Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00733/20.5BEPRT |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 02/02/2023 |
| Tribunal: | TAF de Penafiel |
| Relator: | Carlos de Castro Fernandes |
| Descritores: | INCIDÊNCIA IRS, ADIANTAMENTOS POR CONTA DOS LUCROS, ÓNUS DA PROVA, N.º 1 DO ART.º 100.º DO CPPT. |
| Sumário: | I – O artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS, sistematicamente inserido na categoria de incrementos patrimoniais (normas de incidência real), consagra como rendimentos de capitais sujeitos a incidência de IRS os lucros, incluindo os adiantamentos por conta de lucros, colocados à disposição dos respetivos associados. II - Para se preencher a estatuição legal do conceito de adiantamento por conta dos lucros previsto no artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS é necessário que fique demonstrado que as entregas feitas aos sócios ocorreram por conexão com os lucros obtidos pela sociedade. III - De acordo com o artigo 75º, nº 1 da LGT, as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, presumem-se verdadeiras. Esta presunção finda designadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT). III - Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a administração tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos. IV - Porém, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte. V - É pacificamente aceite quer na doutrina, quer na jurisprudência, que compete à Administração Fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua atuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), cabendo, em contrapartida, ao administrado/contribuinte apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, entendimento que corresponde à regra geral artigo 342.º do Código Civil de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos, regra essa que foi acolhida no artigo 74.º, n.º 1 da LGT. |
| Recorrente: | Representação da Fazenda Pública |
| Recorrido 1: | A..., S.A. |
| Votação: | Unanimidade |
| Meio Processual: | Impugnação Judicial - Liquidação de tributos - 1ª espécie - Recursos jurisdicionais [Del. 2186/2015] |
| Decisão: | Negar provimento a ambos os recursos. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: | Foi emitido parecer no sentido de ser dada procedência ao recurso da RFP e ser improcedente o recurso da segunda Recorrente. |
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| Decisão Texto Integral: | I – A Representação da Fazenda Pública – RFP (primeira Recorrente) e "A..., S.A." (segunda Recorrente) vieram interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, pela qual se julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida pela segunda Recorrente, intentada contra as liquidações adicionais de IRC dos exercícios de 2015 e 2016 e correspondentes liquidações de juros compensatórios, assim como contra as guias de retenção na fonte de IRS relativas aos apontados períodos. No presente recurso, a primeira Apelante (RFP) formula as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial intentada por “"A..., S.A."”, com o NIPC ..., tendo esta última, por objeto as liquidações adicionais de IRC respeitantes ao exercício de 2015 acrescida de juros compensatórios associados, que resultou na nota de compensação no montante de € 214.158,08 e 2016, acrescida de juros compensatórios associados, que resultou na nota de compensação no valor de € 39.058,52, assim como, contra as guias de retenção na fonte n.º ...11 no montante de € 87.416,42, acrescida de juros compensatórios no valor de € 13.076,53 e n.º ...20 no montante de € 66.556,00, acrescida de juros compensatórios no valor de € 8.059,65. B. Tendo a sentença recorrida decidido pela improcedência no que respeita às liquidações adicionais de IRC de 2015 e 2016 acima descritas, visam as presentes alegações, o recurso relativamente à parte em que a AT decaiu relativamente às guias de retenção na fonte de IRS respeitantes a 2015 e 2016 nos valores acima considerados. C. Considerou o Tribunal a quo na sua sentença que, se por um lado, a AT não beneficiou da presunção plasmada no disposto no artigo 6º n.º 4 do CIRS, porquanto, não resulta dos autos que as retiradas de meios financeiros da Impugnante com destino ao seu sócio acionista, tenham sido relevadas em lançamentos em quaisquer contas correntes de sócios escrituradas na sociedade, por outro, também não logrou cumprir com o ónus da prova que sobre si impendia, nos termos do disposto no artigo 74º n.º 1 da LGT, para subsumir as referidas retiradas de dinheiro no disposto no artigo 5º n.º 1 e n.º 2 al. h) do CIRS. D. Mais decidiu ainda, que no caso dos autos, a AT desconsiderou a necessidade de observação das regras contempladas no disposto no artigo 297º do CSC, regras a que estão sujeitos os adiantamentos por conta de lucros, sendo certo que, não se extrai do probatório junto ao processo administrativo, que a Impugnante, aqui recorrida, tenha apresentado lucro tributável e que tenha sido deliberado em assembleia geral de acionistas, a distribuição de resultados pelos sócios. E. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto entende que a decisão proferida enferma de erro de julgamento, de facto e de direito. F. Na verdade, considera a FP que ao contrário do decidido na douta sentença recorrida, a AT, por intermédio dos SIT, ainda que não tenha beneficiado da presunção prevista no disposto no artigo 6º n.º 4 do CIRS, cumpriu com o ónus da prova a seu cargo, nos termos do disposto no artigo 74º n.º 1 da LGT. G. Os SIT aquando da realização de ação inspetiva à Impugnante, credenciada pela OI2017....39 e pela OI2019....76, respetivamente, conforme relatório inspetivo constante do processo administrativo, constataram, mediante análise ao extrato de conta corrente da empresa “B..., Corp” (extrato de conta corrente “B” – ...10), que foram efetuados pela Impugnante à referida empresa, pagamentos no montante total de € 320.201,50 em 2015 e no montante total de € 237.700,00 em 2016. H. Pagamentos que foram alegadamente efetuados para liquidação das faturas que a empresa “B”, emitiu durante aqueles exercícios para a Impugnante (e melhor discriminadas no RIT), para as quais, os SIT reuniram indícios mais do que suficientes de que não corresponderam a efetivas transações, tal como assim, foi também decidido pela douta sentença recorrida. I. Os SIT na recolha desses indícios, designadamente, mediante a análise do ponto de vista financeiro que efetuaram, comprovaram que foram utilizados no pagamento das faturas cheques sacados sobre contas domiciliadas em Portugal e não transferências internacionais, aliás, como seria usual em transações ocorridas entre empresas sediadas em diferentes países (a empresa “B” tem sede em Delaware, ...); J. Mediante consulta aos elementos contabilísticos de suporte aos referidos movimentos, foram detetadas cópias de cheques (frente), verificando-se que num número significativo emitidos ao portador, foi aposto manualmente no espaço destinado à identificação do seu beneficiário, o nome do acionista da Impugnante através da utilização das seguintes expressões: “particular”; “particular – Sr. "FF"”; “carro – Sr. "FF"”; K. Solicitadas cópias frente e verso dos referidos cheques após desconto bancário, constataram os SIT que parte deles, continha no seu verso, a assinatura do administrador/acionista da Impugnante; L. E, nos restantes, verificou-se terem sido depositados na conta bancária “PT...90”, sendo que, a este respeito, salientam os SIT, não existir na base de dados da AT, qualquer entidade com a designação “B..., Corp”, sendo a existência de um número de identificação fiscal válido, requisito necessário para abertura de uma conta bancária; M. Mais constataram os referidos Serviços, que a sede da empresa “B” em “619, ..., USA”, corresponde à morada de um conjunto alargado de empresas, várias delas com registo em Portugal, sendo o estado de Delaware, internacionalmente conhecido como um estado atrativo para a instalação de empresas devido a uma legislação comercial pouco regulamentada, que oferece elevados níveis de proteção da identidade dos seus detentores e níveis de tributação muito reduzidos ou inexistentes, sem a conotação negativa de “paraíso fiscal”. N. Resultando assim prova inequívoca e suficiente da saída de meios financeiros da Impugnante com destino ao seu administrador/acionista, conforme o comprovam os cheques e demais documentos probatórios oportunamente remetidos pela FP ao tribunal a quo e constantes do processo inspetivo e do processo de evidência de trabalho (PET). O. Aliás, facto dado como provado pela sentença recorrida (veja-se facto provado 8). P. Assim, resulta provado que a retirada de fundos financeiros da Impugnante, embora associados ao pagamento das faturas timbradas em nome da “B”, foram, na realidade, destinados ao seu acionista. Sendo certo que, quer pelo destino dado aos fundos retirados da Impugnante, quer pelos seus montantes e periodicidade, ficou demonstrado que a empresa “B”, foi utilizada pelo acionista da Impugnante para retirar fundos monetários desta última, alguns dos quais, se encontram perfeitamente relacionados com a sua esfera particular, assim como, pelo facto de os restantes, estarem associados a uma conta cuja titularidade se questiona, face à ausência de número de identificação fiscal válido. Q. Verificou-se assim, a transferência de meios financeiros da Impugnante com destino ao seu acionista sem qualquer tipo de justificação legal, pelo que, o único enquadramento fiscal possível, é o de terem sido transferidos a título de lucros/adiantamento por conta de lucros. O depósito de cheques a favor do acionista da Impugnante, foi efetuado como adiantamento por conta de lucros e, consequentemente, enquadráveis como rendimentos de capitais, uma vez que, tais montantes, saindo da sociedade e deles se aproveitando o seu acionista, não podem deixar de ser imputados ao próprio como rendimentos seus, nos termos do disposto no artigo 5º n.º 2 al. h) do CIRS. R. Veja-se, neste sentido, o decidido no Acórdão do TCAS de 27/01/2009, proferido no âmbito do Processo n.º 02479/09 e na Decisão do CAAD, proferida no âmbito do Processo n.º 23/2019-T. S. Razão pela qual, consideramos que a douta sentença recorrida incorreu em erro na análise da matéria de facto e subsequente subsunção em matéria de direito. T. Por outro lado, ao contrário da douta sentença recorrida, não considera a FP como condição necessária e essencial para a incidência, o facto de ter de existir um lucro efetivo da empresa e sua subsequente distribuição pelos sócios em assembleia de acionistas, no estrito cumprimento das regras contempladas no disposto no artigo 297º do CSC. U. De facto, é nosso entendimento, salvo o devido respeito por diferente opinião, que as normas de incidência em discussão, não postulam como pressuposto ou condição de tributação, a observância dos requisitos previstos no artigo 297º do CSC ou a existência de uma deliberação em assembleia geral de acionistas. V. Na verdade, seguindo posição diferente, estar-se-á a dar prevalência a aspetos formais em detrimento do que efetivamente aconteceu, abrindo assim caminho, à fraude e evasão fiscais. W. Veja-se neste sentido, a Decisão do CAAD, proferida no âmbito do Processo n.º 23/2019-T. X. Razão pela qual, consideramos, que as vicissitudes elencadas, estão comprovadas e demonstradas, não tendo sido devidamente relevadas pelo Tribunal a quo, uma vez que, a tê-lo sido, o itinerário decisório a implementar, certamente teria sido outro. Y. Por conseguinte, salvo o devido respeito que é muito, o Tribunal a quo, incorreu em erro de interpretação e aplicação do direito e dos factos, nos termos supra explanados, assim como, não considerou nem valorizou como se impunha, a prova documental que faz parte dos autos. Termina a primeira Recorrente pedindo que seja concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida. Pede, igualmente, a final a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça. Respondendo ao apontado recurso, a segunda Recorrente ("A..., S.A.") apresentou contra-alegações, nestas concluindo que: 1 – A sentença de 28-07-2022, que decidiu pela anulação das liquidações de retenção na fonte de IRS de 2015 e 2016, fez uma correta interpretação, quer do disposto no artigo 5º nº 1 e 2 alínea h), quer do nº 4 do artigo 6º, ambos do CIRS, ao reconhecer que só os lançamentos feitos em conta de sócios, nos livros das sociedades, se presumem como adiantamento por conta de lucros. 2 – Não se vislumbra assim o imputado erro de apreciação da matéria de facto e de direito que a AT imputa à decisão recorrida, em matéria de retenções na fonte em sede de IRS. 3 – Nos livros da sociedade recorrida, não há quaisquer registos, ou lançamentos a favor do sócio, que demonstre ou prove a retirada de quaisquer valores da sociedade, de que se possa presumir que pudessem ter sido feitos a título de lucros. 4 – A AT não fez qualquer prova, como alega nas conclusões “P” e “Q”, de que os pagamentos das faturas à “B” foram destinados ao acionista, sem qualquer justificação, demonstrando, por essa via, que o único enquadramento fiscal possível, é o de terem sido transferidos a título de lucros. 5 – A sentença, não deu como provado que a consultora “B......, Corp”, não prestou serviços de consultoria, mas apenas que não foi possível ao tribunal interpretar com exatidão o sentido do depoimento das testemunhas sobre os programas efetuados pela “B” e introduzidos nas máquinas para produção das peças vendidas aos clientes. 6 – A contrapartida da elaboração de programas, poucos ou muitos, é o pagamento do serviço prestado e, nesse sentido, a contrapartida da existência do gasto. 7 – A AT, não fez assim a prova que lhe competia fazer, já que esta prova, não é aquela que vem invocar ter feito, mas sim a de demonstrar que os pagamentos efetuados à “B”, vieram efetivamente a integrar o património do acionista e, 8 – Da existência nos livros da impugnante, de lançamentos ou outros registos nas contas da sociedade, a favor do sócio, que se pudessem presumir que quaisquer retiradas da sociedade, se deviam presumir como feitas a título de lucros. Termina a segunda Recorrente solicitando que seja negado provimento ao recurso interposto pela AT, mantendo-se a decisão recorrida em matéria de retenção na fonte em sede de IRS. Por seu turno a segunda Recorrente apresentou o seu recurso, neste concluindo que: 1 – A sentença recorrida que decidiu não ter a impugnante feito prova da efetividade do gasto e a necessária correspondência entre a necessidade real do gasto e a obtenção ou garantia do lucro sujeito a imposto, valorizou as conclusões do RIT em detrimento da repartição do ónus da prova. 2 – Os gastos desconsiderados respeitam às faturas emitidas pela consultora “B......, Corp”, referente a serviços que permitiram à impugnante entrar no setor industrial dos petróleos nos Estados Unidos, em que o acesso às mesmas só é viável através de uma rede de contactos que as empresas de consultoria facilitam. 3 – A “B”, como consultora, foi selecionada pela impugnante por ter demonstrado estar bem inserida no mercado dos petróleos e conhecer as tecnologias ASM, API, EN, PED, ISO, IEC e ATEX, em uso nas operadoras petrolíferas. 4 – A escolha da “B”, constituiu um ato livre de gestão da impugnante não relevando para tal o facto da consultora estar sediada nos Estados Unidos, mas motivado pelo interesse económico que daí adviria. 5 – Prestados que foram os serviços, a “B” emitiu a sua faturação que lhe foi paga através de cheques bancários. 6 – A decisão recorrida, não afastou a prova de que os serviços de consultadoria foram efetivamente prestados. 7 – Deu como verificado que a “B” desenvolveu programas que foram aplicados nas máquinas e que produziram as peças que eram vendidas pela impugnante. 8 – Tal pressuposto deveria conduzir à aceitação do custo correspondente a deduzir à matéria tributável. 9 – Contudo foi decidido não considerar esse custo, ou custos, pelo facto das testemunhas não terem conseguido descrever com exatidão quais os programas efetuados pela “B” e integrados nas máquinas. 10 – Com efeito, com fundamento nesse critério, o entendimento do tribunal foi o de que não lhe foi possível acolher o princípio da quantidade dos pagamentos inseridos nas máquinas e as faturas emitidas pela “B”. 11 – A impugnante alegou na petição inicial que incorreu nesses gastos de consultoria, colocando-se dúvidas ao tribunal quanto ao montante desses gastos, essa questão, em obediência ao princípio estabelecido no nº 1 do artigo 100º do CPPT, deveria ter sido resolvido a favor da impugnante. 12 – A sentença recorrida deu como verificado que no que respeita aos projetos de engenharia, foram exibidos alguns projetos, que correspondem à impressão dos comandos que foram introduzidos nas máquinas necessárias à produção das peças que era necessário produzir para serem vendidas para o mercado americano. 13 – Só o princípio negativista da inspeção quanto à verificação dos pressupostos que estiveram na origem da faturação da “B” à Impugnante é que impede a aceitação de que os custos foram efetivamente realizados e têm correspondência com os pagamentos efetuados. 14 – O que refere a inspeção sobre os meios de pagamento utilizados não pode ser acolhido como meio científico de auditoria, se não demonstrar que o beneficiário final dos meios de pagamento nada tem a ver com o emitente das faturas. 15 – A impugnante alegou factos que demonstram o erro da AT nas Correções técnicas, provando não só a realização dos gastos, que foram declarados na sua contabilidade, como também fez prova dos meios de pagamento utilizados, cumprindo assim a obrigação que lhe competia, conforme disposto no artigo 74º nº 1 da LGT. 16 – O que não aconteceu com a AT que, invocando a inexistência dos serviços prestados contradiz a sua própria aceitação de existência de alguns serviços prestados e de que só alguns meios de pagamento é que demonstram ter um beneficiário diferente da “B”. 17 – A decisão recorrida, que julgou que a aqui recorrente não fez prova dos gastos incorridos sujeitos a imposto, não deve ser mantida quanto a esta matéria. Termina a "A..., S.A." pedindo que seja parcialmente revogada a sentença recorrida. * Os autos foram com vista ao digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, tendo este emitido parecer no sentido da procedência do recurso da RFP e na improcedência do recurso da segunda Recorrente (cf. fls. 1052 e segs. dos autos – paginação do SITAF). * Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento. -/- II - Matéria de facto indicada em 1.ª instância: 1) A Impugnante, tem como seu objeto social a fabricação de outras máquinas (cfr relatório de inspeção, a fls. 33 do PA junto a fls. 34 do Sitaf); 2) Em 4 de março de 2019, a Autoridade Tributária, credenciada pela Ordem de Serviço n.º ...39 e ...76, deu início a uma ação de Inspeção Tributária, de âmbito geral e parcial, com vista à análise do cumprimento das obrigações tributárias do Impugnante, a qual foi despoletada por seleção aleatória de sujeitos passivos – cf. RIT a fls. 33 e seguintes do PA junto a fls. 34 do Sitaf, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 3) No âmbito da ação de inspeção referida na alínea antecedente, foi elaborado, em 31 de outubro de 2019, o relatório final de Inspeção Tributária, do qual resultou a correção das retenções na fonte declaradas, no montante de € 428.325,26, constando do seu teor, designadamente, o seguinte: [dá-se por reproduzido(a) o(a) documento/imagem conforme original] – Cfr. fls. 34 do Sitaf, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 4) Em resultado das correções referidas na alínea antecedente, a Autoridade Tributária emitiu a liquidação de IRC com ...92, ...22, ...22, ...15 e ...76, respeitantes e IRC e juros compensatórios do período de 2015 e 2016, e das guias de retenção na fonte de IRS n.ºs ...76, ...57, ...57, dos períodos de 2015 e 2016, no montante global de € 428.325,26 – cfr. fls.8 a 28 do PA junto aos autos a fls. 34 do Sitaf; 5) Em 11 de março de 2020, a presente impugnação judicial deu entrada neste Tribunal – cfr. carimbo aposto a fls. 2 do processo físico; Mais ainda ficou provado que: 6) Foi celebrado entre a Impugnante, o Sr. AA e a C... um contrato designado de “Teaming Agreement to Porsue Joint Business Opportunity”, com o objetivo de efetuar a prospeção de clientes na área do petróleo para a área do metal, nos seguintes termos: [dá-se por reproduzido(a) o(a) documento/imagem conforme original] (…) [dá-se por reproduzido(a) o(a) documento/imagem conforme original] (cfr. Fls. 55 a 59 do PA apenso aos autos e prova testemunhal); 7) Foram emitidas pela “B”, dirigidas à Impugnante as faturas n.ºs ...01, ...02, ...03, ...04, ...05, ...06, ...07, ...08, ...09, ...10, ...11, ...12, ...13, ...14, ...15, ...16, ...17, ...18, ...02, ...03, e efetuados os respetivos pagamentos pela Impugnante através de cheque (cfr. Fls. 62 a 82 e 103 a 123 e página 312 a 375 do PA apenso aos autos, os quais se dão por inteiramente reproduzidos e prova testemunhal); 8) Os cheques de fls. 378 a 469 do PA apenso aos autos foram emitidos ao portador e têm no seu verso a assinatura do administrador, Sr "FF" e foram descontados na conta PT..............90” (cfr. Fls. 378 a 469 do PA apenso aos autos e prova testemunhal); 9) A Impugnante apresentou à Autoridade Tributária o documento denominado Código “CAM ....txt” (cfr. Fls. 481 do PA apenso aos autos e que se dá por integralmente reproduzido e prova testemunhal); 10) A Impugnante apresentou à Autoridade Tributária o documento denominado Código “MCG ....txt” (cfr. Fls. 483 do PA apenso aos autos e que se dá por integralmente reproduzido e prova testemunhal); 11) A Impugnante apresentou à Autoridade Tributária o documento denominado Código “... ...35.txt” (cfr. Fls. 485 e 493 do PA apenso aos autos e que se dá por integralmente reproduzido e prova testemunhal); 12) A Impugnante apresentou à Autoridade Tributária o documento denominado Código “...” (cfr. Fls. 495 E 496 do PA apenso aos autos e que se dá por integralmente reproduzido e prova testemunhal); 13) A Impugnante apresentou à Autoridade Tributária o documento denominado Código “SN ..., txt” (cfr. Fls. 497 a 499 do PA apenso aos autos e que se dá por integralmente reproduzido e prova testemunhal); 14) A Impugnante apresentou à Autoridade Tributária o documento denominado Código “....txt” (cfr. Fls. 503 a 508 do PA apenso aos autos e que se dá por integralmente reproduzido e prova testemunhal); 15) A Impugnante apresentou à Autoridade Tributária o documento denominado “Prospeção de novos clientes e gestão da força de venda como alavanca das receitas” (cfr. Fls. 515 a 531 e fls. 553 do PA apenso aos autos e que se dá por integralmente reproduzido) 16) A Impugnante apresentou à Autoridade Tributária o documento denominado “Gestão da Força de Vendas” (cfr. Fls. 532 a 546 e fls. 553 do PA apenso aos autos e que se dá por integralmente reproduzido); 17) A fls. 557 a 640 do PA encontra-se o documento denominado “Memória descritiva e justificativa”, o qual se dá por integralmente reproduzido”; * Na sentença recorrida considerou-se que inexistiam factos não provados com relevância para a decisão da presente questão. * No que diz respeito à motivação factual, escreveu-se na sentença recorrida que: «A convicção do Tribunal alicerçou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos referida no probatório em relação a cada facto, na matéria de facto alegada e não contestada, e outra de conhecimento oficioso do Tribunal, dispensando a respetiva alegação, nos termos do artigo 412º do Código de Processo Civil. Assenta ainda a convicção do Tribunal nos depoimento das testemunhas arroladas pela Impugnante, conforme referido propósito de cada uma das alíneas do probatório, que depuseram de forma clara e convicta, revelando conhecimento direto dos factos (cf. art.º 76.º, da Lei Geral Tributária – LGT – e art.º 362.º e ss. do Código Civil – CC e art.ºs 396.º do CC e 607.º n.º 5 do CPC, aplicável ex vi art.º 2.º do CPPT). Todas as testemunhas depuseram prontamente ao que lhes foi perguntado, de uma forma isenta, clara, desinteressada e credível, demonstrando conhecimento direto sobre os factos em causa, pelo que foram os seus depoimentos valorados pelo tribunal conforme a seguir se explicita. Todas as testemunhas ouvidas em Audiência de julgamento, identificaram o administrador à data dos factos, o Sr. "FF", referindo que foi o mesmo que contratou os serviços da Consultora “B” para que lhe prestasse os serviços de consultoria na área de penetração de mercado no setor petrolífero. Mais afirmaram pelos serviços prestados da consultora que se conseguiu penetrar nas empresas que laboram na extração de petróleos. Todas as testemunhas referiram que havia projetos cujos programas eram desenvolvidos pela “B” e que a administração é que dava indicação de que os mesmos iriam ser colocados nas máquinas. A testemunha "EE" referiu que quando chegavam os consultores, os levava diretamente ao Sr. "FF" ou diretamente para a produção, não havendo qualquer registo de entrada dos mesmos na sede da Impugnante. Relativamente a possíveis clientes da Impugnante obtidos através da “B”, referiu apenas ter conhecimento da sua angariação através do Sr. "FF" e não diretamente. Porém, nenhuma das testemunhas conseguiu efetuar uma descrição de quais os programas efetuados pela “B” e integrados nas máquinas da Impugnante, apenas fazendo referências vagas, sem datas precisas e sem identificação concreta dos projetos efetuados e respetivos valores e prestações de serviços efetivamente concretizadas. Não foi possível assim ao Tribunal conseguir efetuar o matching entre os supostos programas inseridos nas máquinas e as faturas emitidas pela “B”, e consequentemente, da prestação de serviços efetuada. A testemunha "PP", contabilista da Impugnante à data dos factos, referiu mesmo não saber que serviços haviam sido pedidos à “B” para serem prestados, apenas rececionando os pedidos de pagamento das faturas, os quais eram autorizados pelo administrador. Relativamente aos cheques que haviam sido endossados ao administrador referiu que era uma restituição de valores adiantados antes à “B”. Esclareceu ainda que a dívida do sócio foi saldada através do contrato para prestar serviços, não existindo qualquer documento escrito. Por último referiu não saber quem era o administrador da “B”. Assim sendo, apesar de ter referido pelas testemunhas que existiram serviços prestados pela “B” à Impugnante, não foi possível perceber em concreto quais os serviços prestados, por inexistência de qualquer contrato de prestação de serviços específico para cada projeto, nem estabelecer um nexo entre esses possíveis serviços e as faturas e pagamentos efetuados pela Impugnante à “B”.» -/- III – Questões a decidir. No presente recurso, cabe analisar e decidir as questões colocadas pelas Recorrentes, que, sumariamente, são os seguintes: - Recurso da primeira Apelante (RFP): erro de julgamento na apreciação de facto e quanto à interpretação dada ao disposto no n.º 4 do art.º 6.º, n.º 1 e alínea h) do n.º 2, todos do IRS, 74.º n.º1 da LGT e 297.º do CSCom, todos por referência à questão da validade das guias de retenção na fonte em sede de IRS; - Recurso da segunda Apelante (abreviadamente, "A..., S.A."): erro de julgamento de direito no que concerne à interpretação e aplicação do disposto no n.º 1 do art.º 100.º do CPPT e 74.º n.º 1 da LGT, no que tange à desconsideração de determinados custos em sede de IRC (exercícios de 2015 e 2016). -/- IV – Da apreciação dos presentes recursos. Constitui objeto dos presentes recursos a sentença proferida nestes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel Tendo a presente impugnação sido intentada no TAF do Porto, que se declarou territorialmente incompetente para a decidir, pelo que esta foi remetida para o TAF de Penafiel que proferiu a decisão jurisdicional ora sob escrutínio – cf. fls. 162 e segs. e 935 e segs. dos autos (paginação do SITAF). , pela qual se concedeu parcial provimento à impugnação deduzida pela segunda Recorrente ("A..., S.A."), intentada contra as liquidações adicionais de IRC dos exercícios de 2015 e 2016 e correspondentes liquidações de juros compensatórios, assim como contra as guias de retenção na fonte de IRS atinentes ao mesmo período temporal. Assim, na sentença recorrida, o Tribunal de primeira instância decidiu: “Nestes termos e nos das disposições legais citadas, julga-se a presente impugnação judicial a) improcedente, por não provada, no que diz respeito às liquidações de IRC, com os n.ºs ...92 e ...15, no valor global de € 253.216,60, devendo ser mantidas as liquidações adicionais ora impugnadas e acima referidas; b) procedente, por provada, no que diz respeito às guias de retenção na fonte n.ºs ...11 e ...20, e respetivos juros compensatórios, no valor global de € 175.108,60, devendo ser anuladas, com todas as legais consequências.” As liquidações e as guias supra referidas encontram os seus fundamentos num relatório inspetivo elaborado pelos serviços da AT, no qual se concluiu, em suma, pela aplicação de correções técnicas no âmbito do IRC dos exercícios de 2015 e 2016, por desconsideração de custos e no campo de ação do IRS, por existência de adiantamento por conta dos lucros a sócio. Vejamos, então. IV.I – Do recurso movido pela RFP. A RFP inicia o presente recurso afirmando um conjunto de factos e de ilações de facto, sem que relativamente a estes estabeleça um qualquer juízo de antinomia com a factualidade considerada na sentença recorrida (cf., designadamente, a matéria inclusa nas conclusões «G», a «Q» do apontado recurso). Acresce que tais factos estão em linha com os que constam da decisão jurisdicional ora em apreço. Assim, na ausência de uma verdadeira intenção recursiva quanto aos apontados factos e ilações, não estamos aqui perante um recurso verdadeiramente incidente sobre a matéria de facto, ao invés do que parece afirmar a aludida Recorrente na sua apelação. Posto isto, as questões fundamentais do presente recurso movido pela RFP giram em torno de saber se na sentença apelada se houve erro de julgamento na apreciação de facto e quanto à interpretação dada ao disposto no n.º 4 do art.º 6.º, n.º 1 e alínea h) do n.º 2, todos do IRS, 74.º n.º1 da LGT e 297.º do CSCom, isto no que se refere à questão da validade das guias de retenção na fonte em sede de IRS. Com efeito, é unicamente sobre esta parte do apreciado e julgado em primeira instância que se insurge a RFP. Ora, na sentença recorrida sobre a questão acima referida, expôs-se que: “[…] Considera a Impugnante que, tendo sido consideradas pela Autoridade Tributária como adiantamentos por conta as quantias entregues aos sócios, deveria ter constar do relatório a norma constante do CIRS que prove a existência desses lucros e que os mesmos foram colocados à disposição dos sócios. Conforme decidiu o Tribunal Central Administrativo Norte, entre outros, no seu acórdão de 08-03-20181, proferido no processo n.º 00865/13.6BEPRT e acessível em www.dgsi.pt. , o artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS, sistematicamente inserido na categoria de incrementos patrimoniais (normas de incidência real), consagra como rendimentos de capitais sujeitos a incidência de IRS os lucros, incluindo o adiantamento por conta de lucros, colocados à disposição dos respetivos associados. O artigo 6.º, n.º 4 do CIRS consagra uma presunção relativa a rendimentos de capitais, de que as quantias escrituradas em quaisquer contas de sócios de sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, quantias essas que não resultem de mútuos, da prestação de trabalho ou do exercício de cargos sociais, presumem-se feitos a título de lucros ou adiantamento dos lucros. Só os lançamentos feitos em conta de sócio (e que não se prove que respeitem a alegados mútuos) se presumem, face ao disposto no n.º 4 do artigo 6.º do CIRS, feitos a título de lucros ou adiantamento de lucros.» No caso sujeito, refere o relatório inspetivo que houve quantias entregues pela Impugnante ao seu sócio, o que constitui retirada de fluxos financeiros da empresa, valores que foram pagos pela “B” aquando da efetivação do acordo acima referido. No entanto, a Autoridade Tributária faz o enquadramento em sede dos artigos 5º n.º 1 do CIRS e alínea h) do n.º 2, referindo que “as retiradas de dinheiro têm a natureza de adiantamentos por conta, apenas referindo que as faturas da “B” foram destinadas ao acionista da Impugnante, o que se comprova pelo destino dos fundos e pelo facto de os mesmos estarem destinados a ma conta cuja titularidade se questiona face à ausência de numero fiscal válido, o que constitui um indício de que esses meios financeiros tiveram como destino a sua esfera particular”, não efetuando prova concludente das suas afirmações. Face ao exposto extrai-se não operar, no caso, a presunção ínsita no citado artigo 6.º, n.º 4 do CIRS, termos em que cabia à Administração Tributária fazer prova dos pressupostos do seu agir (conforme artigo 74.º, n.º 1, da LGT), coligindo e invocando factos índice passíveis de conduzirem ao enquadramento dos valores identificados como rendimentos da categoria E, colocados à disposição do sócio, nos termos previstos no artigo 5.º, n.os 1 e 2, alínea h) do CIRS. Ora, neste âmbito, decidiu-se no Acórdão do TCA Norte de 08.03.2018, proferido no Processo n.º 00865/13.6BEPRT e acessível em www.dgsi.pt, conforme segue: “(...) O Código das Sociedades Comerciais (CSC), no seu artigo 297.º, n.º 1, prevê que nas sociedades anónimas sejam feitos aos accionistas adiantamentos sobre lucros, desde que observadas as seguintes regras: «a) O conselho de administração ou o conselho de administração executivo, o consentimento do conselho fiscal, da comissão de auditoria ou do conselho geral e de supervisão, resolva o adiantamento; b) A resolução do conselho de administração ou do conselho de administração executivo seja precedida de um balanço intercalar, elaborado com a antecedência máxima de 30 dias e certificado pelo revisor oficial de contas, que demonstre a existência nessa ocasião de importâncias disponíveis para os aludidos adiantamentos, que devem observar, no que seja aplicável, as regras dos artigos 32.º e 33.º, tendo em conta os resultados verificados durante a parte já decorrida do exercício em que o adiantamento é efectuado; c) Seja efectuado um só adiantamento no decurso de cada exercício e sempre na segunda metade deste; d) As importâncias a atribuir como adiantamento não excedam metade das que seriam distribuíveis, referidas na alínea b). 2 – Se o contrato de sociedade for alterado para nele ser concedida a autorização prevista no número anterior, o primeiro adiantamento apenas pode ser efectuado no exercício seguinte àquele em que ocorrer a alteração contratual». Embora o CSC não contenha disposição idêntica para as sociedades por quotas (caso da impugnante), o certo é que a admitir-se tal possibilidade também nesta modalidade societária, sempre haveriam de observar-se as regras a que está sujeito o adiantamento sobre os lucros nas sociedades anónimas – cfr. Acórdão do TCA Norte, de 09/06/2016, proferido no âmbito do processo n.º 545/10.4BECBR. E analisadas tais regras, logo se vê que o adiantamento por conta dos lucros supõe a transferência de disponibilidades financeiras geradas em resultados do exercício, da sociedade para os sócios. Ora, os resultados das empresas decorrem da diferença entre os proveitos e os custos apurados no exercício. Como decorre do disposto no n.º 1 do artigo 17.º do CIRC, «O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não refletidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código” (sublinhado nosso). No caso dos autos, ao contrário do firmado no aresto acabado de aludir, a Autoridade Tributária desconsiderou a necessidade de observação das citadas “regras a que está sujeito o adiantamento sobre os lucros”, concluindo pela verificação daquele. Não obstante, não se extrai sequer da documentação junta ao processo administrativo que a Impugnante tenha apresentado lucro tributável e que tenha sido deliberado em assembleia geral da citada sociedade, haver distribuição de resultados pelos sócios, do que decorre a ausência de prova da verificação, nos anos em crise, de adiantamentos por conta de lucros a favor sócio, e em consequência, da ausência de obrigatoriedade de retenção na fonte. Face ao exposto, impõe-se concluir pela procedência da pretensão da Impugnante, o que se decide, anulando-se a retenção na fonte de IRS dos períodos de 2015 e 2016. […]” Desde já adiantamos que sufragamos na íntegra a posição assumida pela primeira instância quanto à presente questão e que tem o devido respaldo na jurisprudência deste TCA supra citada e que é de aplicar à situação nos presentes autos. Efetivamente no aresto desta instância citado na sentença recorrida relatou-se que: “Ora, preceitua o artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS, na redacção aplicável: “1 - Consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, directa ou indirectamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respectiva modificação, transmissão ou cessação, com excepção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias. 2 - Os frutos e vantagens económicas referidos no número anterior compreendem, designadamente: (…) h) Os lucros das entidades sujeitas a IRC colocados à disposição dos respectivos associados ou titulares, incluindo adiantamentos por conta de lucros, com exclusão daqueles a que se refere o artigo 20.º”. Este artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS, sistematicamente inserido na categoria de incrementos patrimoniais (normas de incidência real), consagra como rendimentos de capitais sujeitos a incidência de IRS os lucros, incluindo os adiantamentos por conta de lucros, colocados à disposição dos respectivos associados. Mas para que tal suceda é necessário que se prove a existência de lucros e que estes foram colocados à disposição dos sócios ou titulares, sendo que não existe qualquer presunção de que no caso de haver lucros estes sejam recebidos pelos sócios ou titulares. Com efeito, a única presunção legal que se conhece, neste âmbito, é a que decorre da norma do artigo 6.º, n.º 4 do CIRS, na redacção então em vigor, segundo a qual os lançamentos em quaisquer contas correntes dos sócios, escrituradas nas sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, quando não resultem de mútuos, da prestação de trabalho ou do exercício de cargos sociais, presumem-se feitos a título de lucros ou adiantamento dos lucros. E para esta presunção operar pressupõe-se, efectivamente, o registo na conta corrente do sócio. […]” No entanto, no aresto desta instância citado reconhece-se que: “[…] a norma do artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS não exige a escrituração formal dessa realidade como pressuposto de incidência, mesmo porque “deixar ao critério do sujeito passivo a “classificação” como adiantamento por conta de lucros, de realidades da vida corrente das sociedades comerciais, que constituem verdadeiros desvios de fundos em proveito dos sócios, seria frustrar o interesse público do Estado na arrecadação de impostos e no combate à fraude e evasão fiscais e permitir que ficassem por tributar verdadeiros incrementos patrimoniais dos sócios”. É comummente aceite que quando os lucros distribuídos ou adiantamento por conta de lucros são devidamente escriturados, estamos perante um rendimento sujeito a impostos sobre o rendimento das pessoas singulares. Porém, o mesmo não acontece quanto uma parte do património das sociedades é afectado ou onerado, por contrapartida da transferência duma parte deste, de modo permanente e definitivo, para a esfera jurídica de um associado ou titular, sem que às mesmas operações lhes sejam dados os qualificativos de "lucros distribuídos" ou "adiantamentos por conta dos lucros". Tal situação ocorre quando os montantes, que deviam ter sido reconhecidos como proveitos das sociedades, acabam por não ser registados nas contabilidades destas e vão acrescer ao património individual dos respectivos associados ou titulares e, ainda, quando o registo, apesar de efectuado na contabilidade da sociedade, não foi relevado numa conta de proveitos, mas sim numa qualquer conta de passivo que confira ao associado ou titular o direito de, como qualquer normal credor, vir a exercer a respectiva exigibilidade - vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 27/01/2009, proferido no âmbito do processo n.º 02479/08. Assim, a questão que se coloca é a de saber se os factos recolhidos pela administração tributária permitem extrair a conclusão de que foram postos à disposição do seu sócio-gerente proveitos auferidos pela Recorrente, constituindo adiantamentos por conta de lucros e, nessa medida, devem ser qualificados como rendimento de capitais nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS. Importa relembrar que era a Administração Tributária que tinha o ónus de alegar e provar factos índices donde se pudesse extrair aquela conclusão (cfr. artigo 74º da LGT), impondo-se verificar se a argumentação constante do RIT e vertida no probatório contém factos objectivos susceptíveis de demonstrar que a quantia em causa foi colocada à disposição do sócio e se permite extrapolar a conclusão de que estamos perante adiantamento por conta dos lucros e, como tal, rendimento de capitais, categoria E, nos termos do estatuído no artigo 5º, n.º 1 e n.º 2, alínea h) do CIRS, para depois concluir que a Recorrente estava obrigada a reter na fonte a importância correspondente a essa quantia. […] O Código das Sociedades Comerciais (CSC), no seu artigo 297.º, n.º 1, prevê que nas sociedades anónimas sejam feitos aos accionistas adiantamentos sobre lucros, desde que observadas as seguintes regras: «a) O conselho de administração ou o conselho de administração executivo, com o consentimento do conselho fiscal, da comissão de auditoria ou do conselho geral e de supervisão, resolva o adiantamento; b) A resolução do conselho de administração ou do conselho de administração executivo seja precedida de um balanço intercalar, elaborado com a antecedência máxima de 30 dias e certificado pelo revisor oficial de contas, que demonstre a existência nessa ocasião de importâncias disponíveis para os aludidos adiantamentos, que devem observar, no que seja aplicável, as regras dos artigos 32.º e 33.º, tendo em conta os resultados verificados durante a parte já decorrida do exercício em que o adiantamento é efectuado; c) Seja efectuado um só adiantamento no decurso de cada exercício e sempre na segunda metade deste; d) As importâncias a atribuir como adiantamento não excedam metade das que seriam distribuíveis, referidas na alínea b). 2 - Se o contrato de sociedade for alterado para nele ser concedida a autorização prevista no número anterior, o primeiro adiantamento apenas pode ser efectuado no exercício seguinte àquele em que ocorrer a alteração contratual». […] E analisadas tais regras, logo se vê que o adiantamento por conta dos lucros supõe a transferência de disponibilidades financeiras geradas em resultados do exercício, da sociedade para os sócios. Ora, os resultados das empresas decorrem da diferença entre os proveitos e os custos apurados no exercício. Como decorre do disposto no n.º 1 do artigo 17.º do CIRC, «O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código». […]”. Retornando ao caso presente, o que os serviços da AT constaram é que a sociedade impugnante teria efetuado pagamentos a uma sociedade terceira (denominada «“B”»), relativamente a serviços que esta lhe havia faturado, mas que as quantias pagas teriam como destino um acionista e administrador da sociedade impugnante. Para o efeito, os serviços da AT tiveram em conta os montantes e a periodicidade dos pagamentos efetuados, os destinos dados aos mesmos (alguns dos quais ligados a pagamentos de natureza particular) e a circunstância de determinados pagamentos estarem associados a uma conta que não deteria número fiscal válido. Ora, independentemente da eventual menor ou maior consistência de tais indícios Questão que será adiante analisada no âmbito do recurso movido pela segunda Recorrente ("A..., S.A.")., no sentido que os mesmos pudessem cumprir, ou não, o disposto no ónus probatório que cabia à AT e decorrente do n.º 1 do art.º 74.º da LGT, a verdade é que em concreto faltou verificar se tais retiradas de dinheiro por parte da empresa aconteceram por reporte aos lucros de exercícios dos anos em questão. Dito de outro modo, não se encontra demonstrada a conexão entre os pagamentos supostamente efetuados a um dos sócios e os lucros que a segunda Recorrente (Impugnante) poderá ter tido nos anos de 2015 e 2016, sendo que a demonstração de tal facto cabia à AT, nos termos do n.º 1 do art.º 74.º da LGT. Acresce que a apontada e omissa circunstância factual era também necessária para preencher a estatuição legal do conceito de adiantamento por conta dos lucros previsto no artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS. Em função do que vai supra explanado, fica prejudicada a análise da questão conexa com o suposto erro de julgamento relativo à aplicação do disposto no art.º 297.º do CSCom, uma vez que não se deixa de verificar a invalidade que foi apontada pela sentença recorrida quanto às guias de retenção na fonte de IRS e com a qual aqui concordamos. Por isso, terá que improceder o recurso aqui movido pela RFP. IV.2 – Do recurso intentado pela segunda Apelante ("A..., S.A."). A segunda Recorrente veio questionar a sentença apelada na parte em que na mesma se negou provimento à presente impugnação, mais concretamente quanto às invalidades atribuídas às liquidações de IRC dos exercícios de 2015 e 2016. Para o efeito, a segunda Recorrente afirma que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento relativamente à interpretação e aplicação do disposto no n.º 1 do art.º 100.º do CPPT e 74.º n.º 1 da LGT. Sobre a questão acima enunciada, extrai-se da sentença recorrida os seguintes fundamentos: “[…] Não estamos, pois, perante um problema nem de falta, nem de insuficiente documentação do gasto. A questão que a Autoridade Tributária levanta é o da efetividade do gasto, baseando-se num conjunto de indícios e de irregularidades. Em primeiro lugar, alega a Autoridade Tributária que não é possível perceber através da contabilidade o fluxo financeiro correspondente ao gasto. Com efeito, como se disse anteriormente, a prova da efetividade do gasto requer que se demonstre que o mesmo originou uma variação patrimonial negativa, sem a qual o gasto não existe. Pelo que, se a contabilidade não revela o fluxo financeiro, esse facto é suscetível de pôr em dúvida a existência do gasto (veja-se neste sentido, o acórdão do TCA-Sul de 30-09-2019, proc. nº 447/04.3BESNT em que se judicia que “se a Administração Fiscal duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respectivo escopo societário, tal ónus implica a demonstração do circuito económico-financeiro das despesas em presença, bem como os beneficiários das mesmas”). Ora, o RIT é conclusivo no sentido de que não ocorreu uma variação patrimonial negativa associada ao gasto, fazendo uma concreta referência ao facto de terem sido sacados cheques sobre contas domiciliadas em Portugal, tendo sido alguns desses cheques endossados ao representante legal da Impugnante. Apesar de a Impugnante afirmar que os cheques apenas foram endossados ao representante legal porque este já havia levado “dinheiro vivo” para os Estados Unidos, a testemunha "PP", contabilista da Impugnante referiu que o “Sr. "FF" acertou contas” relativamente a valores anteriormente levados em dinheiro para os Estados Unidos, não tendo explicado o porquê de tal ser efetuado desse modo. Mais ainda, financeiramente, a Autoridade Tributária constatou que nem todas as faturas emitidas em nome da “B” foram registadas em contrapartida da conta “Fornecedores “B” – ...10”, mas sim parte foi registada por contrapartida da conta “278101 – outros devedores – “B””, sendo que esta última tinha no inicio do ano de 2015 um valor muito elevado que foi diminuindo ao longo do tempo, em virtude de um contrato celerado entre as partes denominado “Teming Agreement to Persue Joint Bussiness Opportunities”. No âmbito deste contrato, e uma vez que o acionista Sr. "FF" tinha uma dívida perante a Impugnante, as entidades acordaram estabelecer como fee de participação o valor daquela mesma dívida, ficando esta liquidada. Mais constatou que no seguimento desse contrato, parte das faturas emitidas pela “B” no ano de 2015, embora registadas como gasto na conta “6221 – Trabalhos especializados” foram sendo utilizadas para liquidar a dívida que a “B” tinha assumido perante a Falual, não se verificando saída de meios financeiros. Ao contrário do referido pela Impugnante, é claro que a Autoridade Tributária conseguiu efetuar o “matching” entre os empréstimos pessoais efetuados o sócio e que não se encontravam pagos e a aceitação da liquidação da dívida por parte da “B”, substituindo-se ao devedor primitivo. Ora, apesar de a Impugnante afirmar que o acordo de assunção de dívida nada teve a ver com a prestação dos serviços, não fez qualquer prova desta afirmação. Mais ainda, não foi feita qualquer prova de que os documentos juntos aos autos, nomeadamente os códigos juntos, tenham sido elaborados pela implementado pela “B”, pois nada nos documentos se refere à sua autoria. Por último, a prova testemunhal também não foi contundente no sentido de efetuar um matching entre os códigos supostamente implementados nas máquinas e as supostas prestações de serviços efetuadas patentes nos documentos juntos aos autos. Aponta em seguida o RIT uma série de características dos documentos de suporte que reputa de “fragilidades”, referentes à análise económica: o estudo de mercado exibido corresponde a um “relatório de estágio” elaborado no âmbito de um mestrado em gestão; o estudo detalhado quando ao novo investimento corresponde a um projeto de arquitetura de ampliação das suas instalações e os projetos de engenharia “.../...” teriam por base a entrega dos projetos, tendo sido exibidos os respetivos códigos, sem indicação da sua autoria, mas não tendo sido junto qualquer comprovativo das comunicações efetuadas. Analisando a documentação junta aos autos pela Impugnante, conforme probatório acima referido, verificamos que o estudo de mercado junto corresponde efetivamente a um relatório de estágio, facilmente consultável na internet. Ora, refere a Impugnante que não tem culpa do plágio efetuado pela “B”. Porém, a Autoridade Tributária não obteve outros elementos por parte da Impugnante por forma a verificar se o documento foi retirado diretamente de internet pela Impugnante ou se foi efetivamente plagiado pela “B” e enviado para a Impugnante sem o conhecimento por parte desta. A realidade é que não foi junto aos autos qualquer documento comprovativo do envio do estudo de mercado por parte da “B” para a Impugnante, seja um email, carta ou qualquer outra forma. Também a prova testemunhal em causa não foi concludente quando ao estudo em causa. Por outro lado, quanto aos projetos de engenharia juntos aos autos, não se verifica qualquer correspondência entre os mesmos e as faturas emitidas, pois os mesmos são apenas sequências de números e letras, não fazendo qualquer referência à empresa que os elaborou e não sendo feita qualquer referência ao mesmo nos descritivos nas faturas. A prova testemunhal efetuada, nomeadamente pela Sra. "EE", referiu que quem fornecia os programas era a “B”, instalando-os nas máquinas, mas não conseguiu identificar quais os programas, nem se eram enviados via email ou outra forma de identificação dos mesmos. Não foi também efetuado o matching entre os programas instalados nas máquinas da Impugnante e os clientes finais para os quais foram efetuados os projetos respetivos. Quanto ao projeto de arquitetura junto aos autos, o mesmo diz respeito a ampliação das instalações da Impugnante, não tendo sido juntos aos autos comprovativos das deslocações ao local por parte da “B” para elaboração do projeto, nem efetuada prova testemunhal que o comprovasse. Mais ainda se constatou que não foi junta aos autos qualquer troca de emails ou documentação escrita comprovativa dos vários pedidos de prestação de serviços ou de respostas aos mesmos por parte da “B”, bem como outras comunicações, nomeadamente de possíveis deslocações à sede da impugnante com vista à implementação nas respetivas máquinas ou entrega dos projetos, mas apenas os “documentos” finais. De tudo o referido anteriormente se pode concluir que a Autoridade Tributária efetuou a prova da desconsideração da veracidade da contabilidade da impugnante não tendo a impugnante junto prova suficiente da efetiva realização das prestações de serviços. Em conclusão, a correção ao lucro em causa, através da desconsideração do gasto, não assenta em erro de direito e de facto, sendo por esse motivo legal a correção efetuada e improcedendo a alegação em apreço. […]” Assim, fazendo o enquadramento jurídico da presente questão, seguimos aqui o decidido no acórdão desta instância proferido no processo n.º 01426/12.2BEPRT, datado de 04.06.2020 (in www.dgsi.pt), que subscrevemos: “[…] O n.º 1 do art.º 75.º do Lei Geral Tributária (LGT) determina que “Presumem-se verdadeiras de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando este tiverem organizada de acordo com a lei comercial e fiscal.” Assim, o artigo 75.º da LGT consagra o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei fiscal e comercial. Esta presunção vincula a Administração Fiscal à realização da liquidação com base nas declarações dos contribuintes, (art.º 59.º do CPPT) sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, ao controlo dos factos declarados. Essa presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT). Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a Administração Tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos ou, quando tal não seja possível, a métodos indiretos. No entanto, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte. E como a doutrina e a jurisprudência têm afirmado, “actuando a Administração Tributária no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional, designadamente a prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções técnicas que suportam essa liquidação”. – cf., por todos, acórdão do STA de 28/9/2011, Processo 0494/11. […]”. A primeira questão que urge decidir diz respeito a saber se tal como decidido na sentença recorrida, a Administração Tributária reuniu indícios credíveis, sérios e fundados que os gastos desconsiderados não se traduziam em custos necessários para garantir os rendimentos sujeitos a IRC. Ora, quanto a esta questão, temos que considerar que atendendo aos indícios colhidos pela inspeção tributária e que vão enunciados no relatório que fundamenta as presentes liquidações de IRC, julgamos que tais indícios apresentam a supra citada tríplice caraterística. Mais: para além indiciações enunciadas na sentença recorrida, teremos que acrescentar que o tratamento contabilístico feito pela segunda Recorrente (Impugnante) quanto à sua relação com a «“B”» é bastante anómalo, uma vez que, como se diz no relatório inspetivo aqui em questão, temos um fornecedor que é devedor de uma elevada prestação financeira a um cliente, sem que se encontre solidamente demonstrada a origem de tal inversão de papeis. Ainda para mais, tal circunstância adensa a dúvida quando tal inversão resultaria de uma suposta cedência de um crédito de um terceiro sobre a segunda Recorrente (Impugnante), do qual seria inicialmente detentor um sócio desta última e que, ainda para mais, possuía uma posição dominante na «“B”». Ora, sequer a apontada cedência do crédito foi suficientemente demonstrada nos presentes autos. Assim, à semelhança do decidido na sentença recorrida, consideramos que a AT recolheu indícios credíveis, sérios e fundados que os custos desconsiderados não se traduziam em gastos necessários para garantir os rendimentos sujeitos a IRC, nos termos do art.º 23.º do CIRC, tendo cumprido o ónus da prova que sobre si pendia no sentido de por em causa a veracidade da contabilidade da segunda Recorrente (Impugnante). A segunda questão que se coloca é se, já em sede judicial, a ora segunda Apelante conseguiu por em causa os aludidos indícios. Ora, como resulta dos factos dados por provados na sentença recorrida e que aqui se encontram estabilizados, apenas podemos concluir que nenhuma prova foi trazida que corroborassem a versão da segunda Apelante, ou seja, que os ditos gastos haviam efetivamente ocorrido em benefício do seu rendimento. Desta circunstância não emergiu e/ou não emerge qualquer dúvida para o julgador que o force a percorrer o caminho delimitado pelo regime previsto no n.º 1 do art.º 100.º do CPPT, ao contrário do que é invocado pela segunda Recorrente. Efetivamente, estatui o n.º 1 do art.º 100.º do CPPT que: “sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado.” Ora, daqui decorre que o âmbito da aplicação da referida norma resulta especificamente que só nos casos em que o julgador, confrontado com a prova produzida, se veja numa situação de dúvida fundada sobre a existência e quantificação do facto tributário, só então é que deverá direcionar a sua decisão no sentido da anulação do ato tributário. Ora, como já aludimos, não é esta a situação aqui presente. Por isso, quanto às apontadas questões terá que improceder o recurso ora movido pela "A..., S.A." (segunda Recorrente). * Estabelece o artigo 6.º, n.º 7 do RCP que nas causas de valor superior a € 275.000,00, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, exceto se o Juiz de forma fundamentada dispensar o respetivo pagamento, se a especificidade da situação o justificar, atendendo nomeadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes. A dispensa do remanescente da taxa de justiça prevista na aludida norma legal depende, assim, da verificação de dois requisitos cumulativos: a singeleza da questão analisada e o comportamento das partes facilitador e simplificador do labor desenvolvido pelo Tribunal. Na situação presente, consideramos que se justifica a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida de acordo com o disposto no n.º 7 do artigo 6.º do RCP, uma vez que as questões a decidir no recurso não se afiguraram como sendo particularmente complexas, a conduta processual das partes não é merecedora de qualquer censura ou reparo e o concreto valor das custas a suportar pela parte vencida se afiguraria desproporcionado relativamente ao serviço público ora prestado, isto caso não se admitisse a referida dispensa ora concedida. -/- Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, apresenta-se o seguinte sumário: I – O artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS, sistematicamente inserido na categoria de incrementos patrimoniais (normas de incidência real), consagra como rendimentos de capitais sujeitos a incidência de IRS os lucros, incluindo os adiantamentos por conta de lucros, colocados à disposição dos respetivos associados. II - Para se preencher a estatuição legal do conceito de adiantamento por conta dos lucros previsto no artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS é necessário que fique demonstrado que as entregas feitas aos sócios ocorreram por conexão com os lucros obtidos pela sociedade. III - De acordo com o artigo 75º, nº 1 da LGT, as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, presumem-se verdadeiras. Esta presunção finda designadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT). III - Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a administração tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos. IV - Porém, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte. V - É pacificamente aceite quer na doutrina, quer na jurisprudência, que compete à Administração Fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua atuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), cabendo, em contrapartida, ao administrado/contribuinte apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, entendimento que corresponde à regra geral artigo 342.º do Código Civil de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos, regra essa que foi acolhida no artigo 74.º, n.º 1 da LGT. -/- V – Dispositivo Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento a ambos os recursos, mantendo-se a sentença recorrida. Custas pela primeira Recorrente (RFP) e pela segunda Recorrente ("A..., S.A."), por vencidas, na proporção do respetivo decaimento que se fixa em 41 % para a primeira Apelante e em 59 % para a segunda Apelante, em ambas as instâncias, com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça. |