Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00069/10.0BECBR-A
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/19/2011
Relator:José Luís Paulo Escudeiro
Descritores:INCIDENTE DE DERROGAÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO
INTERVENÇÃO DO TRIBUNAL SUPERIOR NA DECISÃO DO INCIDENTE DE DERROGAÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO.
RESPECTIVOS REQUISITOS
Sumário:I- Em matéria de segredo profissional, os ministros de religião ou confissão religiosa, os advogados, os médicos, os jornalistas, os membros de instituições de crédito e as demais pessoas a quem a lei permitir ou impuser que guardem segredo profissional podem escusar-se a depor sobre os factos abrangidos por aquele segredo – Cfr. artº135º do CPP;
II- Havendo dúvidas fundadas sobre a legitimidade da escusa, a autoridade judiciária perante a qual o incidente se tiver suscitado procede às averiguações necessárias. Se, após estas, concluir pela ilegitimidade da escusa, ordena, ou requer ao tribunal que ordene, a prestação do depoimento – Cfr. nº 2 do mesmo comando jurídico;
III- O tribunal superior àquele onde o incidente se tiver suscitado, ou, no caso de o incidente se ter suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça, o plenário das secções criminais, pode decidir da prestação de testemunho com quebra do segredo profissional sempre que esta se mostre justificada face às normas e princípios aplicáveis da lei penal, nomeadamente face ao princípio da prevalência do interesse preponderante – Cfr. nº 3, ainda do artº 135º do CPP;
IV- Do mesmo modo, no âmbito do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeira (RGICSF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31.DEZ, se contêm regras que definem o dever de segredo bancário, os seus destinatários, as suas excepções e as sanções pela sua violação, estando abrangidos pelo segredo bancário os factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações destas com os seus clientes, designadamente, os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias;
V- No entanto, porque o segredo bancário não constitui um fim em si mesmo nem sequer um valor absoluto, a lei prevê diversas situações em que o mesmo pode ser derrogado em face de outros interesses públicos ou privados.
VI- O RGICSF, prevê as seguintes excepções ao dever de sigilo:
– Autorização do cliente;
– No âmbito dos poderes de supervisão e de controlo dos riscos;
– Nos termos da lei penal e de processo penal ; e
– Quando exista outra disposição legal que expressamente limite o dever de segredo.
VII- Por outro lado, conforme resulta do enunciado no art. 519.º-3-c) do CPC, é legítima a recusa de colaboração com o tribunal se a obediência importar violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado, mas, como logo se ressalva no mesmo preceito legal, sem prejuízo do disposto no n.º 4, que preceitua que uma vez deduzida escusa com fundamento na alínea c) do número anterior, é aplicável, com as adaptações impostas pela natureza dos interesses em causa, o disposto no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de sigilo invocado.
VIII- E de acordo com o disposto nos artºs 135.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 182º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal (CPP), importa considerar os seguintes aspectos:
– O primeiro, relativo à legitimidade da escusa com base no segredo profissional, sendo ilegítima a escusa, por a informação não estar abrangida pelo segredo, ou por existir consentimento do titular da conta, o próprio tribunal em que a escusa for invocada, depois de ultrapassadas eventuais dúvidas sobre a ilegitimidade da escusa, ordena a prestação da informação, nos termos do n.º 2 do art. 135.º do Código de Processo Penal; e
– O segundo, respeitante à justificação da escusa, em termos de a afirmar ou a declarar não subsistente, sendo que, nesta última hipótese, o tribunal superior (o tribunal competente para o efeito) ordena que se prestem as informações pretendidas, com quebra do segredo profissional.
IX- No caso de uma instituição de crédito (rectius, dos funcionários ou administradores dessa instituição) se escusar a prestar uma informação que lhe foi solicitada pelo tribunal administrativo e fiscal no âmbito de um processo de impugnação judicial com fundamento no segredo bancário a que está obrigada (cf. art. 78.º, n.º 2, do RGICSF) – o segredo bancário constitui uma modalidade de sigilo profissional - deve o juiz desse tribunal, antes do mais, decidir se tal escusa é ou não legítima, ou seja, se estão ou não verificados os pressupostos que permitem àquela instituição escusar-se legalmente a prestar tal informação sendo que, somente, no caso de decidir que a escusa é legítima e está justificada deverá suscitar a intervenção do tribunal superior no incidente de dispensa do segredo bancário (Cfr. artºs 135.º, n.ºs 2 e 3, do CPP, 519º, nº 4 do CPC ex vi do art. 2.º, alínea e) do CPPT).
X- Tendo sido proferida decisão pelo tribunal a quo, nos termos da qual julgou as recusas das instituições bancárias legítimas e justificadas, ao abrigo do dever de sigilo bancário, cumpre ao Tribunal Superior decidir da quebra do sigilo bancário, de acordo com a prevalência dos interesses preponderantes.
XI- Tendo-se decidido, no tribunal a quo, pela legitimidade e pela justificação das recusas das identificadas instituições bancárias, uma eventual quebra do sigilo bancário a decidir por este TCAN, a justificar a intervenção do tribunal superior no incidente de dispensa do segredo bancário, passaria pelo entendimento de que os elementos bancários, em causa, se mostrariam indispensáveis à descoberta material dos factos em questão na Impugnação judicial deduzida, e nessa medida interessariam à realização da justiça, devendo sobrepor-se ao interesse particular dos clientes das instituições bancárias, tais como a reserva à vida privada bem como das relações de confiança que se estabelecem entre as entidades bancárias e os respectivos clientes, de acordo com o princípio da prevalência dos interesses preponderantes.
XII- Considerando que, nos presentes autos de impugnação de liquidações de IRC, em que a fiscalização tributária concluiu que a maior parte da facturação se configurava como fictícia por não corresponder a efectivas operações comerciais e tendo a Impugnante solicitado a remessa de extractos e de cheques bancários de que possa depreender-se, eventualmente, pela realidade dessas operações materiais, os elementos bancários, em questão, mostram-se indispensáveis à descoberta material dos factos, objecto da impugnação judicial, e nessa medida interessarem à realização da justiça, devendo sobrepôr-se aos interesses particulares acima assinalados.
XIII- E estabelecendo-se uma ponderação de interesses, ente os interesses públicos e privados, em presença, segundo critérios de proporcionalidade, decidindo-se no sentido da prevalência dos primeiros em detrimentos dos segundos, e, em consequência, dever determinar-se uma quebra ou o levantamento do sigilo bancário.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Tributário do TCAN:
I- RELATÓRIO
No processo de impugnação judicial supra identificado, o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra solicitou a diversas instituições bancárias a entrega de documentos e a prestação de informações bancárias (remessa de extractos bancários e cópias de cheques), a requerimento da Impugnante.
Na sequência da escusa dessas instituições, fundamentada no dever de sigilo a que estão obrigadas, o Juiz remeteu a este Tribunal Central Administrativo Norte certidão de diversas peças processuais extraída daquele processo de impugnação judicial, pedindo a resolução do incidente, “nos termos e para os efeitos do disposto nos nºs 2 e 3 do 135.º do CPP.”.
O Mº Pº emitiu parecer, pronunciando-se no sentido da não intervenção deste TCAN, por entender que o tribunal a quo se pronunciou no sentido da ilegitimidade da escusa.
Colhidos os vistos legais, o processo é submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento.
II – QUESTÕES A DECIDIR NO RECURSO
Os requisitos da intervenção do Tribunal Superior na decisão do Incidente de derrogação do sigilo bancário.
III – FUNDAMENTAÇÃO
III-1. Matéria de facto
Com interesse para a decisão do presente Incidente de intervenção do Tribunal Superior na decisão do Incidente de derrogação do sigilo bancário, mostram-se provados os seguintes factos:
a) Na Impugnação judicial, em referência, instaurada contra os actos de liquidação de IRC dos exercícios respeitantes aos anos de 2003, 2004 e 2005, no montante global E 279 214,53 e, na génese das quais, está o relatório de 10 de Julho de 2007 elaborado na sequência da acção inspectiva realizada ao abrigo da ordem de serviço n° 0I200700699, peticiona-se a anulação dos actos tributários impugnados invocando, para o efeito, a falta de demonstração de factos susceptíveis de ilidir a presunção de verdade das operações constantes da escrita do contribuinte e respectivos documentos de suporte, quanto às correcções técnicas; a falta de idoneidade do método de quantificação utilizado pela Administração Fiscal porquanto deviam ter sido utilizados métodos indirectos de determinação da matéria colectável e não somente correcções aritméticas; a inobservância do dever de fundamentação, traduzido na ilegalidade do vício de forma; e o erro nos pressupostos de facto e de direito do acto tributário, quanto às correcções por métodos indirectos;
b) No seu requerimento de prova, a Impugnante requereu que, relativamente, ao período temporal compreendido entre 01.04.2003 a 31.12.2005, fossem remetidos todos os extractos bancários da sociedade “L…, Ldª”, com referência a todas as contas da sua titularidade, isto quanto, à CCAM de Coimbra; ao Millenium BCP, a remessa de todos os extractos bancários daquela sociedade, com à referência a todas as contas da sua titularidade, no período temporal de 01.09.2003 a 31.12.2005 e, finalmente, que todas as instituições remetessem as cópias dos cheques melhor indicados no documento A. junto aos autos;
c) Por despacho, de fls. 147, o Tribunal determinou o cumprimento do requerido;
d) Invocando o disposto no disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 135° do C.P.P. aplicável ex vi artigo 519°., n°. 4 do Código de Processo Civil, nos presentes autos, as instituições bancárias "Millenium - BCP" e "CGD, Caixa Geral de Depósitos, S.A." recusaram-se ao abrigo do dever de segredo bancário a cumprir com o determinado, no despacho de fls. 147; e
e) Por decisão de fls. 237 e segs., o tribunal a quo julgou as recusas das instituições bancárias legítimas e justificadas, ao abrigo do dever de sigilo bancário.
III-2. Matéria de direito
Como atrás se deixou dito, impõe-se indagar da verificação no caso dos autos, dos requisitos da intervenção do Tribunal Superior na decisão do Incidente de derrogação do sigilo bancário.
Em matéria de sigilo bancário dispõem os artºs 519º e 618º do CPC e 182º e 135º do CPP, o seguinte:
Artº 519.º
(Dever de cooperação para a descoberta da verdade)
1. Todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspecções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os actos que forem determinados.
2. Aqueles que recusem a colaboração devida serão condenados em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis; se o recusante for parte, o tribunal apreciará livremente o valor da recusa para efeitos probatórios, sem prejuízo da inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no nº 2 do art. 344.º do Código Civil.
3. A recusa é, porém, legítima se a obediência importar:
a) Violação da integridade física ou moral das pessoas;
b) Intromissão na vida privada ou familiar, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações;
c) Violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado, sem prejuízo do disposto no nº 4.
4. Deduzida escusa com fundamento na alíena c) do número anterior, é aplicável, com as adaptações impostas pela natureza dos interesses em causa, o disposto no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de sigilo invocado.
Artº 618.º
(Recusa legítima a depor)
(…)
3. Devem escusar-se a depor os que estejam adstritos ao segredo profissional, ao segredo de funcionários públicos e ao segredo de Estado, relativamente aos factos abrangidos pelo sigilo, aplicando-se neste caso o disposto no nº 4 do artigo 519.º.
Arº 182.º
(Segredo profissional ou de funcionário e segredo de Estado)
1 - As pessoas indicadas nos artigos 135.º a 137.º apresentam à autoridade judiciária, quando esta o ordenar, os documentos ou quaisquer objectos que tiverem na sua posse e devam ser apreendidos, salvo se invocarem, por escrito, segredo profissional ou de funcionário ou segredo de Estado.
2 - Se a recusa se fundar em segredo profissional ou de funcionário, é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 135.º, n.º 2 e 3, e 136.º, n.º 2.
3 - Se a recusa se fundar em segredo de Estado, é correspondentemente aplicável o disposto no artigo 137.º, n.º 3.
Artº 135.º
(Segredo profissional)
1 - Os ministros de religião ou confissão religiosa, os advogados, os médicos, os jornalistas, os membros de instituições de crédito e as demais pessoas a quem a lei permitir ou impuser que guardem segredo profissional podem escusar-se a depor sobre os factos abrangidos por aquele segredo.
2 - Havendo dúvidas fundadas sobre a legitimidade da escusa, a autoridade judiciária perante a qual o incidente se tiver suscitado procede às averiguações necessárias. Se, após estas, concluir pela ilegitimidade da escusa, ordena, ou requer ao tribunal que ordene, a prestação do depoimento.
3 - O tribunal superior àquele onde o incidente se tiver suscitado, ou, no caso de o incidente se ter suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça, o plenário das secções criminais, pode decidir da prestação de testemunho com quebra do segredo profissional sempre que esta se mostre justificada face às normas e princípios aplicáveis da lei penal, nomeadamente face ao princípio da prevalência do interesse preponderante. A intervenção é suscitada pelo juiz, oficiosamente ou a requerimento.
4 - O disposto no número anterior não se aplica ao segredo religioso.
5 - Nos casos previstos nos n.ºs 2 e 3, a decisão da autoridade judiciária ou do tribunal é tomada ouvido o organismo representativo da profissão relacionada com o segredo profissional em causa, nos termos e com os efeitos previstos na legislação que a esse organismo seja aplicável.
Por seu lado, o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeira (RGICSF) – Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro – sob o título VI (“regras de conduta”), capítulo II (“segredo profissional”), prevê nos arts. 78.º a 84.º as regras que definem o dever de segredo, os seus destinatários, as suas excepções e as sanções pela sua violação, estando abrangidos pelo segredo bancário os factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações destas com os seus clientes (art. 78.º, n.º 1), designadamente, os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias (art. 78.º, n.º 2).
No entanto, porque o segredo bancário não constitui um fim em si mesmo nem sequer um valor absoluto, a lei prevê diversas situações em que o mesmo pode ser derrogado em face de outros interesses públicos ou privados.
Desse modo, o art. 79.º do RGICSF, prevê as seguintes excepções ao dever de sigilo:
– Autorização do cliente (n.º 1);
– No âmbito dos poderes de supervisão e de controlo dos riscos (n.º 2, alíneas a) a c));
– Nos termos da lei penal e de processo penal (n.º 2, alínea d)); e
– Quando exista outra disposição legal que expressamente limite o dever de segredo (n.º 2, alínea e)).
Ora, conforme resulta do enunciado no art. 519.º, n.º 3, alínea c), do CPC, é legítima a recusa de colaboração com o tribunal se a obediência importar violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado, mas, como logo se ressalva no mesmo preceito legal, sem prejuízo do disposto no n.º 4, que preceitua que uma vez deduzida escusa com fundamento na alínea c) do número anterior, é aplicável, com as adaptações impostas pela natureza dos interesses em causa, o disposto no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de sigilo invocado.
E de acordo com o disposto nos artºs 135.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 182º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal (CPP), importa considerar dois aspectos:
– O primeiro, relativo à legitimidade da escusa com base no segredo profissional, sendo ilegítima a escusa, por a informação não estar abrangida pelo segredo, ou por existir consentimento do titular da conta, o próprio tribunal em que a escusa for invocada, depois de ultrapassadas eventuais dúvidas sobre a ilegitimidade da escusa, ordena a prestação da informação, nos termos do n.º 2 do art. 135.º do Código de Processo Penal; e
– O segundo, respeitante à justificação da escusa, em termos de a afirmar ou a declarar não subsistente, sendo que, nesta última hipótese, o tribunal superior (o tribunal competente para o efeito) ordena que se prestem as informações pretendidas, com quebra do segredo profissional (Cfr. neste sentido PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, in Comentário do Código de Processo Penal, à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2ª edição actualizada, pp. 360.).
Ou seja, no caso de uma instituição de crédito (rectius, dos funcionários ou administradores dessa instituição) se escusar a prestar uma informação que lhe foi solicitada pelo tribunal administrativo e fiscal no âmbito de um processo de impugnação judicial com fundamento no segredo bancário a que está obrigada (cf. art. 78.º, n.º 2, do RGICSF) – o segredo bancário constitui uma modalidade de sigilo profissional - deve o juiz desse tribunal, antes do mais, decidir se tal escusa é ou não legítima, ou seja, se estão ou não verificados os pressupostos que permitem àquela instituição escusar-se legalmente a prestar tal informação sendo que, somente, no caso de decidir que a escusa é legítima e está justificada deverá suscitar a intervenção do tribunal superior no incidente de dispensa do segredo bancário (Cfr. artºs 135.º, n.ºs 2 e 3, do CPP, 519º, nº 4 do CPC ex vi do art. 2.º, alínea e) do CPPT).
Ora, no caso sub judice, foi proferida decisão pelo tribunal a quo, nos termos da qual julgou as recusas das instituições bancárias legítimas e justificadas, ao abrigo do dever de sigilo bancário.
Assim, julgadas as recusas das instituições bancárias legítimas e justificadas, ao abrigo do dever de sigilo bancário, cumpre a este Tribunal Superior decidir da quebra do sigilo bancário, de acordo com a prevalência dos interesses preponderantes.
No caso dos autos, a Impugnação judicial, em referência, instaurada contra os actos de liquidação de IRC dos exercícios respeitantes aos anos de 2003, 2004 e 2005, no montante global E 279 214,53 e, na génese das quais, está o relatório de 10 de Julho de 2007 elaborado na sequência da acção inspectiva realizada ao abrigo da ordem de serviço n° 0I200700699, tem como pedido a anulação dos actos tributários impugnados e como causa de pedir a falta de demonstração de factos susceptíveis de ilidir a presunção de verdade das operações constantes da escrita do contribuinte e respectivos documentos de suporte, quanto às correcções técnicas; a falta de idoneidade do método de quantificação utilizado pela Administração Fiscal porquanto deviam ter sido utilizados métodos indirectos de determinação da matéria colectável e não somente correcções aritméticas; a inobservância do dever de fundamentação, traduzido na ilegalidade do vício de forma; e o erro nos pressupostos de facto e de direito do acto tributário, quanto às correcções por métodos indirectos.
Nessa Impugnação judicial, no requerimento de prova constante da PI, a Impugnante requereu que, relativamente, ao período temporal compreendido entre 01.04.2003 a 31.12.2005, fossem remetidos todos os extractos bancários da sociedade “L…, Ldª”, com referência a todas as contas da sua titularidade, isto quanto, à CCAM de Coimbra; ao Millenium BCP, a remessa de todos os extractos bancários da mesma sociedade, com à referência a todas as contas da sua titularidade, no período temporal de 01.09.2003 a 31.12.2005 e, finalmente, que todas as instituições remetessem as cópias dos cheques melhor indicados no documento A. junto aos autos.
Tendo-se decidido, no tribunal a quo, pela legitimidade e pela justificação das recusas das identificadas instituições bancárias, uma eventual quebra do sigilo bancário a decidir por este TCAN, a justificar a intervenção do tribunal superior no incidente de dispensa do segredo bancário, passaria pelo entendimento de que os elementos bancários, em causa, se mostrariam indispensáveis à descoberta material dos factos em questão na Impugnação judicial deduzida, e nessa medida interessariam à realização da justiça, devendo sobrepor-se ao interesse particular dos clientes das instituições bancárias, tais como a reserva à vida privada bem como das relações de confiança que se estabelecem entre as entidades bancárias e os respectivos clientes, de acordo com o princípio da prevalência dos interesses preponderantes.
Ora, considerando que, nos presentes autos de impugnação de liquidações de IRC, em que a fiscalização tributária concluiu que a maior parte da facturação se configurava como fictícia por não corresponder a efectivas operações comerciais e tendo a Impugnante solicitado a remessa de extractos e de cheques bancários de que possa depreender-se, eventualmente, pela realidade dessas operações materiais, parece que os elementos bancários, em questão, se mostram indispensáveis à descoberta material dos factos, objecto da impugnação judicial, e nessa medida interessarem à realização da justiça, devendo sobrepôr-se aos interesses particulares acima assinalados.
Assim sendo, estabelecendo-se uma ponderação de interesses, ente os interesses públicos e privados, em presença, segundo critérios de proporcionalidade, decide-se no sentido da prevalência dos primeiros em detrimentos dos segundos, e, em consequência, dever determinar-se uma quebra ou o levantamento do sigilo bancário.
IV- CONCLUSÃO
Termos em que acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TACN em determinar o levantamento do sigilo bancário.
Sem custas.
Porto, 19 de Maio de 2011
José Luís Paulo Escudeiro
Francisco António Pedrosa de Areal Rothes
Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro