de € 10.074,96 à Faculdade de Ciências de da UNIVERSIDADE 1, a título de propinas de Doutoramento dos anos letivos de 2004/2005, 2005/2006, 2006-2007 e 2007/2008 – cfr. documento n.º 6 junto com a petição inicial
10) Em 02 de julho de 2008, «BB» dirigiu ao Reitor da UNIVERSIDADE 1 requerimento no qual peticiona lhe seja reconhecido o direito de isenção do pagamento de propinas – cfr. fls. 20-24 do SITAF;
11) Em 25 de julho de 2008, «BB» adquiriu o grau de Doutor no ramo de Educação, especialidade de Didática da Matemática – cfr. documento n.º 8 junto com a petição inicial;
12) Em 20 de janeiro de 2005, o Conselho Diretivo da Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1 aprovou o Regulamento de Propinas dos Programas de Estudos Pós-graduados que entrou em vigor no ano letivo 2004/2005 e cujo teor se dá integralmente por reproduzido – cfr. documento n.º 1 junto com a contestação da UNIVERSIDADE 1.
Não se apuraram quaisquer outros factos com relevância para a decisão a proferir.
Fundamentação da matéria de facto:
A convicção do Tribunal baseou-se no teor de toda a documentação junta aos autos pelas Partes e que não foi objeto de impugnação a que se fez referência supra em cada um dos pontos da matéria assente.»
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3.2. Da exceção da ilegitimidade passiva da recorrente [UNIVERSIDADE 1] e preterição de formalidade legal no processo de remessa dos autos para o tribunal competente.
A recorrente suscita a sua ilegitimidade passiva no entendimento de que legitimidade passiva é da Faculdade de Ciências.

Contudo, não se colocando uma dúvida fundada quanto à titularidade da relação material controvertida, a exceção tem de ser indeferida por duas ordens de razões, na sua contestação a recorrente não suscitou a ilegitimidade passiva, mas, e sobretudo, o despacho saneador julgou que as partes eram legítimas e ainda assim a UNIVERSIDADE 1 produziu as suas alegações e não suscitou a sua ilegitimidade.

Ora, de acordo com o art.88.º do CPTA, o despacho, logo que transite, constitui caso julgado formal no caso da al. a).
Na verdade, embora não invocada a ilegitimidade na contestação certo é que não recorreu do despacho saneador que a julgou parte legítima na ação. Cfr. Voto Vencido do Conselheiro Carlos Carvalho no processo n.º 0163/19.1BEPRT de 06-02-2020: 1.Com efeito, perante uma situação em que nos respetivos articulados não foi arguida pelos demandados concreta matéria de defesa por exceção, sede própria para esse efeito, e em que a decisão de saneamento do processo se haja limitado a emitir juízo tabular sobre os pressupostos e a regularidade da instância, considero que as alegações de recurso jurisdicional dirigidas ao TCA, a pretexto de pretenderem querer sindicar um tal juízo, não poderão servir como meio ou sede adequada e legítima para suprir aquilo que foi uma omissão/falha havida na defesa por exceção produzida em momento anterior e que, manifestamente, não se apresenta como superveniente, torneando não só aquilo que eram e são os deveres e ónus que nessa sede sobre os mesmos impendem [cfr. arts. 83.º do CPTA, 571.º, 572.º, 573.º, do CPC], mas, também, e essencialmente o regime inserto no n.º 2 do art. 88.º do CPTA e as limitações à cognoscibilidade de questões prévias [v.g. as exceções dilatórias] que ali se mostram previstas. 2. Sem prejuízo daquilo que entendo dever ser a devida leitura deste preceito e de o mesmo carecer de interpretação restritiva [vide, aliás, deste Supremo Tribunal, o acórdão do Pleno desta Secção de 13.11.2014 (Proc. n.º 0356/11)], por forma a dele excluir as questões prévias silenciadas no saneador que continuem plenamente operantes e ainda oponíveis à decisão de mérito em termos de interesse e utilidade na produção de efeitos [mormente, por haverem sido oportunamente arguidas e não conhecidas em sede e momento devido (sob pena nulidade de decisão por omissão de pronúncia - arts. 608.º, n.º 2, e 615.º, n.º 1, al. d), do CPC), ou das que se mostrem ser supervenientes, ou ainda das que, através de permissão da regularização da instância pelos meios e incidentes devidos, venham a lograr assegurar a utilidade, o interesse e a inteira produção de efeitos da decisão de mérito a proferir], considero que admitir uma tal via de apreciação, nesta sede e contexto, será inviabilizar quase por completo o desiderato prosseguido pelo regime inserto no n.º 2 do art. 88.º do CPTA e que era o de as questões prévias obstativas ao conhecimento do mérito [vide, v.g., as exceções dilatórias], que deveriam ser apreciadas no despacho saneador, não poderem ser suscitadas nem decididas depois dessa fase, assim se promovendo a tomada de decisões de mérito.
Acórdãos do STA de 13-05-2021, no processo 064/07 BEFUN e de 13-07-2021, no recurso de revista, processo n.º 536/19.0 BELLE.

Por fim, a questão da nulidade da decisão que suscita com base em acórdão do TCA Sul de 21-11-2013, não tem qualquer aplicação nos autos, pois, o aresto pronunciou-se em face da omissão de pronúncia da decisão sobre a exceção da legitimidade aventada após saneador. Ora, neste processo a ilegitimidade foi suscitada apenas no presente recurso jurisdicional o que obsta a que se possa imputar nulidade à decisão.
Ademais, a questão colocada nestes termos configura questão nova que está excluída do âmbito do conhecimento do recurso, na medida em que os recursos, como meios impugnatórios de decisões dos tribunais, visam a reapreciação de questões decididas.

A segunda questão que coloca consubstancia numa preterição de formalidade legal no processo, nulidade processual, decorrente de as demandadas haverem sido absolvidas da instância por incompetência absoluta em razão da matéria e não ter sido a UNIVERSIDADE 1 notificada da remessa do processo para o TAF de Braga, atendendo ao art. 105.º n.º 2, do CPC.

Mas, também aqui, não tem razão, porquanto estando perante uma nulidade secundária [art. 195.º do CPC], ou seja, nulidade que não é do conhecimento oficioso [art 196.º do CPC], a recorrente não reclamou, suscitando a falta de notificação, quando tomou conhecimento da remessa do processo para o tribunal competente [art. 199.º], que se deu com o despacho saneador, o qual foi notificado às demandadas, quer, depois, com as alegações que apresentou em 15-06-2012.

De resto, a jurisprudência Ac. da Rel. Lisboa de 10-05-2018, no processo 1905/13.4TYLSB e Ac Rel. disponível em www.dgsi.pt
tem assim entendido, que a ter-se cometido nulidade decorrente da omissão de um ato ou uma formalidade legal prescrita por lei, que não é do conhecimento oficioso, está dependente de arguição pela parte interessada [art. 197.º, n. º1, in fine do CPC], razão por que se impõe a sua arguição perante o tribunal que a cometeu.
Acrescenta-se, manter-se a atualidade e pertinência do brocardo segundo o qual: dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se.
Com efeito, se houver um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou a omissão do ato ou formalidade, o meio próprio para reagir será a impugnação do respetivo despacho pela interposição do recurso competente. CPC de Antº Abrantes Geraldes e Luís Filipe Pies de Sousa, Vol. I, Almedina, pág. 252-254, 2.ª edição. A reclamação e o recurso não são meios de impugnação concorrentes, cabendo à parte reclamar previamente para suscitar a prolação de despacho sobre a arguida nulidade”

Deste modo, improcedem os dois segmentos recursivos sobre questões processuais.
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4. Apreciação jurídica do recurso.

No respeitante ao mérito do recurso, está em causa saber se a decisão recorrida incorre em erro de julgamento ao decidir como decidiu, condenando as Entidades Demandadas a pagarem ao associado do autor [«BB»] a quanta de 10.074,96€.

Sustenta a UNIVERSIDADE 1 que sendo o associado do autor docente da UNIVERSIDADE 2 caberá a esta suportar o encargo com as propinas, e não outras Universidades, por tal não decorrer do n. º4 do D.L. n.º 216/92 que apenas se refere à isenção.

Ademais, o D.L. n.º 205/2009, de 31/8 que alterou o Estatuto da Carreira Docente Universitária, quer o D.L. 207/2009 de 31/8 que alterou o Estatuto da Carreira Docente do Pessoal do Ensino Superior Politécnico, determinam, nos artigos 19.º e 15.º, respetivamente, que as instituições de ensino devem promover a criação de condições para apoiar o processo de qualificação dos seus docentes integrados em programas de doutoramento, com efeito esta norma refere-se expressamente ao dever das instituições para com os seus próprios docentes, responsabilizando assim cada entidade pela criação de condições que visem apoiar o seu corpo docente, no processo de obtenção do referido grau.

Apreciando
No que respeita aos citados diplomas sobre a alteração do Estatuto da Carreira Docente do Ensino Superior, importa desde já esclarecer que não têm aplicação ao caso, já que quando o associado do autor frequentou o Doutoramento e adquiriu o grau de Doutor não existiam na ordem jurídica, e, as leis só se aplicam para o futuro, ainda que lhes seja atribuída eficácia retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos produzidos pelos factos que a lei se destina a regular. [art. 12.º, n. º1 do Código Civil].

No que tange à norma do D.L. n.º 216/92, a jurisprudência vem entendendo de forma sistemática e uniforme que o referido direito de isenção ao pagamento de propinas, de que são titulares os docentes do ensino superior nas condições aí previstas, encontra-se previsto como um direito subjetivo, oponível erga omnes, que vincula diretamente, não apenas o Estado, mas também as instituições de ensino superior público enquanto credoras da taxa devida pelo serviço de ensino prestado àqueles docentes.
Note-se que o direito previsto no artigo 4.º, n.º4, do D.L. n.º 216/92 é um direito de isenção do pagamento das propinas, sendo certo que estas propinas consubstanciam uma taxa [contrapartida do serviço de ensino] que constitui receita própria das instituições de ensino superior Lei n.º 62/2007 de 10/09. [cfr. artigo 115.º, n.º1, al. b) do atual Regime jurídico das instituições de ensino superior, na linha do que já previa a revogada Lei de Autonomia das Universidades].

Assim, quando o Estado-legislador atribui aos estudantes [docentes] um direito de isenção do pagamento de propinas devidas pela frequência de determinado curso, tal direito de isenção origina uma situação jurídica ativa [direito subjetivo potestativo] na esfera jurídica dos destinatários abrangidos, mas origina também uma situação jurídica passiva [sujeição] na esfera jurídica das instituições de ensino superior, bloqueando o direito de crédito que, à partida, lhes assistia. Acórdão deste TCA de 17-04-2015 no processo 00655/12 BECBR disponível em www.dgsi.pt

Sobre situação similar, da Universidade de Évora, pronunciou-se o TCA Sul No acórdão de 18-03-2021 no processo 1020/16BELRA, disponível em www.dgsi.pt
: A Autora, ora Recorrida, encontra-se abrangida pelo artigo 4.º, n.º 4 do D.L. n.º 216/92, de 13/10, que prescreve a isenção do pagamento de propinas aos docentes do ensino superior que, nos termos do respetivo estatuto, estejam obrigados à obtenção dos graus de mestre e de doutor.
Sendo a Autora equiparada a Assistente no 2.º Triénio, encontrando-se vinculada ao Instituto Politécnico de ... desde 01/09/1995, atualmente na modalidade de contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo, preenche o requisito da norma legal, de ser docente o ensino superior.
Do mesmo modo que preenche o segundo requisito previsto na norma do artigo 4.º, n.º 4 supra referido, de obrigatoriedade de obtenção do grau de doutor, com base no disposto no artigo 7.º do D.L. n.º 207/2009, conjugado com o seu artigo 3.º, n.º 1, tal como decidido na decisão sob recurso.
A Autora carece de obter o grau de doutor como forma de manter a sua vinculação ao Instituto Politécnico de ..., mas também para manter a vinculação à carreira docente, por ser obrigatória a detenção dessa habilitação académica.
Reunidos os requisitos previstos no artigo 4.º, n.º 4 do D.L. n.º 216/92, de 13/10, a outro entendimento não se chega pela aplicação da Lei n.º 37/2003, de 22/08, por não se exigir uma coincidência entre o estabelecimento de ensino em que o docente exerce funções docentes e aquele em que se encontra a frequentar, para obtenção do grau de mestre ou de doutor.
Para o que não interfere no julgamento da presente questão de direito a norma do artigo 9.º, n.º 1 do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior, aprovado pela Lei n.º 62/2007, de 10/09, invocada pela ora Recorrente no presente recurso, sobre a natureza e o regime jurídico das instituições de ensino superior públicas.»

Assim, na relação jurídico-tributária que opõe o Autor, Sindicato Nacional do Ensino Superior e UNIVERSIDADE 1 e Faculdade de Ciências da UNIVERSIDADE 1, o associado do Autor, «BB», é titular de um direito de isenção do pagamento das propinas e, por isso, a sentença que condenou as recorridas ao pagamento da quantia de 10.074,96€ tem de ser confirmada.
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5. DECISÃO.
Nestes termos, acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, Subsecção Comum, em negar provimento ao recurso mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pelas demandadas, havendo lugar ao pagamento da taxa de justiça pelo recurso por parte da UNIVERSIDADE 1 e taxa de justiça pelo incidente de rejeição do recurso pela Faculdade de Ciências.

Notifique-se.
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Porto, 08 de fevereiro de 2024


Cristina da Nova
José António Coelho
Cristina Travassos Bento