Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00472/11.8BEVIS |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 04/13/2023 |
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Tribunal: | TAF de Viseu |
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Relator: | Margarida Reis |
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Descritores: | IMPUGNAÇÃO JUDICIAL; IRS 2006/2007; CATEGORIA B; CUSTOS; ÓNUS DA PROVA; FUNDAMENTAÇÃO SUBSTANCIAL |
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Sumário: | A fundamentação, formal e substancial dos atos tributários, deve ser-lhes contemporânea, resultando dos mesmos, e não produzida a posteriori, não cabendo aos Tribunais tributários, que em sede de impugnação judicial operam no domínio do contencioso de mera legalidade, suprir as respetivas deficiências.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A Fazenda Pública, inconformada com a sentença proferida em 2016-11-19 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial interposta por AA e BB tendo por objeto a liquidação adicional de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) de 2006 e 2007 e correspondentes juros compensatórios, no montante total de EUR 67.833,20, vem dela interpor o presente recurso. A Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: Em conclusão: A. Incide o presente recurso sobre a douta sentença, na parte que julgou parcialmente procedente a impugnação apresentada nos autos, apenas no que respeita ao segmento relativo aos custos referentes às deslocações e estadas do ano de 2006 (no valor de € 1.603,90) e de 2007 (no valor de € 1.425,40), no qual o Tribunal considerou que tais custos devem ser fiscalmente aceites. B. A conclusão a que chega o decisor, de que os custos relacionados com deslocações e estadas devem ser fiscalmente aceites, não é passível de ser extraída em função daquilo que é o teor do relatório inspectivo e da base fática fixada na própria sentença. C. O juízo decisório confunde o sujeito passivo com sociedade por ele detida, sendo justamente dessa confusão que promana o respectivo desacerto jurídico. D. Conforme se deixou firmado em sede de relatório de conclusões e também se fixou na base fática da sentença sob recurso, os sujeitos passivos (e impugnantes) – eles próprios e não qualquer sociedade por eles detida – imputaram custos relativos a deslocações e estadas nos anos de 2006 e 2007. E. Sucede que, de acordo com o afirmado na sentença, da prova testemunhal produzida resultou que o impugnante durante a execução da obra de ... e outras que trazia em curso na região de ..., efectuava várias deslocações semanais a fim de prestar apoio às obras. F. Ocorre, no entanto, que os impugnantes detêm duas sociedades, cujo objecto social é justamente a construção de edifícios. E foi uma destas sociedades que construiu o empreendimento imobiliário em ..., por subcontratação de serviços dos impugnantes. Com efeito, era esta sociedade que detinha os meios materiais, físicos e humanos para a realização da construção, o que efectivamente ocorreu. G. Do vindo de referir resulta a seguinte evidência: quando o impugnante marido se deslocava semanalmente ao empreendimento de ... ou a quaisquer outras obras a fim de prestar apoio e acompanhar o desenvolvimento dos trabalhos, fazia-o não na sua esfera estritamente individual, mas na qualidade de sócio-gerente da sociedade «X, Lda.», entidade jurídica a quem estava materialmente adstrita a responsabilidade pela construção, pelos seus trabalhadores e com os seus equipamentos. H. E é justamente por essa razão e com esse fundamento que os custos, os de deslocações e estadias (bem como os demais referentes a combustíveis e a despesas de conservação e reparação das viaturas) foram desconsiderados na acção inspectiva, porquanto a sua admissibilidade ocorre na esfera de outro sujeito de direito – a sociedade – e não na esfera pessoal dos impugnantes. I. Sublinhe-se que não está em causa nem sequer se questiona o enquadramento no art. 23.º do CIRC de tais custos, mas somente o ente de direito a que os mesmos devem ser imputados, que só pode ser a sociedade encarregue de realizar as construções, que é também quem manteve a fonte produtora do rendimento. J. Numa palavra: é na esfera da sociedade - e só aí - que a aceitação fiscal de tais custos deve ocorrer. K. Assim, ressalvando-se o devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, sendo nosso entendimento que, nesta parte, a decisão aqui sindicada padece de erro de julgamento. L. Em face de tudo quanto vimos de referir, julgamos que a sentença aqui sindicada faz, nesta parte, um incorrecto juízo sobre a matéria de facto, impondo-se a sua eliminação da ordem jurídica e a subsequente substituição por outra que julgue - na parte relativa ao ponto do relatório de inspecção III – 1.4. Outros custos não aceites - completamente improcedente a impugnação. Termina pedindo: Nestes termos e nos mais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso eliminando-se a douta sentença recorrida e determinando-se a sua substituição por outra que julgue, na parte relativa aos outros custos não aceites (ponto III – 1.4. do relatório inspectivo), totalmente improcedente a acção, como será de JUSTIÇA! *** Os Recorridos não apresentaram contra-alegações. *** O Digno Magistrado do M.º Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso *** Os vistos foram dispensados com a prévia concordância dos Ex.mos Juízes Desembargadores-Adjuntos, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 657.º do CPC, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT. *** Questões a decidir no recurso Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações de recurso. Assim sendo, importa apreciar se a sentença sob recurso padece do erro de julgamento de direito que lhe vem imputado, por ter feito uma incorreta interpretação e aplicação ao caso concreto do disposto no art. 23.º do CIRC. II. Fundamentação II.1. Fundamentação de facto Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz: III – Fundamentação de facto: a) Factos provados: Com interesse para a boa decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos: 1. A impugnante exerceu a atividade de construção de edifícios entre 4 de abril de 2003 e 31 de dezembro de 2008, tendo estado coletada em termos de IVA no regime normal – cfr. doc. de fls. 27 do PA anexo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o mesmo se dizendo para os demais elementos infra referidos. 2. Em cumprimento das Ordem de Serviço n.º ...26, de 17/09/2010, os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção Distrital de Finanças de ..., procederam a uma acção de fiscalização à escrita da impugnante, que incidiu sobre o exercício de 2008, que decorreu entre 30/11/2010 e 23/03/2011 – fls. 25 e sgs. dos autos. 3. Do relatório da fiscalização, consta, de entre o demais, o seguinte: “DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS E À MATÉRIA TRIBUTÁVEL III - Procedimento inspectivo Entre 2006 e 2008, a actividade desenvolvida pelo sujeito passivo consistiu no desenvolvimento de um projecto imobiliário em ..., projecto esse que se iniciou em 6 de Abril de 2006, com a compra de um terreno para construção, artigo urbano ...01 da freguesia ... (...) e cuja construção foi sempre efectuada com recurso a subcontratação de serviços, por não possuir qualquer funcionário nos seus quadros. O empreendimento foi concluído em 2008 e os apartamentos vendidos nesse mesmo exercício (prédio com 6 apartamentos). Nos anos de 2006 e 2007, todos os custos da actividade foram imputados à obra de ... e por isso contabilizados em variação da produção, o que implicou em IRS, resultados ficais nulos nestes exercícios. Estes custos, contabilizados na variação da produção, apenas influenciaram o resultado fiscal do exercício de 2008, ano em que foram alienados os imóveis. Durante o procedimento inspectivo foram analisados todos os custos e proveitos imputados à obra, distribuindo-se a nossa análise em 3 fases distintas: validação das declarações fiscais com elementos da contabilidade, dos valores de venda dos imóveis e indispensabilidade dos custos registados. O contribuinte alvo da presente acção inspectiva é sócio-gerente de duas sociedades, a saber: > «Y, Unipessoal, Lda.», NIPC ..., sociedade que exerceu a actividade de construção de edifícios entre 4 de Abril de 2003 e 31 de Dezembro de 2008, presentemente com actividade cessada. Durante o período de actividade esteve colectada em termos de IVA no regime normal, com periodicidade trimestral; > «X, Lda.»., NIPC ..., sociedade que iniciou a actividade em 1 de Outubro de 2006 e que se encontra registada para efeitos de IVA no regime de isenção, nos termos do disposto no artigo 9.º do CIVA. Esta empresa encontra-se, desde 2006, a desenvolver empreendimentos em ..., construindo imóveis para revenda. III- 1.1. Validação das declarações fiscais com os elementos da contabilidade Numa primeira fase, o trabalho desenvolvido na acção inspectiva consistiu na validação das declarações fiscais entregues pelo sujeito passivo, para efeitos de IRS, através da comparação destas com os elementos da contabilidade. Do cruzamento efectuado não apurámos qualquer irregularidade ou divergência. III - 1.2. Valores declarados nas vendas dos imóveis Numa segunda fase, no sentido de validar os valores declarados nas vendas dos apartamentos, solicitámos aos clientes do sujeito passivo, os seguintes elementos e/ou esclarecimentos (ver anexo n.º 1): 1. Contrato promessa de compra e venda; 2. Fotocópia dos meios de pagamento utilizados para pagamento do imóvel; 3. Fotocópia do(s) extracto(s) da(s) conta(s) de depósitos à ordem, a partir das quais foram efectuados os pagamentos; 4. Outros documentos e meios de prova julgados relevantes. Analisadas as respostas recebidas, verificámos desde logo existir total consonância entre o valor de venda dos imóveis registados nos contratos promessa de compra e venda e os registados nas respectivas escrituras públicas, não existindo assim qualquer omissão ao nível dos proveitos. Contudo, apurámos a existência de irregularidades no que diz respeito aos valores entregues pelos clientes para sinalização dos contratos. Os clientes na data de assinatura do contrato promessa, ou mesmo posteriormente, entregaram valores monetários para sinalizar o contrato, estas importâncias ou não deram entrada na actividade ou foram considerados indevidamente como empréstimos particulares do sujeito passivo: a) O cliente, CC, em 17 de Maio de 2006, assinou um contrato promessa de compra e venda da fracção ... do artigo urbano ...02 da freguesia ... por € 160.000,00. Em 17 de Maio de 2006, entregou a importância de € 2.500,00 relativa à sinalização do contrato. Este valor foi contabilizado indevidamente como empréstimo particular do sujeito passivo à actividade, registado a crédito da conta 51.3.01 - AA. Para reforço do sinal, o cliente entregou mais € 2.500,00. Esta importância não foi registada na contabilidade, daí desconhecemos o seu destino - Anexo n.º 2; b) Os clientes, DD e EE, em 28 de Dezembro de 2006, assinaram um contrato promessa de compra e venda da fracção A do artigo urbano ...02 da freguesia ... por € 160.000,00. Nesta data entregaram como sinal e princípio de pagamento, o montante de € 2.500,00. Esta importância não deu entrada nas contas da actividade, pelo que desconhecemos o seu destino - Anexo n.º 3; c) A cliente, FF, em 17 de Outubro de 2006, assinou um contrato promessa de compra e venda da fracção F do artigo urbano ...02 da freguesia ... por € 142.500,00. Nesta data entregou como sinal e princípio de pagamento, o montante de € 3.000,00. Esta importância não deu entrada nas contas da actividade, pelo que desconhecemos o seu destino. Para reforço do sinal, o cliente em 15 de Dezembro de 2006, entregou mais € 11.250,00. Este valor foi contabilizado indevidamente como empréstimo particular do sujeito passivo à actividade, a crédito da conta 51.3.01 - AA - Anexo n.º 4; d) A cliente, GG, em 26 de Dezembro de 2006, assinou um contrato promessa de compra e venda da fracção D do artigo urbano ...02 da freguesia ... por € 132.500,00. Nesta data entregou como sinal e princípio de pagamento, o montante de € 13.250,00. Esta importância não deu entrada nas contas da actividade, pelo que desconhecemos o seu destino - Anexo n.º 5. Das irregularidades enumeradas, algumas devem-se apenas a erros de contabilização e sem implicações fiscais, nomeadamente os valores registados indevidamente como empréstimo particular de AA. No que diz respeito às importâncias que não deram entrada nas contas da actividade e cujo destino/beneficiário desconhecemos, constituem nos termos do disposto no artigo 81.º, n.º 1 do CIRC, por remissão do artigo 32.º do CIRS, despesas não documentadas, sendo tributadas autonomamente à taxa de 50%. Verificamos, contudo, que a totalidade destas importâncias entregues pelos clientes, dizem respeito ao exercício de 2006, pelo que tendo em consideração o prazo de caducidade do direito à liquidação estipulado no artigo 45.º da Lei Geral Tributaria, não propomos qualquer correcção relativamente a estes factos. III - 1.3. Análise dos custos imputados à obra de ... - subcontratos Numa terceira fase do controlo, foram analisados todos os custos imputados à obra de .... No controlo efectuado verificámos a contabilização como custos da obra de ..., de materiais de construção adquiridos (ex: cimento e tijolos) em ... - ..., ao fornecedor «G, Lda.», NIPC .... ... (...) encontra-se a 378 quilómetros do local do empreendimento (ver anexo n.º 6), na Rua ... - ..., o que originaria custos de transporte muito elevados, onerando assim bastante o preço final da mercadoria adquirida. Para além da «G, Lda.», apurámos ainda a existência de inúmeros outros fornecedores, com sede ou domicílio fiscal no Distrito ..., pelo que decidimos analisá-los a todos pormenorizadamente. Da análise efectuada, apurámos as seguintes irregularidades: A) «G, Lda.» - No âmbito do Despacho DI201100014, dirigimo-nos à sede da sociedade em ... - ..., onde analisámos as compras efectuadas pelo contribuinte em análise em 2006 (em 2007 e 2008, não existem compras), no montante global de € 36.148,43. Após análise das guias de transporte emitidas pela «G, Lda.», verificámos que no que diz respeito às facturas abaixo indicadas, os respectivos materiais de construção foram entregues em ... - ... - ... e não em ..., pelo que podemos concluir que estes custos não dizem respeito à obra em análise (anexo n.º 7): Valores em euros [Imagem que aqui se dá por reproduzida] B) «S, Unipessoal, Lda.» (... - ...) - No âmbito do Despacho DI2.....78, contactámos o sócio-gerente da sociedade, o Sr. HH, tendo este declarado que a factura n.º 5 de 29/12/2006, emitida ao cliente em análise, pelo montante de € 18.153,63, corresponde a serviços prestados numa moradia em ... - ..., e que nunca executou qualquer tipo de trabalhos em ..., nem para AA, nem para outro qualquer cliente (ver anexo n.º 8). C) «H, Lda.» (... - ...) - No âmbito do Despacho DI........13, contactámos o sócio-gerente da sociedade, II, e questionámo-lo sobre a venda a dinheiro n.º 23 de 22/09/2006 emitida ao cliente em análise pelo montante de € 431,24. Este esclareceu que, tal como se refere no documento, este valor corresponde a um serviço prestado em ... (ver anexo n.º 9). D) JJ (... - ...) - No âmbito do Despacho DI2........79, o fornecedor em questão declarou que houve a possibilidade de executar trabalhos em ..., mas que recusou estes serviços. Que a factura n.º...7 de 30 de Setembro de 2006, no montante de € 10.535,00, corresponderia a um adiantamento de obras que nunca chegou a executar/realizar e a receber (ver anexo n.º 10). Podemos assim concluir, que este custo não corresponde à obra de ..., nem a qualquer obra. E) KK (... - ...) - Este fornecedor emitiu em 8 de Setembro de 2006, a factura n.º ...37, no montante de € 1.349,15 (ver anexo n.º 11), relativa a tetos falsos em gesso cartonado. Ora, nesta data a obra de ... estava ainda numa fase inicial de construção e não em acabamentos, pelo que também este custo não corresponderá a serviços prestados no imóvel em análise. F) LL (...) - No âmbito do Despacho DI........13, contactámos o sujeito passivo em epígrafe, sobre a factura n.º 41 dei de Outubro de 2006, emitida ao cliente em análise pelo montante de € 1.909,89. Este declarou que este valor corresponde a obras de ... e/ou ... no Concelho .... Nunca prestou qualquer serviço em ... (ver anexo n.º 12). G) «Y, Unipessoal, Lda.» (... - ... - ...) - AA é sócio-gerente dessa empresa. No decorrer da análise ao empreendimento, verificámos que esta empresa tinha emitido duas facturas relativas a serviços prestados em ..., factura n.º 49 de 31 de Dezembro de 2006, no montante de € 20.000,00 e a factura n.º 52 de 6 de Outubro de 2008, no montante de € 66.000,00, perfazendo assim, um valor global de € 86.000,00 - ver anexo n.º 13. As facturas enumeradas não pormenorizam nem o serviço efectuado, nem o respectivo preço unitário e quantidade, mas apenas o seu valor global. No âmbito do Despacho n.º ...53, analisámos a contabilidade da sociedade com vista a recolher elementos sobre estes serviços prestados. Verificámos desde logo que, entre 2006 e 2008, esta sociedade não tem evidenciado na contabilidade, qualquer despesa com deslocações, alimentação, estadias e/ou ajudas de custos dos seus funcionários, em .... Não existe ainda qualquer fornecedor subcontratado para efectuar serviços em .... A empresa só tem funcionários declarados ao nível do processamento de salários até Novembro de 2006, inclusive. Nos inventários de obras em curso, respectivamente a 31 de Dezembro de 2006 e 31 de Dezembro de 2007, estão registados os seguintes valores por obras: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] Em relação ao cliente MM, foi emitida em 10 de Novembro de 2008 a factura n.º...3, no montante de € 12.000,00 (com IVA incluído). Analisados os quadros anteriores, e no que diz respeito à obra de ..., existe uma variação no custo da obra, entre 31-12-2006 e 31-12-2007, de € 3.351,04 (= € 51.851,04- 48.500,00). Analisados os custos imputados às obras, em 2007 e 2008, verificamos que as facturas emitidas pelos fornecedores da sociedade «Y, Unipessoal, Lda.», indicam que os serviços foram prestados e/ou as mercadorias foram entregues, em localidades do Concelho de ... e/ou ... - ver anexo n.º 14: a) Factura n.º 2458 de 22/12/2006 do fornecedor «P, SA», no montante de € 204,44, contem a indicação de Obras: ...; b) Factura n.º 471/2007 de 16/03/2007 do fornecedor «P, SA», no montante de €519,16, contem a indicação de Obras: ...; c) Factura n.º 139/2008 de 24/01/2008 do fornecedor «P, SA», no montante de € 118,47, contem a indicação de Obras: ...; d) Factura n.º 338/2008 de 29/02/2008 do fornecedor «P, SA», no montante de € 1.484,98, contem a indicação de Obras: ...; e) Factura n.º 1236/2008 de 04/08/2008 do fornecedor «P, SA» , no montante de € 121,02, contem a indicação de Obras: ... - ...; f) Factura n.º 1259/2008 de 06/08/2008 do fornecedor «P, SA», no montante de € 205,86, contem a indicação de Obras: ...; g) Factura n.º 4286 de 23/04/2008 do fornecedor «S, Lda.»., no montante de € 421,08, contem a indicação de Local de descarga: ...: h) Factura n.º 4299 de 02/05/2008 do fornecedor «S, Lda.»., no montante de € 204,88, contem a indicação de Local de descarga: ...; i) Factura n.º ...90 de 26/04/2008 do fornecedor «S, Lda.»., no montante de € 707,85, contem a indicação de Local de descarga: .... Os elementos enumerados demonstram que a sociedade prestou serviços de construção civil em várias localidades nos concelhos ... e ..., serviços estes não facturados aos respectivos clientes, e imputados indevidamente quer à obra de ..., quer à obra de MM Perante todas estas evidências, solicitámos esclarecimentos às ... e de ... sobre alvarás de licenças de construção/processos de obras em que figurassem como empreiteiros responsáveis, qualquer uma das empresas em que AA é sócio, ou seja, as sociedades «Y, Unipessoal, Lda.» e «X, Lda.»., ambas com alvarás de construção do INCI - Instituto da Construção do Imobiliário. A Câmara Municipal ... apresentou os seguintes elementos e/ou esclarecimentos: v Processo de obras ...06, com alvará de construção de «X, Lda.». e que corresponde à edificação de um edifício destinado a habitação unifamiliar na ... - ... em nome de MM (possui já alvará de utilização com o n.º ...10). v Processo de obras ...06, com alvará de construção de «X, Lda.». e que corresponde à edificação de um edifício destinado a arrumos, em ... - ..., em nome de NN e OO (possui já alvará de utilização com o n.º ...10). v Processo de obras ...05, com alvará de construção de «Y, Unipessoal, Lda.», e que corresponde à edificação de um edifício destinado edifício destinado a habitação unifamiliar, em ... - ..., em nome de PP. v Processo de obras ..9/2006, com alvará de construção de «Y, Unipessoal, Lda.», e que corresponde à edificação de um edifício destinado a habitação unifamiliar, em ... - ..., em nome de QQ. A Câmara Municipal ... apresentou os seguintes elementos e/ou esclarecimentos: v Processo de obras ...8/2006, com alvará de construção de «X, Lda.». e que corresponde à edificação de um armazém, em ..., em nome de RR (possui já alvará de utilização com o n.º ...08). Existe assim, uma correspondência entre as localidades enumeradas nos processos de obras (..., ... - ..., ... e ...), facturas de custos registadas na contabilidade da sociedade «Y, Unipessoal, Lda.» e custos contabilizados directamente à actividade desenvolvida por AA em ..., mas em que os fornecedores esclareceram que correspondem a trabalhos em localidades dos concelhos ... e/ou .... Com os elementos fornecidos pelas câmaras, inquirimos os donos das obras sobre os prédios edificados, nomeadamente sobre: 1. Fotocópia do contrato de celebrado com empreiteiro; 2. Fotocópia das facturas pelas prestações de serviço realizadas; 3. Fotocópia dos meios de pagamento utilizado para pagamento das facturas; 4. Fotocópia dos extracto(s) da(s) conta(s) de depósitos à ordem, a partir das quais foram efectuados os pagamentos; 5. Outros documentos e meios de prova julgados relevantes. Analisadas as respostas recebidas, verificamos que: - RR - Este cliente, de ... - ..., afirma ter executado a obra por conta própria, não tendo por isso facturas de prestação de serviços, não existindo também qualquer contrato estabelecido com empreiteiros. O meio de pagamento utilizado para pagamento das facturas foi exclusivamente, dinheiro. - MM - Este cliente da ... afirma não ter estabelecido qualquer contrato com os fornecedores. O meio de pagamento utilizado para pagamento das facturas foi exclusivamente, dinheiro. - Os restantes clientes apresentaram-nos cópias de facturas emitidas por «Y, Unipessoal, Lda.», Aleatoriamente seleccionámos o cliente MM. Como este cliente tinha enviado cópias das facturas de aquisição de materiais para a habitação, solicitámos aos fornecedores, cópias dos recibos emitidos ao cliente e cópias dos talões de depósitos com os valores depositados. Analisadas as respostas recebidas dos fornecedores verificámos que todos estes elementos evidenciavam que os pagamentos foram efectuados por AA, através de uma conta particular na Agência de ... da Banco 1... (Conta n.º ...00): O fornecedor «D, Lda.» remeteu-nos cópia do recibo n.º ...53 de 26-12-2008, onde referem o cheque n.º ...72 no montante de € 2.400,00, apresentando ainda cópia do respectivo cheque e correspondente talão de depósito. O cheque em questão é de AA - Anexo n.º 15. O fornecedor «P, SA» remeteu-nos cópias de vários recibos e respectivos talões de depósito. Os talões de depósito enviados por esta firma indicam a conta bancária na Banco 1... de AA - Anexo n.º 16. O fornecedor «M, Lda.», remeteu- nos cópia do recibo n.º ...65 de 24-12-2008 e respectivo talão de depósito. O talão de depósito refere uma conta bancária na Agência de ... da Banco 1... Anexo n.º 17. Os restantes clientes apresentaram-nos cópias de facturas emitidas por «Y, Unipessoal, Lda.». Contudo verificamos que as respectivas datas de emissão são anteriores (ver quadro infra), às datas das aquisições enumeradas na páginas 11 e 12 do presente relatório, o que evidencia que aqueles serviços não foram facturados: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] Conclusão: AA e a sociedade «X, Lda.»., desenvolvem ou desenvolveram, empreendimentos em ..., relativos à construção de imóveis para revenda, estando por isso enquadrados no regime de isenção do IVA, nos termos do artigo 9o do CIVA. Os elementos apresentados ao longo do presente relatório, demonstram que a sociedade «Y, Unipessoal, Lda.» (empresa registada no regime normal de IVA), entre 2006, 2007 e 2008, prestou serviços de construção civil, em diversas localidades dos concelhos ... e ..., serviços que não facturou aos respectivos clientes. Em vez disso foram indevidamente facturados ao empreendimento que AA, sócio-gerente daquela sociedade, desenvolveu em ..., enquanto comerciante em nome individual. Face ao exposto, os custos abaixo identificados não se consideram como indispensáveis ao exercício da actividade empresarial (entenda-se empreendimento de ...), pelo que não serão aceites em termos fiscais, nos termos do disposto no artigo 23.º do CIRC. [Imagem que aqui se dá por reproduzida] III - 1.4. Outros custos não aceites Nos exercícios em análise: 2008 e 2009 no âmbito das ordens de serviço ...26 e ...27, ...06 e ...07 por imputação dos custos à variação da produção, o sujeito passivo não possui nos seus quadros quaisquer funcionários. Também não evidencia quaisquer viaturas de transporte no seu imobilizado. No imobilizado corpóreo apenas está contabilizado mobiliário de escritório. Analisadas as subcontas da 62 - Fornecimentos e Serviços Externos, constatamos a contabilização em 2006 e 2007, de custos com combustíveis e reparações de viaturas, e refeições (em 2008 estes custos não existem), custos estes que foram imputados na sua totalidade à variação da produção, e que só afectaram o resultado fiscal de 2008, aquando da venda dos imóveis. A título meramente exemplificativo, iremos enumerar 4 documentos contabilizados em 2006 e 2007: a) Factura n.º 6505 de 20/11/2006, emitida pelo fornecedor «F, Lda.», NIF ..., relativa a reparação de uma viatura ..., no montante de € 221,67; b) Factura n.º 1415 de 28/12/2006, emitida pelo fornecedor SS, NIF ..., relativa a reparação de uma viatura, no montante de € 248,77; c) Factura n.º 204 de 2/1/2007, emitida pelo fornecedor TT, NIF ..., relativa a refeições entre 21/11/2006 e 27/12/2006, no montante de € 832,00; d) Factura n.º 214 de 8/l/2007, emitida pelo fornecedor «W, Lda.», NIF ... (...), relativa a serviço de restaurante, no montante de € 501,00; Estes custos não se identificam como necessários ou ligados à actividade empresarial (viaturas não constam do imobilizado; inexistência de funcionários), pelo que não serão aceites em termos fiscais, nos termos do disposto no artigo 23.º do CIRC. [Imagem que aqui se dá por reproduzida] III - 1.5. Total de correcções Face ao descrito no ponto III - 1.3. e III - 1.4. do presente relatório, obtemos um total de correcções à matéria tributável em IRS para o exercício de 2008 (todos estes custos foram imputados à variação da produção, pelo que só afectam o resultado fiscal do exercício em que os imóveis foram vendidos) de: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] 4. Em 10/06/2011, foi emitida a nota de liquidação n.º ...82, de IRS no montante de € 75.274,27, Derrama € 8.587,54 e juros compensatórios de 4.647,32, no valor total de 79.903,53, cuja data limite de pagamento era 18/09/2002 – cfr. fls. 28 dos autos. 5. Em 11/07/2011, foi emitida a demonstração de liquidação de juros pela compensação n.º ...56, no valor de € 4.749,42 – cfr. fls. 29 dos autos. 6. Em 11/07/2011, foi emitida a demonstração de liquidação de juros pela compensação n.º ...79, no valor de € 1.752,99 – cfr. fls. 30 dos autos. 7. Em 11/07/2011, foi emitida a demonstração de acerto de contas, pela compensação n.º ...49, no valor total a pagar € 67.833,20 – cfr. fls. 31 dos autos. 8. Os impugnantes no âmbito da sua atividade de construção civil adquiriram vários materiais a empresas da região de ..., cujo transporte era efetuado em viaturas da sociedade «Y, Unipessoal, Lda.» para a obra de ... e outros eram adquiridos a fornecedores sediados na zona da obra que desenvolveram em ... – cfr. depoimento das testemunhas arroladas pelos impugnantes. 9. O impugnante marido efetuou várias deslocações à obra de ... e a outras que detinha em acabamentos na região de ..., a fim de orientar os trabalhos e coordenar a aquisição de materiais – cfr. depoimento das testemunhas arroladas pelo impugnante. 10. 11. A presente Impugnação Judicial foi apresentada no dia 03/10/2011 – cfr. fls. 1. dos autos. * b) Factos não provados: Inexistem outros factos, para além dos que foram dados como provados, que revelem interesse para a boa decisão da causa. * c) Motivação: A convicção que permitiu dar como provados os factos acima descritos assentou no teor dos documentos não impugnados juntos aos autos, assim como, dos documentos constantes do processo administrativo, conforme referido em cada ponto do probatório. Ainda o depoimento das testemunhas arroladas pelos impugnantes, que apresentaram o seu depoimento de forma isenta e com respostas esclarecidas que permitiram considerar como provado o que resulta dos pontos 8 e 9 do probatório. No que concerne ao depoimento da testemunha arrolada pela Fazenda Pública, que se identificou como sendo o Inspetor que levou a efeito a inspeção tributária que resulta dos autos, no essencial, confirmou o que resulta do relatório de inspeção. Assim, a testemunha UU, contabilista certificado que detinha empresa que prestou serviços de contabilidade aos impugnantes, afirmou que os impugnantes adquiriam materiais a fornecedores sediados na zona da obra de ... e outros eram adquiridos a empresas sediadas na região de ..., que eram transportados, aquando da ida dos trabalhadores, para essa obra de ... e que a aquisição de materiais a fornecedores da região de ... decorre de questões de confiança e de causas comerciais, sendo que a viatura utilizada para o efeito era da sociedade «Y, Unipessoal, Lda.» Que os impugnantes na sua atividade não detinham pessoal e equipamentos e, por isso, obtinham esses serviços, nomeadamente da sociedade «Y, Unipessoal, Lda.». Afirmou que o impugnante marido todas as semanas se deslocava às obras, afirmando ainda a testemunha que esteve duas ou três e visitou a obra que os impugnantes desenvolviam em ... e que esta obra em final de 2006 se encontrava praticamente concluída. A testemunha VV, afirmou que aquando da ida do pessoal para a obra de ..., no início da semana, efetuavam o transpor de materiais para esta obra e outros materiais havia que eram adquiridos a fornecedores próximos do local da obra. Afirmou que a sociedade «Y, Unipessoal, Lda.», em 2007 prestou serviço aos impugnantes em obra que executavam na ..., nomeadamente com máquina giratória, manobrada pela testemunha, sendo que a obra de ..., em 2006, estava praticamente concluída, tendo a obra iniciado em maio de 2006, sendo que esta obra tinha funcionários fixos e os apresentados por subempreiteiros. A testemunha WW, que disse ser trabalhador da sociedade «Y, Unipessoal, Lda.», firmou que com a ida do pessoal no início da semana para a obra de ..., transportavam materiais que eram fornecidos por empresas da região de .... Que no final de 2006, a obra de ... estava praticamente pronta. Que o impugnante marido tinha carro próprio que utilizava nas deslocações à obra de ... duas ou três vezes por semana a fim de coordenar os trabalhos e a aquisição de materiais * II.2. Fundamentação de Direito A Recorrente Fazenda Pública circunscreve o recurso ao segmento da sentença “(…) relativo aos custos referentes às deslocações e estadas do ano de 2006 (no valor de € 1.603,90) e de 2007 (no valor de € 1.425,40) (…)”, à qual imputa um erro de julgamento de direito, por entender que o ali decidido não tem suporte no teor do relatório de inspeção tributária (RIT) e na fundamentação de facto, confundindo-se o “sujeito passivo com sociedade por ele detida”, pois “quando o impugnante marido se deslocava semanalmente ao empreendimento de ... ou a quaisquer outras obras a fim de prestar apoio e acompanhar o desenvolvimento dos trabalhos, fazia-o não na sua esfera estritamente individual, mas na qualidade de sócio-gerente da sociedade «X, Lda.»., entidade jurídica a quem estava materialmente adstrita a responsabilidade pela construção, pelos seus trabalhadores e com os seus equipamentos”. Entende por isso que na sentença se “… confunde o sujeito passivo com sociedade por ele detida, sendo justamente dessa confusão que promana o respectivo desacerto jurídico”. Vejamos então. Em causa está, efetivamente, o IRS referente aos exercícios de 2006 e 2007 dos aqui Recorridos, no caso, do Recorrido. Resulta do RIT a seguinte fundamentação para a correção em causa (cf. ponto 3, da fundamentação de facto): (…) IlI - 1.4. Outros custos não aceites Nos exercícios em análise: 2008 e 2009 no âmbito das ordens de serviço ...26 e ...27, ...06 e ...07 por imputação dos custos à variação da produção; o sujeito passivo não possui nos seus quadros quaisquer funcionários. Também não evidencia quaisquer viaturas de transporte no seu imobilizado. No imobilizado corpóreo apenas está contabilizado mobiliário de escritório. Analisadas as subcontas da 62 - Fornecimentos e Serviços Externos. constatamos a contabilização em 2006 e 2007, de custos com combustíveis e reparações de viaturas, e refeições (em 2008 estes custos não existem), custos estes que foram imputados na sua totalidade à variação da produção, e que só afectaram o resultado fiscal de 2008, aquando da venda dos imóveis. A título meramente exemplificativo, iremos enumerar 4 documentos contabilizados em 2006 e 2007: a) Factura n.º 6505 de 20/11/2006, emitida pelo fornecedor «F, Lda.», NIF ..., relativa a reparação de uma viatura ..., no montante de € 221,67; b) Factura n.º 1415 de 28/12/2006, emitida pelo fornecedor SS, NIF ..., relativa a reparação de uma viatura, no montante de € 248,77; c) Factura n.º 204 de 2/1/2007, emitida pelo fornecedor TT, NIF ..., relativa a refeições entre 21/11/2006 e 27/12/2006, no montante de € 832,00; d) Factura n.º 214 de 8/1/2007, emitida pelo fornecedor «W, Lda.», NIF ... (...), relativa a serviço de restaurante, no montante de € 501,00; Estes custos não se identificam como necessários ou ligados à actividade empresarial (viaturas não constam do imobilizado; inexistência de funcionários), pelo que não serão aceites em termos fiscais, nos termos do disposto no artigo 23.º do CIRC. [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…) Importa ainda aqui recordar que na sua PI o vício que os Recorridos imputaram ao ato de liquidação foi o da violação do disposto no art. 74.º da LGT, uma vez que, no seu entender, a Administração fiscal não cumpriu com o seu ónus da prova (cf. art. 6.º da PI). E quanto à correção aqui em causa, entendeu-se na sentença em crise ser de dar razão ao Impugnante, aqui Recorrido, relativamente às deslocações e estadias nos anos de 2006 (no montante de EUR 1.603,90) e 2007 (no montante de EUR 1.425,40), anulando-se o ato impugnado neste segmento, por ali se entender ter ficado demonstrado que estes custos foram “indispensáveis à manutenção da fonte produtora ou para a realização da matéria tributável”, dando-se como provado que o mesmo “… efetuou várias deslocações à obra de ... e a outras que detinha em acabamentos na região de ..., a fim de orientar os trabalhos e coordenar a aquisição de materiais” (cf. ponto 9, da fundamentação de facto). Ora, desde já se antecipa que não é de dar razão à Recorrente. Se não, vejamos. Tal como já aqui foi referido, os Recorridos imputaram ao ato recorrido o vício de erro de direito nos pressupostos, por violação do ónus da prova da Administração fiscal, previsto no art. 74.º da LGT. Do disposto no n.º 1 do art. 74.º da LGT resulta que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Por outro lado, resulta do disposto no n.º 1 do art. 75.º da LGT, que se presumem verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, resultando exemplificativamente elencadas no n.º 2 um conjunto de circunstâncias em que a presunção prevista no n.º 1 cede. Pelo que o disposto no n.º 1 do art. 74.º terá de ler lido em conjugação com o disposto no art. 75.º, ou seja, caso a Administração fiscal prove que os dados e apuramentos inscritos na contabilidade do sujeito passivo não se encontram organizados de acordo com a legislação comercial e fiscal, cessa a presunção de verdade e boa-fé das declarações dos sujeitos passivos, passando a caber a estes o ónus da prova de que as suas declarações fiscais, e os dados e apuramentos constantes da sua contabilidade são verdadeiros. Tal como já aqui se referiu, a inspeção tributária e as correções dela resultantes tiveram por objeto o IRS dos Recorridos, que, e não obstante a parcimónia da fundamentação constante no RIT, é possível apreender se encontravam coletados em IRS nas categorias A e B. Concretamente, no que se refere à correção em apreço, está em causa a dedução de custos (gastos, na terminologia atual) nos termos do disposto no art. 23.º do CIRC, aplicável por remissão do art. 32.º do CIRS, porque os rendimentos do Recorrido estavam enquadrados na categoria B (rendimentos empresariais e profissionais), não estando abrangidos pelo regime simplificado, ou seja, e dito de outro modo, porque a determinação dos seus rendimentos se fez com base na contabilidade [cf. alínea b) do n.º 1 do art. 28.º do CIRS, na redação então em vigor]. Alega a Recorrente que a sentença errou, porque quando o Recorrente se deslocava semanalmente ao empreendimento de ... ou a quaisquer outras obras a fim de prestar apoio e acompanhar o desenvolvimento dos trabalhos, o fazia não na sua esfera estritamente individual, mas na qualidade de sócio-gerente da sociedade «X, Lda.»., e que na sentença se confunde o sujeito passivo com sociedade por ele detida. Ou seja, e em síntese, que os custos em causa seriam da sociedade de que era gerente e não do Recorrido. Sucede, no entanto, que a este respeito nada resulta da fundamentação do ato de liquidação em causa. De facto, manifestamente nada resulta da transcrição do trecho da fundamentação do ato de liquidação na qual se sustenta a correção em causa que suporte a afirmação que agora vem fazer a Recorrente, no sentido de que em causa estariam custos da sociedade e não do Recorrido. Com efeito, para tanto não bastava a alegação genérica de que o Recorrido não tinha funcionários, ou viaturas de transporte no seu imobilizado. Aliás, o que resultou provado na sentença foi, precisamente, que era o próprio Recorrido que fazia as deslocações, a obras que detinha, para orientar os trabalhos e coordenar a aquisição de materiais. Ora, e para se concluir que o ato não padece do erro de direito nos pressupostos por violação do disposto no art. 74.º da LGT que lhe foi imputado pelo Recorrido, teriam que do RIT resultar descritos e provados factos concretos dos quais se pudesse retirar a conclusão de que os custos não foram seus, mas sim da sociedade em que era gerente, sendo certo que dali nada resulta neste sentido. E como vem de há muito sendo esclarecido pela jurisprudência constante dos nossos tribunais superiores, a fundamentação formal e substancial dos atos tributários deve ser-lhes contemporânea, resultando dos mesmos, e não produzida a posteriori, como parece pretender a Recorrente, procurando em sede de recurso suprir a manifesta falta de sustentação material da correção em apreço. Com efeito, e para além do mais, permitir-se que o ato administrativo fosse fundamentado a posteriori implicaria o total esvaziamento da tutela que é conferida pelo direito a uma fundamentação adequada e contemporânea à atuação da administração, tal como resulta, desde logo, do disposto no n.º 3 do art. 268.º da CRP (cf. neste sentido, designadamente, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo proferidos em 2005-04-19, no proc. 01306/03, em 2014-03-26, no proc. 01674/13, em 2014-04-23, no proc. 01690/13, em 2017-10-04, no proc. 0406/13, 2020-10-28, no proc. 02887/13.8BEPRT, e em 2021-02-17, no proc. 02111/14.6BEPRT 0981/16, todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt). Importa ainda referir que também não cabe aos tribunais suprir as incorreções ou deficiências de fundamentação dos atos de liquidação. Sobre esta questão, já em decisão proferida em 2011-02-02, no proc. 0621/09 (disponível para consulta em www.dgsi.pt), o Supremo Tribunal Administrativo referia que o tribunal de primeiro conhecimento da causa não está legitimado a invocar e valorar razões de direito – e acrescentamos nós, factos - , que não foram suscitadas – e apurados - pela Administração para justificar e praticar os atos impugnados, “recorrendo a uma fundamentação que terá julgado mais adequada para aferir da legalidade desses actos mas que não pode ser aceite porque os poderes de cognição do tribunal não podem ir além dos fundamentos de que o acto impugnado explicitamente partiu”. E ali se acrescentava que “[o] processo tributário de impugnação situa-se no domínio do contencioso de mera legalidade, visando apenas a apreciação da legalidade da actuação da Administração tal como ela ocorreu, não podendo o tribunal apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos, sob pena de violação do princípio da separação de poderes constitucionalmente garantido e do qual decorre que só à Administração compete decidir sobre a prática ou não de actos administrativos e tributários e que o tribunal não pode substituir-se a ela, sancionando o acto com a fundamentação jurídica que julgue mais adequada.” (destacado nosso; no mesmo sentido, cf. Acórdãos do STA proferidos em 2011-03-02, no proc. 049/10, em 2014-02-26, no proc. 0951/11, em 2016-01-27, no proc. 043/16, e em 2020-10-28, no proc. 02887/13.8BEPRT). Tanto basta para que se conclua que a Recorrente não tem razão, não padecendo a sentença do erro de julgamento de direito que lhe imputa. Assim sendo, e em face do exposto, deve aqui concluir-se pela improcedência total do presente recurso. *** Atendendo ao seu total decaimento no presente recurso, a Recorrente é condenado em custas [cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT]. *** Conclusão: Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva: A fundamentação, formal e substancial dos atos tributários, deve ser-lhes contemporânea, resultando dos mesmos, e não produzida a posteriori, não cabendo aos Tribunais tributários, que em sede de impugnação judicial operam no domínio do contencioso de mera legalidade, suprir as respetivas deficiências. III. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao presente recurso, e em consequência, manter a sentença recorrida, ainda que, em parte, com a fundamentação aqui preconizada. Custas pela Fazenda Pública Porto, 13 de abril de 2023 - Margarida Reis (relatora) – Cláudia Almeida – Paulo Moura. |