Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00435/18.2BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/25/2022
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Luís Migueis Garcia
Descritores:EMPREITADA.
REPOSIÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO.
CADUCIDADE
Sumário:
I) – Extinto o direito à reposição do equilíbrio financeiro do contrato, por caducidade, improcede a acção que aí tem causa.
Recorrente:C..., Ldª
Recorrido 1:Infraestruturas de Portugal, S.A.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não foi emitido parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:
C..., Ldª (R. ..., Coimbra), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto – Juízo de Contratos Públicos, o qual julgou improcedente a acção por si intentada contra Infraestruturas de Portugal, S.A. (Praça ... ...).
Conclui:
1.ª Vem o presente recurso jurisdicional interposto do saneador sentença proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 06.09.2022, o qual, julgando improcedente a pretensão da Autora, ora Recorrente, à luz da responsabilidade contratual e da responsabilidade civil extracontratual, julgou totalmente improcedente a acção instaurada pela Recorrente e, em consequência, absolveu a Entidade Demandada do pedido.
2.ª Ao decidir nos termos em que decidiu, nomeadamente que a pretensão da Recorrente não encontra o seu fundamento jurídico na responsabilidade contratual nos termos gerais regulados no Código Civil, mas sim no instituto da reposição do equilíbrio financeiro por agravamento dos custos na realização da obra previsto e regulado no artigo 354.º do CCP e que neste âmbito o direito da Recorrente caducou nos termos do n.º 2 deste preceito, o Tribunal a quo incorreu em errada interpretação e aplicação das normas dos artigos 563.º, 798.º, 799.º e ss. do CC, 280.º n.º 4, 354.º e 356.º do CCP.
3.ª À luz do alegado pelas partes e face aos elementos de prova juntos aos autos, nunca o Tribunal a quo poderia ter concluído pela aplicação do instituto da reposição do equilíbrio financeiro por agravamento dos custos na realização da obra previsto e regulado no artigo 354.º do CCP, uma vez que não se mostra preenchido o primeiro dos pressupostos “circunstâncias imputáveis ao dono da obra”).
4.ª Dos elementos de prova juntos aos autos resulta que a suspensão da obra não foi imposta pela Recorrida, tendo sido antes proposta pela Recorrente e foi motivada, formalmente e pelo que então era do conhecimento da Recorrente, por condições meteorológicas adversas, ou seja, por circunstâncias alheias às partes contratantes, as quais poderiam, quanto muito, ser subsumidas ao regime de alteração anormal e imprevisível das circunstâncias previsto nos artigos 312.º e 314.º do CCP.
5.ª A Recorrente alega e propõe-se a demonstrar que só em janeiro de 2018 tomou conhecimento de que a responsabilidade pelas circunstâncias que motivaram a suspensão da empreitada e os custos que teve de suportar decorreram afinal de uma conduta ilícita da Recorrida, de um acto ilegalmente praticado, consubstanciado na consignação da empreitada em violação do disposto no artigo 356.º do CCP, o que nunca poderá ter como consequência o ressarcimento através da aplicação do instituto previsto e regulado no artigo 354.º do CCP ou de qualquer outro regime previsto no mesmo diploma.
6.ª O instituto previsto e regulado no artigo 354.º do CCP não pode ser aplicável pois o mesmo é omisso relativamente a situações como a que se encontra a ser discutida nos presentes autos, não regulando situações em que o empreiteiro apenas toma conhecimento do facto que motiva o evento que é gerador dos danos já depois de decorrido o prazo estabelecido no n.º 2 do artigo 354.º do CCP.
7.ª O ressarcimento da Recorrente terá de ocorrer por via da responsabilidade contratual nos termos gerais regulados no Código Civil, por força do disposto no n.º 4 do artigo 280.º do CCP – “Em tudo quanto não estiver regulado no presente Código ou em lei especial, ou não resultar da aplicação dos princípios gerais de direito administrativo, é subsidiariamente aplicável à execução dos contratos administrativos, com as necessárias adaptações, o direito civil”.
8.ª Sem prescindir do apontado erro de julgamento, a decisão a quo ao considerar que o direito da Recorrente caducou, não lhe reconhecendo qualquer direito a ser ressarcida dos danos que teve de suportar para executar e concluir a empreitada, é ainda susceptível de originar uma situação de enriquecimento sem causa por parte da Recorrida à custa da Recorrente, nos termos do disposto no artigo 473.º do CC.
9.ª Posto isto, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em sua consequência, deve o saneador sentença recorrido ser revogado na parte em que julgou improcedente a pretensão da Autora, ora Recorrente, à luz da responsabilidade contratual, devendo o processo prosseguir os seus trâmites normais, designando-se data para a realização de audiência prévia, nos termos do artigo 87.º-A do CPTA,
Contra-alegou a ré, concluindo:
1-A douta sentença proferida na fase do Saneador, dada a factualidade documental verificada, desde logo, acabaria por ser, necessariamente, assim julgada.
2-A Petição vem pedir indemnização por duas vias:
- Em sede de responsabilidade contratual, procurando forçar a aplicação de disposições do Código Civil. Mas, ficam prejudicadas, face à lei especial que prevalece nas obras públicas e que é o Código dos Contratos de Obras Públicas (CCP);
-E ainda, sem qualquer suporte legal, a Autora tentou a aplicação da lei da responsabilidade civil do Estado-Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro. Mas, era manifesta a sua eventual não aplicação por não se verificam os respetivos pressupostos exigíveis.
3-Ora, os factos apontados, caso fossem fundados e relevassem, só poderiam ter enquadramento jurídico no instituto da reposição do equilíbrio financeiro.
4- Mas, para tal, haveria que preencher um conjunto de requisitos ou pressupostos que, de forma alguma, se verificaram.
5-Evidentemente que no decorrer da execução duma obra pública, no interesse de ambas as partes, há um diálogo permanente entra o Dono da Obra e a Firma Adjudicatária, tendo por base, entre outra documentação, um Projeto Aprovado e um Caderno de Encargos, com cláusulas gerais e especiais e o sempre o atual ponto da situação dos trabalhos realizados bem como perspetiva imediata da execução dos trabalhos a realizar.
6- Dadas as características especificas duma obra, um projeto, por mais bem feito que seja, acaba sempre por sofrer inevitáveis alterações. Daí, a previsão regulada no CCP de trabalhos a mais e a menos, sem que o empreiteiro possa recusar a sua execução.
7-Também, se refere que uma obra rodoviária é executada num ambiente natural, ao ar livre. E, como tal, sujeita â variação das condições meteorológicas e a um devido planeamento no tempo.
8-E os empreiteiros sabem disso, antes e depois dos concursos públicos, em que, também, são conhecedores das figuras de suspensão de trabalhos e consequentes reajustamentos do Plano de Trabalhos.
9-A execução da obra constitui um ato contínuo e duradouro, em que obriga a permanente resposta do Dono da Obra ou seus Agentes às questões suscitadas pelos empreiteiros e inversamente.
Procura-se que a obra não pare, pois estão em jogo importantes interesses públicos e valores económicos significativos, de ambas as partes e que interessam ser definidos, equacionados e apurados no momento.
10-E daí, a preocupação dos esclarecimentos em obra e as necessárias decisões serem rápidas. Caso o não sejam, surgem as reclamações em prazos curtos e que deverão ser decididas ou esclarecidas em prazo, com preceitua o CPA e o CCP.
11- De que se invoca aqui o mecanismo da “Reposição do Equilíbrio Financeiro” do artigo 354.º do CCP e o prazo de 30 dias a partir do evento ou momento gerador de potencial indemnização.
12-Todas as vicissitudes em obra estão previstas neste Código dos Contratos Públicos, sendo que as eventuais indemnizações decorrentes de agravamento dos custos na realização da obra serão reguladas pelo artigo 354.º que é, para todos os efeitos, o que está em causa neste processo.
13-E, por conseguinte, qualquer pedido de indemnização por reequilíbrio financeiro deverá ser efetuado no prazo de 30 dias, nos moldes previstos no CCP (artigo 354.º-2).
14-Não aceitável que o Empreiteiro, em dada altura, conheça de eventual agravamento de custos, despesas ou encargos adicionais resultantes, se conforme e continue em obra, sem nada dizer ou reclamar.
Possa tirar benefício de eventuais ajustamentos em obra posteriores, como por exemplo, alterações para mais de preços unitários e outras eventuais compensações, alterações de tipos de trabalho/atividades por outros (variantes) mais rentáveis etc.
15-E, mantendo uma espécie de reserva mental à espera da conclusão da obra, para depois (sem contrapoder) vir pedir um “Reequilíbrio Financeiro”, para lá do prazo legal, o que o legislador não terá querido.
16-Ora, estas situações suscetíveis de agravamento de custos em obra, têm de ser vistas na hora, em que tudo está bem visível, fácil de desmontar, verificar, construir, reconstruir, reparar, etc. E não arrastar a situação para a indefinição, para o mais ou menos ou que, se calhar, foi desta ou daquela maneira.
17-Portanto, bem andou o Tribunal ao decidir com decidiu, não sendo de sindicar qualquer erro de interpretação.
18-E, também, continuamos a dizer e como decorre dos autos, que a IP não praticou qualquer conduta ilícita que possa configurar qualquer responsabilidade em sede de responsabilidade civil extracontratual ou outra.
19-Sendo ainda que não se verificou nenhum facto ou circunstância anormal e imprevisível, com enquadramento nos artigos 312 º e 314.º do CCP, mas, quando muito, factos normais e previsíveis que podem ocorrer em todas as obras.
20-O que poderia estar em causa seria mais uma falta de meios do empreiteiro para a realização da obra, tendo desmobilizado meios durante, pelo menos, os meses de Novembro e Dezembro de 2015, como é referido na Contestação (entre outros, os artigos 26.º a 32.º).
21-Portanto, as razões ou motivação do recurso da Autora, além de vagas e indefinidas, sem conteúdo mínimo e fundamentação consistente, não deverão ser atendidas, mantendo-se, na íntegra, o teor da Sentença proferida.
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A Exmª Procuradora-Geral Adjunta, notificada nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1, do CPTA, não emitiu parecer.
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Dispensando vistos, vêm os autos a conferência, cumprindo decidir.
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Os factos, que o tribunal “a quo” fixou como provados:
1. Em 19.1.2015 os serviços da então Estradas de Portugal, S.A. remeteram à Câmara Municipal ... email do qual consta,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 0074476128 dos autos.
2. Por deliberação de 29.1.2015 do Conselho de Administração da então Estradas de Portugal, S.A., foi aberto o concurso público para realização da empreitada “EN-306 – PH do Ribeiro ..., ao km 16+419 e ponte ao km 24+667; ... ao km 18+587 e ... ao km 23+759 – Reabilitação e alargamento ou substituição de obras de arte” (doravante apenas Empreitada), aprovando-se, além do mais, o Programa de Concurso e o Caderno de Encargos. – doc. DecisãoContratarEP-0021-2015 constante do p.a.
3. Do Programa de Concurso constava, além do mais,
No artigo 6.º, n.º 2 al. d) que a proposta seria constituída por “Programa de trabalhos, incluindo plano de trabalhos (tal como definido no artigo 361.º do Código dos Contratos Públicos), plano de mão de obra e plano de equipamento, tendo em conta que a consignação será efectuada no prazo máximo de 30 (trinta) dias após a assinatura do contrato. Prevê-se que a consignação ocorra em Junho de 2015.”
E no art. 22.º, n.º 2
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. ProgramaEP-0021-2015 constante do p.a.
4. Do Caderno de Encargos resulta que,
“4. PREPARAÇÃO E PLANEAMENTO DOS TRABALHOS
4.1. Preparação e planeamento da execução da obra
[…]
4.1.2. A preparação e o planeamento da execução da obra compreendem, além dos trabalhos preparatórios ou acessórios previstos no artigo 350º do Código dos Contratos Públicos e na cláusula 9.1. deste Caderno de Encargos:
(…)
g) A elaboração e apresentação pelo empreiteiro do plano de trabalhos ajustado, nos termos do nº3 do artigo 361º do Código dos Contratos Públicos, sempre que tenha sido apresentado pelo Dono da Obra, plano final da consignação, sem prejuízo do ajustamento do cronograma financeiro realizado pelo dono de obra exclusivamente para efeitos de cumprimento da Lei da Revisão de Preços, caso o Empreiteiro opte por não apresentar o plano de trabalhos ajustado;
[…]
4.9. Plano de trabalhos ajustado
4.9.1. O plano de trabalhos constante do contrato pode ser ajustado pelo empreiteiro ao plano final da consignação apresentado pelo dono da obra nos termos do disposto no artigo 357º do Código dos Contratos Públicos (plano de trabalhos ajustado) que deverá conter, nomeadamente os elementos referidos na cláusula 4.8..
4.9.2. Os ajustamentos referidos no número anterior não podem implicar a alteração do preço contratual, nem a alteração do prazo de execução da obra, nem ainda alterações aos prazos parciais definidos no plano de trabalhos constante do contrato, para além do que seja estritamente necessário à adaptação do plano de trabalhos e do plano final da consignação.
4.9.3. O plano de trabalhos ajustado carece de aprovação pelo dono da obra, no prazo de 5 dias após a notificação do mesmo pelo empreiteiro, equivalendo o silêncio a aceitação, nos termos do nº5 do artigo 361º do Código dos Contratos Públicos.
4.10. Modificação do plano de trabalhos e do plano de pagamentos:
4.10.1. O dono da obra poderá alterar em qualquer momento o plano de trabalhos em vigor, ficando o empreiteiro com direito a ser indemnizado dos danos sofridos em consequência dessa alteração, mediante reclamação a apresentar nos 30 dias subsequentes à data em que aquela lhe haja sido notificada, nos termos do nº2 e n.º3 do artigo 354º do Código dos Contratos Públicos.
4.10.2. O empreiteiro pode, em qualquer momento, propor modificações ao plano de trabalhos ou apresentar outro para substituir o vigente, justificando a sua proposta, desde que destes não resulte prejuízo para a obra ou prorrogação dos prazos de execução.
4.10.3. Em quaisquer situações em que se verifique a necessidade de o plano de trabalhos ser alterado, independentemente de tal se dever a facto imputável ao empreiteiro, deve este apresentar ao dono da obra um plano de trabalhos modificado.
4.10.4. Sem prejuízo do disposto no número anterior, em caso de desvio do plano de trabalhos que, injustificadamente, ponha em risco o cumprimento do prazo de execução da obra ou dos respetivos prazos parcelares, o dono da obra pode notificar o empreiteiro para apresentar, no prazo de 10 dias, um plano de trabalhos modificado, adotando as medidas de correção que sejam necessárias à recuperação do atraso verificado.
4.10.5. Realizada a notificação prevista no número anterior, se o empreiteiro não apresentar um plano de trabalhos modificado em moldes considerados adequados pelo dono da obra, este pode elaborar novo plano de trabalhos, acompanhado de uma memória justificativa da sua viabilidade, devendo notificá-lo ao empreiteiro.
4.10.6. Caso se verifiquem novos desvios, seja relativamente ao plano de trabalhos modificado pelo empreiteiro ou ao plano de trabalhos notificado pelo dono da obra nos termos do disposto no número anterior, este pode tomar a posse administrativa da obra, bem como dos bens móveis e imóveis à mesma afetos, e executar a obra, diretamente ou por intermédio de terceiro, nos termos previstos nos nºs 2 a 4 do artigo 325º do Código dos Contratos Públicos, procedendo aos inventários, medições e avaliações necessários.
4.10.7. O empreiteiro é sempre responsável, perante o dono da obra ou perante terceiros pelos danos decorrentes do desvio injustificado do plano de trabalhos, quer no que respeita ao conteúdo da respetiva prestação, quer no que respeita ao prazo de execução da obra.
4.10.8. Quando estejam em causa trabalhos a mais ou trabalhos de suprimento de erros e omissões que prejudiquem o normal desenvolvimento do plano de trabalhos, o empreiteiro propõe ao dono da obra as modificações necessárias ao mesmo, nos termos do disposto no artigo 373.º do Código dos Contratos Públicos, devendo este pronunciar -se sobre o plano de trabalhos modificado e comunicar a sua posição ao empreiteiro.
4.10.9. Sempre que se altere o plano de trabalhos, deverá ser feito o consequente reajustamento do plano de pagamentos.
[…]
5. PRAZOS DE EXECUÇÃO
5.1. Prazos de execução da empreitada
5.1.1. A execução dos trabalhos inicia-se na data em que começa a correr o prazo de execução da obra.
5.1.2. O prazo de execução da obra começa a contar -se da data da conclusão da consignação total ou da primeira consignação parcial ou ainda da data em que o dono da obra comunique ao empreiteiro a aprovação do plano de segurança e saúde, nos termos previstos na lei, caso esta última data seja posterior.
(…)
5.1.6. Na contagem dos prazos de execução da empreitada consideram-se incluídos todos os dias decorridos, incluindo sábados, domingos e feriados.
[…]
- doc. Cláusulas 1 a 12 do p.a.
5. A C..., Lda. apresentou proposta juntando, além do mais, Plano de Trabalhos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resultava a execução da empreitada em 210 dias, e do qual, em síntese, se extrai que os trabalhos relativos à EN...02 - ... ao km 23+759, incluindo os de pavimentação dos desvios de trânsito prévios à interdição na ..., decorreriam entre 14 de setembro de 7 de dezembro de 2015
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- cf. docs. 6.2.d2 e 6.2.d3 da pasta A - 2 do p.a.
6. Em 22.4.2015 a Câmara Municipal ..., relativamente ao email referido em 1., notificou a R. que,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. oficio de 13.6.2019 junto aos autos.
7. Por deliberação tomada em 23.4.2015 na reunião do Conselho de Administração, a Empreitada foi adjudicada à A. pelo valor de € 383.613,00, tendo sido, em 5.6.2015 celebrado entre a A. e R. o contrato tem por objeto a execução da Empreitada.
- doc. Adjudicação+Contrato constante do p.a.
8. Em 10.8.2015 a R. informou a Câmara Municipal de ... de que se encontra prevista a consignação da Empreitada para o dia 11.8.2015, dando conta, ainda,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
9. Na sequência da previsão da consignação da obra para 11.8.2015, a A. A. apresentou ao R., Plano de trabalhos ajustado do qual, em síntese, se extrai a alteração da sequência dos trabalhos sendo que os trabalhos relativos à EN...02 - ... ao km 23+759, incluindo os de pavimentação dos desvios de trânsito prévios à interdição na ..., decorreriam entre 21 de setembro de 2015 e 14 de dezembro de 2015,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
– doc. 8 da p.i. cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
10. Em 7.8.2015 o R. remeteu email à A. do qual se extrai “Conforme abordado pessoalmente aguarda-se o encio do PT Ajustado com a manutenção da execução da ... em último lugar, conforme inicialmente previsto”. – doc. 9 da p.i.
11. Nessa mesma data a A. apresentou ao R. Plano de trabalhos ajustado do qual se extrai, além do mais, que os trabalhos relativos à EN...02 - ... ao km 23+759, incluindo os de pavimentação dos desvios de trânsito prévios à interdição na ..., decorreriam entre 21 de dezembro de 2015 e 3 de março de 2016
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- cf. Doc. 9-Informação IP N.º 72_2015_CON – 2015_08_10
12. O Plano de Trabalhos ajustado referido no ponto anterior foi aprovado pelo R. em 10.8.2015. – cfr. doc. 9-Informação IP N.º 72_2015_CON – 2015_08_10
13. Em 11.8.2015 deu-se a consignação da obra, elaborando-se auto, que se mostra assinado pelo representante do dono de obra e pelo representante do empreiteiro, do qual se extrai,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 12-Auto de Consignação – 2015-08-11 constante do p.a.
14. Na sequência de reunião de obra de 18.9.2015, a A. remeteu ao R., por ofício datado de 22.9.2015, proposta de “sugestão exequível para as fundações especiais da ... na EN ...02 ao km 023+759”. – doc. 15-Carta Adjudicatário Ref ...7_15-AG – 22 setembro 2015 do p.a.
15. Com data de 08.10.2015, a Autora dirigiu à Entidade Demandada nova missiva, de cujo teor se destaca o seguinte:
“(…)
Na sequência dos trabalhos de limpeza e desmatação da zona envolvente à obra supra mencionada no passado dia 14 de Setembro de 2015, procedemos ao levantamento e implantação topográfica, bem como à determinação da espessura dos muros (…)
Verificamos que as estacas extremas dos apoios se localizam em zonas de muros de alvenaria, estruturais e jorrados de contenção (…).
Nas condições atrás descritas, que só foi possível determinar em sede de obra, torna-se inviável realizar a solução de concurso.
Deste modo aguardamos que nos sejam transmitidas instruções sobre uma solução viável estudada pelo dono de obra.
(…)
Nestas condições os trabalhos encontram-se suspensos desde esta data solicitando que esta parte da empreitada seja suspensa até que nos sejam fornecidos elementos de projecto viável para execução da obra de ....
(…)” - cfr. Doc. n.º 12, junto a petição inicial, constante de fls. 39 e seguintes dos autos;
- Carta Adjudicatário Ref ...8_...15-AG – 8 outubro 2015
16. Em reunião de obra de 15.10.2015 a A. informou o R. do problema da localização das estacas extremas dos encontros que tornavam inviável a solução do projeto. – doc. 19- Email’s IP, 14 de out., 19 out., 5 nov e 6 de nov. 2015
17. Por email de 23.10.2015 a R. comunicou à A.,
Em resposta à V/ comunicação 068/15 – AG recebida no dia 9/10/2015, informa-se que a situação foi devidamente registada e está a ser avaliada pelos serviços competentes da IP,SA, por forma a serem resolvidas as questões suscitadas.
Quanto à suspensão dos trabalhos referentes à ..., nesta fase, não se justifica qualquer suspensão de trabalhos, mesmo parcial, face ao plano de Trabalhos aprovado.
- doc. 18-Email IP, 23 outubro 2015 do p.a.
18. No início de novembro de 2015 a R. remeteu à A. peça desenhada, elaborada pelo projetista, consistindo da redução e 5 para 4 estacas. - docs. 18-Email IP, 23 outubro 2015 e 20-... – 13 novembro 2015 constantes do p.a
19. Com data de 13.11.2015, a Autora dirigiu à Entidade Demandada nova missiva, de cujo teor se destaca o seguinte:
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 20-... – 13 novembro 2015
20. Em resposta à comunicação referida no ponto anterior, em 26.11.2015 a R. remeteu à A. email do qual consta,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 21-Email IP, 26 novembro 2015 constante do p.a.
21. Com data de 02.12.2015, a Autora dirigiu à Entidade Demandada nova missiva, de cujo teor se destaca o seguinte:
“(…)
Adotando a solução de estacas conforme transmitido vimos mais uma vez alertar para as implicações que tem nas infraestruturas existentes e na estrutura dos encontros, que não é corretamente representado nos elementos que nos foram enviados.
Como é natural e advém das alterações e indefinições que se têm prolongado no tempo, esta situação e alteração de projecto, introduz encargos que não estão previstos, pelo que apresentaremos, após definição completa, os custos de remobilização e reafectação de meios e alteração das circunstâncias.
(…)
Alerta-se no entanto V: Exº que se na execução dos trabalhos surgirem obstáculos que
provoquem alteração das metodologias previstas, face ao estudo geotécnico patente no
concurso, esta empresa reserva-se o direito de pedir os consequentes sobrecustos a apurar no decorrer dos trabalhos.
(…)” – doc. 22-Carta Adjudicatário Ref 91_15-AG – 2 dezembro 2015
22. Em 2.12.2015 a R. remeteu ofício n.º 38...15/CONorte à Câmara Municipal ..., com o seguinte teor,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- cf. doc. junto aos autos em 13.6.2019.
23. Por email de 18.12.2015 a IEP comunicou à A.,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 24-Email IP, 18 dezembro 2015 do p.a.
24. Por email de 22.12.2015 a R. comunicou à A.,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 25-Email IP, 22 dezembro 2015
25. Por oficio de 7.1.2016 a Câmara Municipal ... respondeu à comunicação 381/2015/CONorte dando o acordo aos condicionalismos solicitados para a realização da Empreitada. – doc. junto aos autos em 13.6.2019.
26. Por oficio de 18.1.2016 a A. propôs à R. a suspensão dos trabalhos nos seguintes termos,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 28-Carta Adjudicatário Ref 12_16-AG – 18 janeiro 2016 do p.a.
27. Em 21.1.2016 a Fiscalização da obra emitiu Informação 09...16/CON da qual se extrai, com interesse,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 29-Informação IP N.º 09_2016_CON – 2016-01-21
28. Por deliberação de 25.2.2016 o Conselho de Administração da IEP aprovou a suspensão dos trabalhos da empreitada por um período previsível de 100 dias e a consequente prorrogação legal do prazo. – doc. 30-Deliberação CAE 2016-...5.
29. Em 11.03.2016, foi exarado “Auto de Suspensão” da obra, que se mostrada assinado pelos representantes do empreiteiro e do dono de obra, do qual se extrai,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 33-Auto de Suspensão do p.a.
30. Por oficio de 16.3.2016 o R. comunicou à A. a suspensão total do prazo de execução da empreitada por um período que se prevê de 100 dias, com efeitos a 23 dezembro de 2015. – doc. 31-Ofício IP Ref 31_2016_CONorte – 2016-03-16.
31. Por oficio datado de 12.4.2016 a R. comunicou ao Município de ...,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 35-Ofícios IP Ref. 48 a 52 2016_CONorte – 2016_04_11 a 12
32. Por oficio datado de 15.4.2016 a R. comunicou ao Município de ...,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. junto aos autos em 13.6.2019.
33. Por ofício datado de 18.4.2016 a R. comunicou ao Município de ...,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. junto aos autos em 13.6.2019.
34. Em 18.4.2016 foi lavrado “Auto de recomeço”, assinado pelos representantes da A. e do R., do qual se extrai,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 38-Ofício IP Ref ...7...16_CONorte – 2016-04-26 (Auto de Recomeço)
35. Com data de 27.04.2016, a Autora dirigiu à Entidade Demandada uma missiva, de cujo teor se destaca o seguinte:
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 39-... – 27 abril 2016 do p.a.
36. Em 2.5.2016 a R. remeteu à A. email, contendo desenhos relativos ao reposicionamento das estacas, extraindo-se o seguinte
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- cf. Doc. 41-Email's IP de 27 abril, 2
maio (2 unidades), 3 maio e 4 maio de 2016
37. Em 4.5.2016 a R. remeteu à A. email do qual se extrai,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- cf. Doc. 41-Email's IP de 27 abril, 2 maio (2 unidades), 3 maio e 4 maio de 2016
38. Em 4.5.2016 a A. remeteu ao R. plano de trabalhos atualizado. – cfr. 42-Email's Adjudicatário 4 maio 2016 – 2 unidades.
39. Com data de 4.5.2016, a Autora dirigiu à Entidade Demandada uma missiva com referência ...7...6, de cujo teor se destaca o seguinte:
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
[…]
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
[…]
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
-Carta Adjudicatário Ref 47...6-AG - 4 ...16
40. Em 8.6.2016 a R. respondeu ao empreiteiro nos seguintes termos,
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
- doc. 44-Email’s IP de 17 maio, 27 maio e 8 junho 2016
41. Por ofício datado de 22.6.2016 a A. requereu ao R. a prorrogação do prazo de execução a empreitada até 29.7.2016. - Carta Adjudicatário Ref. 64_16-AG – 22 junho 2016.
42. Por email de 6.7.2016 a R. comunicou à A. o indeferimento do pedido de prorrogação do prazo da empreitada. – doc. 51-Email IP de 6 de julho 2016.
43. A conclusão efetiva da execução dos trabalhos da empreitada ocorreu em 11.08.2016. – facto admitido por acordo,
44. Em 12.9.2016 foi realizada a receção provisória da obra lavrando-se “Auto de Recepção Provisória”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e que se mostra assinado pelo empreiteiro e dono de obra. – doc. 57-Ofício IP Ref 15...16_CONorte - ...16-...14 (Receção Provisória).
45. Em 12.9.2016, 28.9.2017 e 6.12.2018 foram efetuadas as receções definitivas parciais. – doc.s 58, 60 e 62 do p.a.
46. Com data de 17.08.2016, a Autora dirigiu à Entidade Demandada a seguinte missiva:
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
– cfr. Doc. n.º 19, junto a petição inicial, constante de fls. 39 e seguintes dos autos; admitido por acordo;
47. Com data de 12.04.2017, a Autora dirigiu à Entidade Demandada a seguinte missiva:
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
– cfr. Doc. n.º 20, junto a petição inicial, constante de fls. 39 e seguintes dos autos; admitido por acordo;
48. Em 11.08.2017, na reunião n.º 2017/120, o Conselho de Administração da Entidade Demandada “deliberou indeferir, nos termos propostos, a reclamação apresentada pela empresa adjudicatária com vista à Reposição do Equilíbrio Financeiro do contrato em epígrafe, com fundamento no disposto no n.° 2 do art.°354º do CCP. Mais deliberou o CAE autorizar, para efeitos de regularização administrativa e do processo da empreitada, a prorrogação graciosa do prazo de execução da empreitada em 38 (trinta e oito) dias, até 2016-08-11, data em que os trabalhos ficaram concluídos” – cfr. Doc. n.º 4, junto a contestação, constante de fls. 309 dos autos;
49. Com data de 17.08.2017, a Autora dirigiu à Entidade Demandada nova missiva, reiterando o teor das missivas anteriores, constantes dos pontos 44. E 45. – cfr. Doc. n.º 21, junto a petição inicial, constante de fls. 39 e seguintes dos autos; admitido por acordo;
50. Em 26.01.2018, Autora e Entidade Demandada reuniram. – admitido por acordo.
*
A apelação:
Como decorre da matéria supra fixada, entre as partes foi celebrado um contrato administrativo de empreitada
A autora, face à paralisação da empreitada por um período de 143 dias, pede a condenação da ré no pagamento de € 230.585,02, a saber (sic): € 113.091, 31 a título de custos com a manutenção dos meios humanos afetos à empreitada; € 100.815,00 a título de custos com equipamentos, viaturas, estaleiro, habitações e instalações em obra; € 12.505,44 a título de custos de sede, riscos e lucro cobertos por verbas contratuais; € 4.713,27, a título de custos com dispensa de meios humanos.
O pedido condensa o enquadramento jurídico por si proposto:
«a) ser declarada a responsabilidade civil contratual da Ré, condenando-se a mesma a indemnizar a Autora no montante de 230.585,02 € (duzentos e trinta mil, quinhentos e oitenta e cinco mil e dois cêntimos), acrescida esta quantia de juros de mora vincendos, à taxa legal, desde a citação da Ré e até efectivo e integral pagamento;
ou, caso assim não se entenda,
b) ser declarada a responsabilidade civil extracontratual da Ré, condenando-se a mesma a indemnizar a Autora no montante de 230.585,02 € (duzentos e trinta mil, quinhentos e oitenta e cinco mil e dois cêntimos), acrescida esta quantia de juros de mora vincendos, à taxa legal, desde a citação da Ré e até efectivo e integral pagamento.».
O tribunal “a quo” não se desviando do que à própria autora se deparou ser prioridade de melhor direito, afastou que ao caso conviesse solução por regime de responsabilidade civil extracontratual (o que nos merece acolhimento, mesmo se na reposição do equilíbrio financeiro se mesclam notas que despontam uma dualidade de natureza contratual e extracontratual).
Vendo da particular disciplina normativa, convocou o art.º 354º do CCP [Reposição do equilíbrio financeiro por agravamento dos custos na realização da obra], no qual se dispõe:
1 - Se o dono da obra praticar ou der causa a facto donde resulte maior dificuldade na execução da obra, com agravamentos dos encargos respetivos, o empreiteiro tem o direito à reposição do equilíbrio financeiro.
2 - O direito à reposição do equilíbrio financeiro previsto no número anterior caduca no prazo de 30 dias a contar do evento que o constitua ou do momento em que o empreiteiro dele tome conhecimento, sem que este apresente reclamação dos danos correspondentes nos termos do número seguinte, ainda que desconheça a extensão integral dos mesmos.
3 - A reclamação é apresentada por meio de requerimento no qual o empreiteiro deve expor os fundamentos de facto e de direito e oferecer os documentos ou outros meios de prova que considere convenientes.
4 - O dono da obra aprecia e decide a reclamação no prazo de 90 dias, podendo este prazo ser prorrogado por decisão daquele, caso se revele necessário proceder à realização de diligências complementares.
5 - A decisão, ou a sua omissão no prazo devido, pode ser objeto de impugnação nos tribunais administrativos, nos termos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
E desenvolveu:
«Resulta da factualidade provada que, em 05.06.2015, foi celebrado, entre a Autora e a Entidade Demandada, um contrato de empreitada de obras públicas, sendo que, nos termos do Programa de Concurso, que o antecedeu, a consignação da obra estava prevista para junho de 2015. Em conformidade com a data prevista, e considerando os documentos que constituíam a proposta, a A. integrou a sua proposta com um Plano de Trabalhos que, considerando a data da consignação prevista no art. 6.º, n.º 2 al. d) do Programa de Concurso (junho de 2015) e o prazo de execução da empreitada de 210 dias, programava a execução dos trabalhos relativos à EN...02 - ... ao km 23+759, incluindo os de pavimentação dos desvios de trânsito prévios à interdição na ... no período de 14 de setembro de 7 de dezembro de 2015.
Neste ponto retenha-se que é a própria A. a assumir/confessar que o Plano de Trabalhos por si proposto [em sede de procedimento pré-contratual] “tinha como pressuposto que a pavimentação do desvio da ... fosse executada em período previsivelmente favorável, do ponto de vista climatérico e do enquadramento da obra, ou seja nos meses de Setembro/Outubro, condição essencial à execução da referida ponte”.
Posteriormente à adjudicação e celebração do contrato, veio a data da consignação ser prevista para 11.8.2015, pelo que, em conformidade com a cláusula 4.9. do Caderno de Encargos e art. 361.º, n.º 3 do CCP, a A. apresentou à entidade demandada Plano de trabalhos ajustado, que, prevendo a execução dos trabalhos de substituição do tabuleiro da ... entre 21.9 e 14.12.2015, todavia alterava a sequência dos trabalhos nos termos que resultavam do Plano de Trabalhos constante da proposta.
Neste sentido, na sequência de pedido do R. no sentido de se manter a execução sequencia dos trabalhos da ponte em último lugar, a A. em 7.8.2015 apresenta novo Plano de Trabalhos ajustado, que veio a ser aprovado, do qual, em síntese, se extrai que os trabalhos relativos à EN...02 - ... ao km 23+759, incluindo os de pavimentação dos desvios de trânsito prévios à interdição na ..., decorreriam entre 21 de dezembro de 2015 e 3 de março de 2016, mantendo a sequencialidade de trabalhos que constava do Plano de Trabalhos inicial.
Mais se provou que, por missivas datadas de 22.09.2015, 08.10.2015, 13.11.2015, 02.12.2015 e 27.04.2016, a Autora alertou a Entidade Demandada para a inexequibilidade do projeto de execução das fundações da ....
Entretanto, por falta de condições técnicas/meteorológicas mínimas necessárias, para realização dos trabalhos na ..., a obra foi suspensa entre 23.12.2015 e 18.04.2016. Note-se que já em 18.1.2016 a A. havia proposto à R. a suspensão dos trabalhos, aduzindo que desde o início de dezembro de 2015 que as condições de temperatura e pluviosidade “não têm permitido a execução dos referidos trabalhos” e “até que haja condições que permitam a execução dos trabalhos”.
Em 21.1.2016 já a Fiscalização emitia informação dando conta da inexistência de condições meteorológicas adequadas para a realização dos trabalhos desde dezembro, com um período estimado de suspensão de 100 dias.
A suspensão dos trabalhos foi aprovada por um período previsível de 100 dias com efeitos a 23.12 2015, tendo sido em 11.3.2016 exarado auto de suspensão, assinado também pela A., dando conta da suspensão nos termos citados.
Em 18.4.2016 foi exarado e assinado, também pela A., o auto de recomeço dos trabalhos.
A obra foi concluída em 11.08.2016 e o “auto de receção provisória” foi lavrado em 11.09.2016.
Verifica-se, ainda, que por carta datada de 17.08.2016, a Autora dirigiu à Entidade Demandada uma missiva intitulada “reequilíbrio financeiro resultante da suspensão dos trabalhos”, por força da qual reclama o ressarcimento de um prejuízo, que quantifica em € 253.550,50, “face a uma maior permanência de meios humanos e equipamentos em obra, por motivos que não podem ser-lhe imputáveis”. A aludida reclamação foi indeferida, pela Entidade Demandada, em 11.08.2017, “com fundamento no disposto no n.° 2 do art. 354º do CCP”.
Como resulta do exposto o evento gerador dos danos é muito anterior à data em que a A. reclama os prejuízos.
Note-se que é a própria Autora a assumir que os custos decorrem da paralisação da obra (artigo 72.º da p.i.), alegadamente entre 28.11.2015 a 18.4.2016. As questões que alega, referentes ao adiamento da consignação e à exigência/ necessidade de execução dos trabalhos na ... num período em que as condições meteorológicas seriam adversas à sua execução por, à data da consignação, a R. não dispor de autorização da Câmara Municipal de Ponte Lima para pavimentação das vias municipais com vista à posterior utilização para desvio de trânsito e, bem assim, por ter retardado a resolução das deficiências dos projetos, circunstâncias que imputa à dona da obra, reportam-se às causas de imputabilidade à R. dessa paralisação e, consequentemente, às motivações pelas quais a A. advoga que os sobrecustos por si incorridos devem ser suportados pela R..
Ora, há que dar conta que foi a própria R. a determinar a suspensão da obra entre 23.12.2015 e 18.04.2016, tendo estado suspensa, pelo menos, durante cerca de quatro meses e tendo sido lavrado o “auto de suspensão” já quase no termo da suspensão em 11.03.2016. O que significa que na data do auto a A. nem sequer desconhecia a imputabilidade da paralisação à R. Ora, não é verosímil que a A., enquanto empreiteiro razoável, não tenha tido conhecimento, pelo menos, desde a data em que assina o auto de suspensão dos trabalhos em 11.3.2016 e, portanto, em que a paralisação dos trabalhos lhe é formalmente imposta pelo R. (independentemente da respetiva razão/motivação), numa altura em que os trabalhos já se encontravam suspensos há quase 3 meses, que a mesma lhe determinava os sobrecustos que reclama nestes autos.
Essa falta de verosimilhança é tão mais patente quanto, já em fevereiro de 2016, a fiscalização antevia que a suspensão daria direito à reposição do equilíbrio financeiro a favor da A.. De tal forma que um empreiteiro, na posição de uma entidade com experiência em construção civil e com um grau de diligência mediana, naturalmente que concluiria nos mesmos moldes, ou seja, de que teria direito a ser ressarcido pelos sobrecustos incorridos em decorrência da paralisação da obra. E de resto, assumindo a A. que ao elaborar o plano de trabalhos o fez no sentido de os trabalhos de execução da pavimentação ocorrerem em período climatericamente favorável, tendo-lhe sido imposta a execução desses trabalhos entre dezembro e março, período previsivelmente menos favorável, naturalmente que não se afigura que a A. seja empreiteiro com insuficiente perceção da realidade das obras e dos direitos que para si emergem de eventos que perturbando o normal desenvolvimento dos trabalhos são aptos a provocar-lhe danos.
Sem prejuízo, como dissemos, sempre o prazo de caducidade se iniciou no termo do evento que constitui o direito à reposição do equilíbrio financeiro, ou seja, no termo da paralisação dos trabalhos em 18.4.2016.
Ou seja, o evento - paralisação dos trabalhos - que determina os sobrecustos, ainda que duradouro, terminou em 18.4.2016, pelo que à luz do art. 354.º, n.º 2 do CCP a contagem do prazo de caducidade de 30 dias inicia-se a 19.4.2016.
E, sendo assim, naturalmente que em 17.08.2016 quando a A., pela primeira vez, reclama o direito à reposição do equilíbrio financeiro, naturalmente que já há muito que esse direito caducara (concretamente em 19.5.2016).
Recorda-se que “a caducidade é uma forma de extinção de direitos (e dos correspondentes deveres) em consequência do seu não exercício durante um determinado período de tempo, implicando a extinção definitiva do direito (e do correlativo dever), que não subsiste, sequer, a título de obrigação natural” (Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, de 25.02.2022, Processo n.º 00534/19.3BEBRG-S1).
Face ao exposto, verificando-se a caducidade do direito à reposição do equilíbrio financeiro do contrato, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 354.º do CCP, não assiste à A. o direito a ser ressarcida pelo R. dos (sobre)custos em que incorreu no valor reclamado de € 230.585,02, nem consequentemente aos juros que reclama sobre tal valor.».
O direito objectivo “não é um aglomerado caótico de disposições, mas um organismo jurídico, um sistema de preceitos coordenados ou subordinados, em que cada um tem o seu posto próprio” (Ac. do STJ, de 20-11-2014, proc. n.º 893/09.6JDLSB-A.L1-A.S1).
No presente recurso a autora aponta que acode aplicação subsidiária de regime civil, com aplicação do seu regime sobre responsabilidade contratual.
Daqui logo duas evidências emanam: (i) a perspectiva subsidiária logo implica reconhecimento da existência de normas particulares para uma matéria especial, a que, em primeira linha, a relação jurídica fica sujeita, e não ao direito geral e comum; (ii) inconsistente fica o apelo às regras do enriquecimento sem causa nesse outro âmbito, por subsidiariedade do instituto.
Fica por saber se, então, efectivamente pode, ou não, ser convocado o artigo 354.º do CCP como hipótese normativa que reja.
O tribunal “a quo” deu resposta positiva.
A recorrente entende que “o artigo 354.º do CCP não pode ser aplicável pois o mesmo é omisso relativamente a situações como a que se encontra a ser discutida nos presentes autos, não regulando situações em que o empreiteiro apenas toma conhecimento do facto que motiva o evento que é gerador dos danos já depois de decorrido o prazo estabelecido no n.º 2 do artigo 354.º do CCP.”.
Mas a conclusão é incongruente como o alegado.
A própria alega que “as circunstâncias que motivaram a suspensão da empreitada e os custos que teve de suportar decorreram de uma conduta ilícita da Recorrida, de um acto ilegalmente praticado, consubstanciado na consignação da empreitada em violação do disposto no artigo 356.º do CCP.” [corpo de alegações; sublinhado nosso].
Violação que se lhe deparou a montante!
E não há dúvida que o tribunal “a quo equacionou toda a problemática, não deixando de dar resposta - e boa resposta - à definição do termo, mesmo «“no caso, assaz frequente, em que os factos que estão na base dos atrasos na execução da obra se traduzem em factos continuados ou duradouros, prolongando-se no tempo (…)”».
Também incongruente é ver que ao caso possa convir alegação de que “a suspensão da obra não foi imposta pela Recorrida, tendo sido antes proposta pela Recorrente e foi motivada, formalmente e pelo que então era do conhecimento da Recorrente, por condições meteorológicas adversas, ou seja, por circunstâncias alheias às partes contratantes, as quais poderiam, quanto muito, ser subsumidas ao regime de alteração anormal e imprevisível das circunstâncias previsto nos artigos 312.º e 314.º do CCP” [sublinhado nosso], quando a própria recorrente alega que “a responsabilidade pelas circunstâncias que motivaram a paralisação da empreitada e os custos que essa paralisação originou não é alheia às partes contratantes, mas sim imputável à Recorrida.” [corpo de alegações; sublinhado nosso]!
E, efectivamente, não é sob esse “regime de alteração anormal e imprevisível das circunstâncias” que o caso encontra solução.
Como a recorrente deixou reconhecido, “Em face do prazo fixado no programa de concurso, o Plano de Trabalhos proposto pela Autora tinha como pressuposto que a pavimentação do desvio da ... fosse executada em período previsivelmente favorável, do ponto de vista climatérico e do enquadramento da obra, ou seja nos meses de Setembro/Outubro, condição essencial à execução da referida ponte.” (art.º 10º da p. i.).
De alteração anormal e imprevisível não se pode falar; numa coincidência de adversidade já expectável à alteração do Plano de Trabalhos - que a autora sempre teve de origem imputável à dona da obra, em causa dos sobrecustos - não há “imprevisão; tanto assim que, fosse essa a distinta hipótese, o que poderia advir seria atribuir à Autora o direito à modificação do contrato ou, em alternativa, a uma compensação financeira, segundo critérios de equidade - art.º 314º, n.º 2, do CCP -, alternativas desfasadas do que a autora teve em providência judiciária, projectando-se nos pedidos feitos (que) outra (é) causa de pedir.
Podemos certamente observar construções doutrinais que, com fórmulas diversas, fazem apelo ao conceito da base negocial do contrato (vide António Meneses Cordeiro, Contratos Públicos: Subsídios para a dogmática administrativa como exemplo no princípio do equilíbrio financeiro, in Cadernos “O Direito”, n.º 2, págs. 60-62).
Mesmo que tenhamos por preferí
vel falar da(s) figura(s) em termos da doutrina mais tradicional - distinguindo dogmaticamente o que é alteração anormal e imprevisível das circunstâncias do(s) mecanismo(s) de reposição financeira do contrato -, não admira que à luz do CCP tenda a atenuar-se rigor de linguagem, quando positivamente no art.º 314º, nº 1, a), do Código, também a alteração anormal e imprevisível (… “das circunstâncias a que se refere a alínea b) do artigo 312.º seja imputável a decisão do contraente público, adotada fora do exercício dos seus poderes de conformação da relação contratual, que se repercuta de modo específico na situação contratual do co-contratante”) a lei se refere para fundamentar direito de reposição financeira (direito também conferido quando “O contrato seja modificado por razões de interesse público, nos termos da alínea c) do artigo 312.º” – art-º 314º, n.º 1, b), do CCP).
No entanto, também positivamente se vê que nem tudo se aglutina, e que a lei não deixa de efectuar destrinça, em linha com os estudos e terminologia clássica, prevendo que “Os demais casos de alteração anormal e imprevisível das circunstâncias conferem direito” - casos de alteração não imputável ao contraente público (os intitulados Acts og God) - não têm consequência antes enunciada (direito à reposição do equilíbrio financeiro, nos termos do artigo 282.º), antes “direito à modificação do contrato ou a uma compensação financeira, segundo critérios de equidade” (art.º 314º, n.º 2, do CCP).
Aferindo à luz do art.º artigo 354.º do CCP, o tribunal “a quo” equacionou:
«Como resulta deste normativo se (i) por circunstâncias imputáveis ao dono da obra, o empreiteiro tiver de enfrentar (ii) maiores dificuldades na execução dos trabalhos, (iii) com custos adicionais (sobrecustos) para o empreiteiro, este tem direito à reposição do equilíbrio financeiro do contrato (cfr. artigo 354.º, n.º 1, do CCP), isto é, ao “restabelecimento da equação financeira inicial” (Miguel Assis Raimundo, Direito dos Contratos Públicos, Volume 2, Regime Substantivo, AAFDL Editora, 2022, p. 156).
Quanto ao primeiro pressuposto – circunstâncias imputáveis ao dono da obra -, estão em causa “situações alheias ao empreiteiro [que] têm, essencialmente, por base a ocorrência de factos (lícitos ou ilícitos) praticados pelo dono da obra, ou a que este deu azo, e que conduzem a uma suspensão da execução dos trabalhos” (Pedro Melo e Maria Ataíde Cordeiro, “O direito à reposição do equilíbrio financeiro por agravamento dos custos da obra: reflexões de ordem prática” in Revista de Contratos Públicos, Coimbra, n.º 24 (Ago. 2020), p. 143).
Relativamente ao segundo pressuposto – maior dificuldade na execução dos trabalhos -, “ponto é que cada uma das situações descritas dificulte e/ou impeça a execução dos trabalhos, de acordo com o plano de trabalhos inicial, o que significa que, muito frequentemente, fica comprometido o cumprimento do próprio prazo (originário) da execução da obra” (Pedro Melo e Maria Ataíde Cordeiro, “O direito…”, ob. cit., pp. 143 e 144.)
O terceiro e último pressuposto corresponde ao agravamento dos encargos, implicando, pois, “um prejuízo patrimonial (isto é, com expressão financeira)” (Pedro Melo e Maria Ataíde Cordeiro, “O direito…”, ob. cit., pp. 143 e 144.)».
Segue-se que, como também observou o tribunal “a quo”, que «Reunidos os aludidos pressupostos, e sob pena de caducidade, o exercício do direito à reposição do equilíbrio financeiro do contrato depende da apresentação, pelo empreiteiro, de uma “reclamação”, junto do dono da obra, no prazo de 30 dias a contar do evento que o constitua ou do momento em que o empreiteiro dele tome conhecimento, ainda que desconheça a extensão integral dos danos (cfr. artigo 354.º, n.º 2, do CCP).».
O tribunal “a quo” concluiu, como já acima se viu, que no legal prazo de 30 dias não foi feita necessária reclamação, atingindo de caducidade o direito.
É o regime legal que quadra à causa da autora/recorrente, a qual sempre se pautou em alegação por reconduzir o sucedido a circunstâncias imputáveis ao dono da obra (no dizer legal “praticar ou der causa”); naturalmente agora advindo a dificuldade em colocar sob diferente equação o antes dito, confrontada com a afirmada caducidade; mas não tem sucesso emprestar diferente enquadramento a fim de ultrapassar obstáculo.
E também não é por ela - caducidade - se deparar que se autoriza falar em enriquecimento sem causa; possa/pudesse até a autora ter visto agravados custos, isso não é sinónimo de, por si só, a ré se ter “injustamente” locupletado (art.º 473º, n.º 1, do CC); e “importa reter que a caducidade é uma forma de extinção de direitos (e dos correspondentes deveres) em consequência do seu não exercício durante um determinado período de tempo, implicando a extinção definitiva do direito (e do correlativo dever), que não subsiste, sequer, a título de obrigação natural” (in Ac. deste TCAN, de 25-02-2022, Processo n.º 00534/19.3BEBRG-S1).
O direito de o contraente privado «sair economicamente indemne desta aventura contratual» (Paulo Otero, “Estabilidade Contratual, Modificação Unilateral e Equilíbrio Financeiro em Contrato de Empreitada de Obras Públicas”, in Revista da Ordem dos Advogados, Ano 56, III, págs. 938 a 945, Lisboa, Dezembro 1996), não prescinde de ser exercido segundo os cânones de lei.
Sem negar o recurso à tutela jurisdicional, mas também sem prejuízo do disposto na lei substantiva (art.º 41º, n.º 1, do CPTA); no caso, advindo excepção peremptória extintiva.
Conhecido o direito - que se vê extinto por caducidade, sendo que nada dita da ocorrência de erro de julgamento no concreto cômputo -, nada justifica ulteriores trâmites processuais de fito a uma pronúncia já alcançada.
*
Acordam, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas: pela recorrente.
Porto, 25 de Novembro de 2022.
Luís Migueis Garcia
Conceição Silvestre
Isabel Costa