Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 02530/05.9BEPRT |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 01/13/2022 |
| Tribunal: | TAF do Porto |
| Relator: | Irene Isabel Gomes das Neves |
| Descritores: | NULIDADE ACÓRDÃO; OMISSÃO DE PRONÚNCIA |
| Sumário: | I - A nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia [art. 668º, n. º1 d) do Antigo CPC/ actual 615º nº 1 d) do CPC], é um vício que ocorre quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que devia apreciar e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras [cf. art. 660º, n.º 2 do Antigo CPC/ actual 608.º, nº 2, do CPC].* * Sumário elaborado pela relatora |
| Recorrente: | A.,SA |
| Recorrido 1: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Indeferir a arguição de nulidade do Acórdão. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: | N/A |
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| Decisão Texto Integral: | Incidente de nulidade do acórdão. 1. RELATÓRIO 1.1. A., S.A., com os demais sinais dos autos, notificada do acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 14 de outubro de 2021, e exarado a fls. 466-493 proc. SITAF, que negando provimento ao recurso jurisdicional por si interposto, manteve a decisão de 1ª instância que havia julgado improcedente a impugnação judicial das liquidações de IRC dos anos de 2001 e 2002, no montante de € 484.641,28, vem por via de reclamação arguir o incidente de arguição de nulidade de acórdão, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigos 615.º, n.º 1, alínea d) e n.º 4, e 666.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e do artigo 125.º, n.º 1, do CPPT. Apresenta, para tanto, as seguintes conclusões: «1º - Por acórdão de 14 de outubro de 2021 foi negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente da sentença de 29 de abril de 2011, que havia julgado improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IRC dos exercícios de 2001 e 2002. 2º - No recurso interposto daquela sentença a Recorrente invocou que o Tribunal de primeira instância havia incorrido em erro de julgamento da matéria de facto e de direito. 3º - No que ora releva e em suma, quanto ao erro de julgamento de direito incorrido pelo Tribunal de primeira instância, a Recorrente invocou: i) A ilegalidade da correção sub judice decorrente da existência efetiva de operações tituladas pelas faturas emitidas pela S., Ltd. [cf. subcapítulo C.1. das alegações de recurso, página 11]; ii) A ilegalidade da correção sub judice decorrente do impacto nulo, no apuramento do lucro tributável dos exercícios de 2001 e de 2002, da contabilização das faturas emitidas pela S., Ltd [cf. subcapítulo C.2. das alegações de recurso, página 12; parecer de junho de 2009 junto aos autos a fls. 139 e seguintes, páginas 7 a 14]; iii) A ilegalidade da correção sub judice decorrente da avaliação direta da matéria coletável e da caducidade do direito à liquidação [cf. subcapítulo D. das alegações de recurso, páginas 13 a 16]. 4º - No douto acórdão julgou-se não verificados os erros de julgamento da matéria de facto e de direito. 5º - No entanto, compulsada a fundamentação do douto acórdão, constata-se que esse Ilustre Tribunal não se pronunciou sobre a questão referida na alínea ii) do artigo 3.º supra, o que, desde logo, no entender da Recorrente, configura nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º, aplicável ex vi artigo 666.º, n.º 1, ambos do CPC. 6º - Em linha com a argumentação aduzida em primeira instância, nas alegações de recurso a Recorrente invocou, subsidiariamente, que a correção em apreço é ilegal, uma vez que a desconsideração das faturas emitidas pela S., Ltd não pode traduzir o acréscimo imediato do valor correspondente a essas faturas ao lucro tributável dos exercícios de 2001 e de 2002, nos moldes em que foi feito pelos serviços de inspeção tributária [cf. subcapítulo C.2. das alegações de recurso, página 12; parecer de junho de 2009 junto aos autos a fls. 139 e seguintes, páginas 7 a 14]. 7º - Com efeito, como se referiu nas alegações de recurso e fazendo apelo ao referido parecer junto aos autos, tendo em consideração que tais faturas se referem a mercadorias em existências (cf. Página 11 do relatório de inspeção) a sua contabilização enquanto custo não traduziu um resultado negativo que justifique, em função da desconsideração daquelas operações, o correspondente acréscimo de igual valor ao lucro tributável [cf. subcapítulo C.2) das alegações de recurso, página 12; parecer de junho de 2009 junto aos autos a fls. 139 e seguintes, páginas 7 a 14]. 8º - De facto, estando em causa a aquisição de mercadorias em existências a contabilização do custo é efetuada, por contrapartida, de vendas (conta POC – 61), o que significa que, não tendo existido quaisquer vendas destas mercadorias nos exercícios de 2001 e de 2002 – como sustentam os serviços de inspeção tributária no relatório de inspeção –, as faturas emitidas pela S., Ltd. não produziram qualquer impacto no resultado dos exercícios em apreço, não podendo o valor de tais faturas ser acrescido nos termos em que o foi pelos serviços de inspeção tributária [cf. parecer de junho de 2009 junto aos autos a fls. 139 e seguintes, página 11]. 9º - Salvo o devido respeito, ao deixar de se pronunciar sobre a invocada ilegalidade da correção controvertida, esse Ilustre Tribunal incorreu em omissão de pronúncia, geradora de nulidade do acórdão. 10º - Esta questão foi expressamente suscitada pela Recorrente nas alegações de recurso, concretamente no subcapítulo C.2., página 12, bem como, por remissão para o entendimento vertido no parecer junto aos autos a fls. 139 e seguintes. 11º - Deste modo, a referida questão integra o objeto do recurso, recaindo sobre esse Ilustre Tribunal o dever de a apreciar. 12º - De referir, por fim, que este dever de pronúncia do Tribunal não é abalado pela apreciação do invocado erro de julgamento da matéria de facto. 13º - Com efeito, nas alegações de recurso a Recorrente invocou, no que ora releva, que a sentença padecia de erro de julgamento da matéria de facto, por o Tribunal de primeira instância não ter dado como provado o teor do parecer junto aos autos a fls. 139 e seguintes. 14º - No douto acórdão concluiu-se pela improcedência do invocado erro de julgamento da matéria de facto. 15º - Todavia, tal não exonera o Tribunal de conhecer o erro de julgamento de direito. 16º - De facto, estão em causa duas questões distintas, por um lado, o erro de julgamento da matéria de facto e, por outro lado, o erro de julgamento da matéria de direito, invocado de forma expressa e autónoma nas alegações de recurso. 17º - Em face de todo o exposto, conclui-se, salvo o devido respeito, que esse Ilustre Tribunal não se pronunciou sobre a questão que lhe foi colocada quanto à ilegalidade da correção em apreço, decorrente do impacto nulo no apuramento do lucro tributável dos exercícios de 2001 e de 2002, melhor identificada supra, o que consubstancia uma nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos dos artigos 615.º, n.º 1, alínea d) e n.º 4, e 666.º, n.º 1, ambos do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT e artigo 125.º, n.º 1, do CPPT, a qual se requer que seja suprida, com as demais consequências legais.» 1.2. A Requerida (AT), notificada da apresentação do presente incidente, não emitiu pronúncia. 1.3. Constitui objeto de análise a invocada nulidade assacada ao acórdão proferido fundada em alegada «omissão de pronúncia» quanto ao erro de julgamento mencionado em sede de recurso jurisdicional, a saber - da ilegalidade da correção decorrente do impacto nulo, no apuramento do lucro tributável dos exercícios de 2001 e de 2002, da contabilização das faturas emitidas pela S., Ltd. [615.º, n.º 1, alínea d) e n.º 4, e 666.º, n.º 1, ambos do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), e do artigo 125.º, n.º 1, do CPPT]. 1.4. Cumpre, nos termos e em conformidade com o preceituado no artigo 666º n.º 2 do CPC, decidir. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos, submete-se desde já à conferência a apreciação da alegada nulidade. 2. Da Nulidade do Acórdão 2.1. Cumpre, emitir pronúncia nos termos do disposto no artigo 617.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. Nos termos dos artigos 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e 668.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil (CPC, revogado mas aplicável aos autos), a decisão judicial é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar. Esta nulidade (como, aliás, repetidamente tem sido afirmado pela Secção do Supremo Tribunal Administrativo) está conexionada com os deveres de cognição do Tribunal, previstos no artigo 660.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, no qual se estabelece que o juiz tem o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, por tal modo que é a omissão ou infracção a esse dever, que concretiza a dita nulidade – cf. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil anotado, vol. V, p. 143. É consabido, também, que o âmbito dos recursos jurisdicionais é delimitado pelo objecto da alegação do recurso, condensado nas respectivas conclusões – cf. o artigo 684.º do Código de Processo Civil. Assim, e entrando na questão que cabe apreciar, dir-se-á que de acordo com o artigo 608º n.º 2 do CPC, “(…) O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, (...).” A inobservância de tal comando é, como se sabe, sancionada com a nulidade da sentença: artigo 615º n.º 1 al. d) CPC. O exato conteúdo do que sejam as questões a resolver de que falam tais normativos foi objeto de abundante tratamento jurisprudencial. Destaca-se, nesta problemática, o Acórdão produzido por este Tribunal Central Administrativo Norte de 07.01.2016, no processo 02279/11.5BEPRT, cujo teor ora parcialmente se transcreve: “(…) As causas determinantes de nulidade de decisões judiciais correspondem a irregularidades que afetam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua validade encontrando-se tipificadas, de forma taxativa, no artigo 615.º do CPC. O que não se confunde, naturalmente, com errados fundamentos de facto e/ou de direito. Determina o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 1.º do CPTA, que a nulidade por omissão de pronúncia ocorre “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. Este preceito relaciona-se com o comando ínsito na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e não todos e cada um dos argumentos/ fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão); e os acórdãos, entre outros, do STA de 03.07.2007, rec. 043/07, de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09 de 17/03/2010, rec. 0964/09).”. E, como se refere no Acórdão, desta feita do STA nº 01035/12, de 11.03.2015, “a nulidade de sentença por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixar de apreciar questão que devia conhecer (artigos 668.º, n.º 1, alínea d) e 660.º, n.º 2 do Código de Processo Civil revogado, aplicável no caso sub judice). (…) Numa correta abordagem da questão importa ainda ter presente, como também vem sublinhando de forma pacífica a jurisprudência, que esta obrigação não significa que o juiz tenha de conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes hajam produzido. Uma coisa são as questões submetidas ao Tribunal e outra são os argumentos que se usam na sua defesa para fazer valer o seu ponto de vista. Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.” Em reforço deste entendimento, ressalte-se o expendido no Acórdão do STA de 12.06.2018 [processo n.º 0930/12.7BALSB] “(…) 24. Caraterizando a arguida nulidade de decisão temos que a mesma se consubstancia na infração ao dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja ou fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. art. 608.º, n.º 2, CPC]. 25. Com efeito, o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos/pretensões pelas mesmas formulados, ressalvadas apenas as matérias ou pedidos/pretensões que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se haja tornado inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões. 26. Questões para este efeito são, assim, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que exigem decisão do julgador, bem como, ainda, os pressupostos processuais [gerais e específicos] debatidos nos autos, sendo que não podem confundir-se aquilo que são as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com o que são as razões de facto ou de direito, os argumentos, ou os pressupostos em que cada a parte funda a sua posição nas questões objeto de litígio (…)”. Munidos destes ensinamentos jurisprudências, e em jeito de sinopse, temos que: a omissão de pronúncia sobre questões de que devesse tomar conhecimento é fundamento de nulidade de acórdão (artigos 666.º/1 e 615.º/1/d), CPC – artigos 716º e 668º Antigo CPC). «O conceito de questões abrange tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem» (cfr. Jorge Lopes Sousa, CPPT Anotado, 6.º Ed., vol. II, p. 363). A este propósito, refere-se que «as questões que o tribunal deve apreciar e decidir são apenas aquelas que contendem directamente com a substanciação da causa de pedir, do pedido e das exceções, não se confundindo com as considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pela parte (e, portanto, quanto a estas últimas, o tribunal não só não tem de ser pronunciar, como nenhuma consequência daí advirá se o não fizer, nomeadamente, não configurando tal situação uma omissão de pronúncia)» (cfr. Helena Cabrita, A sentença cível, Fundamentação de facto e de direito, Almedina, 2019, p. 235). «O conhecimento de todas as questões não significa que o tribunal tenha de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes e só a falta de conhecimento de questões constitui nulidade por omissão de pronúncia» (cfr. Jorge Lopes de Sousa, in ob cit, p.364). 2.2. Tendo presente estes considerandos, e volvendo agora ao caso concreto, verifica-se que, quanto ao recurso jurisdicional da decisão judicial emanada pelo TAF do Porto, finaliza a Recorrente, o seu recurso, nos seguintes termos: “(…) deverá o presente recurso ser julgado procedente, reapreciando-se a prova produzida, ampliando-se a matéria de facto provada e procedendo-se à correcta aplicação do Direito aos factos, com a consequente revogação da sentença recorrida, pelos motivos acima expostos, e ordenando-se, a final, a anulação das liquidações impugnadas, com as devidas e legais consequências.”.(negrito nosso) Em termos estruturais a Recorrente nas suas alegações de recurso, subdivide as mesma, em várias subsecções, a B, respeitante ao imputado erro de julgamento da matéria de facto, B1 da prova testemunhal por si produzida e B2 do Parecer emitido pelo Dr. José Alberto Pinheiro Pinto, e a C, corolário da B, “Da correcta aplicação do direito aos factos provados”, em que C1 “Da existência de operações comerciais de compra e venda entre a Recorrente e a sociedade S.” e C2 (sobre a qual terá sido omitida pronúncia por este tribunal ad quem) “Do impacto nulo da contabilização das facturas emitidas pela S.Ltd no lucro tributável da Recorrente”. Alega a Recorrente nesta sede, arguição de nulidade, que “…, ao deixar de se pronunciar sobre a invocada ilegalidade da correção controvertida, esse Ilustre Tribunal incorreu em omissão de pronúncia, geradora de nulidade do acórdão. 10º - Esta questão foi expressamente suscitada pela Recorrente nas alegações de recurso, concretamente no subcapítulo C.2., página 12, bem como, por remissão para o entendimento vertido no parecer junto aos autos a fls. 139 e seguintes.” Olvida a Recorrente que nas suas alegações de recurso sob o ponto C2., inserido no “capítulo” C. DA CORRECTA APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS PROVADOS, sob a epigrafe “Do impacto nulo da contabilização das facturas emitidas pela S. Ltd. no lucro tributável da Recorrente”, mais não estamos que em sede da valoração jurídica de factos, os quais por força do decidido por este Tribunal de recurso não foram carreados para o probatório, pelo que nenhuma ilação jurídica ou valoração cumpria ao mesmo estabelecer, salvo o erro de julgamento de direito decorrente da matéria de facto provada, entenda-se levada ao probatório. Especificando, nas suas alegações e conclusões de recurso pretende a Recorrente que o Parecer junto aos autos, por si, demonstra e comprova que o resultado contabilístico das facturas da S. Ltd não implicou o apuramento de qualquer custo, uma vez que o que está em causa são simples compras e que, esse mesmo resultado contabilístico, não estava influenciado por qualquer custo que não devesse ter sido reconhecido para efeitos fiscais, pois que o impacto no resultado do exercício da Recorrente decorrente das facturas emitidas pela S.Ltd, é nulo, conforme resulta claro do Parecer juntos aos presentes autos. Ora, sobre esta matéria – do erro de julgamento de facto e eventual erro de julgamento de direito daí decorrente – distendeu-se no acórdão que “Quanto à prova decorrente do Parecer emitido pelo Dr. José Alberto Pinho, cumpre referir que o mesmo consta do item 11 da matéria de facto dada como provada, no qual consta “11 – Dá-se aqui por reproduzido o parecer constante destes autos de fls. 139 a 152 destes autos.” e, em sede de fundamentação de facto refere-se a final que “No que se refere à prova documental apresentada, designadamente quanto ao parecer constante destes autos de fls. 139 a 152, atente-se que o mesmo reflecte uma opinião de âmbito técnico, debruçando-se no essencial quanto à questão da aplicação dos métodos directos e indirectos no apuramento da matéria colectável, bem como a questões contabilísticas inerentes ao uso dos mesmos.”. Parece-nos que nesta parte o recurso é algo ininteligível, pois fica-se sem saber quais os factos que a Recorrente considera provados e que justificam ser aditados ao probatório para a boa decisão da causa que possam decorrer do Parecer. Se percebemos bem as alegações e conclusões do recurso, a Recorrente por via da reapreciação da prova produzida mais não quer que a matéria dada por não provada passe a constar como provada, pois que a factualidade descrita nas conclusões 2. a 5. que pretende ver aditada, reconduz à declaração de que as mercadorias mencionadas nas facturas emitidas pela S. Ltd foram efectivamente objecto de transacção comercial, sendo que o julgado concluiu precisamente o contrário na especificação dos factos dados por não provados. (…) Como está bem de ver, nem nas conclusões, nem na alegação de recurso, a Recorrente cumpre o ónus que sobre si impendia quanto à impugnação da matéria de facto por inerência ao Parecer junto aos autos, designadamente porque não indica os pontos que considera terem sido incorrectamente julgados, nem tão-pouco em que medida as afirmações e conclusões inerentes ao Parecer, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. É que, como se vê, a lei impõe ao Recorrente o ónus de indicar os concretos meios de prova constantes do processo, não equivalendo a tal, em nosso entendimento, o caminho seguido neste recurso, ou seja, o de pura e simplesmente, remeter este Tribunal para o conteúdo do Parecer e seus considerandos técnicos. No caso, aliás, importa considerar que a sentença sob recurso sobre o Parecer considerou que “(…) o mesmo reflecte urna opinião de âmbito técnico, debruçando-se no essencial quanto à questão da aplicação dos métodos directos e indirectos no apuramento da matéria colectável, bem como a questões contabilísticas inerentes ao uso dos mesmos”, o que em sede de alegações é corroborado pela Recorrente ao insurgir-se do seguinte modo «Com a devida vénia, nada de mais errado. Senão vejamos: O parecer em apreço faz uma análise critica à opção pelo método de avaliação directa da matéria colectável e, consequentemente, identifica os erros contabilísticos em que incorre a administração tributária, os quais resultam no acréscimo à matéria colectável da Recorrente das quantias previstas nas facturas emitidas pela S.Ltd e que não foram aceites como custo fiscal. Num primeiro ponto, o parecer explica que a aplicação de métodos directos na presente situação, por força das próprias conclusões do relatório de inspecção, está errada. Esta conclusão assenta em dois argumentos (…)» A lei, permitindo às partes ver amplamente reapreciado o julgamento da matéria de facto, por parte do tribunal de recurso, não deixa de lhes impor a observância de um critério de rigor, obstando a que a impugnação da matéria de facto seja, simplesmente, uma manifestação vaga de não conformação com o decidido e relegando para o Tribunal Superior a procura e especificação dos documentos aptos a demonstrar a factualidade que a parte pretende ver consignada. Ora, vertido que está o conteúdo do Parecer no item 11 – da matéria de facto dada por provada a sua consideração, a existir e em que termos, reconduz-se apreciação de erro de julgamento de direito em questão em sede recursiva da utilização do método de avaliação directa da matéria colectável. Por outro lado, a Recorrente demitiu-se da correspondência evidente, que lhe era exigida, entre o Parecer e as facturas desconsideradas, entre as relações comerciais inerentes às mesmas, deixando para o Tribunal o cumprimento de um ónus que a si competia. Ora, do nosso ponto de vista, tal modo de proceder à impugnação da matéria de facto está longe de corresponder à exigência legal de especificação dos concretos meios de prova, sendo certo que a não observância de tal exigência dá lugar, nos termos do normativo supratranscrito, à rejeição dessa impugnação.” E, mais adiante “Cristalizada a matéria de facto, decorrente da improcedência do recurso sobre o erro de julgamento de facto imputado, cumpre tão só atentar ao alegado pela Recorrente de que as empresas não podem vender sem comprar e que a as empresas devem ser tributadas pelo seu lucro real, devia a Administração Tributária in casu ter recorrido a métodos indirectos, e não a métodos directos, como fez, para determinar a matéria colectável. Não o tendo feito, conclui-se no julgamento que ora se sindica, foi violado o princípio constitucional consagrado no artigo 104.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP), bem como o disposto no artigo 17º do Código do IRC (vide conclusões 6 a 11).” Conhecendo do erro de julgamento de direito, lê-se no acórdão que “A sentença sob recurso, bem, considerou improcedente a impugnação, outro resultado não seria possível ao e não ter dado como provados factos donde se possa inferir que as facturas desconsideradas se reportam a transacções efectivamente realizadas, e fê-lo fundamentando que “Deste modo, e tendo por base os princípios consignados nos normativos acima identificados, verifica-se que a regra, é a utilização da avaliação directa como meio de determinação da matéria tributável, em que a Administração Tributária se socorre dos elementos contabilísticos, dos documentos de suporte e se assim for o caso, da desconsideração de facturas contabilizadas, revelando-se o recurso a métodos presuntivos ilegal, uma vez que é comprovadamente possível a determinação por métodos directos. (…)” e, mais adiante “Notificada a impugnante para o exercício do direito de audição aquando das correcções efectuadas pelos Serviços de Inspecção tributário, a mesma não se pronunciou quanto às correcções efectuadas nem procedeu à junção de qualquer documento que contrariasse as conclusões exaradas no relatório. E assim sendo, e em face de todos os elementos apurados em sede de inspecção entre si conjugados, não pode deixar de concluir-se que a AF fez prova dos pressupostos legais que legitimam a correcção e subsequente liquidação impugnada, pelo que passou a competir à impugnante demonstrar que esse fornecimento foi, de facto, efectuado, comprovando o custo por si contabilizado. Todavia, não o fez, pois que da matéria de facto dada como assente, não resulta qualquer elemento susceptível de abalar a conclusão fáctica a que chegou a AF através daqueles “factos-índices””. Explicitando, temos que a prova que a Recorrente logrou é muito escassa, a A. não alcançou provar a materialidade das operações tituladas pela emitente S.Ltd, bem como não provou factos conducentes da operação triangular que alega com A., Ld.ª na qualidade de agente relacionados em concreto com a aquisição de metais a que as facturas desconsideradas dizem respeito. Designadamente não foi provado, por exemplo, que quaisquer que tenham sido os “carregamentos” e “descarregamentos” efectuados, armazenamento, circuitos de pagamentos, se estes se reportavam a compras e, muito menos, os períodos temporais, especialmente a sua integral ocorrência nos anos de 2001 e 2002, nem que as operações desconsideradas atingiam um percentual tão relevante no conjunto das aquisições da Recorrente que sem as quais as vendas efetuadas a clientes careceriam de justificação. (…) Aliás, a factualidade assente não permite dizer que operações materiais de aquisição de mercadorias foram efectivamente realizadas por reporte as facturas não consideradas, sendo certo que, em conformidade com a alínea g) do n.º 1 do artigo 42.° do CIRC (na redacção em vigor previamente à produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13/07, que republicou aquele Código) não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável, ainda que contabilizados como custos ou perdas do exercício, os encargos não devidamente documentados, dos custos realizados, no sentido de que apenas poderão ser aceites fiscalmente aqueles em relação aos quais o sujeito passivo faça prova inequívoca da sua concretização, nunca forneceu tal informação, pelo que, assim sendo, a AT não estava vinculada a aplicar métodos indirectos para determinação da matéria colectável. E, acresce referir, que o universo subjacente “às facturas falsas”, como resultou provado à saciedade in casu, pode ter por base situações distintas, ou seja, na sua origem podem estar aquisições sem emissão de facturas, compra ou venda de mercadorias muito abaixo do preço do mercado, mercadorias de proveniência duvidosa ou mesmo ilícita, etc, sendo a mais comum a emissão de facturas e ausência de transacção, perante a amálgama de situações é legitimo concluir que qualquer eventual determinação da matéria colectável por métodos indirectos podia conduzir a resultados falseados e a um verdadeiro enriquecimento sem causa da recorrida, proibido pelo nosso ordenamento jurídico (cfr. artigo 473.º do Código Civil), obtido à custa dos impostos que deveria pagar e que não pagaria em consequência da determinação de uma colecta baseada em premissas indiciárias (v. g. rácios da actividade em causa), eventualmente erradas na sua aplicação concreta.” (Fim de transcrição) Em face do assim decidido no acórdão reclamado, e que se vem ora de transcrever, não podemos de modo algum concluir que o acórdão censurado deixou de resolver todas as questões decidendas submetidas a juízo. Poderemos questionar-nos se o assim decidido é o mais correto e adequado em face das questões de facto e de direito envolvidas. Poderemos equacionar se o argumento avançado pela Recorrente, as ilações factuais e/ou jurídicas que pretende retirar do Parecer, poderiam ser outras. Mas tais interrogações não se inserem no vício de nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia, antes se incluindo no âmbito de eventual erro de julgamento. De facto, saber se este Tribunal decidiu com acerto, ao não ampliar a matéria de facto, se fez incorreta interpretação e/ou aplicação da lei, são questões que já não contendem com a nulidade do acórdão, mas sim com o erro de julgamento - este, traduzindo uma apreciação da questão em desconformidade com a lei [Vd. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, ob. cit., p. 686, sublinham que não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário]. Concludentemente, o acórdão sob censura não padece da assacada nulidade de “sentença” fundada na violação do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC (668º, n.º 1, alínea d) do Antigo CPC), a qual improcede. 2.3. Conclusões I - A nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia [art. 668º, n. º1 d) do Antigo CPC/ actual 615º nº 1 d) do CPC], é um vício que ocorre quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que devia apreciar e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras [cf. art. 660º, n.º 2 do Antigo CPC/ actual 608.º, nº 2, do CPC]. 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em desatender, por infundada, a presente arguição de nulidade. Custas pela Recorrente. Porto, 13 de janeiro de 2022 Irene Isabel das Neves Ana Paula Santos Celeste Oliveira |