Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00447/22.1BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/19/2024
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL E REGIONAL, EMPRESAS PÚBLICAS, CONCESSIONÁRIAS E AFINS / MUNICÍPIO;
PROCEDIMENTO DESTINADO A ATRIBUIÇÃO DO SUPLEMENTO REMUNERATÓRIO COM FUNDAMENTO NO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES EM CONDIÇÕES DE PENOSIDADE E INSALUBRIDADE AOS TRABALHADORES DO MUNICÍPIO;
AUDIÇÃO DOS REPRESENTANTES DOS TRABALHADORES;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-:

RELATÓRIO
SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL E REGIONAL, EMPRESAS PÚBLICAS, CONCESSIONÁRIAS E AFINS, instaurou ACÇÃO ADMINISTRATIVA contra o MUNICÍPIO ..., todos melhor identificados nos autos, fazendo o seguinte pedido:
“Termos em que, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e em consequência ser o R condenado a adoptar o procedimento tendo em vista a atribuição do suplemento remuneratório com fundamento no exercício de funções em condições de penosidade e insalubridade aos trabalhadores ao seu serviço, procedendo à audição do STAL enquanto entidade representante dos seus associados, com as legais consequências.”
Por decisão proferida pelo TAF de Viseu foi julgada procedente a acção e condenada a Entidade Demandada a reinstruir o procedimento administrativo relativo à atribuição de subsídio de penosidade e insalubridade aos seus trabalhadores, procedendo à audição dos representantes dos trabalhadores.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Entidade Demandada formulou as seguintes conclusões:
1 - O artigo 24° da Lei N°75-B/2020, de 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2021, estabelece o seguinte:
“Suplemento de penosidade e insalubridade
1 - Nos termos do nº 6 do artigo 159º da LTFP, o suplemento remuneratório de penosidade e insalubridade da carreira geral de assistente operacional no que respeita às áreas de recolha e tratamento de resíduos e tratamento de efluentes, higiene urbana, do saneamento, dos procedimentos de inumações, exumações, transladações e aterro de sepulturas de que resulte comprovada sobrecarga funcional que potencie o aumento da probabilidade de ocorrência de lesão ou um risco potencial agravado de degradação do estado de saúde, é atribuído por cada dia de trabalho efectivamente prestado em que seja reconhecido um nível de insalubridade ou penosidade baixo ou médio, sendo o seu valor abonado no intervalo entre 3,36 [euro) e 4,09 (euro), não sendo cumulável com outra prestação de idêntica natureza ou finalidade, independentemente da sua denominação.
2 - Nas situações em que seja reconhecido um nível de penosidade ou insalubridade alto, o valor do suplemento remuneratório atribuído por cada dia de trabalho efectivamente prestado em que o trabalhador esteja sujeito às condições corresponde a 15/prct. da remuneração base diária, não sendo cumulável com outra prestação de idêntica natureza ou finalidade, independentemente da sua denominação.
3 - Em cumprimento do disposto no presente artigo, nas autarquias locais compete ao órgão executivo, sob proposta financeiramente sustentada do presidente da câmara, do presidente da junta ou do dirigente máximo do serviço, quando aplicável, definir quais são as funções que preenchem os requisitos de penosidade e insalubridade, ouvidos os representantes dos trabalhadores e com parecer fundamentado do serviço de segurança, higiene e saúde no trabalho.
4 - Para efeitos do número anterior, anualmente, o empregador público deve identificar e justificar no mapa de pessoal os postos de trabalho cuja caracterização implica o exercício de funções naquela condições.”

2 - Face ao disposto na norma legal acima transcrita, resultou a possibilidade de criação do suplemento remuneratório, a conceder aos trabalhadores da autarquia integrados na carreira geral de assistente operacional, que desenvolvam as actividades de penosidade e insalubridade previstas no n°1.

3 - Tendo em conta o carácter transitório do disposto na Lei do Orçamento de Estado, a que acima se fez referência, o Dec. Lei N°93/2021, de 9 de Novembro de 2021, veio proceder à fixação do suplemento remuneratório pelo exercício de funções em condições de penosidade e insalubridade.

4 - Em conformidade com o disposto no artigo 2° do referido normativo legal “[O] suplemento de penosidade e insalubridade previsto no presente decreto-lei aplica-se aos trabalhadores integrados na carreira geral de assistente operacional que desempenhem funções nas áreas de recolha e tratamento de resíduos e tratamento de efluentes, higiene urbana, saneamento, procedimentos de inumações, exumações, transladações, cremação, abertura, aterro e arranjo de sepulturas, limpeza de canis e recolha de cadáveres animais, bem como os de asfaltamento de rodovias, de que resulte comprovada sobrecarga funcional que potencie o aumento da probabilidade de ocorrência de lesão ou um risco potencial agravado de degradação do estado de saúde.”

5 - Já o artigo 3º do referido Dec. lei veio estabelecer as formalidades prévias para a atribuição do suplemento de penosidade e insalubridade.

6 - Deste modo, o referido artigo 3º determina o seguinte:
“1 - Para efeitos de enquadramento no artigo anterior, o dirigente máximo de cada órgão ou serviço, no exercício das suas competências inerentes à qualidade de empregador público, e tendo em conta a respectiva sustentabilidade financeira, identifica anualmente, e justifica, no mapa de pessoal, os postos de trabalho da carreira geral de assistente operacional cuja caracterização implica o exercício de funções em condições de penosidade e insalubridade.
2 - Nas autarquias locais a competência para definir quais as funções que efectivamente preenchem os requisitos de penosidade e insalubridade, bem como o seu nível, pertence ao órgão executivo, sob proposta financeiramente sustentada do respectivo presidente da câmara municipal, do presidente da junta de freguesia ou do dirigente ou órgão máximo do serviço, quando aplicável.
3 - A deliberação referida nos números anteriores produz efeitos, anualmente, a 1 de Janeiro do ano a que reporta.
4 - A proposta prevista no número anterior é precedida da audição dos representantes dos trabalhadores e de parecer fundamentado do serviço de segurança, higiene e saúde no trabalho.
5 - Da identificação prevista nos números anteriores deve constar, expressamente, a qualificação do nível de insalubridade ou penosidade como baixo, médio ou alto.”

7 - Assim, face ao estabelecido em tal normativo, cabe, no caso presente, à Câmara Municipal ..., sob proposta financeiramente sustentada do seu presidente e, tendo em conta a sustentabilidade financeira do município, identificar e justificar no respectivo mapa de pessoal aprovado, os postos de trabalho da carreira geral de assistente operacional, cuja caracterização envolve o exercício de funções em condições de penosidade e insalubridade.

8 - Tal proposta é antecedida da audição dos representantes dos trabalhadores e de parecer fundamentado do serviço de segurança, higiene e saúde no trabalho.;

9 - Todavia, da identificação dos postos de trabalho da carreira geral de assistente operacional que exerçam funções em condições de penosidade e insalubridade deve constar a qualificação do nível de insalubridade ou penosidade como baixo, médio ou alto.

10 - Em 20/04/2022, a pedido do MUNICÍPIO ..., foi emitido, pela técnica de segurança, o “Parecer do Serviço de Saúde e Segurança do Trabalho Sobre Condições de Trabalho Insalubres e Penosas” que identifica os postos de trabalho abrangidos e respectivos níveis de insalubridade ou penosidade, conforme resulta do doc. n° ... que foi junto aos autos com a contestação.

11 - O Presidente da Câmara Municipal procedeu à realização de diversas reuniões com os representantes dos trabalhadores sindicalizados para apreciação da proposta de atribuição do suplemento remuneratório, tal como resulta do doc. nº ... junto com a contestação e cujo teor se encontra transcrito na sentença ora recorrida, em c) dos Factos Provados.

12 - Em 13/05/2022 foi elaborado parecer pelo Chefe da Divisão de Administração Geral que se pronunciou sobre o cabimento orçamental dos trabalhadores abrangidos pelo subsídio em causa, identificando o serviço, a função o nível de risco de penosidade e insalubridade e o encargo anual, conforme resulta do doc. nº ... junto aos autos com a contestação.

13 - Baseado no teor do doc. nº ..., o Presidente da Câmara Municipal ... elaborou, e apresentou à Câmara Municipal, a Proposta de Atribuição do Suplemento de Penosidade e Insalubridade, conforme resulta do doc. nº ... junto aos autos com a contestação.

14 - De acordo com o referido documento, propôs à referida Câmara Municipal que, “Aos trabalhadores afectos às funções nas áreas: da recolha de resíduos; higiene urbana; saneamento e tratamento de efluentes; procedimentos de inumações, abertura e aterro de sepulturas, exumações e transladações; limpeza de canis e recolha de cadáveres de animais, seja atribuído o suplemento de penosidade e insalubridade, conforme estabelecido no Parecer Técnico do Serviço de Segurança e Saúde no Trabalho, conjugado com a Informação Financeira apresentada pelo Chefe da Divisão de Administração Geral, com efeitos retroactivos a 1 de Janeiro de 2022.” (doc. n°...).

15 - Conforme resulta da acta número treze da reunião ordinária da Câmara Municipal ..., realizada no dia 2 de Junho de 2022, no ponto 2 da Ordem do Dia - Apreciação e Votação do Suplemento de Penosidade e Insalubridade, foi o mesmo aprovado por maioria, conforme resulta do doc. n°... junto com a contestação.

16 - Em conformidade com tudo quanto vai acima exposto, o MUNICÍPIO ... procedeu oportunamente às reuniões com os trabalhadores sindicalizados com vista a que os mesmos se pronunciassem acerca da proposta para atribuição do suplemento remuneratório de penosidade e insalubridade.

17 - Sendo certo que o Réu aprovou e está a aplicar o pagamento do referido suplemento aos trabalhadores abrangidos pelo mesmo, com efeitos retroactivos a 1 de Janeiro de 2022, conforme consta do doc. n°... junto com a contestação, tudo em conformidade com os documentos a que acima se faz referência.

18 - Não faz, pois, qualquer sentido proceder à audição do Autor uma vez que o suplemento já foi aprovado e encontra-se a ser pago aos respectivos trabalhadores que têm direito ao seu recebimento.

19 - Em todo o caso, sempre se dirá que o parecer dos representantes dos trabalhadores não é vinculativo para o Réu.

20 - Conforme resulta do Dicionário Online Priberam de Português (https://dicionario.priberam.org), audição tem como significado:
“1. Acto e faculdade de ouvir ou de escutar.
2. Auscultação.”

21 - É entendimento do recorrente que a auscultação do recorrido não tem qualquer efeito vinculativo para o Réu.

22 - Em todo os trabalhadores do MUNICÍPIO ... foram auscultados pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal.

23 - E o pagamento dos suplementos devidos encontra-se a ser pago com referência a 1 de Janeiro de 2022 a todos os trabalhadores a que ao mesmo têm direito.
24 - Sem que tal pagamento alguma vez tenha sido alvo de qualquer reclamação, seja por parte de quem entendesse que ao mesmo tinha direito, seja por quem estando as recebê-lo entendesse que o mesmo não estaria a ser pago nos montantes estabelecidos legalmente.

25 - Salvo o devido respeito, proceder a nova audição do STAL, após em tempo oportuno terem sido ouvidos os trabalhadores do Município e estes estarem a ser pagos dos valores devidos a título de subsídio, trata-se de uma diligência sem qualquer efeito prático, traduzida apenas no cumprimento de uma formalidade que já teria sido cumprida directamente com os trabalhadores do recorrente.

26 - Sem que da aplicação da lei tenha resultado, até ao momento presente, qualquer incidente ou reclamação dos trabalhadores.

27 - Em todo o caso, o recorrente não tem de atender ao conteúdo resultante da audição dos representantes dos trabalhadores, apenas poderá considerá-las se e na medida em que as considere pertinentes.

28 - O alcance prático da mencionada audição tem um conteúdo meramente residual, uma vez que o resultado desta não tem qualquer força impositiva.

29 - Não obstante, e conforme já referido, o recorrente deu cumprimento à realização da mesma junto dos trabalhadores sindicalizados.

30 - É, pois, não exigível, e em todo o caso extemporâneo, o pedido de audição requerido pelo Autor.

31 - Salvo o devido respeito por opinião contrária, na sentença recorrida foi feita uma deficiente interpretação e aplicação do artigo 24°, n°3, da Lei N°75-B/2020, de 31 de Dezembro, Lei do Orçamento do Estado para 2021.

32 - Deverá, pois, ser revogada a decisão ora recorrida.

TERMOS EM QUE e nos melhores de direito, deve a decisão proferida ser revogada, substituindo-a por outra que julgue a acção improcedente, absolvendo-se, assim, o Réu do peticionado pelo Autor.

Assim procedendo, far-se-á
JUSTIÇA!

Não foram juntas contra-alegações.
O Senhor Procurador Geral Adjunto notificado, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
a) A 20.04.2022, foi elaborado parecer do serviço de Saúde e Segurança do Trabalho sobre Condições de Trabalho Insalubres e Penosas – doc. ... junto com a contestação;

b) A 13.05.2022, o Chefe da DAG da Entidade Demandada elaborou informação com o seguinte teor:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]


Cfr. doc. ... junto com a contestação;

c) A 2 de Junho de 2022, a Câmara Municipal deliberou a atribuição do suplemento de penosidade e insalubridade nos seguintes termos:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]


Cfr. doc. ... junto com a contestação;
Em sede de factualidade não provada o Tribunal exarou:
Não se provou que:
1. No procedimento para a atribuição do subsídio de penosidade e insalubridade aos seus trabalhadores, a Entidade Demandada procedeu à prévia audição da Autora;
DE DIREITO
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o Tribunal, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Assim,
É objecto de recurso a sentença que, julgando a acção totalmente procedente, condenou o MUNICÍPIO ... a reinstruir o procedimento administrativo relativo à atribuição de subsídio de penosidade e insalubridade aos seus trabalhadores, procedendo à audição dos representantes dos trabalhadores.
Cremos que decidiu com acerto.
A Recorrente sustenta que já aprovou e está a proceder ao pagamento do referido suplemento aos trabalhadores com efeitos a 1/01/2022, pelo que não faz qualquer sentido proceder à audição do Autor/Recorrido, tanto mais que a audição dos representantes dos trabalhadores não tem qualquer efeito vinculativo para o Réu/Recorrente.
Não vemos que assim seja.
Conforme sentenciado:
o procedimento tendente à identificação dos trabalhadores daquela concreta carreira e que exercem as suas funções naquelas específicas áreas, implica, além de critérios objectivos (carreira e áreas em que exercem funções), uma apreciação subjectiva sobre essas mesmas funções, pois que é necessário demonstrar que do exercício das mesmas “resulta comprovada sobrecarga funcional que potencie o aumento da probabilidade de ocorrência de lesão ou um risco potencial agravado de degradação do estado de saúde”.
Portanto, para a identificação dos trabalhadores que podem auferir tal suplemento estão envolvidos critérios de natureza objectiva - estarem em causa assistentes operacionais que exerçam funções e, determinadas áreas, mas também critérios de natureza subjectiva, dado que este só é atribuído caso o respectivo exercício envolver “comprovada sobrecarga funcional” que potencie o aumento de lesão ou degradação do estado de saúde.
Daí que, previamente à atribuição do suplemento, a proposta seja precedida da audição dos representantes dos trabalhadores e parecer fundamentado do serviço de segurança, higiene e saúde no trabalho.
Acresce que, nos termos do artigo 33º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas as associações sindicais têm o direito de “participar nos procedimentos relativos aos trabalhadores”.
Ora, no caso posto, como resulta do probatório, não existe qualquer documento do PA que demonstre que o Autor, enquanto representante dos trabalhadores tenha sido ouvido previamente à elaboração de proposta para atribuição daquele suplemento.
Acresce que, para tal efeito, não serve a realização de reuniões mais ou menos informais com os representantes dos trabalhadores, até porque a audiência dos interessados, obedece a requisitos estabelecidos no artigo 121º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, do qual se destaca a dever de ser ouvido, antes da decisão final, devendo ser informado sobre o sentido provável desta.
É certo que o artigo 123º do Código do Procedimento Administrativo prevê que a audiência possa ser feita de forma oral, mas, contudo, quando assim seja, esta seja documentada, ou seja, deve ser lavrada acta “da qual consta o extracto das alegações feitas pelo interessado, podendo este juntar alegações escritas, durante a diligência ou posteriormente” - formalidade que manifestamente não foi cumprida no caso concreto e que leva a considerar que a mesma é inexistente.
Note-se que está em causa uma formalidade ad substanciam relativa à obrigação de cumprir com o dever de audiência dos interessados pelo que a mesma não pode ser substituída por qualquer outro meio de prova destinado a comprovar a sua existência.
Sendo imperativa a consulta prévia dos trabalhadores e das suas estruturas representativas, a outra conclusão não se pode chegar senão que a Entidade Demandada, incumpriu o disposto no n.° 4 do artigo 3° do Decreto-Lei n.° 93/2021, de 9 de novembro.
Em suma,
O DL 93/2021, de 09/11, prevê expressamente a “audição dos representantes dos trabalhadores” e não dos trabalhadores não se podendo fazer uma interpretação diversa daquela que a letra da lei e o princípio da legalidade que vincula a Administração permitem, designadamente de que pode ser a “audição dos trabalhadores”;
Não sendo uma formalidade vinculativa trata-se de uma formalidade obrigatória;
Independentemente do facto da Entidade Demandada estar actualmente, e desde janeiro de 2022, a processar e a pagar o referido suplemento remuneratório a alguns dos seus trabalhadores da carreira geral de assistente operacional, conclui-se que, ao não ter sido permitido às estruturas representativas dos seus trabalhadores tomarem parte na decisão sobre a aplicação de tal suplemento remuneratório, houve violação do disposto no n.° 4 do artigo 3° do DL 93/2021, de 9/11;
Não é em vão que o n.° 5 do artigo 257° da Constituição da República Portuguesa e o artigo 12° do Código do Procedimento Administrativo, asseguram a participação dos cidadãos nas decisões que lhes disserem directamente respeito, neste caso, mediante a audição das estruturas representativas dos trabalhadores previamente à definição dos trabalhadores que irão auferir o respectivo suplemento;
Dispensar tal formalidade com o argumento do facto consumado - de já estar em vigor o respectivo subsídio -, e de terem sido ouvidos os trabalhadores, afronta claramente o preceito em apreço, esvaziando-o de qualquer conteúdo útil;
Pelo que, ao não ter permitido às estruturas representativas dos seus trabalhadores (in casu ao Autor) tomarem parte na decisão sobre a atribuição do suplemento de penosidade e insalubridade e a identificação dos trabalhadores aos quais o iria atribuir, dúvidas não restam que foi violado o disposto do n.° 4 do artigo 3° do Decreto-Lei n.° 93/2021, de 9 de novembro, que constitui a concretização do direito de audiência dos interessados previsto no artigo 121° e seguintes do Código do Procedimento Administrativo;
O facto da audição do Autor não ter qualquer efeito vinculativo para a Entidade Demandada, não a dispensa de o fazer, até porque, como se disse, a atribuição do suplemento envolve elementos subjectivos, daí que, em sede de audiência, o Autor possa identificar outros trabalhadores com direito ao suplemento ou vice-versa - sendo que a Entidade Demandada está, pelo menos, obrigada a ponderar as alegações em sede de audiência dos interessados na decisão que vier a tomar;
Daí que, neste caso, não tenha qualquer aplicação o estatuído no n.º 5 do artigo 163º do Código do Procedimento Administrativo, dado que não é possível comprovar que, mesmo sem a audiência dos interessados, o acto tinha necessariamente o mesmo conteúdo;
Assiste razão ao Autor no peticionado ao Tribunal, tendo o Réu, ora recorrente, de ser condenado a reinstruir o procedimento administrativo em causa, precedendo a audição dos representantes dos trabalhadores;
A circunstância de estar em curso o pagamento do suplemento remuneratório aos trabalhadores já identificados não obsta ao cumprimento pela Entidade Demandada do ora determinado, nem afecta a validade do pagamento já efectuado, pois que a Entidade Demandada auto vinculou-se a esse pagamento;
Pode, no entanto, revelar interesse à inclusão de outros trabalhadores no universo daqueles que preenchem os requisitos para auferirem tal suplemento;
Daí a utilidade da audição dos representantes dos trabalhadores.
Improcedem as Conclusões das alegações.

DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Réu/Recorrente.
Notifique e DN.

Porto, 19/01/2024

Fernanda Brandão
Rogério Martins
Isabel Jovita