Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02130/07.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/20/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Tiago Miranda
Descritores:IRC;
CORRECÇÕES TÉCNICAS;
Sumário:
I – O artigo 685-Bº do CPC antigo (640º da actual), aqui aplicável ex vi artigo 281º do CPPT, faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente factos indevidamente provados ou indevidamente não provados, decisão que devia ter sido tomada e meios de prova determinantes, impondo-lhe inclusivamente, no caso da prova verbal gravada (com é o caso), indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (nº 2 alª a). sob pena de rejeição do recurso nessa parte.

II – Não há erro de julgamento de direito da sentença que confirmar um acto impugnando quando se provou um facto alegado pela impugnante, mas insuficiente para, por si só, impor a conclusão de que o acto impugnado relevou de erro nos pressupostos de facto.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - Relatório

A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) interpôs o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 31/8/2017, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, no processo em epígrafe, em que é impugnante [SCom01...], SA, com sede na Rua ..., freguesia ..., ... ....
Pretende a revogação da dita sentença na parte em que foi julgada procedente a impugnação da liquidação de IRC n.º ...79, de 19.06.2006, relativo ao exercício de 2003, no montante de € 546.865,75, e que se julgue improcedente a mesma impugnação, também nessa parte.

As alegações de recurso terminam com as seguintes conclusões:
«CONCLUSÕES:
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial contra o acto de liquidação de IRC n.° ...79, de 19.06.2006, respeitante ao exercício de 2003, no montante de € 546.865,75.
B. A referida liquidação adicional foi emitida na sequência de acção de inspecção à ora impugnante sobre o exercício de 2003, ao abrigo da OI n.° ...01, conforme relatório elaborado com data de 26.05.2006, integrado no Processo Administrativo (PA) a fls. 296 a 419.
C. O Tribunal a quo decidiu pela anulação da liquidação respeitante a amortizações de marca própria (€ 196.206,23); provisões para cobranças duvidosas - dívidas de fornecedores (€ 984.594,87); juros de mora (€ 367.069,00), bem como a anulação da liquidação de juros compensatórios no valor de € 33.856,02 na parte correspondente ao valor da liquidação de imposto anulada; a anulação da liquidação de juros compensatórios no valor de € 804,22, pela totalidade, relativos a reembolso indevido; e pelo direito da impugnante a ser indemnizada pelos encargos correspondentes à garantia n.° GAR/......01, prestada para suspensão da execução fiscal n.° ...51, na parte proporcional à da liquidação nestes autos impugnada e anulada, com o limite do montante que corresponderia aos dos juros indemnizatórios relativos à mesma quantia, em valor a liquidar.
D. Com a ressalva do sempre devido respeito, que é muito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, uma vez que a douta sentença ora recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, pelas razões que se passa a expor.
E. Relativamente à questão das amortizações da marca própria, a sentença refere que a AT não cumpriu com o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais da sua actuação, no sentido da demonstração de existirem objectivamente razões para duvidar da inserção no interesse societário daquela despesa, em termos que passasse a caber ao contribuinte, no que respeita à qualificação das verbas contabilizadas como custos dedutíveis, o ónus da prova da sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora.
F. A sentença recorrida refere ainda que, tanto bastaria para determinar a procedência da impugnação na parte relativa a esta correcção, não obstante, refira-se que, ante a prova produzida, ficou demonstrado que os referidos encargos não são estranhos à actividade da [SCom01...], na medida em que existe um nexo causal destes “com os proveitos ou ganhos (...), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica” e em que “Um custo indispensável não tem de ser um custo que directamente implique a obtenção de proveitos. Há vários custos que só mediatamente cumprem essa função e que nem por isso deixam de ser considerados indispensáveis”, não se podendo considerar que os referidos encargos correspondem à “manifestação de interesses alheios à vida da sociedade”.
G. A Fazenda pública discorda desta conclusão.
H. Com efeito, e tal como resulta do relatório de inspecção tributária (RIT), o custo/gasto que está a ser aqui discutido tem por referência a Marca"X"”, sendo certo que esses mesmos custos foram relevados na conta do activo imobilizado incorpóreo, e, após esse reconhecimento, a impugnante procedeu à amortização e reintegração do activo, tendo em conta o período de vida útil atribuído.
I. In casu, a empresa “[SCom02...], SA” (doravante, apenas, [SCom02...]) é a detentora do direito exclusivo de utilização em Portugal dos sinais distintivos da Marca"X"”, conforme contrato celebrado entre a sociedade “[SCom03...], SA” e a sociedade de direito francês “[SCom04...], SA”, em 29 de Julho de 1993, com efeitos a partir de Janeiro de 1993.
J. Os serviços de inspecção tributária (SIT) fundamentaram a sua decisão de não consideração do custo/gasto (as amortizações praticadas), com base em duas premissas: a primeira, pelo entendimento de que sendo a [SCom02...] a entidade que recolhe todos os benefícios da Marca"X"”, então a impugnante, ao suportar encargos com a adaptação das embalagens com a referida marca, apesar de os ter suportado, os mesmos custos não contêm qualquer nexo causal com a obtenção dos proveitos correspectivos, e,
K. em segundo lugar, estes encargos não foram “repassados” para a entidade que, efectivamente, obtinha os benefícios da utilização da marca.
L. Assim, entende a Fazenda Pública que a AT cumpriu com o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais da sua actuação, pelo que prevalece a conclusão de que os encargos incorridos pela impugnante não constituem custos relacionados com a sua actividade, mas sim custos relacionados com a actividade da [SCom02...], que é a entidade que recolhe todos os proventos da utilização da Marca"X"” em Portugal, e como tal, devem os mesmos ser desconsiderados no apuramento do resultado tributável da impugnante no exercício em causa.
M. Relativamente às provisões para dívidas de fornecedores, o tribunal a quo entendeu que se no desenvolvimento da actividade principal de “comércio armazenista de produtos alimentares”, a [SCom01...] celebra contratos com os fornecedores e que são estipulados descontos percentuais, em função das compras efectuadas e, uma vez verificadas as condições para adquirir o direito aos crédito correspondentes aos referidos descontos, os debita aos fornecedores, não pode deixar de se considerar que estes créditos resultam da sua “actividade normal”.
N. A sentença ora recorrida refere ainda que não se encontra justificação para interpretar restritivamente o conceito de “créditos resultantes da actividade normal da empresa”, de modo a nele incluir “unicamente, aqueles que decorrem de operações de natureza comercial relacionadas com a venda de bens ou serviços respeitantes à actividade principal da empresa, ou seja, as operações que envolvam transacções correntes”, como fez a AT.
O. Mais uma vez, discorda a Fazenda Pública destas conclusões.
P. As provisões podem ser definidas como sendo custos estimados e actuais (do exercício), correspondentes a despesas cujo montante ainda não é certo ou que são de eventual ocorrência futura - custos de ocorrência certa e de montante incerto, pelo que,
Q. a constituição de provisões envolve um elevado grau de subjectividade por parte da empresa na apreciação dos factos que, no seu entender, poderão gerar perdas no futuro. Esta conduta cautelosa por parte da empresa tem em conta a sua realidade económica e as regras contabilísticas aplicáveis.
R. Assim, a consideração de uma provisão como custo de um determinado exercício dá tradução prática aos princípios contabilísticos da prudência e da especialização dos exercícios,
S. Porém, a lei fiscal assume uma política mais restritiva, uma vez que, por aquela via poderia estar aberto caminho para se adiar a tributação, através da constituição de provisões excessivas, daí que as regras fiscais se afastem das contabilísticas, podendo existir provisões registadas na contabilidade que não são aceites como custo fiscal - a este propósito, vide MANUAL DO IRC, Centro de Formação da (extinta) Direcção-Geral dos Impostos, págs. 189 a 200.
T. Em termos fiscais, dispõe o art.° 34.°, n.° 1, al. a) do CIRC (numeração e redacção à data dos factos), que podem ser deduzidas para efeitos fiscais as provisões que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade (sublinhado nosso),
U. Ora, resulta do RIT que os saldos devedores de fornecedores provisionados não se enquadram na disposição prevista na alínea a) do n.° 1 do art.° 34.° do CIRC, pois os mesmos não correspondem a transacções passíveis de serem consideradas correntes, requisito essencial para serem provisionáveis ao abrigo do referido normativo.
V. Vejamos então em que consiste a noção de “actividade normal”.
W. O referido preceito legal, ao referir-se às provisões que "tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal” limita directamente e de forma explícita o campo de aplicação ou a base de incidência dessas provisões, sendo bem claro que o legislador pretendeu pôr em evidência que tais provisões não cobririam todos e quaisquer créditos de cobrança duvidosa.
X. No Código do IRC não se define o conceito de “actividade normal” para efeitos de demarcação dos créditos que entram na base de incidência das provisões previstas no art.° 34.°, n.° 1, al. a).
Y. Face a esta ausência, o melhor entendimento a retirar da norma conduz à conclusão de que para efeitos das provisões ali previstas, apenas os créditos resultantes das transacções de bens e serviços relacionados com a actividade produtiva da empresa, deveriam ser susceptíveis de ser qualificados como “créditos resultantes da actividade normal”.
z. Tal como é defendido no RIT, a actividade normal de uma empresa decorre das operações de natureza comercial relacionada com a venda de bens ou serviços respeitantes à actividade principal da empresa, ou seja, as operações que envolvam transacções correntes.
AA. In casu, os saldos devedores, relativamente aos quais foram constituídas as provisões, resultaram de descontos percentuais - rappel - obtidos pela [SCom01...] junto dos fornecedores.
BB. Ora, uma empresa, ao efectuar as suas vendas, regista um proveito sem que, muitas vezes (diga-se, na maior parte das vezes), ocorra o recebimento por parte do credor, resultando daqui uma diferença entre a realização do proveito e o fluxo financeiro que lhe está subjacente.
CC. Daí que, quando a mora no pagamento se prolongue por um prazo mais longo do que se estabeleceu entre os contratantes, se constituam provisões em ordem aos princípios da prudência e da especialização dos exercícios.
DD. Diferentemente, no caso de dívidas de fornecedores, não se vislumbra como é que a concessão de um desconto por parte do mesmo possa entrar em mora na esfera do devedor.
EE. Com efeito, quando o fornecedor concede um desconto ao seu cliente, este abate esse desconto no pagamento que vai efectuar, sendo este o procedimento normal, numa actividade normal.
FF. De facto, não se compreende como é que um cliente que pague uma determinada factura pela sua totalidade não compense, no pagamento, os descontos obtidos pelo fornecedor, tratando as duas situações de modo distinto.
GG. A não ser que, e por hipótese meramente académica, as notas de débito respeitantes a descontos, emitidas pela impugnante, tenham subjacente uma prestação de serviço, situação que, a ser assim, modificaria por completo o enquadramento da questão.
HH.Não sendo o caso, os procedimentos subjacentes aos ditos “créditos” assumem contornos de operações financeiras realizadas sobre os fornecimentos contratados (muito distante do que é a actividade para a qual a impugnante se encontra registada), em que os fluxos financeiros não coincidem com movimentos de mercadorias.
II. Enfim, os saldos devedores de fornecedores resultam única e exclusivamente do procedimento contabilístico adoptado pela impugnante, ao registar numa mesma conta as relações que estabelece com determinada entidade, tanto na óptica de cliente como de fornecedora.
JJ. Ou seja, a impugnante regista, numa mesma conta de terceiros/fornecedores, tanto os valores correspondentes às aquisições de bens transaccionáveis bem como os valores correspondentes aos serviços prestados pela impugnante relativamente às condições estabelecidas no contrato geral de fornecimento, instrumento regulador das relações entre as partes.
KK. Assim, entende a Fazenda Pública, na esteira do Parecer n.° 115/95 do Centro de Estudos Fiscais no processo n.° 1244/95, de 12.07.1995, que somente se enquadram numa actividade normal as operações de natureza comercial relacionadas com a venda de bens ou serviços para a qual a empresa se constituiu e registou (ou seja, próprias dos objectivos ou finalidades principais da mesma), não se subsumindo nesse conceito os créditos que resultem de meras operações de carácter financeiro, nomeadamente os descontos obtidos dos fornecedores e não descontados nos pagamentos efectuados pelos clientes.
LL. Desta forma, não se podem dar como provados os requisitos impostos pelo art.° 34.°, n.° 1, al. a) do CIRC, como pretende a douta sentença ora recorrida, para serem aceites fiscalmente como custos do exercício as provisões para cobrança duvidosa, sendo legal a correcção efectuada pela Autoridade Tributária.
MM. Em relação aos juros de mora suportados junto da “[SCom05...]” ([SCom05...]), considerou o Tribunal a quo que “...a perspectiva em que assenta a correcção efectuada pela AT apresenta-se desenvolvida sob um prisma redutor, insuficiente e ambíguo, em face das exigências legais de fundamentação.
NN. “Redutor e insuficiente porque a AT não se refere a operações comparáveis e não aporta para o caso factores que importa ter em linha de conta quando se pretende assegurar ou aferir se existe o necessário grau de comparabilidade entre a operação sob análise e operações consideradas comparáveis...centrando a sua análise exclusivamente em duas das operações realizadas pela [SCom01...] - entre a [SCom01...] e a [SCom05...] e a [SCom01...] e a [SCom03...].”
00.“Ambíguo e insuficiente a respeito da natureza das operações e dos juros que lhes correspondem, quanto às operações entre a [SCom01...] e a [SCom05...] e a [SCom01...] e a [SCom03...], que não se equivalem em termos da sua natureza e, por isso, não são susceptíveis de ser colocadas no mesmo plano, em termos de comparabilidade dos seus termos, além do mais, quanto à taxa de juro estipulada, para que se alcance a razão de ser da relação de causalidade estabelecida pela AT...”
PP. Concluindo que “a fundamentação expendida no caso sob apreciação, não se apresenta de molde a permitir aferir se a situação se subsume ao disposto no artigo 58° do CIRC e, ainda que ali seja enquadrável, se a actuação administrativa no caso concreto respeitou a vinculação que a mesma acarreta quanto ao estabelecimento do preço de plena concorrência.”
QQ. É referido ainda na sentença ora recorrida que “...reconhecendo-se como constitucionalmente consagrado o princípio da autonomia da vontade, densificador do valor “liberdade”, o mesmo apresenta-se, neste domínio, como “princípio de sinal contrário”: nos domínios empresarial e profissional a autonomia da vontade materializa-se na actuação de acordo com as respectivas convicções de gestão...”
RR. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido.
SS. Vejamos,
TT. Nos termos do n° 1 do art° 58° do CIRC (actual art° 63°) “Nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis."
UU.Ora, obviamente que a actividade económica das empresas é feita de opções, não devendo a procura da optimização fiscal colidir com o estrito cumprimento da lei,
W. No entanto, os resultados pretendidos têm de ser avaliados à luz das normas legais, com as devidas consequências,
WW. o que não significa que as correcções efectuadas pela AT, ao abrigo dos princípios que norteiam o Direito Fiscal, desrespeitem os princípios constitucionais da livre iniciativa e da propriedade privada,
XX. ou mesmo seja questionada a boa-fé dos intervenientes, pois o artigo 58.° do CIRC apenas se limita a extrair as consequências fiscais de terem sido praticadas condições díspares das que seriam fixadas na ausência de relações especiais.
YY. Numa economia de mercado, normalmente os preços são formados através da oferta e da procura, pois os interesses das contrapartes serão tendencialmente opostos.
TL. Ou seja, o adquirente irá procurar adquirir o bem ou serviço pelo melhor preço possível, ao passo que o vendedor procurará auferir o maior rendimento possível com a realização da transacção.
AAA. No entanto, quando em presença de relações especiais, uma das contrapartes goza do poder de exercer uma influência significativa nas decisões da outra, o que poderá conduzir a que as condições efectivamente praticadas se afastem das condições que normalmente seriam praticadas entre entidades independentes com os efeitos fiscais daí decorrentes.
BBB. Atento a esta situação, o legislador, tendo presente o princípio da igualdade, consagrou no artigo 58.° do CIRC a possibilidade destas operações serem tributadas, não em função das condições acordadas pelas partes, mas em função das condições que seriam definidas caso as mesmas tivessem sido realizadas por entidades independentes.
CCC. Em sede de preços de transferência não se procede a nenhuma recaracterização dos negócios, muito menos se considera que constitui requisito para a aplicação do artigo 58.° do CIRC que estejamos em presença de negócios não permitidos pela lei comercial (ou outra), pois da aplicação desse preceito legal apenas se pretende proceder à tributação das operações que as partes pretenderam realizar (e que a Administração reconhece que realizaram) mas em relação às quais a Administração Fiscal demonstrou que não foram respeitadas as condições normais de mercado.
DDD. No sentido pugnado pela Fazenda Pública veja-se o Acórdão do STA de 11-02- 2009, proc. 0862/08 onde pode ler-se “Por vezes, as normas fiscais desconsideram custos (em função da sua impertinência empresarial), e consideram preços diferentes dos que foram acordados pelas partes. Estas normas são genericamente consideradas como normas anti-abuso. Tais normas, apontando o tipo específico de abuso que querem prevenir, condicionam a liberdade de conformação dos negócios.”
EEE. Quanto à definição da fronteira entre a liberdade de gestão empresarial e o alcance destas específicas medidas de combate à elisão fiscal (onde se insere obviamente o artigo 58.° do CIRC),
FFF. António Moura Portugal in “A dedutibilidade dos custos na jurisprudência Fiscal Portuguesa”, Coimbra Editora, 2004, página 347 referencia que “Tratando-se de especiais casos ou limites à dedutibilidade, previstos em norma expressa, a solução é óbvia e decorre da lei, pois que esta limitação traduz a forma de combate à evasão fiscal eleita pelo legislador. Contudo, estas medidas específicas esgotam-se nas situações nelas previstas, daí advindo um limite para a Administração Fiscal, que não pode alargar ou estender as normas de incidência tributária, sob pena de violação do princípio da legalidade fiscal.”
GGG. Continuando “Se é certo que tanto nas normas anti-abuso, como na cláusula geral do artigo 23.° estamos perante um mesmo fim informador - prevenir abusos de dedutibilidade ou evitar fugas ao Fisco - este desiderato é procurado por vias distintas: no primeiro caso, trata-se de prescindir dos valores fornecidos pelo contribuinte, limitando-os ou substituindo-os por valores normais, de mercado. No segundo caso, não há uma alteração do valor, mas apenas e tão só uma negação dos seus efeitos por via do comando legal e das exigências de comprovação e indispensabilidade.” E acrescenta, que “existem custos que, perfeitamente admissíveis do ponto de vista do Direito Comercial, não são dedutíveis para efeitos fiscais.”
HHH. A propósito do regime dos preços de transferência, J.L. Saldanha Sanches in “Manual de Direito Fiscal”, 3.a Edição, Coimbra Editora, página 167, enquadra o artigo 58.° do CIRC como uma cláusula anti-abuso específica e refere que “Está aqui em causa o direito de uma empresa de fixar livremente os preços que pratica nas suas compras e vendas. Nos preços de transferência não está em causa a manipulação das formas jurídicas, mas apenas a possibilidade de manipulação dos valores praticados, uma vez que as sociedades, em vez de se encontrarem à normal distância do mercado, estão sujeitas a uma direcção comum, podendo uma das sociedades determinar a vontade da outra de modo a obter vantagens fiscais.”
III. Assim, a correcção em questão não teve por base qualquer intromissão nas decisões da gestão, mas apenas a extracção das consequências fiscais resultantes do incumprimento do princípio de plena concorrência, postura que tem acolhimento no disposto do artigo 58° do CIRC.
JJJ. Portanto, no âmbito das operações lícitas, o legislador pretendeu salientar a existência de certos negócios considerados abusivos ou anómalos introduzindo na lei fiscal para os combater ou neutralizar medidas anti abuso especiais, das quais o artigo 58° do CIRC, em análise, é disso exemplo.
KKK. Como referencia Tiago Caiado Guerreiro in “O novo regime Fiscal das SGPS”, Vida Económica - Editorial. SA, pág. 85: “Uma cláusula geral anti abuso tem como objectivo estabelecer uma repressão ao abuso do direito à poupança fiscal, considerando como tais os negócios anómalos mas reais (isto é, negócios efectivamente queridos e efectuados pelas partes e não meros negócios simulados) que tenham por escopo (normalmente exclusivo) a elisão da aplicação de normas de incidência tributária (poupança fiscal extra legem)”
LLL. Ora, no caso em apreço, procuraram os SIT, através dos factos controvertidos, demonstrar os termos e condições em que decorreram as operações sob análise, confrontando-as com as que seriam normalmente aceites se aquelas operações tivessem sido praticadas entre partes independentes, objectivando assegurar a justiça na tributação, através da paridade no tratamento fiscal entre empresas integradas num grupo e empresas independentes.
MMM. Refira-se ainda que, de acordo com o disposto no parágrafo 1.10 do Relatório da OCDE em matéria de preços de transferência, poderão existir problemas de ordem prática na aplicação do princípio de plena concorrência quando empresas associadas realizam operações que empresas independentes não efectuariam. A realização de tais operações torna difícil a aplicação do princípio da plena concorrência, podendo conferir alguma artificialidade às mesmas. No entanto, e de acordo com doutrina internacional nesta matéria, esta artificialidade é endémica da aplicação do princípio de plena concorrência e não poderá impedir a sua aplicação.
NNN. Acresce que, de acordo com o ponto 1.40. das Guidelines “(...) para determinar se uma operação vinculada tal como está estruturada, satisfaz o princípio de plena concorrência, a Administração Fiscal pode considerar útil ter como referência operações entre empresas independentes, levadas a efeito segundo modalidades distintas (...)”.
000. Por outro lado, mesmo que se concluísse pela não comparabilidade quanto ao aspecto formal das operações, o que só por mero dever de raciocínio se coloca, teríamos na mesma que atender ao ponto 1.70 das Guidelines, segundo o qual “(...) Não é desejável que informações úteis, como as que dizem respeito a operações no mercado aberto não idênticas às operações vinculadas, sejam rejeitadas pela simples razão de não satisfazerem totalmente um critério de comparabilidade aplicado de modo rígido."
PPP. A aplicação do princípio da plena concorrência assenta assim numa comparação entre as condições praticadas numa operação vinculada (entre empresas em situação de relações especiais) e as condições praticadas numa operação entre empresas independentes, determinando para o efeito o n.° 2 do art. 58.° do CIRC, a imputação ao sujeito passivo do dever de adoptar um método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações e outras substancialmente idênticas em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais.
QQQ. A jurisprudência tem vindo a defender que a avaliação de qualquer operação e encargo/proveito associado deverá ser efectuado numa perspectiva individualizada de cada empresa ou instituição, em detrimento de uma óptica de gestão do grupo. Assim, estas operações poderão fazer sentido quando analisadas em termos de impacto das mesmas no seio do Grupo, mas, quando se analisa o impacto das mesmas na esfera jurídica da [SCom01...], fica realçado desde logo a irracionalidade económica das mesmas, pois nenhuma entidade independente estaria disposta a prescindir (através da diminuição dos seus custos) da rentabilidade associada à diferença de taxas.
RRR. De acordo com a alínea b) do n° 4 do artigo 58° considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente uma entidade e os titulares do respectivo capital (...) detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto.
SSS. Ora, de acordo com a página 30 do Relatório e Contas Consolidadas da [SCom03...], SA, referente ao exercício de 2003, quer a [SCom01...] quer a [SCom05...] são detidas em 100% pelo Grupo " Y ".
TTT. Por sua vez, a impugnante não refuta a existência de relações especiais entre si e a [SCom03...] e a [SCom05...].
UUU. Concluíram os SIT que a [SCom01...], embora tenha relações com vários fornecedores apenas incorre em juros de mora com a [SCom05...], entidade relacionada, optando, nos restantes casos, pela liquidação das dívidas aos fornecedores em vez de efectuar aplicações, pelo que,
VW. o lucro tributável apurado foi diferente do que se apuraria na ausência dessas relações, uma vez que não foram praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados com clientes independentes (a entidade independente teria preferido amortizar a dívida à [SCom05...] em vez de efectuar a abertura de crédito, dado que com a primeira hipótese teria aumentado mais o seu património).
WWW. Não cumpriu assim, a impugnante, as regras de plena concorrência, pelo que os SIT procederam às necessárias correcções, utilizando para o efeito o Método do Preço Comparável de Mercado (MPCM), previsto na alínea a) do n.° 3 do artigo 58.° do CIRC e no artigo 6.° da Portaria 1446-C/2001, de 21/12, tendo sido apurado um valor global de € 367.069,00 para as transacções efectuadas no ano de 2003, resultante dos preços praticados serem substancialmente inferiores para as entidades relacionadas, em comparação com preços praticados para entidades independentes.
XXX. No processo de escolha do método a adoptar, imputando ao sujeito passivo o dever de optar pelo método mais apropriado para cada operação, o n.° 2 do art.° 4 da referida Portaria, considera como método mais apropriado para cada operação aquele que é susceptível de fornecer a melhor e mais fiável estimativa dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência, devendo proporcionar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações vinculadas e outras não vinculadas, de forma a que se faça o menor número de ajustes para eliminar as diferenças existentes entre factos e as situações comparáveis.
YYY. E, tal como resulta do disposto no n.° 3 do artigo 4.° da mesma Portaria: “Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares (...)
zzz. Refira-se que a legislação exige apenas que as operações sejam substancialmente idênticas, e não que sejam coincidentes.
AAAA. Adicionalmente, cumpre-nos recordar que, de acordo com o ponto 2.7 das Guidelines, o MPC “constitui o meio mais directo e mais fiável de aplicação do princípio de plena concorrência. Por consequência, neste caso deve ser dada preferência a este método sobre os demais.”
BBBB. Tal método adapta-se a, praticamente, qualquer tipo de operação económica, desde que esteja disponível informação comparável, de qualquer tipo de fonte (interna ou externa). Com efeito, desde que seja possível a identificação de operações comparáveis em mercado aberto, o MPC apresenta-se como a forma mais directa e segura de garantia do Princípio da Independência, sendo, por isso, preferível em relação aos demais métodos.
CCCC. Quanto à influência reconhecida às Guidelines da OCDE na interpretação das questões de Preços de Transferência, apraz referenciar que o preâmbulo da Portaria 1446-C/2001, de 21/12 refere que “(...) nos casos de maior complexidade técnica, é aconselhável a consulta dos relatórios da OCDE que desenvolvem esta matéria, e cuja adopção pelos países membros é objecto de recomendações aprovadas pelo Conselho desta organização internacional.
DDDD. As orientações emanadas pela OCDE constituem uma fonte de primordial importância na interpretação da temática de preços de transferência, nomeadamente, na aplicabilidade do princípio de plena concorrência.
EEEE.A este respeito, Stephen Callahan in “As Novas Regras de Preços de Transferência em Portugal”, Fisco n°s 97-98, Setembro, 2001, p. 39-46, refere que “A OCDE através do Comité para os Assuntos Fiscais, tem incentivado as Administrações Fiscais e contribuintes a adoptar princípios internacionais comuns de tributação, com o propósito de estimular o comércio e evitar a dupla tributação internacional.”
FFFF. No mesmo sentido, Helena Evangelista e Sousa in “O contributo da OCDE para a disciplina dos preços de transferência”, em "Preços de Transferência Casos Práticos”, Vida Económica, 2006, página 205, referencia que “Portugal acolheu amplamente as directrizes da OCDE sobre preços de transferência, não se tendo coibido de referir expressamente essa “fonte”.
GGGG. De facto, quer em diplomas preambulares, quer na Jurisprudência, deparamo-nos com assumidas menções aos Relatórios e Recomendações da OCDE.
HHHH. No plano jurisprudencial, são várias as decisões judiciais em que é feita menção aos trabalhos da OCDE relativos aos preços de transferência, não só do lado dos sujeitos passivos como também na própria fundamentação do posicionamento do Tribunal e da Administração Tributária - vide o Acórdão do TC A Sul de 27.04.2006, proc. 04902/01.
IIII. Assim, não podemos, com o devido respeito, conceder, como entendeu o Tribunal a quo, que a AT não aporta para o caso factores que importa ter em linha de conta quando se pretende assegurar ou aferir se existe o necessário grau de comparabilidade entre a operação sob análise e operações consideradas comparáveis, pois,
JJJJ. resulta do exposto e do relatório de inspecção que os factores que havia a considerar foram considerados e que a fundamentação expendida apresenta-se de molde a aferir que a situação se subsume ao disposto no artigo 58° do CIRC.
KKKK. Destarte, decidindo como decidiu o Tribunal a quo, incorreu em erro de julgamento de facto e consequentemente, em erro de julgamento de direito.
Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências».

Notificada, Recorrida não respondeu à alegação

O Digno Magistrada do Ministério Público neste Tribunal apresentou douto parecer no sentido da improcedência do recurso, de se transcreve o essencial:
«(…) constata-se que a Recorrente contra a sentença recorrida, por, alegadamente, enfermar de erro de julgamento de facto e de direito no que tange às correcções provenientes de provisões para cobranças duvidosas sobre fornecedores, E de encargos contabilizados em “imobilizado incorpóreo” e às correcções aos juros de mora suportados pela [SCom01...] junto da [SCom05...] e de juros cobrados à [SCom03...].
Sucede que, em nosso entender não assiste qualquer razão à Recorrente uma vez que a sentença impugnada fez uma correta interpretação dos factos e aplicou correctamente o direito que lhes corresponde.
Assim, no tocante às questões jurídicas suscitadas nas conclusões das alegações da Recorrente, discorre a Mma Juíza a quo, na douta sentença recorrida, com proficiência, fazendo uma exegese rigorosa dos preceitos legais, avalizada pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores.
Na verdade, a Mma Juíza a quo citou, inventariou e analisou as disposições que convocou para a solução do caso vertente.
Fê-lo com clareza, acerto e proficiência, razão pela qual merece a nossa total adesão.
Sendo igualmente válida toda a argumentação do Ex.°. Senhor Procurador da República do TAF do Porto, expendida no seu douto parecer de fls. 589 a 597 do processo fiscal, com o qual concordamos e cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos.
Acresce que as considerações interpretativas aí vertidas são, quanto a nós, inteiramente válidas e pertinentes e resultam da mais sã e fidedigna hermenêutica jurídica, sendo, ademais, as que decorrem dos ensinamentos dos mais insignes autores
Já o entendimento plasmado nas alegações dor recurso em apreço, se nos afigura por demais simplista, desarticulado e confuso e, daí, contrário aos ensinamentos da doutrina e da jurisprudência e, também, violador das disposições legais aplicáveis, pelo que não o sufragamos.
Nesta conformidade, sem necessidade de aduzir argumentação mais aprofundada, pronunciamo-nos pela improcedência do recurso (…).»

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.
II
Âmbito do recurso e questões a decidir
Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações.
Ora, a Recorrente, embora enuncie como objecto do recurso, logo no início das alegações e, depois, nas conclusões C) e D), como objecto do seu inconformismo e do recurso, toda a dimensão da sentença que julgou procedente a Impugnação, acaba por apresentar conclusões que não comportam qualquer critica da sentença recorrida quanto ao decidido em matéria de a anulação da liquidação de juros compensatórios no valor de € 804,22, relativos a um reembolso indevido.
Assim sendo, nesta parte a sentença recorrida não será sindicada nesta instância, indo o recurso julgado, sem mais, improcedente nessa parte.
Neste pressuposto, as questões que a recorrente suscita são, por ordem lógica, as seguintes:

1ª Questão:
O tribunal a quo errou no julgamento de facto e de direito ao infirmar a desconsideração, pela AT, como custos, em ordem às liquidações impugnadas, das amortizações do investimento relativo à Marca"X"”, dita própria, no valor de € 196.206,23, pois não se trata de marca própria da impugnante nem os custos com a mesma foram cobrados à empresa detentora da marca?

2ª questão
O tribunal a quo errou no julgamento de direito ao infirmar a desconsideração pela AT como custos, em ordem às liquidações impugnadas, das provisões para cobranças duvidosas, relativas a dívidas de fornecedores, no valor de € 984.594,87, pois tais dívidas não resultam do que se pode dizer ser actividade normal da empresa para efeitos do artigo 34º nº 1 alª ) do CIRC de então, uma vez que não correspondem a transacções constitutivas da actividade principal da empresa, pois têm origem em descontos percentuais – rappel – obtidos pela Impugnante junto dos fornecedores, sendo certo que não se concebe como é que a concessão de um desconto por parte do fornecedor o pode fazer entrar em mora de devedor no valor do desconto?

Questão
O tribunal a quo errou no julgamento de facto e de direito ao julgar viciada de insuficiência de fundamentação, em face das exigências legais de fundamentação (artigo 77 nºs 1 e 3 alíneas b) e c) da LGT, 268º nº 3 da Constituição r 123º nº 1 d) 124º e 125º do CPA (antigo) a adição feita pela AT, de 367 069 €, ao rendimento colectável, em ordem às liquidações impugnadas, com fundamento no artigo 58º nº 1 do CIRC (regime dos preços de transferência), a propósito dos juros de mora suportados pela [SCom01...] junto da “[SCom05...]” ([SCom05...]), já que os serviços de Inspecção demonstraram os termos e condições em que decorreram as operações sob análise, confrontando-as com as que seriam normalmente aceites se aquelas operações tivessem sido praticadas entre partes independentes?


III – Apreciação do Recurso
Da decisão recorrida convém transcrever, antes de mais, a enunciação dos factos provados e não provados e a respectiva fundamentação:
«Com relevância para a decisão a proferir resultam, provados os seguintes factos:
1. Em 2003, a "[SCom01...], SA", era uma sociedade anónima, com o capital social de € 2.500.000,00, cuja actividade principal consistia no "Comércio armazenista de produtos alimentares", tendo, em Julho de 2003, transferido para a [SCom02...], SA toda a actividade de entreposto, alienado o inventário e passado a efectuar serviços de logística e continuando com a parte de armazenamento, sendo detida em 31.12.2002 a 100% pela [SCom01...] SGPS, a qual, alienou, em 31.12.2003, a sua participação na "[SCom01...], SA" à [SCom06...], detida a 100% pela [SCom03...] [cfr. relatório de inspecção tributária (RIT) a fls. 71-72 do processo físico].

2. A sociedade "[SCom01...], SA", relativamente ao exercício de 2003, na declaração de rendimentos apresentada, Auto-liquidou IRC a pagar, no montante de € 37.303,58 [cfr. declaração de rendimentos modelo 22, junta como documento 12 com a PI, a fls. 198 a 202 do processo físico].

3. Em 31.05.2004, a "[SCom01...], SA" pagou o IRC autoliquidado a que se reporta o ponto anterior [cfr. vinheta aposta no modelo Pl, junto como documento 13 com a PI, a fls. 204 do processo físico].
4. Em 09.02.2006 foi emitido o cheque do tesouro a favor da "[SCom01...], SA", no valor de € 78.069,35, relativo ao reembolso do mesmo valor, com o n....31, resultante da liquidação n....28, de 22.09.2004, referente a IRC do exercício de 2003, identificada pela compensação n....34, emitida em 03.02.2006 [cfr. documento 14 junto com a PI, a fls. 204 do processo físico].
5. Na sequência de acção de inspecção à "[SCom01...], SA", incidente sobre o exercício de 2003, em 19.06.2006, foi emitida a liquidação de IRC n.º ...79, no montante de € 553.705,51 [cfr. documentos 2 e 3, juntos com a PI, a fls. 47-52 do processo físico].

6. A referida liquidação de IRC n.º ...79 foi anulada em 21.06.2006 [cf. documentos 2 e 3, juntos com a PI, a fls. 47-52 do processo físico].

7. Em 20.08.2006, para cobrança, além do mais, da liquidação de IRC do exercício de 2003, com o n.º ...79, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º ...19, [cfr. documento 2 junto com a PI, a fls. 47-50 do processo físico].

8. Em 24.11.2006, ao processo de execução fiscal n.º ...19, foi associada a garantia n.º ...80 de 2006 [cfr. documento 2 junto com a PI, a fls. 49 do processo físico].

9. Em 02.05.2007, foi registada a fusão, através da qual a "[SCom01...], SA", com o número de identificação de pessoa colectiva ...20, foi juntamente com outras sociedades, incorporada por transferência global de património, pela "[SCom02...], SA", com o número de identificação de pessoa colectiva ...75 [cfr. documento 1, junto pela Impugnante, a fls. 46 do processo físico].

10. Referente à liquidação n.º ...79, do exercício de 2003, foi emitida a "demonstração de reacerto financeiro de liquidação de IRC", no montante de €546.865,74, que inclui o valor de € 34.660,24 relativo a juros compensatórios comunicada à impugnante pelo documento n.º ...13 e a "demonstração de liquidação de juros", comunicada à impugnante pelo documento n.º ...59, concomitantemente com a "demonstração de acerto de contas", relativa à compensação n.º ...32, com a data de 04.06.2007, que integra a notificação de cobrança e a referência à data limite de pagamento de 11.07.2007 [cfr. documentos 5 a 7, juntos pela Impugnante com a PI, a fls. 58-62 do processo físico].

11. A referida "demonstração de acerto de contas", identificada pelo documento n....90, integra o movimento correspondente ao "extorno da liq. de 2003 -Liq. ...79", pelo valor de "+553.705,50", o movimento correspondente ao "Acerto Liq. de 2003 - Liq. ...79", pelo valor de "-512.205,50" e os movimentos relativos às liquidações de juros compensatórios, pelos valores de "-33.856,02" e "-804,22", especificados na "demonstração da liquidação de juros", do seguinte modo: "Juros Compensatórios (artigo 94º do ClRC)". liquidação n.º ...20, reportada à liquidação n.º ...79, valor base de 426.118,99, período de 01.06.2004 a 26.05.2006, taxa 4% e valor de € 33.856,02 e "Juros Compensatórios por Recebimento Indevido", liquidação n.º ...21, reportada à liquidação n.º ...79, relativa a IRC do exercício de 2003, valor base de € 78.069,35, período de cálculo de 22.02.2006 a 26.05.2006, à taxa de 4%, totalizando o montante de €804,22 [sublinhado nosso, cfr. documentos ..., ... e ... juntos com a PI, a fls. 58,59 a 62 e informação da DSIT defls. 268 do processo físico].

12. Em 05.06.2007, foi repercutida no processo executivo n.º ...19, a anulação referida no ponto 6., pelo valor de € 553.705,51 [cfr. documento 2 junto com a PI, a fls. 49 do processo físico].

13. O processo executivo n.º ...51 foi instaurado para cobrança de dívida integrada na certidão n.º 2007/...60, de 01.08.2007, com a quantia exequenda de € 546.865,75, relativa a IRC de 2003 [cfr. documento 3, junto pela lmpugnante com a PI, a fls. 52 do processo físico].

14. Em 18.09.2007, no processo executivo n.º ...51, foi proferido despacho determinando a suspensão do processo, em virtude da intenção de deduzir impugnação, condicionada à prestação de garantia bancária no montante de € 697.373,25 [cfr. documento 4, junto pela Impugnante com a PI, a fls. 53 a 56 do processo físico].

15. Em 04.10.2007, pelo Banco 1..., SA, foi emitida a garantia n.º GAR/......01, à ordem da Direcção Geral de Impostos, no valor de €697.373,25 e foi debitado à Impugnante o valor de € 5.113,31 e, em cada uma das seguintes datas - 04.01.2008, 04.04.2008, 04.07.2008, 06.10.2008, 05.01.2009 e 06.04.2009 - foi debitado o montante de € 897,87 [cfr. documento 6, junto pela Impugnante, a fls. 493-499 do processo físico].

16. No processo de execução fiscal n.º ...19, foi junto o requerimento da ora Impugnante, de 16.11.2009, na qualidade de sociedade incorporante da [SCom01...], SA, solicitando a "autorização para alteração do tomador do seguro caução, apresentado como prestação de garantia (...), por ter sido apresentada Impugnação Judicial” [cfr. documento 1 junto pela lmpugnante, a fls. 439-440 do processo físico].

17. No processo de execução fiscal n.º ...19, foi prestada informação, em 27.11.2009, no sentido de que "em virtude de anulação total da nota de cobrança n.º ...65, relativa a IRC do ano de 2003, o valor dos presentes autos totaliza nesta data o montante de €170.124,57, pelo que, (...) o valor da garantia poderá ser reduzido para € 212.655,71" [cfr. documento 1 junto pela Impugnante, a fls. 438-439 do processo físico].

18. Em 27.11.2009, no processo de execução fiscal n.º ...19, foi proferido despacho autorizando a alteração do tomador do seguro caução prestado pela [SCom07...], SA, a que corresponde a apólice n.º ...35, nos termos requeridos e autorizando a redução do montante seguro para €212.655,71 [cfr. documento 1 junto pela Impugnante, a fls. 439-440 do processo físico].

19. O despacho referido no ponto anterior foi comunicado à Impugnante, pelo ofício n.º ...17, de 27.11.2009 [cfr. documento 1 junto pela Impugnante, a fls. 439-440 do processo físico].

20. Em 19.01.2010, deu entrada no Serviço de Finanças ..., a cópia da acta adicional n.º 1, com a data de 12.01.2010, relativa à apólice n.º ...35 em que é tomador do seguro a ora Impugnante, reflectindo que o montante seguro passa a ser de € 212.655,71 [cfr. documento junto pela Impugnante, a fls. 441 do processo físico].

21. Na origem das liquidações referidas no ponto 5. e 10., relativas ao exercício de 2003, emitidas à "[SCom01...], SA", esteve uma inspecção tributária externa, de âmbito geral, efectuada ao abrigo da ordem de serviço n.º ...01, de 26.06.2005, que incidiu sobre aquele exercício, iniciada em 29.07.2005 [cfr. relatório de inspecção tributária (RIT) a fls. 296-302, informação de fls. 72 e carta-aviso de fls. 96, do PA anexo aos autos].

22. Simultaneamente, a "[SCom01...], SA", estava a ser objecto de uma inspecção tributária, ao abrigo da ordem de serviço n.º ...00, de 20.06.2005, que incidiu sobre o exercício de 2002, iniciada em 27.07.2005 [cfr. informação de fls. 72 do PA anexo aos autos].


23. Em 10.01.2006, no âmbito das inspecções tributárias referidas no ponto 21. e 22., foi elaborada informação que refere que o prazo de seis meses para a conclusão dos referidos procedimentos inspectivos termina em 27.01.2006 e 29.01.2006, para os exercícios de 2002 e 2003, e solicita a ampliação do referido prazo do procedimento por mais três meses, com base na circunstância de que "o sector em que o sujeito passivo se insere envolve situações de especial complexidade" por "reunião das condições referidas na alínea a) do n.º 3do artigo 36.º do RCPIT" [cfr. informação n.º ...1-ITC/06, de fls. 71-72 do PA anexo aos autos].

24. Em 10.01.2006, na informação referida no ponto 23, foi proferido parecer de confirmação e determinação da notificação ao sujeito passivo da prorrogação do prazo, ao abrigo do n.º 4 do artigo 36.º do RCPIT, sobre o qual recaiu despacho de concordância, de 13.01.2006 [cfr. parecer e despacho lavrados na informação n.º ...1-ITC/06, de fls. 71-72 do PA a nexo a os autos].

25. A informação, o parecer e o despacho a que se reportam os pontos 23. e 24. foram comunicados, em 19.01.2006, à "[SCom01...], SA", com a menção de que "foi prorrogado o prazo por mais três meses, nos termos da alínea a) do n.º 3 do art. 36.º do RCPIT" [cfr. ofício ...70 da DSPIT, datado de 13.01.2006 e ofício ...74 da DSPIT, datado de 16.01.2016, de fls. 69 e 70 do PA a nexo aos autos].

26. Em 20.01.2006, no âmbito das inspecções tributárias referidas no ponto 21. e 22., foi elaborada informação solicitando uma segunda ampliação do prazo inicial de seis meses para a conclusão dos referidos procedimentos inspectivos, por mais três meses, referindo que ao abrigo da primeira prorrogação, o prazo terminaria em 27.04.2006 e 29.04.2006, respectivamente para os exercícios de 2002 e 2003, e acrescentando que "dada a circunstância de o sector em que o sujeito passivo se insere envolver situações de especial complexidade" estão "reunidas as condições referidas na alínea a) do n.º 3 do artigo 36.º do RCPIT, devendo ser o sujeito passivo notificado, nos termos do n.º 4 do art. 36.® do RCPIT" [cfr. informação n.º ...7-ITC/06, de fls. 77-78 do PA anexo aos autos].
27. Em 20.04.2006, na informação referida no ponto 26., foi proferido parecer de confirmação e determinação da notificação ao sujeito passivo da prorrogação do prazo, ao abrigo do nºs 4 do artigo 36.º do RCPIT, sobre o qual recaiu despacho de concordância, de 02.05.2006 [cfr. parecer e despacho lavrados na informação n.º ...7-ITC/06, de fls. 77-78do PA anexo aos autos].

28. Em 04.05.2006, à "[SCom01...], SA", foi comunicado que "foi prorrogado o prazo por mais três meses, nos termos da alínea a) do n.º 3 do art. 36.º do RCPIT" relativo aos procedimentos de inspecção aos exercícios 2002 e 2003 [cfr. ofício ...18 da DSPIT, datado de 02.05.2006 de fls. 76 do PA anexo aos autos].

29. Em 05.05.2006, no âmbito da inspecção referida no ponto 21, foi comunicada ao sujeito passivo a nota de diligência a que se refere o artigo 61.º do RCPIT [cfr. nota de diligência a fis.74 PA anexo aos autos].

30. O relatório final da acção inspectiva referida no ponto 21. foi comunicado à "[SCom01...], SA" pelo ofício ...19 de 05.06.2006 e apresenta, além do mais, o seguinte teor [cfr. relatório de inspecção tributária de fls. 65 a 125 do I volume do processo físico]:
III -1.1.1 - Provisões para cobranças duvidosas - dívidas de fornecedores
A empresa vem constituindo provisões para cobranças duvidosas, tendo atingido no exercício de 2003 o valor acumulado de € 3.958.539,91, conforme se pode verificar pelos saldos das contas «28100100 - Provisões para cobranças duvidosas - Clientes», cujo montante ascende a € 377.855,58 e «28800100 - Provisões para cobranças duvidosas -0 / Fornecedores» de valor igual a € 3.580.684,33;
(...)
Quanto às provisões para cobranças duvidosas relacionadas com saldos devedores de fornecedores, a empresa considerou como custo do exercício o montante de € 984.594,87, contabilizado na conta 6718 - Provisões do exercício - outras dívidas de terceiros.
As provisões para cobranças duvidosas de fornecedores são constituídas da seguinte forma:
■ A empresa procede a uma avaliação trimestral da situação das dívidas dos fornecedores, avaliação que tem em conta a sua mora, o seu eventual pagamento ou a sua reclamação judicial e, por último, a verificação da existência de processos judiciais de falência ou de processos especiais de recuperação de empresas relacionados com os fornecedores devedores;
■ Com base na avaliação referida, a empresa procede à relevação contabilística da provisão pelo saldo global apurado, ou seja, pela diferença entre o saldo final apurado e o correspectivo saldo final; daqui resulta que a política adoptada é a de não efectuar registos contabilísticos individuais das dívidas, mas, pelo contrário avaliar global mente a situação (a avaliação é suportada por um mapa elaborado em Excel);
■ Mediante os procedimentos descritos, se se apurar um saldo positivo, regista-se o aumento de custos por via do lançamento desse saldo na rubrica 6718 - lançamento a débito; caso se apure um saldo negativo, ou seja, sempre que o montante das dívidas no final do trimestre for inferior ao montante das dívidas no início do trimestre, então procede-se ao lançamento a crédito da mesma conta 6718; e
■ Por outro lado, quando se verificam dívidas incobráveis, a empresa procede à sua relevação contabilística na conta 69200100 - Dívidas incobráveis, reflectindo na conta de proveitos 79620100 Redução de provisões, o custo anteriormente relevado nas respectivas contas de custo 6718. Quando ocorrem os recebimentos das dívidas dos fornecedores, o lançamento na conta de proveitos processa da mesma forma, ou seja, o custo anteriormente registado numa conta 6718 é anulado por via do reconhecimento do proveito.
(...)
Ora, na situação em apreciação, a constituição de provisões para dívidas de fornecedores, para que as mesmas sejam aceites fiscal mente como custos, são essenciais três requisitos: que os créditos resultem da actividade normal; que estejam em mora há mais de seis meses e tenham sido efectuadas diligências para o seu recebimento; e tenham sido evidenciados como tal na contabilidade.
Analisadas as demonstrações financeiras, confirma-se que as provisões estão devidamente evidenciadas na contabilidade.
Questionado o sujeito passivo quanto às diligências efectuadas para o recebimento dos créditos em mora, as mesmas foram apresentados.
Por último, a questão que se coloca é a de se saber se os saldos devedores de fornecedores são de qualificar como créditos resultantes da actividade normal, pois só estes são relevantes para efeitos de provisionamento, no âmbito da alínea a) do n.º 1 do Art.º 34.º do CIRC.
(...)
Assim sendo, os saldos devedores de fornecedores seja qual for a sua natureza, não relevam para efeitos da base de incidência das provisões para créditos de cobrança duvidosa, pois só os créditos sobre clientes resultantes das transacções de bens e serviços relacionados com a actividade produtiva da empresa, devem ser qualificados como créditos resultantes da actividade normal, para efeitos da constituição da previsão prevista na alínea a) do n.º 1 do Art.º 34.º do CIRC.
Face ao referido, os saldos devedores de fornecedores provisionados não se enquadram na disposição prevista na alínea a) do n.º 1 do Art.º 34.º do CIRC, pois os mesmos não correspondem a transacções passíveis de serem consideradas correntes, requisito essencial para serem provisionáveis ao abrigo do referido normativo.
Em face do que antecede, e de acordo com o preceituado na alínea a) do n.º 1 do Art.º 34.º do CIRC, o sujeito passivo considerou provisões indevidas no apuramento do seu resultado líquido, no valor de € 984.594,87, o qual não é aceite como custo para efeitos fiscais, pelo que se acresce o referido montante ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo.
Desta forma, propõe-se um acréscimo ao lucro tributável declarado de € 984.594.87.

III -1.1.2. Amortização de marca própria
O sujeito passivo contabilizou na rubrica «43200100 - Imobilizado Incorpóreo - Despesas de Investigação e Desenvolvimento» encargo incorrido em 30 de Novembro de 2000, com um projecto de investimento intitulado "Controlo de Marcas" pelo valor definitivo de € 706.342,46. A partir desta data, o referido valor passou a ser amortizado - por duodécimos - à taxa de 33,33% (3 anos), conforme dispõe o Decreto Regulamentar 2/90 de Janeiro.
Assim, no exercício de 2000, foi relevado como custo do exercício o montante de € 39.241,25; no exercício de 2001, foi relevado como custo do exercício o montante de € 235.447,49; em 2002, foi igualmente relevado como custo do exercício, na conta «66320100 - Amort. Imobilizado Incorpóreo -1 & Da.», o montante de € 39.241,25 e, no exercício 2003, foi relevado como custo do exercício o remanescente no montante de€ 196.206,23.
O projecto contém as despesas resultantes da adaptação da Marca"X"" de vários produtos comprados pela "[SCom01...]" e depois vendidos à empresa "[SCom02...], SA".
Relativa mente aos documentos que sustentam o projecto os mesmos foram analisados aquando da acção inspectiva efectuada em 2003, por força das ordens de serviço (...) que incidiram, respectivamente, sobre os exercícios de 1999 a 2001. No relatório final elaborado e que aqui se dá como integralmente reproduzido, na parte respeitante a esta temática, foi descrito todo o processo de selecção de documentos e contratos analisados bem como, todos os motivos que levaram à consideração como Despesas de Investigação e Desenvolvimento elegíveis para efeitos de capitalização de tais custos.
Conclui-se, então que os custos em que a "[SCom01...]" incorreu ao suportar todos os encargos decorrentes da adaptação das embalagens à Marca"X"" eram, na realidade, não um custo da "[SCom01...] ", mas sim da [SCom02...], entidade que recolhe todos os beneficias da utilização da referida marca.
Com base nestas conclusões, foi na altura verificado que estes custos não haviam sido repassados para a [SCom02...] ou seja, o encargo suportado com tais custos não tinham sido imputados à entidade que, efectivamente, obtinha os benefícios da utilização da marca. Por esse motivo os custos evidenciados (...) não foram aceites como custos para efeitos fiscais, uma vez que não cumpriam os requisitos de indispensabilidade previstos no Art.º 23.º do CIRC, já que eram encargos correspondentes à «manifestação de interesses alheios à vida da sociedade.
Em face do acima exposto, questionamos a empresa quanto aos procedimentos efectuados no exercício em apreciação, tendo-nos sido dito que quanto a esta matéria, procedimentos não tinham sido alterados relativa mente aos exercícios anteriores (cfr. Anexo 1).
Desta forma, os custos relevados na conta «66320100»(...) de montante igual a € 196.206,23, não são indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, conforme dispõe o citado Art.º 23.º do CIRC, pelo que os mesmos não devem ser aceites fiscalmente. Relativamente a esta matéria, as correcções propostas implicam um acréscimo ao lucro tributável declarado de € 196.206.23".

III - 1.1.3. Juros de mora suportados com a entidade relacionada não residente [SCom05...], S.A. ([SCom05...].)
Descrição da operação e Condições contratuais
Em 31 de Dezembro de 2003, na contabilidade da "[SCom01...]", estava evidenciado um custo no montante de € 1.801.622,37, resultante de juros suportados com atrasos nos pagamentos efectuados à [SCom05...], adiante designada por "[SCom05...]".
A taxa de juro praticada é a legalmente estipulada em Espanha, para quaisquer atrasos de pagamento relativamente aos prazos acordados, sendo que esta se cifrava em 5,5%, durante o ano de 2003.
Concessão de uma linha de crédito
Em termos gerais poderemos referir que as linhas de crédito constituem operações financeiras, por regra de prazo inferior a um ano, e visam dar resposta a necessidades pontuais de tesouraria. Geralmente, consistem em acordos pelos quais as entidades contratualizam determinados limites de crédito (vulgo plafonds), cuja utilização, total ou parcial, está à disposição, em determinado momento, das respectivas entidades que destes beneficiam.
A "[SCom01...]" assinou um contrato, datado de 18/12/2002, válido por um prazo improrrogável de 362 dias, que se consubstancia no estabelecimento a favor da [SCom08...], S.A. de uma linha de crédito com um plafond máximo de€ 200.000.000.
Esta linha de crédito foi concedida com vista a cobrir, exclusivamente, carências de tesouraria corrente (situação que a nosso ver não se verifica, conforme argumentos explicitados no ponto 3.1 do presente relatório) e funciona em sistema de conta corrente.
A cláusula IV do acordo refere que "O capital utilizado no âmbito do presente contrato vencerá juros contados diariamente à taxa Euribor 12 M do dia em que a primeira utilização de fundos se verifique, acrescida de um spread de 0% e refixada anualmente."
O Sujeito Passivo apresentou os cálculos efectuados, donde se pode concluir que a taxa de juro utilizada foi de 2,734%. Assim sendo, esta operação originou, no exercício de 2003, um proveito financeiro de € 839.307,65.
Apresentação das entidades
a) [SCom01...]. SA
A [SCom01...], S.A. é uma empresa do Grupo " Y ", responsável pela operação logística do um verso de lojas do Grupo, já que estas estão distribuídas pelos principais aglomerados populacionais do país.
A Prestação de Serviços de Logística consiste na recepção, armazenagem das mercadorias e a respectiva distribuição às lojas das várias empresas do Grupo " Y ".
b) [SCom05...]. S.A. ([SCom05...])
A [SCom05...], S.A., é uma empresa do Grupo " Y ", sediada na Espanha, a qual tem como objecto:
- Negociação com os fornecedores de mercadorias intracomunitárias e países terceiros;
- Confirmação das facturas e respectivo pagamento;
- Elaboração e contabilização do processo administrativo de compra e venda de mercadorias.
Por estes serviços a [SCom01...] paga 5% sobre as mercadorias adquiridas à "[SCom05...]'
c) [SCom06...] ([SCom02...])
A [SCom06...], detém 100% da [SCom01...], S.A.
A [SCom02...] é detida em 100% pela [SCom03...], S.A.
Análise das relações societárias existentes entre as entidades intervenientes
De acordo com a página 30 do Relatório e Contas Consolidadas, referente ao exercício de 2003, da [SCom03...], S.A., quer a [SCom01...] quer a [SCom05...] são detidas em 100% pelo Grupo " Y ".
A [SCom01...], S.A é detida pela [SCom06...], em 100%, a qual por sua vez, é detida em 100% pela [SCom03...], S.A.
Daqui se conclui que todas as entidades intervenientes fazem parte do Grupo " Y ".
A posição do Sujeito Passivo
De acordo com o Sujeito Passivo a natureza dos juros suportados (juros de mora) enquadra-se no regime previsto no normativo legal em Espanha, para quaisquer atrasos verificados nos pagamentos, para além dos prazos contratualmente estabelecidos, assumindo assim características de penalização.
O Sujeito Passivo, acrescenta que "No que se refere às taxas praticadas para a utilização de uma linha de crédito, também referimos que as mesmas são sustentadas por princípios de economia monetária e por tendências globais no que respeite ao estabelecimento de acordos para taxas de juros sobre disponibilizações de fundos temporários com maior ou menor duração." Questionado sobre a racionalidade económica subjacente à diferença de taxas entre as operações activas e passivas, com desvantagem para o Sujeito Passivo, este argumenta que a racionalidade económica subjacente às operações descritas surge inquestionável, na medida em que as mesmas operações são sustentadas por princípios de economia monetária e por tendências globais no que respeita ao estabelecimento de taxas de juros sobre empréstimos."
Os Juros de Mora e os Preços de Transferência
a) Enquadramento destas operações face ao disposto no artigo 58.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC)
De acordo com o número 1 do artigo 58.º do CIRC "(...) nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e uma qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis".
Do estatuído na norma legal referenciada no parágrafo anterior, resulta que:
1. Quando entre entidades relacionadas,
2. Sejam desenvolvidas operações financeiras,
3. Estas deverão estar em conformidade com o Principio de Plena Concorrência
Assim, ao longo da exposição que se segue demonstraremos que se estas operações tivessem sido realizadas entre entidades independentes as condições praticadas teriam sido diferentes. Ou seja, se a [SCom01...] operasse com entidades independentes, teria preferido, em vez de emprestar o dinheiro à sua entidade relacionada [SCom03...], S.A. onde aufere uma rentabilidade inferior a 3%, utilizar esse dinheiro para amortizar a dívida que detém na sua entidade relacionada "[SCom05...]" e em relação à qual suporta um custo de 5,5%,
Em suma, uma entidade independente teria anulado um custo de 5,5%, em vez de auferir um proveito de 2,734%.
b) Das relações especiais
Entre a "[SCom01...]" e a "[SCom05...]"
De acordo com a alínea b) do artigo 58.º do CIRC, considera-se que existem relações especiais entre duas entidades, nas situações em que uma tem o poder de exercer, de forma directa, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, que se considera verificado, designadamente, entre entidades em que os mesmos titulares do capital, (...) detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos devoto.
A "[SCom01...]" e a "[SCom05...]" encontram-se numa situação de relação especial uma vez que, de acordo com a estrutura de participações do Grupo " Y ", quer a [SCom01...] quer a [SCom05...] são detidas em 100% pelo Grupo " Y ".
Entre a "[SCom01...]" e a [SCom03...], S.A.
A [SCom03...], S.A. e a "[SCom01...]" encontram-se, também, numa situação de relação especial uma vez que a primeira tem o poder de exercer, de forma directa, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, que se considera verificado, designadamente entre "uma entidade e os titulares do respectivo capital, (...) que detenham, directa ou indirecta mente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto" (vide alínea a) do número 4 do artigo 58.º do CIRC).
Da mesma forma, a "[SCom01...]" e a [SCom03...], S.A. encontram-se numa situação de relação especial uma vez que a [SCom01...] é detida pela [SCom06...], em 100%, a qual por sua vez, é detida em 100% pela [SCom03...], S.A. Em suma, a [SCom03...], S.A. detém indirectamente 100% da [SCom01...].
c) Da racionalidade económica da operação
As condições estabelecidas e praticadas, entre a [SCom01...] e a [SCom05...], são diferentes das que seriam estabelecidas entre entidades independentes. Ao longo deste ponto iremos demonstrar que se, as transacções realizadas com a [SCom05...] tivessem sido efectuadas com uma independente, certamente a [SCom01...] não teria optado por juros de mora a 5,5%, concedendo, simultaneamente uma linha de crédito a outra entidade relacionada [SCom02...] onde aufere uma rentabilidade (cerca de 2,7%) bastante inferior aos custos suportados com o atraso nos pagamentos à [SCom05...].
Esta situação só ocorre porque entre as partes intervenientes existem relações especiais e em virtude dessas relações especiais foram estabelecidas condições diferentes das que seriam estabelecidas se estas operações tivessem sido realizadas entre entidades independentes, dado que as vantagens económicas de realizar uma operação em detrimento da outra são evidentes. A jurisprudência portuguesa tem vindo a defender que a avaliação de qualquer operação e encargo/proveito associado deverá ser efectuado numa perspectiva individualizada de cada empresa ou instituição, em detrimento de uma óptica de gestão grupo Assim estas operações poderão fazer sentido quando analisadas em termos de impacto das mesmas no seio do Grupo. No entanto, quando se analisa o impacto das mesmas na esfera jurídica da [SCom01...], fica realçado desde logo a irracionalidade económica das mesmas, pois nenhuma entidade independente estaria disposta a prescindir (através da diminuição dos seus custos) da rentabilidade associada à diferença de taxas.
Cfr., por exemplo, Acórdãos do Tribunal Central Administrativo de 18 de Novembro de 2003 e 19 de Outubro de 2004, processos 06594/02 e 07127/02, respectivamente (site dgsi.pt)
Escolha do método
De acordo com o n.º 2 do artigo 58.º do CIRC "O sujeito passivo deve adoptar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efectua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais(...)."
No mesmo sentido estipula o n.º 1 do artigo 4.º da Portaria 1446-C/2001, que "O sujeito passivo deve adoptar, para determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método mais apropriado a cada operação ou série de operações
O n.º 2 do citado normativo "Considera-se como método mais apropriado para cada operação ou série de operações aquele que é susceptível de fornecer a melhor e mais fiável estimativa dos termos econdições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência, devendo ser feita a opção pelo método mais apto a proporcionar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações vinculadas e outras não vinculadas”
O n.º 3 do artigo 58.º do CIRC, identifica os métodos que podem ser utilizados na determinação do preço de transferência, a saber:
1. Método do Preço Comparável de Mercado;
2. Método do Preço de Revenda Minorado;
3. Método do Custo Majorado;
4. Método do Fraccionamento do Lucro;
5. Método da Margem Líquida da Operação.
O Método do Preço Comparável de Mercado
O Método do Preço Comparável de Mercado compara o preço pago por bens, direitos ou serviços transferidos numa operação vinculada com o preço pago por bens, direitos ou serviços transferidos numa operação comparável não vinculada.
Este método pode ser utilizado, designadamente, quando o sujeito passivo em análise realiza uma operação da mesma natureza, que tenha por objecto um serviço idêntico, com uma entidade independente. (Ver alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º da referida Portaria).
O Método do Preço Comparável de Mercado assume-se como o método mais adequado a aplicar. A sua preferência em relação aos demais métodos advém do facto de constituir a forma mais directa de determinar se as condições acordadas entre entidades relacionadas, são condições de Plena Concorrência. Assim, uma vez que se encontram reunidas condições de aplicação deste método às operações em análise, encontra-se perfeitamente justificada a escolha deste método em detrimento dos demais.
Rejeição do Método do Preço de Revenda Minorado
O Método do Preço de Revenda Minorado tem como base o preço de revenda praticado pelo Sujeito Passivo numa operação comparável realizada com uma entidade independente, tendo por objecto um produto adquirido a uma entidade com a qual esteja em situação de relações especiais, ao qual é subtraída a margem de lucro bruto praticada por uma terceira entidade numa operação comparável (Cfr. artigo 7.º da Portaria).
Este método é especialmente recomendado para actividades de distribuição (Cfr. parágrafo 2.14 a 2.31 do Relatório da OCDE 1995).
Assim, uma vez que as operações em análise não se enquadram como actividades de distribuição, rejeitamos a utilização deste método.
Rejeição do Método do Custo Majorado
O Método do Custo Majorado tem como base o montante dos custos suportados por um fornecedor de um produto ou serviço fornecido numa operação vinculada, ao qual é adicionada a margem de lucro bruto praticada numa operação não vinculada comparável (cfr. artigo 8.º da Portaria).
A utilização deste método é recomendada pela OCDE essencial mente no caso de vendas de produtos semi-acabados entre empresas associadas, no quadro de acordos celebrados entre empresas associadas com vista à usufruição em comum de equipamentos ou ao aprovisionamento a longo prazo, ou quando a operação vinculada consiste na prestação de serviços (cfr. parágrafo 2.32 do Relatório da OCDE de 1995).
Assim, atendendo às operações alvo de análise, rejeitamos a utilização deste método.
Rejeição dos métodos não tradicionais
Os vulgarmente designados métodos não tradicionais (método do fraccionamento do lucro e método da margem líquida da operação) apenas serão susceptíveis de utilização quando os métodos tradicionais (método do preço comparável de mercado, método do preço de revenda minorado e método do custo majorado) não possam ser aplicados (cfr. alínea b) in fine do número 1 do artigo 4.º da Portaria).
Face a tudo o que foi exposto, o método do preço comparável de mercado revela-se o mais apropriado em conformidade com o previsto no número 2 do artigo 4.° da Portaria, pelo que será utilizado na pesquisa de condições que seriam praticadas entre entidades independentes em operações similares às ora analisadas.
Pesquisa de Comparáveis
Conforme vimos no ponto anterior, o Método do Preço Comparável de Mercado pode ser utilizado comparando as condições ocorridas numa operação vinculada com as condições praticadas numa operação comparável realizada por entidades independentes.
De acordo com o n.º 3 do artigo 4.º da Portaria "Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar deforma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas". Note-se que a "[SCom01...]" embora tenha relações com vários fornecedores apenas incorre em juros de mora com a "[SCom05...]", entidade relacionada, optando nos restantes casos pela liquidação das dívidas aos fornecedores em vez de efectuar aplicações. Assim, e face a tudo que já foi referido, caso estas operações tivessem sido efectuadas por entidades independentes, a entidade independente teria preferido amortizar a dívida à "[SCom05...]" em vez de efectuar a abertura de crédito, dado que com a primeira hipótese teria aumentado mais o seu património.
Determinação do preço que seria praticado entre entidades independentes
Face ao exposto, se as operações não se tivessem realizado entre entidades relacionadas, os juros pagos à taxa de 5,5% sobre o capital em dívida à [SCom05...], na parte em que procedeu à aplicação junto da [SCom03...], S.A., bem como os juros obtidos à taxa de 2,734% sobre o valor emprestado à [SCom03...], S.A., na parte em (que) poderia ser utilizado para amortizar a dívida à [SCom05...], não teriam ocorrido, pelo que importa apurar o montante de juros desconformes ao Princípio de Plena Concorrência.
Para o efeito, foi elaborado um mapa (Anexo IV à presente informação), de onde se constata que o lucro tributável apurado pela "[SCom01...]" se encontra subavaliado em € 367.069,00.
Obrigações não cumpridas pelo Sujeito Passivo
De acordo com o n.º 8 do artigo 58.º do CIRC "Sempre que as regras enunciadas no n.º 1 não sejam observadas, relativamente a operações com entidades não residentes, deve o sujeito passivo efectuar, na declaração a que se refere o artigo 112.º, as necessárias correcções positivas na determinação do lucro tributável, pelo montante correspondente aos efeitos fiscais imputáveis a essa inobservância."
Na esteira do preconizado pelo normativo anterior, o n.º 1 do artigo 3.º da Portaria 1446C/2001, de 21/12, vem referir que "Sempre que os termos e condições de uma operação vinculada em que intervenha um sujeito passivo e uma entidade não residente em território português difiram dos que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, deve aquele efectuar na declaração periódica de rendimentos a que se refere o artigo 112.º do, Código do IRC, uma correcção positiva correspondente aos efeitos fiscais imputáveis àquele desvio, por forma que o lucro tributável determinado não seja diferente do que se apuraria na ausência de relações especiais".
Conjugando estes dois normativos, conclui-se que a "[SCom01...]", deveria ter procedido a um acréscimo ao lucro tributável referente ao exercício de 2003, no montante de € 367.069.00, através da inscrição desse valor no Quadro 07 da Declaração de rendimentos modelo 22 (declaração periódica de rendimentos a que se refere o artigo 112.9 do Código do IRC).
Conclusões
Face a tudo o que foi exposto podemos concluir que as condições praticadas nas operações em análise, divergem das condições que seriam praticadas entre entidades independentes.
Assim, e estando cumpridos os requisitos de fundamentação previstos no número 3 do artigo 77.º da Lei Geral Tributária, propõe-se que se proceda a uma correcção positiva ao lucro tributável declarado pela "[SCom01...]". relativa ao exercício de 2003. no montante de€ 367.069.00.
III -1.2 IMPOSTO EM FALTA
III -1.2.1. Tributação autónoma - Encargos Relacionados com viaturas ligeiras de passageiros
O sujeito passivo acresceu ao IRC liquidado do exercício, o valor de € 19.636,64, a título de tributação autónoma sobre os encargos relacionados com despesas de representação e viaturas ligeiras de passageiros, conforme se pode ver na coluna "Valores Declarados" do quadro que seguidamente se apresenta:
(...)
Ora, o n.º 3 do art.º 81.º do CIRC refere que: "3 - São tributados autonomamente,...., os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação e os relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, ..., efectuados ou suportados por sujeitos passivos não isentos subjectivamente e que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.".
Da leitura do preceituado normativo, constata-se que são necessários três requisitos para que as despesas ou os encargos sejam tributados autonomamente, a saber: a dedutibilidade dos encargos, a totalidade dos encargos e, por último, a qualidade do sujeito passivo.
O primeiro requisito consiste na dedutibilidade dos encargos; não basta, portanto, que existam encargos com viaturas ligeiras de passageiros devidamente suportados por documentos; revela- se necessário que os mesmos estejam nas condições de dedutibilidade exigidas no art.9 23.9 do CIRC, ou seja, que os encargos referidos sejam, comprovada mente, indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto. Esta primeira condição verifica-se.
O segundo requisito destaca a totalidade dos encargos; o legislador, quando se refere aos encargos com as despesas de representação e os relacionados com as viaturas ligeiras de passageiros, não elencou o tipo ou tipos de encargos que se enquadravam neste preceito. Assim sendo, todos os encargos que estejam relacionados comas despesas referidas devem fazer parte do cálculo do imposto a pagar autonomamente. Dito de outra forma, os encargos suportados pelo sujeito passivo a título de Juros de Aluguer de Longa Duração, contabilizados na conta 62219013 bem como, o IVA correspondente a este encargo, contabilizado na conta 62219014, são encargos que se enquadram no âmbito do preceito legal referido pelo que deveriam fazer parte do respectivo cálculo. Parte desta condição não se verificou.
Por último, há que referir a qual idade do sujeito passivo; de facto, quer o sujeito passivo "[SCom01...]" - aquele que suporta o encargo - quer o sujeito passivo que presta o serviço de aluguer de longa duração - aquele que efectua o serviço - são entidades que não estão isentos s ubjectiva mente, nos termos propostos pelo art.9 9.9e seguintes do CIRC, e, são entidades que exercem actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola. Esta condição também se verifica.
Concluindo, no caso sub judice, só parte da segunda condição é que não se verificou.
Analisados os cálculos efectuados pelo sujeito passivo, verificamos que o mesmo não contemplou na base de cálculo para apuramento do imposto a pagar, as verbas respeitantes aos juros suportados com o ALD das viaturas ligeiras de passageiros e o IVA relacionado com os mesmos juros, conforme havíamos referido acima.
Os montantes e as correspondentes rubricas referidos, encontram-se espelhados na coluna "Valores Corrigidos" do quadro acima e revelam que o sujeito passivo deveria ter acrescido ao IRC liquidado o montante de€ 21.045,02 e não, o montante de€ 19.636,28, conforme ocorreu. Nestes termos, e de acordo com o n.9 3 do art.9 81.9 do CIRC, são tributadas autonomamente, à taxa correspondente a 20% da taxa normal mais elevada - 6%(20%x30%) os encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, pelo que se acresce ao IRC Liquidado pelo sujeito passivo o montante de€ 1.408,38.
Assim, propõe-se uma correcção à colecta de IRC no montante de€ 1.408.38" (…)

31. As dívidas de fornecedores e os correspondentes saldos devedores, relativamente aos quais foram constituídas provisões no exercício de 2003, resultam na sua maioria de descontos percentuais - rappel - obtidos pela [SCom01...] junto dos fornecedores, obtidos em função do volume de compras efectuado de acordo com "contratos gerais do fornecimento" e "contratos promocionais" celebrados entre a [SCom01...] e os fornecedores [cfr. prova testemunhal, depoimentos das 1.3, 2.3 e 3.3 testemunhas].

32. No âmbito da inspecção referida no ponto 21, em resposta ao "pedido n.º 2006 - 04.18" relativo a "Amortizações-Despesas de Investigação e Desenvolvimento no valor de 196 206,23 €", a [SCom01...] apresentou uma exposição com o seguinte teor [cfr. anexo i ao RIT a fs. 127 do 1 volume do processo físico]:
"Os encargos cm causa respeitam fundamentalmente a encargos com o "Design" e controlo do formato e apresentação das embalagens e produtos de consumo comercializados pela [SCom01...]. Estes encargos dizem respeito a custos incorridos junto de agências de publicidade, de Marketing e consultoria ao nível da concepção, desenho e apresentação de embalagens, rótulos e produtos, visando adapta-los a determinadas imagens, grafismos e marcas.
Todos os encargos dizem respeito a produtos comercializados pela [SCom01...], adquiridos junto de fornecedores e por ela mesma revendidos aos seus clientes.
A actividade da [SCom01...] consiste em servir de central (de) compras, armazenamento e fornecimento de todas as empresas do sector da Distribuição do grupo " W ", que por sua vez os comercializam junto do grande público. Empresas estas que, relativamente a determinados produtos, exigem à [SCom01...] todo um controlo do "layout" desses mesmos produtos, para que os mesmos estejam adaptados a determinadas imagens, grafismos e marcas.
Estes encargos são depois repercutidos nos preços cobrados pela [SCom01...] junto dos seus clientes e, por sua vez, nos preços cobrados pelas empresas distribuidoras.
Relativamente aos documentos de suporte, toda a documentação já foi entregue no âmbito da visita de análise aos exercícios de 1999, 2000 e 2001, exercícios em que o respectivo custo foi contabilizado". 

33. No âmbito do relatório final da inspecção referida no ponto 21, a propósito da, "amortização de marca própria" a AT remete para a análise efectuada em 2003, por força das ordens de serviço n.º ...13, ...14 e ...3/l/112, que incidiram, respectiva mente, sobre os exercícios de 1999, 2000 e 2001, dando-se como reproduzido o respectivo relatório final quanto à temática em causa, do qual consta, além do mais, o seguinte teor [cfr. documento n.º 15 junto com a PI, a fls. 208 a 211 do I volume do processo físico]:
"(...) Assim, ainda no exercício de 2000, foi relevado como custo do exercício o valor referente à amortização do mês de Dezembro, no montante de 7.867.164$00.
Ao analisarmos a natureza de tal projecto, verificámos tratar-se de despesas resultantes da adaptação para a Marca"X"" de vários produtos, comprados pela [SCom01...] e depois vendidos à empresa "[SCom02...], SA".
Do valor imobilizado do Projecto Marca Própria foram verificados todos os documentos que perfazem a quantia em questão, não restando dúvidas quanto ao fim das despesas pagas aos vários fornecedores.
A título exemplificativo mencionamos os seguintes documentos, bem como o seu descritivo.
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
É sabido que a empresa "[SCom02...], SA" é detentora do direito exclusivo de utilização em Portugal dos Sinais distintivos da Marca"X"".
O direito adquirido advém-lhe do contrato que a "[SCom03...]" celebrou com a sociedade "[SCom04...], S.A" em 29 de Julho de 1993, com efeitos a partir do dia 1 de Janeiro de 1993 e a vigorar pelo prazo de vinte anos. Desse contrato resulta a faculdade de utilização da referida marca.
Esta possibilidade permitiu à "[SCom02...], SA" uma maior agressividade nos seus negócios e uma maior facilidade de entrada no competitivo ramo do comércio a retalho, já que a Marca"X"" possui um tipo de marketing nesta área sobejamente reconhecido internacionalmente.
Ora, os custos em que a "[SCom01...]" incorreu ao suportar todos os encargos decorrentes da adaptação das embalagens à Marca"X"" são na real idade não um custo da "[SCom01...]" mas sim da [SCom02...] entidade que recolhe todos os benefícios da utilização da referida Marca.
A "[SCom01...] SA" adquire produtos de uma infinidade de marcas, não suportando, por esse facto, quaisquer custos adicionais coma adaptação das diversas embalagens a cada uma das marcas dos produtos comercializados.
E a prova de que a própria "[SCom01...]" tem a noção perfeita de que os custos e proveitos inerentes à Marca"X"" não fazem parte do seu negócio, é que:
- mantém relações comerciais com a "[SCom09...] SA", empresa que comercializa produtos de Marca"X"", e que por isso pagava em 2000, 2% de comissão sobre as vendas efectuadas de produtos da mesma marca, conforme cláusula 10ª do l.º contrato celebrado entre a "[SCom01...]" e a "[SCom09...]":
- "[SCom01...]" debita à "[SCom09...]", periodicamente, esta comissão, que contabiliza na conta 73709G02 - "Proveitos Suplementares _ Com. Açores";
- a "[SCom01...]" transfere este proveito, creditando a [SCom02...](...)
Como podemos verificar, ao comparar os saldos finais do exercido de 2000 destas duas contas, constatamos que são rigorosamente iguais, 49.280.103$00.
Ou seja, esta quantia não afecta os resultados apurados, dado que esta repassa os custos para a [SCom02...] o que consideramos ser a actuação correcta. Já o mesmo não se verifica relativa mente às despesas de investigação e desenvolvimento inerentes a adaptação dos rótulos à Marca"X"", não os repassando para a [SCom02...].
Mais, ao questionarmos a "[SCom01...]" sobre o procedimento actual, quanto a estes custos de Marca"X"", o sujeito passivo respondeu, por escrito, que estes passaram a ser debitados directamente à "[SCom02...] S.A", entidade que deve arcar com este tipo de despesainerente, de facto, à sua actividade.
Esta resposta veio confirmar o nosso julga mento no que concerne ao facto de considerarmos que o "Projecto Marca Própria" não é custo da [SCom01...], muito menos custo fiscal.
Em conclusão:
Não se verificou qualquer benefício económico para a "[SCom01...]" em incorrer neste tipo de custos. Razões mais que suficientes para considerarmos que o montante de 7.867.164$00 referente à amortização do exercido de 2000, com origem nestes encargos de maquetagem, não é passível de ser aceite como custo fiscal, dado não cumprir os requisitos de indispensabilidade previstos no art.º 23.º do C.I.R.C., pelo facto de ter tido como causa encargos correspondentes à manifestação de interesses alheios à vida da sociedade".

34. No exercício de 2000, o departamento responsável pela área desenvolvimento dos produtos de marca própria estava funcionalmente integrado na [SCom01...] [Cfr. prova testemunhal, depoimento das 1.3 e 3.3 testemunhas].

35. Os encargos incorridos e contabilizados no ano de 2000 respeitantes a "design" e controlo do formato e apresentação de embalagens são todos relativos a produtos comercializados pela [SCom01...] e vendidos exclusivamente às empresas distribuidoras integradas no grupo "Y" [Cfr. prova testemunhal, depoimento das 1.ª e 3.ª testemunhas],

36. A [SCom01...] repercutia os encargos incorridos no desenvolvimento da sua actividade, incluindo os respeitantes a "design" controlo do formato e apresentação de embalagens, nos preços dos produtos vendidos [Cfr. prova testemunhal, depoimento das 1.3 e 3.3 testemunhas].

37. O desenvolvimento dos produtos de marca própria determinou um aumento das vendas da [SCom01...] associadas aos mesmos produtos [Cfr. prova testemunhal, depoimento das 1.3 e 3.3 testemunhas].

38. Entre a [SCom05...] e a [SCom01...], SA foi outorgado contrato, com a vigência de um ano, renovável por iguais períodos, em que a segunda encomenda à primeira a gestão de determinados serviços, mediante um determinado preço, estipulando, ainda que, as facturas emitidas ao abrigo do mesmo contrato deverão ser liquidadas no prazo de 30 dias a contar da data da sua emissão e que sobre as quantias facturadas e não pagas no prazo estabelecido serão devidos juros de mora à taxa equivalente à taxa legal estabelecida [cfr. cláusulas primeira a terceira do contrato datado de 01.01.2001, entre aquelas duas empresas, junto a fls. 578 a 583 do II volume do processo físico].
39. A entrada da petição inicial desta impugnação foi registada em 09.10.2007 [cfr. carimbo de entrada n.º 87960 aposto na primeira folha da PI e comprovativo de entrega presencial a fls. 1 e 2 do processo físico].

40. No âmbito da presente Impugnação, foi prestada informação pela Direcção de Serviços de Inspecção Tributária, sancionada por despacho de 24.03.2008, integrada no Processo Administrativo apenso aos autos, que apresenta, além do mais, o seguinte teor:
"(...) 6.2.1 O I não aceita a liquidação de juros compensatórios resultantes de um "reembolso", que considera "indevido", no montante de € 78.069,35, pelo período do 22.02.2006 a 26.05.2006. A este propósito alega, que relativa àquele período "já teriam sido calculados juros compensatórios sobre imposto a legadamente em falta", pelo que se verificará uma duplicação na liquidação.
6.2.2 Segundo o I, este não terá "autoliquidado qualquer IRC a reembolsar referente ao exercício de 2003"; terá autoliquidado a importância de € 37.303,58 a pagar - integral e tempestivamente pago em 31.05.2004 -, pelo que o reembolso de € 78.069,35, conferido ao I (Documento n.º 14), será "da única e exclusiva responsabilidade da AF", não se encontrando "preenchidos os pressupostos legais para a liquidação de juros compensatórios (n.º 1 do Art.º 94.s do CIRC)".
6.2.3 O I "nunca foi notificado de que esse reembolso seria indevido", nem "nunca lhe foi exigido a restituição da importância de € 78.069,35", concluindo que não havendo "qual quer sinal de que aquele reembolso seja indevido, não há lugar à liquidação de quaisquer juros compensatórios".
6.2.4 O reembolso em causa (n.º ...31), no montante de €78.069,35, resulta da liquidação n.º ...28, datada de 22.09.2004, referente ao IRC do exercício de 2003, identificada pela compensação n.º ...34, emitida em 3.02.2006 (Documento n." 24), com data de 21.02.2006, discriminada nos seguintes termos:
(...)
6.2.5 Este reembolso, porque indevido, ficou sujeito a juros compensatórios desde 22.02.2006 a 26.05.2006 (data do RI de 2003), os quais atingiram o montante de € 804,22.
6.2.6 O sujeito passivo ([SCom01...]) quando recebeu da Direcção-Geral do Tesouro o cheque n.º ...79, emitido em 9 de Fevereiro de 2006, não reconhecendo o seu direito ao mesmo, deveria de imediato, tendo em conta o princípio da boa-fé preconizado no n.º 1 do Art.º 6.º-A do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo D.L. n.º 442/91, de 15 de Novembro, ter devolvido o mesmo. Facto que não ocorreu.
Assim, somos de parecer que a liquidação dos juros compensatórios sobre € 78.069,35, no montante de € 804,22 - calculados à taxa de 4% pelo período decorrente entre 22.02.2006 e 26.05.2006 -, referente à obtenção de um reembolso indevido (n.º 1 do Art.º 94.º do CIRC e Art.º 35.º da LGT) constante da «demonstração de liquidação de juros» (compensação n.º ...32) são devidos e encontram-se correctamente calculados.
(...)
6.3.8 Tendo em conta o disposto no n.º 1 do Art.º 74.º da LGT, verificamos que o I não carreou para o processo de impugnação, em termos de matéria de facto, quaisquer elementos que sustentem os fundamentos por si alegados, quer durante o acto inspectivo (maxime em sede do direito de audição), quer nos presentes autos, quanto aos valores relevados na contabilização pelas reposições ou utilizações de provisões em apreço - equivalentes a proveitos contabilísticos - o que não permite a apreciação do reenquadramento dos valores impugnados, pelo que, afigura-se-nos que se deverá manter a correcção da Inspecção Tributária, no montante de € 984.594,87, com os mesmos fundamentos invocados no seu RI de 2003: os saldos devedores de fornecedores provisionados não se enquadram na alínea a) do n.º 1 do Art.º 34. do CIRC, pois os mesmos não correspondem a transacções passíveis de serem consideradas correntes.
(...)
6.4.3 Atento, por um lado, aos fundamentos de impugnação constantes no ponto 3.4 da presente informação (artigos 119 a 186 da petição inicial da impugnação) e, por outro, ao disposto no n.º 1 do Art.º 74.º da LGT, o I não fez qualquer prova, em termos de matéria de facto, que os encargos controvertidos (encargos de "packaging"), tenham sido efectivamente repassados para os seus clientes, pelo que somos de parecer que será de manter a correcção (nos mesmos fundamentos) da Inspecção Tributária, relatada no seu RI, no montante de € 196.206,23, não aceite fiscal mente nos termos do Art.º 23.º do Código do IRC, na medida em que quem acolhe os benefícios (directos) da utilização da marca/grafismo não é o I, mas outrossim o seu cliente específico, "[SCom02...]".
(...)
Assim, a [SCom01...] embora tenha relações com vários fornecedores apenas incorre em juros de mora com a [SCom05...], entidade relacionada, optando nos restantes casos pela liquidação das dívidas aos fornecedores em vez de efectuar aplicações.
Caso estas operações tivessem sido efectuadas por entidades independentes, a [SCom01...] teria preferido amortizar a dívida à [SCom05...] em vez de efectuar a «abertura de crédito» à [SCom03...], aumentando, assim, mais o seu património.
6.5.8 Face ao exposto, se as operações não tivessem sido realizadas entre entidades relacionadas, os juros pagos à taxa de 5,5% sobre o capital em dívida à [SCom05...], na parte em que a [SCom01...] procedeu à aplicação junto da [SCom03...], bem como os juros obtidos à taxa de 2,734% sobre o valor emprestado à [SCom03...], na parte em que poderia ser utilizado para amortizara dívida à [SCom05...], não teriam ocorrido, pelo que importou apurar o montante de juros desconformes ao princípio de plena concorrência.
Assim, com este objectivo foi elaborado o Anexo (Documento n.º 25) do qual se retira que o lucro tributável apurado pela [SCom01...] encontra-se subavaliado em € 367.069,00 (juros a desconsiderar).
(...)
Da conjugação destes dois artigos, conclui-se que a [SCom01...] deveria ter procedido a um acréscimo ao lucro tributável referente ao exercício de 2003, no montante de € 367.069,00, através da inscrição desse valor no Quadro 07 da DR Mod. 22 (a declaração de rendimentos a que se refere o Art.º 112.º do Código do IRC).
6.5.10 Em face do exposto, pode-se concluir, que as condições praticadas nas operações em análise, divergem das condições que seriam praticadas entre entidades independentes, pelo que estando cumpridos os requisitos de fundamentação previstos no n.º 3 do Art.º 77.º da LGT, deve manter-se a correcção da Inspecção Tributária, relativa ao exercício de 2003, no montante de € 360.079,00 (...)
Efectivamente, porque os encargos em crise - juros e respectivo IVA suportados nas rendas de ALD de viaturas ligeiras de passageiros - serem totalmente enquadráveis na disposição legal em foco e a [SCom01...] não ser um sujeito passivo subjectivamente isento, nos termos do Art.º 9.º do CIRC, somos de parecer de manter a correcção da Inspecção Tributária, (...), respeitante à tributação autónoma, no montante de € 1.408,38, correspondente a 6 % do valor daqueles encargos, nos termos do n.º 3 do Art.º 81.º do mesmo código. (...)".

Com interesse para a decisão a proferir, não se apuraram outros factos, provados ou não provados.»



Voltemos às questões já enunciadas.
1ª Questão
1ª Questão:
O tribunal a quo errou no julgamento de facto e de direito ao infirmar a desconsideração, pela AT, como custos, em ordem às liquidações impugnadas, das amortizações relativas ao investimento na Marca"X"”, dita própria, no valor de € 196.206,23, pois não se trata de marca própria da impugnante nem os custos com a mesma foram cobrados à empresa detentora da marca?

As conclusões não associam, esta alegação de erro de direito a qualquer norma jurídica. Subentende-se, porém, que a norma violada seria o artigo 23º nº 1 do CIRC, no sentido de que estes custos com o investimento na aplicação de uma marca alheia não seriam indispensáveis à geração de proveitos ou à manutenção da fonte produtiva da então Impugnante, pelo que tão pouco poderiam ser relevadas fiscalmente as respectivas amortizações.
Todo o discurso fundamentador da AT gravita em torno da alegação de que a marca é alheia e os custos não foram repassados à dona da marca, pelo que o custo não tem interesse para a [SCom01...].
Julgamos que aqui se labora numa petição de princípio. Parte-se do pressuposto, indemonstrado, de que não pode interessar a empresa alguma investir na aplicação da marca alheia e daí conclui-se que não é do interesse da [SCom01...] o investimento na Marca"X".
Porém, a realidade do caso concreto, e é disso que se trata ao dizer o direito quanto a uma liquidação de um imposto, pode bem divergir daquele dogma apriorístico. É o caso.
Vejamos.
Provou-se que todos os produtos nos quais era aposto o símbolo da Marca"X"” eram destinados a serem vendidos à "[SCom02...], SA”. Provou-se, igualmente, que a [SCom01...] expôs à AT que “Todos os encargos (com a adaptação dos produtos à Marca"X"”) Parêntesis do Relator dizem respeito a produtos comercializados pela [SCom01...], adquiridos junto de fornecedores e por ela mesma revendidos aos seus clientes.
A actividade da [SCom01...] consiste em servir de central de compras, armazenamento e fornecimento de todas as empresas do sector da Distribuição do grupo " W ", que por sua vez os comercializam junto do grande público. Empresas estas que, relativamente a determinados produtos, exigem à [SCom01...] todo um controlo do "layout" desses mesmos produtos, para que os mesmos estejam adaptados a determinadas imagens, grafismos e marcas.
Estes encargos são depois repercutidos nos preços cobrados pela [SCom01...] junto dos seus clientes e, por sua vez, nos preços cobrados pelas empresas distribuidoras.
Esta alegação da [SCom01...] não foi posta em crise pela AT.
Mais se provou que o departamento responsável pela área desenvolvimento dos produtos de “marca própria” estava funcionalmente integrado na [SCom01...]; e que “o desenvolvimento dos produtos de marca própria determinou um aumento das vendas da [SCom01...] associadas aos mesmos produtos”.
Acresce uma ilação. Certamente a vontade contratual da [SCom02...] SA, compradora dos produtos à [SCom01...], era que os produtos comprados pela [SCom01...] lhe fossem vendidos já com a Marca"X"”, de maneira a estarem prontos para a venda a retalho. Ora, se o interesse da [SCom01...] é vender, satisfazer esta vontade contratual do cliente em ordem a fazer o negócio acaba por ser também do seu interesse.
Assim, julgamos, que bem andou o Mº Juiz a quo ao julgar não demostrada pela AT a dispensabilidade dos custos com a gestão e aplicação da Marca própria da “[SCom02...] SA”, pelo que, no que ao objecto da primeira questão concerne, o recurso improcede.

2ª questão
O tribunal a quo errou no julgamento de direito ao infirmar a desconsideração pela AT como custos, em ordem às liquidações impugnadas, das provisões para cobranças duvidosas, relativas a dívidas de fornecedores, no valor de € 984.594,87, pois tais dívidas não resultam do que se pode dizer ser actividade normal da empresa para efeitos do artigo 34º nº 1 alª ) do CIRC de então, uma vez que não correspondem a transacções constitutivas da actividade principal da empresa, pois têm origem em descontos percentuais – rappel – obtidos pela Impugnante junto dos fornecedores, além de que não se concebe como é que a concessão de um desconto por parte do fornecedor o pode fazer entrar em mora de devedor no valor do desconto?

O discurso da sentença recorrida colocado em crise nesta questão é redutível à seguinte transcrição:
“Retomando agora o caso sob apreciação, verifica-se que, no RIT se refere, expressamente, relativamente aos três requisitos essenciais para constituição das provisões, - "que os créditos resultem da actividade normal; que estejam em mora há mais de seis meses e tenham sido efectuadas diligências para o seu recebimento; e tenham sido evidenciados como tal na contabilidade - que, "analisadas as demonstrações financeiras, confirma-se que as provisões estão devidamente evidenciadas na contabilidade" e, "questionado o sujeito passivo quanto às diligêndas efectuadas para o recebi mento dos créditos em mora, as mesmas foram apresentados".
Deste modo, a razão subjacente à correcção sob apreciação resume-se à falta de um daqueles requisitos-por ter sido considerado que, relativamente às provisões relacionadascom saldos devedores de fornecedores, no valordeC 984.594,87, "contabilizado na conta 6718-provisões do exercício-outrasdívidas deterceiros", faltava a verificação do requisito de que os créditos fossem resultantes da actividade normal da [SCom01...].
A respeito deste requisito, a AT considerou que créditos resultantes da actividade normal da empresa são "unicamente, aqueles que decorrem de operações de natureza comercial relacionadas com a venda de bens ou serviços respeitantes à actividade principal da empresa, ou seja, as operações que envolvam transacções correntes" e, assim, só os créditos sobre clientes resultantes das transacções de bens e serviços relacionados com a actividade produtiva da empresa, devem ser qualificados como créditos resultantes da actividade normal, para efeitos da constituição da previsão prevista na alínea a) do n.9 1 do Art.9 34.9 do CIRC [tudo cfr. teor do RIT acolhido no ponto 30 do probatório].
Não se acolhe o entendimento da AT subjacente à correcção efectuada.
Com efeito, o conceito de actividade normal da empresa deve ser interpretado como referindo-se à actividade operacional a que a empresa se dedica e que foi definida no contrato de sociedade.
Como se viu, conforme o enquadramento da actividade efectuado no RIT, em 2003, a "[SCom01...], SA", era uma sociedade anónima, cuja actividade principal consistia no "Comércio armazenista de produtos alimentares" [cfr. ponto ido probatório].
Por seu turno, os saldos devedores, relativamente aos quais foram constituídas as provisões, resultaram de descontos percentuais - rappel - obtidos pela [SCom01...] junto dos fornecedores, emfunçãodo volume de compras, os quais estão definidos em "contratos gerais do fornecimento" e "contratos promocionais"celebrados com os mesmos fornecedores [cfr. teor do RIT acolhido no ponto 30 em conjugação com o ponto 31 do probatório].
Então, se no desenvolvimento da actividade principal de "comércio armazenista de produtos alimentares", a [SCom01...] celebra contratos com os fornecedores em que são estipulados descontos percentuais, em função das compras efectuadas e, uma vez verificadas as condições para adquirir o direito aos créditos correspondentes aos referidos descontos, os debita aos
mesmos fornecedores, não pode deixar de se considerar que estes créditos resultam da sua "actividade normal".
Não se encontra justificação para interpretar restritivamente o conceito de "créditos resultantes da actividade normal da empresa", de modo a nele incluir "unicamente, aqueles que decorrem de operações de natureza comercial relacionadas com a venda de bens ou serviços respeitantes à actividade principal da empresa, ou seja, as operações que envolvam transacções correntes", como fez a AT.
Tanto são de considerar resultantes da "actividade normal da empresa" [com o objecto social principal-Comércio armazenista de produtos alimentares], os créditos sobre clientes, que resultam de operações activas [vendas desses produtos alimentares] como os créditos sobre fornecedores, que resultam das operações passivas [compras dos produtos que hão-de ser armazenados e vendidos], em virtude do cumprimento de condições contratuais previamente estabelecidas, pois se considera que estes se integram, naturalmente, no âmbito da actividade operacional da mesma empresa [que consiste na compra, armazenamento e venda de produtos alimentares], podendo até assumirem peso significativo no modo e condições do exercício da referida actividade.
A lei não define o que são créditos resultantes da actividade normal das empresas, no entanto, a posição ora adoptada apresenta-se consentânea com a jurisprudência que tem vindo a destacar que a AT vinha entendendo, desde o domínio da Contribuição Industrial, que eles abrangiam os saldos devedores de clientes e fornecedores mencionados n o balanço reportado a 31 de Dezembro de cada ano e com a doutrina que salienta que os créditos resultantes da actividade normal da empresa são os saldos devedores de clientes e fornecedores, devidamente evidenciados em contas apropriadas […].
Ante o exposto, a correcção ora sob apreciação não se pode manter, impondo-se determinar a procedência da Impugnação nesta parte, com a consequente anulação da liquidação, na parte que por aquela correcção, no valor de € 984.594,87, se encontra influenciada, ficando, assim, prejudicado o conhecimento do vício de erro nos pressupostos de facto subjacentes à quantificação do valor da mesma correcção que vinha também imputado a esta correcção [artigo 6O8.2, n. 2 do CPC, ex vi artigo 2.® alínea e) do CPPT].»
Quanto a questão essencialmente idêntica a esta pronunciou-se, este Tribunal, em acórdão de 29/4/2021, no processo 579/06.3BEPRT, em que era Impugnada e Recorrente a aqui recorrente e recorrida [SCom10...] – Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A., NIPC ...35, no sentido de que os créditos relativamente a fornecedores, cuja fonte resida na efectivação de descontos baseada num contrato geral de fornecimento no âmbito da exploração da actividade de venda a retalho numa rede de hipermercados são créditos provenientes da actividade normal da empresa, para os efeitos da constituição de provisões para créditos de cobrança duvidosa, nos termos do artigo 34º nº 1 alª a) do CIRC, na redacção em vigor em 2001.
Por economia de meios, limitamo-nos a transcrever, desse aresto, o que para aqui releva:
«Assim, ao menos à partida, o que cumpre apreciar é apenas aquela questão da provisionabilidade dos créditos (consideráveis de cobrança duvidosa) relativamente a fornecedores, a qual se joga na interpretação da cláusula aberta integrante da alínea a) do nº 1 do artigo 34º de então do CIRC, consistente na expressão “créditos resultantes da actividade normal”.
Para a AT, digamos, o algo complexo sistema de efectivação de descontos que faz da Impugnante credora do valor dos descontos, relativamente aos fornecedores, não pode considerar-se actividade normal, quer porque o seu objectivo é vender a retalho e, portanto, devedores serão, em princípio, os clientes, e não os fornecedores – destes será ela, em princípio, a devedora – quer porque introduz créditos que não têm uma relação directa com compras concretas e descontos concretos.
Para a Mª Juiz a qua esses créditos, posto que provêm de um contrato geral de fornecimento (CGF) pelo qual a Impugnante leva a cabo normalmente a sua actividade de retalhista em “híper-escala”, são provenientes da actividade normal da mesma e como tal devem poder ser provisionáveis.
Em nosso julgamento, uma cláusula tão aberta como a sub judicio, se não pode servir, por isso que se trata de liquidação de impostos, para votar à subjectividade, seja da AT, seja do Contribuinte, a eleição dos créditos de cobrança duvidosa a provisionar, tão pouco pode ser interpretada tão restritivamente que deixe de prosseguir o seu escopo, que é acompanhar as realidades da vida, neste caso, as especificas realidades da venda a retalho em escala de Hipermercado em que a Impugnante se insere.
Depois, se o objectivo essencial do sistema de imposto sobre o rendimento das empresas é, por imperativo constitucional (artigo 104º bº 2 da Constituição) tributar o rendimento real das empresas, uma interpretação da norma aqui em apreciação ( alª a) do nº 1 do artigo 34º do CIRC na redacção e numeração de 2001) constitucionalmente informada não pode deixar de ser sensível ao facto, provado e sobejamente ilustrado e densificando no anexo 1 do RIT da Impugnante, do valor, da transversalidade e da recorrência de créditos quejandos em todo o exercício em causa e em todo o modus operandi do sujeito passivo, de maneira a considerar que temos de entender que os mesmos relevam da “actividade normal” da empresa para efeitos da citada norma.
Nem a qualidade de fornecedor é em si mesma de difícil coincidência, na prática, com a de devedor, mesmo na inexistência do comprovado sistema de efectivação dos descontos. Basta pensarmos em dividas de devolução do preço recebido, em caso de defeito de toda ou parte da mercadoria vendida, sendo certo que a uma escala “híper” da venda a retalho estas outras obrigações (do fornecedor para com o comprador) podem ser muitas, em significativo valor, e onerar muitos sujeitos, tal como pode perigar o seu cumprimento.
No sentido da abrangência, na sobredita alínea a) e no sobredito conceito indeterminado de “créditos resultantes da actividade normal” dos créditos contra fornecedores e outros que só mediatamente – porventura bem mais mediatamente do que os aqui sub judicio – têm a ver com o objecto social do sujeito passivo de IRC, pode ver-se o ac. do TCA Sul de 16/12/2020, tirado no processo nº 235/08.8BESNT, que passamos a citar apesar de se referir, concretamente, a dívidas sobre clientes relacionadas com as despesas de saque e pagamento de letras de câmbio:
Como é sabido as provisões constituem um fundo criado pela empresa, levado a custos ou encargos do exercício, destinado a fazer face a prejuízos que se esperam, mas cujo valor não se conhece ainda com precisão.
Mais não são, pois, do que montantes retirados da matéria tributável de determinado exercício, que ficam afectos a compensar perdas de montantes incertos imputáveis ao mesmo exercício mas cuja concretização se apurará em exercícios posteriores, ou a fazer face a prejuízos previsíveis advindos da desvalorização das existências.
As provisões de um exercício são lançamentos que, nesse mesmo exercício, se fazem na conta de resultados, como valores negativos, correspondentes a factos nele ocorridos mas cuja concretização fica dependente de eventualidades que só nos exercícios seguintes podem ocorrer.
De acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC podem ser deduzidas para efeitos fiscais as provisões «que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade» (negrito da nossa autoria).
No caso trazido a juízo, como limpidamente se retira do discurso que suporta a correcção em análise não estão em causa os dois últimos requisitos (cobrança duvidosa e sua evidência na contabilidade), e sendo assim, haverá de determinar se está ou não verificado o primeiro requisito (actividade normal).
Assim, e antes de mais, os créditos têm que resultar da actividade normal da empresa e tem-se entendido que os créditos resultantes da actividade normal da empresa são os saldos devedores de clientes e fornecedores no final do exercício devidamente evidenciados em contas apropriadas.
É que, a lei não define o que são «créditos resultantes da actividade normal das empresas», mas a Administração Tributária vinha entendendo no domínio da Contribuição Industrial que eles abrangiam os saldos devedores de clientes e fornecedores mencionados no balanço reportado a 31 de Dezembro de cada ano.
Acentuando, J.A.R. Martins Barreiros, Manuel A. Costa Teixeira e Henrique Quintino Ferreira, no Boletim da Direcção Geral das Contribuições e Impostos, que «no cálculo das provisões previstas na alínea c) do art. 33° [do Código da Contribuição Industrial] [provisões para cobertura de créditos de cobrança duvidosa] entra-se em conta com as letras descontadas e não pagas pelos aceitantes até ao fim do exercício.». (Pág. 389 dos nºs 116-117 do Boletim, 1968, e pág. 101 do Boletim, n.ºs 211-213, de Julho e Set. de 1976) (nosso sublinhado).
(…)
Assim, em nosso entender, não podem os encargos bancários com letras deixarem de estarem intimamente conexionados com o negócio causal, de que a letra é o simples escrito particular. Por isso, como bem afirma a recorrente, porque as letras não eliminam o risco de incobrabilidade que impõe a constituição da provisão, dada a sua autonomia relativamente à relação extra-cambiária, é manifesto que as provisões constituídas devem ser consideradas dedutíveis em sede do IRC porque conformes com o disposto no artigo 35.º do CIRC.”
O objecto dos créditos neste aresto considerados provenientes da actividade normal da empresa não tem as mesmas natureza ou sequer espécie dos créditos contra fornecedores, em causa nos presentes autos – desde logo trata-se de devedores que também são clientes; e porque são clientes. Contudo há entre ambos uma analogia, pois também quanto a estes outros créditos cambiários ou de origem cambiária se poderia dizer que não provêm da actividade normal da empresa, por isso que relevam de uma peculiar maneira de a empresa se fazer pagar os preços dos bens e ou serviços que fornece, maneira cuja escolha é da sua responsabilidade e cujos créditos são imediatamente alheios ou independentes dos fluxos de aquisições e vendas de mercadorias ou prestação de serviços.
Pelo exposto entende-se serem admissíveis as provisões em discussão, pelo que as correcções feitas no pressuposto da sua inadmissibilidade legal violavam efectivamente o artigo 34º nº 1 al a) do CIRC na redacção e numeração vigente em 2001, não podendo, portanto, ser mantidas.»
Bem andou, assim a sentença recorrida em julgar a impugnação procedente, também nesta parte.

3ª Questão
O tribunal a quo errou no julgamento de facto e de direito ao julgar viciada de insuficiência de fundamentação, em face das exigências legais de fundamentação (artigo 77 nºs 1 e 3 alªs b) e c) da LGT, a adição feita pela AT, de 367 069 €, ao rendimento colectável, em ordem às liquidações impugnadas, com fundamento no artigo 58º nº 1 do CIRC (regime dos preços de transferência), a propósito dos juros de mora suportados pela [SCom01...] junto da “[SCom05...]” ([SCom05...]), já que os serviços de Inspecção demonstraram os termos e condições em que decorreram as operações sob análise, confrontando-as com as que seriam normalmente aceites se aquelas operações tivessem sido praticadas entre partes independentes?

O discurso da sentença recorrida colocado em crise nesta questão é redutível à seguinte transcrição:
«Quanto ao segundo vício invocado a respeito desta correcção, o da falta de fundamentação, cumpre assinalar que a AT pode proceder a correcções ao lucro tributável, ao abrigo do artigo 58.º, n.º 1 ou n.º 8, do CIRC, desde que se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos: existência de relações especiais entre o contribuinte e outra pessoa; que entre ambos sejam estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes; que daquelas resulte um lucro tributável diverso do que se apuraria na sua ausência.
Quando a AT assim procede, a fundamentação das correcções deve respeitar as exigências gerais de fundamentação relativas aos actos tributários [cfr. artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, artigos 123.º, n.º 1 alínea d), 124.º e 125.º do Código de Procedimento Administrativo de 1991 (aplicável, atenta a data dos factos sob apreciação) e n.ºs l e 2 do artigo 77.º n.º l da Lei Geral Tributária], bem como, observar os requisitos de fundamentação especialmente estabelecidos no artigo 77.º, n.º 3, da LGT.
É sabido que a fundamentação deve ser expressa e conter a sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto e que o dever de fundamentação dos actos administrativos, constituindo um princípio fundamental da administração, visa permitir captar a actividade administrativa [princípio da transparência da acção administrativa], aferir da sua correcção [princípio da boa administração], e, principalmente, possibilitar um controlo contencioso mais eficaz do acto administrativo, sobretudo quanto aos vícios resultantes da ilegalidade dos pressupostos [cfr. G.
Canotilho e V. Moreira, CRP Anotada, página 935 e 936].
Assim, sendo a fundamentação um conceito relativo, varia em função do tipo legal de acto e visa responderás necessidades de esclarecimento do interessado, sendo direccionada à transmissão do itinerário cognoscitivo e valorativo e das razões de facto e de direito que determinaram a sua prática e, apesar de integrar um requisito formal e não substancial do acto administrativo, a sua necessidade é tanto maior quanto a necessidade de assegurar a possibilidade do controlo contencioso do acto quanto à legalidade dos pressupostos [fundamentação substancial].
Por esta razão, foram definidos requisitos de fundamentação especiais de uma liquidação adicional realizada no âmbito de aplicação do disposto quanto aos preços de transferência, no n.º 3 do artigo 77.º da LGT, que exigem a descrição das relações especiais [n.º 3, alínea a)], a descrição dos termos em que nomeadamente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes em idênticas circunstâncias [n.º 3,alínea b)],a indicação das obrigações incumpridas pelo SP [sendo estas obrigações necessariamente de entre as elencadas no artigo 58.º e na portaria 1446-C/2001] e, a demonstração das razões da escolha e aplicação do método e a quantificação dos respectivos efeitos [n.º 3, alínea c)].
Conforme o teor do RIT acolhido no probatório [cfr. ponto 30], procedeu-se à descrição das relações especiais entre as entidades envolvidas nas operações económicas analisadas, com especificação das razões pelas quais a [SCom03...] tem influência decisiva nas decisões da [SCom01...], uma vez que esta, através da [SCom02...] detém 100% da [SCom01...] e "quer a [SCom01...] quer a [SCom05...] são detidas em 100% pelo Grupo " Y ", mostrando-se, por isso, observado o disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 77.9 da LGT.
Resulta ainda dos factos assentes [pontos 30 e 38 do probatório], que a impugnante suportou no ano de 2003, custos no montante de € 1.801.622,37, com juros de mora à taxa legal praticada em Espanha de 5,5%, por atrasos no pagamento dos serviços prestados pela [SCom05...], sociedade espanhola, conforme contratual mente estipulado entre ambas.
Que, entre a [SCom05...], SA [[SCom05...]] e a [SCom01...], SA [[SCom01...]], em 01.01.2001, foi outorgado contrato, com a vigência de um ano renovável por iguais períodos, em que a segunda encomenda à primeira a gestão de determinados serviços, mediante um determinado preço, estipulando-se, ainda, que as facturas emitidas ao abrigo do mesmo contrato deverão ser liquidadas no prazo de 30 dias e que, sobre as quantias facturadas e não pagas no prazo estabelecido, serão devidos juros de mora à taxa equivalente à taxa legalmente estabelecida em Espanha, país onde da [SCom05...] está localizada.
E, que, no mesmo exercício, de 2003, por força de contrato de operação financeira celebrado, em 18.12.2002, entre a [SCom01...], SA [[SCom01...]] e a [SCom03...] [[SCom03...]], aquela abriu uma linha de crédito a favor desta, em sistema de conta corrente, no âmbito da qual recebia juros à taxa de 2,734%.
Perante tal circunstancialismo, a AT referiu que, de acordo com o artigo 58.º do CIRC, “(…)nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e uma qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis" e, do estatuído na nesta norma resulta que: "l. Quando entre entidades relacionadas 2. Sejam desenvolvidas operações financeiras. 3. Estas deverão estar em conformidade com o Princípio de Plena Concorrência", procurando demonstrar com a fundamentação expendida "que se estas operações tivessem sido realizadas entre entidades independentes as condições praticadas teriam sido diferentes. Ou seja, se a [SCom01...] operasse com entidades independentes, teria preferido, em vez de emprestar o dinheiro à sua entidade relacionada [SCom03...] S.A. onde aufere uma rentabilidade inferior a 3%, utilizar esse dinheiro para amortizara dívida que detém na sua entidade relacionada "[SCom05...]" e em relação à qual suporta um custo de 5,5%. Em suma, uma entidade independente teria anulado um custo de 5,5%, em vez de auferir um proveito de 2,734%".
Em termos de "Pesquisa de Comparáveis", a AT referiu que, de acordo com o n.º 3 do artigo 4.º da Portaria: "Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas".
Especificou que a [SCom05...] SA [[SCom05...]] "é uma empresa do Grupo " Y ", sediada na Espanha, a qual tem como objecto: - Negociação com os fornecedores de mercadorias intracomunitárias e países terceiros; - Confirmação das facturas e respectivo pagamento; - Elaboração e contabilização do processo administrativo de compra e venda de mercadorias".
Asseverou que, "As condições estabelecidas e praticadas, entre a [SCom01...] e a [SCom05...], são diferentes das que seriam estabelecidas entre entidades independentes. Ao longo deste ponto iremos demonstrar que se, as transacções realizadas coma [SCom05...] tivessem sido efectuadas com uma independente, certamente a [SCom01...] não teria optado por suportar juros de mora a 5,5%, concedendo, simultaneamente uma linha de crédito a outra entidade relacionada [SCom02...] onde aufere uma rentabilidade (cerca de 2,7%) bastante inferior aos custos suportados com o atraso nos pagamentos à [SCom05...]. Esta situação só ocorre porque entre as partes intervenientes existem relações especiais e em virtude dessas relações especiais foram estabelecidas condições diferentes das que seriam estabelecidas se estas operações tivessem sido realizadas entre entidades independentes, dado que as vantagens económicas de realizar uma operação em detrimento da outra são evidentes" [sublinhado nosso].
A AT afirmou igualmente que, em relação a outros fornecedores com quem a [SCom01...] estabelece operações económicas esta opta por solver as respectivas dívidas, em vez de efectuar aplicações.
Objectivamente, é nestas premissas, que a AT assenta a afirmação de que, quando analisado o impacto das condições praticadas na esfera jurídica da [SCom01...], nenhuma entidade independente estaria disposta a prescindir da diminuição dos custos que resultaria da utilização dos fundos para amortizar a dívida, em função da rentabilidade associada à aplicação financeira em que consistiu a segunda das operações descritas.
Ora, segundo a norma do artigo 58.º do CIRC, quando entre entidades relacionadas, sejam desenvolvidas operações, estas deverão estarem conformidade com o princípio de plena concorrência e, segundo a Portaria dos preços de transferência, que comporta as regras relativas a preços de transferência [transfer pricing - que se reportam às operações comerciais entre entidades especialmente relacionadas], que assentam nos princípios da independência e da plena concorrência [transacção em condições normais de mercado - arm's length principle] e da comparabilidade dos preços, aplicável sempre que existam relações especiais entre duas entidades, ou seja, em situações em que uma tenha o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra.
O referido princípio arm's length [ou do preço de plena concorrência], baseia-se na premissa da empresa distinta e separada [contratação, aceitação e prática de preços em termos ou condições substancialmente idênticos dos que normalmente seriam contratados, aceites ou praticados entre entidades independentes em operações comparáveis], isto é, as diferentes partes são tratadas como entidades distintas e separadas, mediante uma ficção de autonomia, sendo o resultado imputável a cada uma determinado com base nesta ficção.
De forma a assegurar o maior grau de comparabilidade entre operações ou séries de operações, deve ter-se em consideração uma série de factores, incluindo as características dos bens, direitos ou serviços, as funções desempenhadas pelas entidades em causa, os activos utilizados, a repartição do risco, os termos e condições contratuais acordados, as circunstâncias económicas, as características dos bens, a posição de mercado, a situação económica, financeira e estratégia do negócio e, bem assim, outras características das entidades envolvidas que se mostrem relevantes ante as circunstâncias em causa.
No que concerne aos "termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes e em idênticas circunstâncias", a AT não descreveu operações económicas comparáveis de forma individualizada e com enfoque no valor da taxa de juro correspondente, isto é, apontando qual seria a taxa de juro praticada em situação de plena concorrência entre entidades independentes nas duas operações económicas que analisou, dado que o motivo da correcção efectuada não assentou no facto de em cada uma dessas operações não ter observado o princípio da plena concorrência no que respeita às condições e taxas de juro estabelecidas e praticadas.
Na verdade, não se ter utilizado o capital, para amortização da dívida que obriga a [SCom01...] a pagar juros mais elevados do que os que recebe em operação à qual o mesmo capital foi considerado afectado, diminuindo o seu património, constituem as condições praticadas entre a [SCom01...] e a [SCom05...], que foram tidas pela AT como não conformes ao princípio da plena concorrência, pelo que, se impunha que os "termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes e em idênticas circunstâncias", fossem reportados a estas mesmas circunstâncias.
Verifica-se, porém, que a AT não concretizou os termos que são praticados nas únicas operações a que se referiu como comparáveis [as estabelecias entre a [SCom01...] e os restantes fornecedores], as suas características, a natureza das mesmas operações, condições contratuais, se respeitam ao fornecimento de bens ou serviços, e, bem assim, não se referiu às características da actividade desenvolvida pelos referidos fornecedores por comparação com o fornecedor [SCom05...], à respectiva posição no mercado, etc., para que se pudesse aferir se as operações que se tomaram por referência são "substancialmente idênticas". OU seja, se "as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo a que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas".
Então, com base na fundamentação expendida no RIT, desconhecem-se quais são, em concreto, os fornecedores da [SCom01...] que a AT tomou como referência, para afirmar que em relação a outros fornecedores, com quem a [SCom01...] estabelece operações económicas, esta opta por solveras respectivas dívidas, em vez de efectuar aplicações, e, bem assim, as circunstâncias que presidem às operações económicas estabelecidas com os referidos fornecedores e as características da actividade a que estes se dedicam, para se poder aferir se estas operações são substanciamente idênticas, por as suas "características económicas e financeiras relevantes serem análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajusta mentos que eliminemos efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas".
Acresce que os juros devidos à [SCom05...], à taxa de 5,5%, não são devidos em virtude de uma operação financeira, mas de uma estipulação contratual integrada no âmbito da uma operação comercial que, em correspondência com o estipulado na lei, visa ressarcir a [SCom05...] pela privação do recebimento do preço contratual mente estabelecido, dentro do prazo acordado, apresentando natureza indemnizatória.
Por sua vez, por força de contrato relativo à operação financeira celebrado, em 18.12.2002, entre a [SCom01...], SA e a [SCom03...], aquela abriu uma linha de crédito a favor desta, em sistema de conta corrente, no âmbito da qual recebia juros à taxa de 2,734 %, os quais apresentam natureza remuneratória.
No primeiro caso, existe uma operação comercial, em que são suportados juros de mora como consequência contratual mente estabelecida para o não cumprimento atempado, por parte da [SCom01...], da contraprestação devida em virtude da relação comercial subjacente, do pagamento do preço e, no segundo, verifica-se que a disponibilização do capital constitui o objecto da operação financeira e a taxa de juro é a remuneração contratualizada por essa disponibilização de fundos.
Em suma, face a tudo que antecede, a perspectiva em que assenta a correcção efectuada pela AT apresenta-se desenvolvida sob um prisma redutor, insuficiente e ambíguo, em face das exigências legais de fundamentação.
Redutor e insuficiente porque a AT não se refere a operações comparáveis e não aporta para o caso factores que importa ter em linha de conta quando se pretende assegurar ou aferir se existe o necessário grau de comparabilidade entre a operação sob análise e operações consideradas comparáveis [e, se fosse o caso de inexistência de operações comparáveis, impunha-setersido feita essa menção, com a indicação das premissas em que assentava], centrando a sua análise exclusivamente em duas das operações realizadas pela [SCom01...]-entre a [SCom01...] e a [SCom05...] e a [SCom01...] e a [SCom03...].
Ambíguo e insuficiente a respeito da natureza das operações e dos juros que lhes correspondem, quanto às operações entre a [SCom01...] e a [SCom05...] e a [SCom01...] e a [SCom03...], que não se equivalem em termos da sua natureza e, por isso, não são susceptíveis de ser colocadas no mesmo plano, em termos de comparabilidade dos seus termos, além do mais, quanto à taxa de juro estipulada, para que se alcance a razão de ser da relação de causalidade estabelecida pela AT [uma relação é comercial, no âmbito da qual são suportados juros que apresentam natureza indemnizatória e outra relação é financeira, no âmbito da qual é disponibilizado capital, em sistema da conta corrente, sendo recebidos em contrapartida juros que apresentam natureza remuneratória ].
O estabelecimento de uma relação ou nexo de causalidade em que se pretende que a opção da [SCom01...], de realizar a segunda das operações [a abertura de linha de crédito, remunerada à taxa de 2,734%, a favor da [SCom01...] a suportar pela [SCom03...]], não apresenta racionalidade económica face aos termos da primeira das operações [juros de mora suportados em virtude de atrasos nos pagamentos de prestações de serviços, à taxa de 5,5%, a suportar pela [SCom01...] em benefício da [SCom05...]], constituindo o comportamento que teria entidade independente a opção pela amortização da dívida que originava o custo inerente aos juros, não constitui fundamentação que preencha os requisitos acrescidos e especiais relativos à aplicação da disposição relativa aos preços de transferência, não possibilitando um controlo contencioso eficaz do acto administrativo quanto aos vícios resultantes da ilegalidade dos pressupostos.
Assim é, porque os pressupostos para a correcção do lucro tributável à luz deste regime legal são específicos para as situações que lhe sejam subsumíveis, por a actuação administrativa estar vinculada ao estabelecimento do preço de plena concorrência, não manifestando a norma [do anterior artigo 57.º a que corresponde à data dos factos o artigo 58.º do CIRC] qualquer abertura possibilitadora da existência de uma liberdade de eleição ou de escolha quanto ao efeito jurídico que a fixação dos "termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes" é passível de consequenciar, como decorrência do princípio da tipicidade [como salienta o Acórdão do Tribunal Constitucional 252/05, de 10.05.2005 (Que julgou que a norma do n.º 1 do artigo 579 do CIRC, na redacção em causa, não padece de inconstitucionalidade, por ofensa do princípio da tipicidade e legalidade consagrado no citado artigo 106º, n.º 2, da CRP e, no mesmo sentido, também do Tribunal Constitucional, o Acórdão 271/05 de 24.05.2005)] e não servindo para limitar a autonomia da vontade que se materialize apenas em actuação de acordo com as convicções de gestão, do sujeito passivo, com a inerente liberdade de planificar e executar meios de gestão lícitos.
Ante a factualidade assente e as considerações que antecedem, a fundamentação expendida no caso sob apreciação, não se apresenta de molde a permitir aferir se a situação se subsume ao disposto no artigo 58.5 do CIRC e, ainda que ali seja enquadrável, se a actuação administrativa no caso concreto respeitou a vinculação que a mesma acarreta quanto ao estabelecimento do preço de plena concorrência.
Com base no exposto, impõe-se determinara procedência da Impugnação nesta parte, por vício deforma atinente à fundamentação legalmente exigível, em violação do disposto no artigo 77.º, n.º 1 e n.º 3 alíneas b) e c) e, consequentemente, anular a liquidação na parte em que se encontra influenciada pela correcção de € 367.069,00, ficando prejudicado o conhecimento do demais alegado quanto à mesma correcção [artigo 608.º n.º 2 do CPC, ex vi artigo 2.2 alínea e) do CPPT].
Embora a longa exposição que acabamos de reproduzir nem sempre se tenha restringido à apreciação do vicio de falta de fundamentação formal, resvalando frwquentemente para a discussão de questões atinentes à legalidade ou ilegalidade substancial, parecendo confundir a insuficiência de fundamentação com o erro de direito na fundamentação material, não deixa de ser possível isolar e considerar os trechos em que proficuamente se discurte e aprecia o vicio de forma.
São eles, essencialmente, os seguintes:
Na verdade, não se ter utilizado o capital, para amortização da dívida que obriga a [SCom01...] a pagar juros mais elevados do que os que recebe em operação à qual o mesmo capital foi considerado afectado, diminuindo o seu património, constituem as condições praticadas entre a [SCom01...] e a [SCom05...], que foram tidas pela AT como não conformes ao princípio da plena concorrência, pelo que, se impunha que os "termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes e em idênticas circunstâncias", fossem reportados a estas mesmas circunstâncias.
Verifica-se, porém, que a AT não concretizou os termos que são praticados nas únicas operações a que se referiu como comparáveis [as estabelecias entre a [SCom01...] e os restantes fornecedores], as suas características, a natureza das mesmas operações, condições contratuais, se respeitam ao fornecimento de bens ou serviços, e, bem assim, não se referiu às características da actividade desenvolvida pelos referidos fornecedores por comparação com o fornecedor [SCom05...], à respectiva posição no mercado, etc., para que se pudesse aferir se as operações que se tomaram por referência são "substancialmente idênticas". OU seja, se "as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo a que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas".
Então, com base na fundamentação expendida no RIT, desconhecem-se quais são, em concreto, os fornecedores da [SCom01...] que a AT tomou como referência, para afirmar que em relação a outros fornecedores, com quem a [SCom01...] estabelece operações económicas, esta opta por solveras respectivas dívidas, em vez de efectuar aplicações, e, bem assim, as circunstâncias que presidem às operações económicas estabelecidas com os referidos fornecedores e as características da actividade a que estes se dedicam, para se poder aferir se estas operações são substanciamente idênticas, por as suas "características económicas e financeiras relevantes serem análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajusta mentos que eliminemos efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas".
Acresce que os juros devidos à [SCom05...], à taxa de 5,5%, não são devidos em virtude de uma operação financeira, mas de uma estipulação contratual integrada no âmbito da uma operação comercial que, em correspondência com o estipulado na lei, visa ressarcir a [SCom05...] pela privação do recebimento do preço contratual mente estabelecido, dentro do prazo acordado, apresentando natureza indemnizatória.
Por sua vez, por força de contrato relativo à operação financeira celebrado, em 18.12.2002, entre a [SCom01...], SA e a [SCom03...], aquela abriu uma linha de crédito a favor desta, em sistema de conta corrente, no âmbito da qual recebia juros à taxa de 2,734 %, os quais apresentam natureza remuneratória.
No primeiro caso, existe uma operação comercial, em que são suportados juros de mora como consequência contratual mente estabelecida para o não cumprimento atempado, por parte da [SCom01...], da contraprestação devida em virtude da relação comercial subjacente, do pagamento do preço e, no segundo, verifica-se que a disponibilização do capital constitui o objecto da operação financeira e a taxa de juro é a remuneração contratualizada por essa disponibilização de fundos.
Em suma, face a tudo que antecede, a perspectiva em que assenta a correcção efectuada pela AT apresenta-se desenvolvida sob um prisma redutor, insuficiente e ambíguo, em face das exigências legais de fundamentação.
Redutor e insuficiente porque a AT não se refere a operações comparáveis e não aporta para o caso factores que importa ter em linha de conta quando se pretende assegurar ou aferir se existe o necessário grau de comparabilidade entre a operação sob análise e operações consideradas comparáveis [e, se fosse o caso de inexistência de operações comparáveis, impunha-setersido feita essa menção, com a indicação das premissas em que assentava], centrando a sua análise exclusivamente em duas das operações realizadas pela [SCom01...]-entre a [SCom01...] e a [SCom05...] e a [SCom01...] e a [SCom03...].
Ambíguo e insuficiente a respeito da natureza das operações e dos juros que lhes correspondem, quanto às operações entre a [SCom01...] e a [SCom05...] e a [SCom01...] e a [SCom03...], que não se equivalem em termos da sua natureza e, por isso, não são susceptíveis de ser colocadas no mesmo plano, em termos de comparabilidade dos seus termos, além do mais, quanto à taxa de juro estipulada, para que se alcance a razão de ser da relação de causalidade estabelecida pela AT [uma relação é comercial, no âmbito da qual são suportados juros que apresentam natureza indemnizatória e outra relação é financeira, no âmbito da qual é disponibilizado capital, em sistema da conta corrente, sendo recebidos em contrapartida juros que apresentam natureza remuneratória ].
O estabelecimento de uma relação ou nexo de causalidade em que se pretende que a opção da [SCom01...], de realizar a segunda das operações [a abertura de linha de crédito, remunerada à taxa de 2,734%, a favor da [SCom01...] a suportar pela [SCom03...]], não apresenta racionalidade económica face aos termos da primeira das operações [juros de mora suportados em virtude de atrasos nos pagamentos de prestações de serviços, à taxa de 5,5%, a suportar pela [SCom01...] em benefício da [SCom05...]], constituindo o comportamento que teria entidade independente a opção pela amortização da dívida que originava o custo inerente aos juros, não constitui fundamentação que preencha os requisitos acrescidos e especiais relativos à aplicação da disposição relativa aos preços de transferência, não possibilitando um controlo contencioso eficaz do acto administrativo quanto aos vícios resultantes da ilegalidade dos pressupostos.



III – Conclusão:
Do exposto decorre a improcedência do recurso, saindo prejudicada a 3ª questão acima enunciada.


IV – Custas
As custas do recurso ficarão a cargo da Recorrente, atento o total decaimento (artigo 527º do CPC).

V- Dispositivo
Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal em julgar o recurso improcedente.
Custas do recurso e da acção pela Recorrida.

Porto, 23 de Novembro de 2023

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Cristina Maria Santos da Nova
Maria Celeste Gomes de Oliveira