Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01311/12.8BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/30/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Joaquim Cruzeiro
Descritores:URBANISMO; MURO DE VEDAÇÃO; DEMOLIÇÃO
Sumário: I - A partir do momento em que foram realizadas obras sem licença, num muro de vedação frontal, essa obra, para poder ser legalizada, tem que cumprir com as normas regulamentares aplicáveis ao caso concreto, não podendo, nomeadamente, apresentar uma descontinuidade altimétrica relativamente a outros muros que lhe são contíguos.
II- A ordem de demolição de um edificado pode ser evitada se for possível proceder ao seu licenciamento. Estamos perante o afloramento do princípio da proporcionalidade uma vez que se um edifício pode ser legalizado não faz sentido proceder à sua demolição para depois se poder solicitar a construção de um novo nas mesmas circunstâncias.
III -No caso em apreço nos autos verifica-se que a entidade recorrida apenas vem referir que o muro de vedação frontal deve ser demolido até à altura de 1,20m e, quanto ao muro de vedação lateral, poderá ser dispensado o seu licenciamento, desde que este não exceda 1, 80m. Ou seja, não vem a entidade recorrida solicitar pura e simplesmente que seja demolida toda a construção edificada. Apenas vem referir que a mesma seja colocada dentro das normas legais aplicáveis. Assim sendo, não se vê como tal decisão possa violar o princípio da proporcionalidade nas suas mais diversas vertentes. É uma decisão adequada e equilibrada.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:FPAPN
Recorrido 1:Município de Vila Nova de Gaia
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu no sentido de ser confirmada a sentença recorrida.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1 – RELATÓRIO
FPAPN vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 21 de Setembro de 2015, que julgou improcedente a acção interposta contra o Município de Vila Nova de Gaia e onde era requerido:
“1. A declaração de invalidade da ordem de demolição referente à diminuição do muro frontal (incluindo pilares e portão) para que a mesma (altura) não ultrapasse 1.20 metro, convertendo a vedação numa obra de escassa relevância urbanística, nos termos do art. 6°-A, n.21, al. b), do Decreto-Lei 555/99, de 16/12, alterado pela legislação subsequente;
2. Declaração de invalidade da ordem de demolição (remoção) da rampa de acesso, que altera o perfil transversal do arruamento, tornando-se obstáculo e elemento perturbador para a circulação pedonal;
3. Declaração de invalidado da ordem relativamente ao muro de vedação interior, considerando a alteração legislativa, entretanto havida, poder-se-á dispensar licenciamento, caso a sua altura não ultrapasse 1.80 metro, cumprindo dessa forma o articulado na al. c), nº 1, do art. 67º do Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas de Vila Nova de Gaia, publicado a 22 de Julho de 2011”.

Em alegações a recorrente concluiu assim:

A) O muro frontal tem ano de construção anterior a 1951.

B) A propriedade onde este se insere, chegou por sucessão à actual proprietária.

C) O referido muro já possuía a presente configuração.

D) A propriedade sempre teve o acesso à rua naquele local, conforme as plantas topográficas presentes nos autos.

E) Como se depreende de toda a prova apresentada pela Autora, e tida por assente no ponto 16 da douta sentença o referido muro não foi construído, mas reparado.

F) Como muito bem refere a sentença, a Autora apenas procedeu à reparação do referido muro.

G) A reparação foi provocada pela actuação da Junta de Freguesia, quando procedeu à pavimentação do passeio.

H) Como se pode constatar, a construção do passeio pela Junta de Freguesia, não obedeceu à legislação vigente para a construção dos passeios.

I) Com a referida construção do passeio, a Junta de Freguesia destruiu/danificou em diversos pontos o muro da Autora.

J) Não pode a Autora atender às ordens emanadas pelo Município porque:
1. O muro é anterior a 1951,
2. O muro já existia, não foi construído no ano do embargo,
3. O Município refere que o muro tal qual se encontra não é licenciável, quando na mesma rua, a escassos metros licenciou muros com mais altura,
4. Não compreende Autora o porquê de impor a demolição para 1,20m, quando este muro já existia e a norma legal que a administração invoca para fundamentar tal imposição diz respeito a muros a construir,
5. O muro da Autora é pré-existente aos muros confinantes.
6. A Autora, não compreende nem aceita que o processo de contra-ordenação que o referido procedimento acarretou, foi arquivado sem qualquer sanção, e o Município lhe imponha cumprimentos desproporcionados.

K) O muro lateral foi construído de acordo com o processo de licenciamento a que foi sujeito, conforme aos autos.

L) Não se verifica qualquer desconformidade na construção desse muro lateral.

M) O Município alega que a construção do muro lateral foi feita com desconformidades relativamente ao projecto de construção.

N) O Município ignora que desconformidades possam existir na construção do muro lateral.

O) O Município não identifica qualquer desconformidade na construção desse muro lateral.

P) O Município ao não identificar qualquer desconformidade na construção do muro lateral, impede a Autora de se defender convenientemente.

Q) O Muro lateral já possui licenciamento, não carece por isso de obedecer à imposição que pretende o Município de novo licenciamento.

R) A autora não construiu nenhuma rampa de acesso à sua propriedade.

S) A propriedade sempre teve acesso com aquela configuração naquele local.

T) Pelo que a remoção da rampa existente, impede o acesso à propriedade.

U) Padece assim a actuação do Réu de vários vícios.

V) Vícios esses que ofendem princípios gerais de direito administrativo, havendo também uma clara falta de fundamentação do acto administrativo e aplicação errada das normas invocadas pelo Réu, havendo ainda violação de lei por erro nos pressupostos de facto.

W) Assim, viola o princípio da proporcionalidade plasmado no art. 5º CPA, isto porque a actuação da administração quando colide com as posições jurídicas dos administrados exige que a decisão por ela tomada deverá ser adequada, necessária e proporcional.

X) Será a actuação da administração adequada quando a lesão das posições jurídicas dos administrados tem de revelar-se apta à prossecução do interesse público visado, ou seja, deverá observar o princípio da adequação.

Y) Será essa mesma actuação necessária quando a lesão das posições jurídicas dos administrados se mostrar exigível, ou seja, não é possível satisfazer o interesse público por outro meio, deverá observar o princípio da necessidade.

Z) Terá que actuação da administração ser proporcional, ou seja, a lesão sofrida pelos administrados deve ser proporcional e justa em relação ao benefício alcançado para o interesse público, devendo assim a administração atender à proporcionalidade na relação custo/benefício.

AA) Existe também a violação do princípio da igualdade, isto porque, este princípio exige o tratamento igual em situações iguais, mas impõe também que seja tratado desigualmente aquilo que é jurídico ou materialmente desigual.

BB) Observando o disposto no art. 124º CPA há uma ostensiva violação do dever de fundamentação.

CC) Sendo este um importante sustentáculo da legalidade administrativa e instrumento fundamental da garantia contenciosa, sendo também elemento fundamental da interpretação do acto administrativo, a sua não observação traduz uma clara violação das garantias constitucionais nomeadamente do plasmado no art. 268º n.º 3 da CRP.

DD) Esta garantia constitucional consagra o dever de fundamentação de todos os actos administrativos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

EE) Por se revelar um dever da administração consagrado na lei fundamental, autores como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA apontam no sentido que a falta de fundamentação do acto irá cair na hipótese do art 133º n.º 2 al. d) do CPA, implicando assim a nulidade do acto administrativo, isto por força da dimensão “subjectivo-garantístico” da sua protecção constitucional, isto porque só se exige que sejam fundamentados os actos que lesem direitos ou interesses legalmente protegidos.

FF) Mas mesmo que assim não se entenda, a falta de fundamentação, obscuridade, incongruência, ou insuficiência da mesma será sempre gerador de anulabilidade do acto, nos termos do art. 135º CPA.

GG) Verifica-se, in casu, a violação ostensiva do disposto no art. 125.º do CPA, isto porque para dar cumprimento à exigência de fundamentação não basta que o autor do acto determine e pondere factos e factores jurídico-administrativos em presença, à luz dos interesses que no caso caiba realizar, é também necessário que revele externamente os termos, a sequência lógica, dessa determinação e ponderação.

HH) Quanto ao principio da legalidade previsto no art. 3º do CPA, este encontra-se violado, porque o Réu ao determinar que a Autora diminua a altura do muro de vedação frontal, fá-lo por referência e determinação da norma constante do art. 6º–A, n.º 1, al. b) do DL 555/99 de 16/12, mas tal norma é de aplicação a muros que não confinem com a via pública.

II) Assim sendo, não entende nem poderá entender a Autora a pretensão/decisão do Réu.

JJ) Pelo que, a administração actua em completa desobediência à lei e ao direito, gerando assim a invalidade do acto.

KK) Há ainda violação da lei por erro nos pressupostos de facto, se não veja-se a situação nos autos;

LL) O Réu identifica a situação real (ou de facto) ocorrida, como sendo uma construção de muro, subsume-a na previsão legal e tira daí a consequência, mas tal não sucedeu pelos motivos supra descritos, visto o muro já existir e ter sofrido apenas uma reparação.

MM) Também quando o Réu ao fazer uso do seu poder discricionário quanto à escolha da medida adoptada, não refere qual a motivação pelo qual a faz, ou seja, não expõe o processo de escolha da medida adoptada, que permita à Autora compreender quais foram os interesses e os factores (motivos) que o Réu considerou nessa opção.

NN) Existe assim uma clara ilegalidade do acto, visto que há erro de facto (o muro frontal já existia, o corpo do muro está lá todo, nada foi construído, a estrutura resistente do muro é a mesma que sempre existiu) e erro de direito (não houve qualquer construção mas sim reparação, que a ser assim considerada leva aplicação errónea da lei).

OO) Em franca violação da lei o Réu impõe o cumprimento de um acto completamente ilegal e inválido.

PP) Foi numa ostensiva violação do princípio da prossecução do interesse público (art. 266º da CRP e art. 4º do CPA) enquanto limite imanente da margem de livre decisão da Administração, que o Réu ordenou à Autora a demolição constante da notificação constante nos autos como Doc.1 da Autora.

QQ) Pelo exposto supra a ordem de demolição e o demais ordenado na notificação supra identificada, no âmbito do processo 1351/FU/2006-G... dos serviços do Réu violam as disposições legais dos artigos 3º, 4º, 5º, 123º, 124º, 125º, 133º n.º 2 al. d), e 135º todos do CPA e arts 266º e 268º nº3 da CRP.

RR) Nos termos do artigo 5.º do NCPC, e demais legislação aplicável a Autora deverá ter a sua acção julgada procedente por provada.

O Recorrido, notificado para o efeito, contra-alegou, tendo concluído:

1. Considerando que o objecto do recurso é balizado pelas conclusões apresentadas pela Recorrente, logo se apreende que nenhuma ilegalidade ou irregularidade substancial ou formal é assacada ao Aresto sob censura.
2. Por outro lado, considerando que o objecto do recurso sempre será o Acórdão recorrido e que a Recorrente somente pede a revogação das decisões contidas no acto administrativo impugnado e não peticiona a revogação do Aresto do Tribunal “a quo”, afigura-se-nos que o presente recurso não poderá ser apreciado, nem deverá proceder, desde logo, por falta de objecto do recurso.
3. Na verdade, confrontada com a decisão que lhe é desfavorável, a Recorrente vem interpor recurso do, aliás douto, Acórdão proferido pelo Tribunal “a quo” limitando-se em sede de recurso a insistir nos mesmos fundamentos já aduzidos na petição inicial para infirmar o que foi decidido em conformidade com os factos provados.
4. Não obstante a Recorrente não invocar ao longo do seu recurso qualquer erro de julgamento, ainda assim, entende que o acto impugnado deve ser anulado, por padecer dos vícios que aponta.
5. Todavia, considerando a matéria de facto dada por assente, o Acórdão sob censura esclarece de forma sábia e sustentada as razões pelas quais o acto administrativo impugnado praticado em 25 de Novembro de 2011 não padece de nenhum dos vícios que lhe são imputados.
6. Por isso, ao invés do que sustenta a Recorrente o acto impugnado está devidamente fundamentado, tanto de facto como de direito, de tal modo que a A. percebeu perfeitamente o alcance e motivação da ordem de diminuição da altura do muro frontal para 1,20m e da remoção da rampa de acesso que altera o perfil transversal do arruamento, tal como decidiu o Aresto recorrido.
7. Além disso, o Acórdão sob censura esclarece de forma clara e objectiva as razões pelas quais, na situação sub judice, o acto impugnado não viola os princípios da proporcionalidade, nem da igualdade, pelo que ao decidir como decidiu, o Tribunal “a quo” fez uma correcta interpretação e aplicação dos princípios ínsitos no artigo 5º do C.P.A.
8. Assim como fez uma correcta interpretação e aplicação do preceito constitucional consagrado no artigo 266º da C.R.P. concluindo que o despacho de 25 de Novembro de 2011, compatibiliza a defesa do interesse público com o respeito dos interesses dos cidadãos.
9. Em face do que fica dito, é patente que o Acórdão recorrido apreciou e decidiu de forma detalhada todas as questões que se impunham resolver, tendo em consideração todos os elementos de prova carreados para os autos.
10. A decisão recorrida teve em consideração todos os aspectos jurídicos da causa, assim como apreciou de forma irrepreensível e de acordo com o seu prudente critério e arbítrio todos os documentos carreados para os autos, inexistindo qualquer nulidade – que nem sequer é invocada.
11. O Acórdão sob censura apreciou e decidiu de forma justa e perfeita todas as questões que se impunham resolver.
12. Inexiste, por isso, qualquer fundamento legal para a revogação da Acórdão ora em crise, porquanto não ocorre qualquer causa que justifique a anulação daquele aresto.
13. Tendo em consideração a matéria dada como provada e a fundamentação da decisão recorrida, pode-se concluir que o Tribunal “a quo” bem andou, fazendo a correcta interpretação e enquadramento legal dos factos.
14. Em suma, é inegável que o Tribunal “a quo” decidiu como se impunha, inexistindo qualquer erro de apreciação ou de julgamento, nada havendo a censurar no Acórdão recorrido, pelo que deverá improceder o presente recurso.

O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, emitiu parecer nos termos que aqui se dão por reproduzidos, pronunciando-se no sentido de ser confirmada a sentença recorrida.

As questões suscitadas e a decidir resumem-se em determinar:

— se ocorre erro de julgamento, quando se decidiu que não ocorrem os vícios invocados ao acto impugnado.

2– FUNDAMENTAÇÃO

2.1 – DE FACTO

Na decisão sob recurso ficou assente o seguinte quadro factual:

1) A Autora é proprietária de um terreno sito na Rua Dr. FA, junto ao nº 217, Lugar de F..., Freguesia de G..., Concelho de Vila Nova de Gaia.

2) O terreno está inscrito na Conservatória do Registo Predial, sob o n.° 3... da Freguesia de G... – cfr. doc. junto com a p.i.

3) A Autora procedeu à reparação do muro frontal do terreno.

4) No mesmo ano a Autora construiu um muro de vedação na parte lateral do terreno.

5) Esse muro (numa extensão de 177 m), foi objecto de um pedido de licenciamento apresentado em 2/2/2006 nos serviços da Entidade Demandada, dando origem ao proc. nº 692/06, no qual foi emitida a licença de construção com o nº 937/06 – cfr. PA apenso.

6) De acordo com o referido pedido de licenciamento apresentado pela A. “será aplicada rede de vedação entre os pilares” “o muro é interior, não confina com qualquer via pública”– v. PA apenso.

7) Os serviços da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia (CMVNG) elaboraram a seguinte informação:

(Dá-se por reproduzido o documento constante dos factos provados da decisão de 1ª instância, nos termos do art.º 663º nº 6 CPC).

8) Posteriormente (em 17/1/2007) foi informado pelo mesmo técnico que não foi dado cumprimento ao despacho de embargo porque a obra se encontrava concluída – cfr. PA apenso.

9) Em 22/2/2008 foi emitido parecer quanto à viabilidade de legalização da obra executada da qual consta:

(Dá-se por reproduzido o documento constante dos factos provados da decisão de 1ª instância, nos termos do art.º 663º nº 6 CPC).

10) A Entidade Demandada notificou a ora Autora nos seguintes termos:
(Dá-se por reproduzido o documento constante dos factos provados da decisão de 1ª instância, nos termos do art.º 663º nº 6 CPC).

11) A Autora pronunciou-se dizendo, em síntese, que quanto ao passeio a que se refere na notificação a CMVNG foi construído pela Junta de Freguesia de G... que danificou parcialmente o muro de vedação frontal pelo que teve que proceder à reparação do dito muro tendo ficado com a mesma configuração anterior e quanto ao muro lateral que foi construído de acordo com o licenciado pelo que requereu o arquivamento do processo.
12) Em 30/9/2010 os serviços da CMVNG informaram o seguinte:
(Dá-se por reproduzido o documento constante dos factos provados da decisão de 1ª instância, nos termos do art.º 663º nº 6 CPC).

13) Por ofício datado de 15/12/2011 foi comunicado à Autora o seguinte:
(Dá-se por reproduzido o documento constante dos factos provados da decisão de 1ª instância, nos termos do art.º 663º nº 6 CPC).

14) Em 2/4/2012 os serviços da CMVNG fizeram uma vistoria ao local, tendo sido constatado que não havia sido removida a rampa na via pública e reformulada a altura do muro para 1,20m.

15) A Junta de Freguesia de G... executou obras no passeio junto ao nº 217 – doc. fls. 142 dos autos.

16) Dão-se aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais o PA apenso bem assim como todos os documentos instrutórios apresentados nestes autos pela A. e pela Entidade Demandada.

3 – DE DIREITO

Cumpre apreciar as questões suscitadas pela ora Recorrente, o que deverá ser efectuado dentro das balizas estabelecidas, para tal efeito, pela lei processual aplicável - ver artigos 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º do C.P.C., na redacção conferida pela Lei n.º 41/2013, ex vi art.º 1.º do C.P.T.A, e ainda conforme o disposto no artigo 149º do CPTA.

I- De acordo com o n.º 2 do artigo 144º do CPTA (aprovado pela Lei 15/2002, de 22 de Fevereiro), o recurso é interposto mediante requerimento que inclui ou junta a respectiva alegação e no qual são enunciados os vícios imputados à sentença (ver ainda artigo 639º do CPC). Ou seja, o recurso deverá conter os fundamentos pelos quais se pede a alteração ou a anulação da decisão judicial recorrida. No caso em apreço o recorrente, nas suas alegações de recurso e nas conclusões vem invocar os mesmos vícios ao acto impugnado, que invoca na petição inicial, mas nada diz sobre a decisão recorrida. Não refere se a decisão recorrida analisou, bem ou mal, o por si invocado. Apenas no pedido referente à sua peça recursiva vem referir que devem as decisões recorridas serem revogadas.
Apesar desta manifesta ausência de fundamentação no seu recurso, sempre se pode entender que o recorrente se vem insurgir contra a análise feita pela decisão recorrida, no que se refere aos vícios por si invocados ao acto impugnado, pelo que iremos analisar a questão nesta perspectiva.
O recorrente vem ainda invocar determinada matéria de facto parecendo pretender recorrer sobre a mesma. No entanto, de acordo com o artigo 640º do CPC, quando seja impugnada matéria de facto deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados,

b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e

c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Quanto a esta matéria o recorrente não cumpre minimamente com os requisitos referidos no artigo 640º do CPC, nada referindo quanto aos pontos concretos da matéria de facto que pretende ver alterados nem que concretos meios probatórios foram incorrectamente analisados, pelo que se rejeita a eventual impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

II- Decorre da matéria de facto dada como provada que a recorrente é proprietária de um terreno sito na Rua Dr. FA, junto ao nº 217, no lugar de F..., Freguesia de G..., Vila Nova de Gaia.
A recorrente procedeu à reparação do muro frontal do terreno. Foi notificada de que tal como se encontra executado promove uma descontinuidade altimétrica no conjunto onde se integra, uma vez que não colmata com as alturas dos muros existentes confinantes quer a norte quer a sul
Por este facto foi decidido que deveria proceder-se à diminuição da altura do muro até 1,20 m, convertendo a vedação frontal numa obra de escassa relevância urbanística.
A recorrente, contrariando esta posição, vem sustentar que o muro tem construção anterior a 1951, está como sempre esteve, e existem outros muros com a mesma altura, violando-se assim princípio a igualdade e da proporcionalidade.
Está ainda em causa a necessidade de proceder à remoção de um rampa de acesso ao local e à reposição da altura de um muro lateral do terreno em causa.
No que se refere ao erro nos pressupostos de facto, relativamente à reconstrução do muro, refere-se na decisão recorrida:

Quanto aos demais vícios invocados (“erro nos pressupostos de facto; violação de normas de direito; violação do artigo 4° do C.P.A, e do artigo 266° da C.R.P.”), o que decorre dos autos é que a Autora realizou obras no muro frontal do terreno, junto ao nº 217 da Freguesia de G..., no ano de 2006, sem licença, como melhor consta descrito no probatório, obras essas que configuram obras de alteração do edificado (veja-se a fotografia anexa à INF 13512006_9F de 22/2/2008 relativa à verificação da viabilidade de legalização de obra executada sem licença – fls. 26 do PA), que estavam sujeitas a controlo municipal, nos termos do disposto na al. c) do n° 2 do art. 4° do DL. n° 555/99, de 16 de Dezembro, ainda que, o que não se provou, o referido muro de vedação tenha sido edificado em data anterior a 1951 como defende a A.
Assim sendo, não se vislumbra que ocorra, no caso em apreço, uma qualquer situação que urge acautelar por virtude de terem sido adquiridos quaisquer direitos relativamente ao estado do muro frontal existente no local que, como resulta do probatório, foi objecto de intervenção não autorizada pelos serviços competentes e como tal não beneficia de isenção de controlo de adequação às regras urbanísticas aplicáveis.
Assim é que, se a obra executada pela Autora no muro frontal do terreno não foi objecto de qualquer pedido de licenciamento/autorização (ao contrário do que sucedeu com o muro lateral que mereceu essa diligência procedimental), então, de modo algum pode a Autora reclamar uma eventual legítima expectativa de que a sua situação fosse reconhecida pela CMVNG como se nada tivesse sido feito, tudo à luz de pretensos direitos adquiridos.
Acresce que, mesmo que a construção de muros de vedação contíguos com a via pública estejam isentos de controlo prévio, como veio a ser consagrado no Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas do MVNG, ao abrigo do disposto na al i) do n° 1 do artigo 6°-A do R.J.U.E., o certo é que, só assim sucedia se os alinhamentos definidos ou a definir para o local não possuíssem altura superior a 1,20m, o que no caso concreto não acontece.
Note-se que o despacho ora impugnado, em sintonia com essa possibilidade legal, em defesa do interesse público e no respeito dos interesses dos cidadãos (consagrado nos art.º 266.º/1 da CRP, nos termos do qual “A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos” e no art.º 4.º do CPA, que estabelece que “Compete aos órgãos administrativos prosseguir o interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.”) não ordenou a demolição do muro de vedação frontal, mas tão-só a redução da sua altura para 1,20m, incumbindo à Autora iniciar o procedimento adequado à verificação da conformidade legal da construção do dito muro, que a Autora insiste em não promover, apesar de expressamente notificada para tal (v. ofício-notificação datado de 29/4/2008, relativo ao projecto de decisão), nem mesmo quando os presentes autos estiveram suspensos a aguardar essa diligência procedimental.
De referir, desde já, que o assim decido é para se manter.
Não há dúvidas de que foram realizadas obras no muro frontal ao terreno do recorrente. Esta questão não vem colocada em crise. Estas obras foram realizadas sem licença (ver informações constantes dos n.º 7 e 8 da matéria de facto dada como provada). Após a realização dessas obras concluiu-se que o muro apresenta uma descontinuidade altimétrica relativamente a outros muros que lhe são contíguos, como resulta das informações referidas e se vê da fotografia dos autos (fotografia a fls. 26 do PA e referida na decisão recorrida). Ou seja, a partir do momento em que foram realizadas obras sem licença, o muro, ou qualquer outra obra realizada, para poder ser legalizado, tem que cumprir com as normas regulamentares aplicáveis ao caso concreto. No caso em apreço tem de estar de acordo com as cérceas dominantes, razão pela qual vem a entidade recorrida referir que o mesmo não poderá ter mais de 1,20m para se poder considerar obra de escassa relevância urbanística. De notar que o recorrente não refere que o muro não esteja mais alto que os muros contíguos ao seu. Apenas refere, conclusivamente, que a escassos metros a entidade recorrida licenciou muros com mais altura. No entanto, nas suas conclusões, não refere onde se situam tais muros, nem que muros estão em causa. Ora, não há dúvidas, com se retira da matéria de facto dada como provada, e como se verifica das fotografias referidas, de que o muro reconstruido pela recorrente representa uma descontinuidade altimétrica no conjunto onde se integra, razão pela qual não ocorre erro nos pressupostos de facto.
No que se refere à rampa de acesso e ao muro lateral refere-se na decisão recorrida:
No que tange à rampa de acesso ao terreno, a Autora sustenta que não existe nem foi construída qualquer rampa, afastando qualquer responsabilidade pela sua execução, mas o que se pode verificar (veja-se a fotografia anexa à INF 13512006_9F de 22/2/2008 relativa à verificação da viabilidade de legalização de obra executada sem licença – fls. 26 do PA) é que existe, efectivamente uma rampa de acesso ao prédio da Autora que não se apurou quem executou, ao contrário das obras realizadas no passeio, que a Junta de Freguesia de G... assumiu ter executado.
Seja como for, a rampa existe mas não foi objecto de qualquer licenciamento/controlo prévio por parte dos serviços competentes da CMVNG, pelo que, incumbindo à Autora executar esse acesso à sua propriedade, terá a Autora, para beneficiar dessa infra-estrutura de acesso à sua propriedade, de se conformar com o que foi determinado e diligenciar junto dos serviços competentes da CMVNG pela legalização da dita rampa, tal como, aliás, consta do despacho ora impugnado.
Quanto ao muro lateral, tal como sucede com o muro frontal, como já vimos, o que a CMVNG determina não é a sua demolição, mas antes a sua adequação aos termos em que foi objecto de licenciamento, podendo tal licenciamento ser dispensado, caso a sua altura não ultrapasse 1.80 metros, nos termos da alínea c), n° 1, do art° 67°, do Regulamento Municipal do Taxas e Compensações Urbanísticas de Vila Nova de Gaia.
De notar, como se refere na decisão recorrida, a entidade recorrida não vem impor a demolição do muro lateral. Apenas vem referir que deve o mesmo estar de acordo com as regras urbanísticas aplicadas ao caso concreto.
Não se vê que ocorra qualquer vício invalidante na decisão assim tomada. Aliás, quanto ao muro lateral não há uma decisão sobre a sua demolição ainda que parcial. Apenas refere que se o mesmo não tiver mais de 1,80m não será necessário licenciamento. Não ocorre qualquer decisão concreta sobre o referido muro não se podendo concluir que exista, assim, qualquer ilegalidade nesta tomada de posição. No que se refere à rampa de acesso, o que a decisão impugnada vem referir é que a mesma tem de ser removida porque é um elemento perturbador à circulação pedonal. Ora, a construções na via pública tem de obedecer às regras urbanísticas próprias não podendo o acesso a uma propriedade privada obstaculizar a circulação pedonal. Não ocorre assim qualquer erro de avaliação da situação concreta na decisão recorrida.

No que se refere à violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade refere-se na decisão recorrida:
Para a Autora teriam sido, ainda, violados os princípios da proporcionalidade e da igualdade.
Contudo, também aqui não lhe assiste razão.
De facto, no que concerne ao princípio da proporcionalidade não se consegue vislumbrar, à luz da matéria de facto dada como provada, em que medida é que a Administração o tenha violado ao praticar o acto consubstanciado no despacho ora impugnado.
É certo que a Administração está vinculada à observância do princípio da proporcionalidade, daí que na actuação administrativa tenha de existir uma proporção adequada entre os meios empregados e o fim que se pretende atingir. A proporcionalidade terá de se verificar: a) entre o fim da lei e o fim do acto; b) entre o fim de lei e os meios escolhidos para atingir tal fim; c) entre as circunstâncias de facto que dão causa ao acto e as medidas tomadas.
Deste modo, a Administração deverá escolher dentro dos diversos meios ou medidas idóneas e congruentes de que disponha aqueles que sejam menos gravosas, ou seja, que causem menos danos.
Estamos, aqui, no âmbito do denominado princípio da intervenção mínima, para que se consiga harmonizar o interesse público e os direitos dos particulares, de modo a que o princípio da proporcionalidade jogue como um factor de equilíbrio, garantia e controle dos meios e medidas.
Ora, em face dos critérios acabados de enunciar é patente não ter a Autora logrado demostrar a violação do princípio da proporcionalidade, não se podendo retirar de matéria de facto dada como provada a existência de uma qualquer conduta desproporcionada ao nível da opção consubstanciada no acto que determinou, em síntese, a diminuição da altura do muro de vedação frontal (incluindo pilares e portão) para que a mesma (altura) não ultrapasse 1.20 metros; procedesse à remoção da rampa de acesso e colocação de outra rampa em betão de acesso à propriedade de acordo com as regras definidas pelos regulamentos aplicáveis; adequação do muro de vedação interior para que não ultrapasse 1,80m, caso em que pode ser dispensado de licenciamento, sendo imperativo que a Autora tivesse logrado demonstrar uma efectiva inconsistência e desadequação entre os objectivos da Administração e os meios utilizados para o conseguir o que, manifestamente, não alcançou sendo certo que, de igual modo, por demonstrar ficou a imposição à Autora de um qualquer sacrifício inútil e imprevisto.
Por outro lado, considera a Autora que foi ofendido o princípio da igualdade.
Não lhe assiste razão.
Como é sabido, o princípio constitucional da igualdade perante a lei implica a obrigação de tratamento igual de situações de facto iguais e a um tratamento desigual de situações de facto desiguais, não autorizando o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual de situações desiguais.
Temos, assim, que tal princípio não pode ser entendido como uma barreira à determinação de soluções diferentes, quando diferentes forem as situações que o acto visa regular. O que se pretende evitar é o arbítrio, mediante uma diferenciação de tratamento injustificado, a que falte inequivocamente apoio material e objectivo.
Sucede, porém, que, face ao que resulta dos autos, não se pode concluir ter a Administração adoptado solução distinta perante a Autora, por comparação com outras situações que a Autora considera iguais à sua, nomeadamente, quanto à altura dos portões frontais das moradias próximas da sua.
A verdade é que, a Autora não pode querer um tratamento igual dado a outras situações que, como a própria reconhece, foram licenciadas, o que manifestamente, não sucedeu no caso da Autora, que não apresentou qualquer pedido de licenciamento para a realização de obras no muro frontal do terreno, antes e só, para o muro lateral do dito terreno que culminou com a sua autorização dentro de determinados parâmetros, como resulta do probatório.
Assim sendo, não ocorre a invocada violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade.
Quanto aos demais vícios invocados (“erro nos pressupostos de facto; violação de normas de direito; violação do artigo 4° do C.P.A, e do artigo 266° da C.R.P.”), o que decorre dos autos é que a Autora realizou obras no muro frontal do terreno, junto ao nº 217 da Freguesia de G..., no ano de 2006, sem licença, como melhor consta descrito no probatório, obras essas que configuram obras de alteração do edificado (veja-se a fotografia anexa à INF 13512006_9F de 22/2/2008 relativa à verificação da viabilidade de legalização de obra executada sem licença – fls. 26 do PA), que estavam sujeitas a controlo municipal, nos termos do disposto na al. c) do n° 2 do art. 4° do DL. n° 555/99, de 16 de Dezembro, ainda que, o que não se provou, o referido muro de vedação tenha sido edificado em data anterior a 1951 como defende a A.
Assim sendo, não se vislumbra que ocorra, no caso em apreço, uma qualquer situação que urge acautelar por virtude de terem sido adquiridos quaisquer direitos relativamente ao estado do muro frontal existente no local que, como resulta do probatório, foi objecto de intervenção não autorizada pelos serviços competentes e como tal não beneficia de isenção de controlo de adequação às regras urbanísticas aplicáveis.
Assim é que, se a obra executada pela Autora no muro frontal do terreno não foi objecto de qualquer pedido de licenciamento/autorização (ao contrário do que sucedeu com o muro lateral que mereceu essa diligência procedimental), então, de modo algum pode a Autora reclamar uma eventual legítima expectativa de que a sua situação fosse reconhecida pela CMVNG como se nada tivesse sido feito, tudo à luz de pretensos direitos adquiridos.
Acresce que, mesmo que a construção de muros de vedação contíguos com a via pública estejam isentos de controlo prévio, como veio a ser consagrado no Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas do MVNG, ao abrigo do disposto na al i) do n° 1 do artigo 6°-A do R.J.U.E., o certo é que, só assim sucedia se os alinhamentos definidos ou a definir para o local não possuíssem altura superior a 1,20m, o que no caso concreto não acontece.
Note-se que o despacho ora impugnado, em sintonia com essa possibilidade legal, em defesa do interesse público e no respeito dos interesses dos cidadãos (consagrado nos art.º 266.º/1 da CRP, nos termos do qual “A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos” e no art.º 4.º do CPA, que estabelece que “Compete aos órgãos administrativos prosseguir o interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.”) não ordenou a demolição do muro de vedação frontal, mas tão-só a redução da sua altura para 1,20m, incumbindo à Autora iniciar o procedimento adequado à verificação da conformidade legal da construção do dito muro, que a Autora insiste em não promover, apesar de expressamente notificada para tal (v. ofício-notificação datado de 29/4/2008, relativo ao projecto de decisão), nem mesmo quando os presentes autos estiveram suspensos a aguardar essa diligência procedimental.
Também o assim decidido é para manter.
De acordo com o artigo 7º, n.º 1, do CPA, a administração deve adoptar os comportamentos adequados aos fins prosseguidos.
Ou seja, no desenrolar da sua actividade a Administração deve escolher, dentro das diversas medidas a adoptar, a que seja menos gravosa e a que cause menos danos, evitando-se, assim, resultados desproporcionais e injustos.
Este princípio desdobra-se em três dimensões, o da adequação, o da necessidade, ou proibição do excesso e o do equilíbrio.

No âmbito da decisão em causa nos autos, a demolição parcial de obras realizadas, refere o art.º 106.º do RJUE, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, com a redacção dada pelo Lei n.º 69/2007, de 4 de Setembro, em vigor à data dos factos, sob a epígrafe “demolição da obra e reposição do terreno” refere o seguinte:
1 - O Presidente da câmara municipal pode igualmente, quando for caso disso, ordenar a demolição total ou parcial da obra ou a reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes da data de início das obras ou trabalhos, fixando um prazo para o efeito.2-A demolição pode ser evitada se a obra for susceptível de ser licenciada ou objecto de comunicação prévia ou se for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correcção ou de alteração.
3-A ordem de demolição ou reposição a que se refere o n.º 1 é antecedida de audição do interessado, que dispõe de 15 dias a contar da data da sua notificação para se pronunciar sobre o conteúdo da mesma.
4- Decorrido o prazo referido no n.º 1 sem que a ordem de demolição da obra ou de reposição do terreno se mostre cumprida, o presidente da câmara municipal determina a demolição da obra ou a reposição do terreno por conta do infractor.

Ou seja, a ordem de demolição de um edificado pode ser evitada se for possível proceder ao seu licenciamento. Estamos perante o afloramento do princípio da proporcionalidade uma vez que se um edifício pode ser legalizado não fazia sentido proceder à sua demolição para depois vir a solicitar a construção de um novo nas mesmas circunstâncias. Como referem Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves, Dulce Lopes e Fernanda Maçãs, in, Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, Comentado, 2ª edição, pág. 565: “ por homenagem ao princípio da proporcionalidade, só depois de concluída a apreciação sobre a viabilidade ou inviabilidade da pretensão de legalização é que poderá lançar-se mão do procedimento de demolição. Deve, assim, em qualquer caso, a ponderação sobre uma possível legalização ter lugar não apenas antes da execução do acto de demolição, como previamente à sua adopção (cfr. Carla Amado Gomes, “ Embargos e demolições: entre a vinculação e a discricionariedade”, in, Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 19, pp.39 e sgs.)
Ver, neste sentido, Acórdão do STA, proc. n.º 0601/10, de 07-04-2011 quando refere: I – A demolição de obras não licenciadas só deve ser ordenada como última e indeclinável medida sancionatória da ilegalidade cometida, por força dos princípios da necessidade, adequação e indispensabilidade ou menor ingerência possível, decorrentes do princípio da proporcionalidade, e o poder de opção entre a demolição e a legalização de obras ilegais, não licenciadas, é discricionário quanto ao tempo da decisão, pois que esta pode ser tomada a todo o tempo.
No caso em apreço verifica-se que a entidade recorrida apenas vem referir que o muro de vedação frontal deve ser demolido até à altura de 1,20m e que o muro de vedação lateral, desde que não exceda 1,80m, poderá ser dispensado o licenciamento. Ou seja, não vem a entidade recorrida solicitar pura e simplesmente que seja demolida toda a construção edificada. Apenas vem referir que a mesma seja colocada dentro das normas legais aplicáveis. Assim sendo, não se vê como tal decisão possa violar o princípio da proporcionalidade nas suas mais diversas vertentes. É uma decisão adequada e equilibrada.
Improcede, assim a invocada violação do princípio da proporcionalidade.
No que se refere à violação do princípio da igualdade também o mesmo não se verifica.
Refere o artigo 6º do actual CPA que “ nas suas relações com os particulares, a Administração Pública deve reger-se pelo princípio da igualdade, não podendo privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever ninguém…”. O princípio da igualdade impõe que se trate de modo igual o que é juridicamente igual e diferente o que é juridicamente diferente.
Ou seja, não pode ocorrer discriminação quando estejam em causa situações que devem ser tratadas materialmente da mesma forma, mas ocorre uma obrigação de diferenciação quando se trata de questões diferentes.
Como já referimos verifica-se que o muro da recorrente promove uma descontinuidade altimétrica no conjunto onde se integra. A recorrente refere que se encontra violado o princípio da igualdade uma vez que no local teriam sido licenciados muros com altura superior. Estamos perante uma alegação conclusiva sem qualquer substanciação. A recorrente não refere quais, nem onde foram licenciados muros com altura superior. Devido à falta de alegação conclui-se que, manifestamente não pode proceder esta alegação.
Refere o recorrente que o acto também não estará fundamentado.
Nos termos da lei, os actos administrativos, quer sejam praticados no exercício de poderes discricionários quer no de poderes vinculados devem, em geral, ser fundamentados (artigo do 124.º do CPA) – isto é, devem conter, de forma clara, congruente, suficiente e concreta, os motivos de facto e de direito que os fundamentam.
A fundamentação de um acto administrativo deve, naturalmente, constar do próprio acto, conquanto que seja expressa, e realizada mediante sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito (...) podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto – (cf. n.º 1 do artigo 125.º do CPA).
Como refere Diogo Freitas do Amaral, in Curso de Direito Administrativo, vol. II, 2ª edição pág. 391 e sgs., o objectivo essencial e imediato da “ fundamentação é, portanto esclarecer concretamente a motivação do acto, permitindo a reconstituição do iter cognoscitivo que levou à adopção de um acto com determinado conteúdo”.
Como requisitos a preencher para que um acto possa considerar-se fundamentado refere este Ilustre Mestre que: em primeiro lugar tem de ser expressa, ou seja enunciado de modo explícito no contexto do próprio acto pela entidade decisória; em segundo lugar, tem de consistir na exposição, ainda que sucinta, dos fundamentos de facto e de direito da decisão; e em terceiro lugar tem de ser clara, coerente e completa (obra citada fls. 392 e sgs.).

Tendo em atenção o exposto não vemos como se possa sustentar que o acto impugnado não esteja fundamentado.
No que se refere ao muro de vedação confiante com o arruamento vem referido que o mesmo promove uma descontinuidade altimétrica no conjunto onde se integra uma vez que não colmata as alturas dos muros existentes confinantes a norte e a sul afectando negativamente a área envolvente do ponto de vista paisagístico.
Refere que não é licenciável invocando o artigo 24º n.º 4 do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 177/2001, d e4 de Junho.
No que ser refere à rampa no passeio refere que as mesmas não estão de acordo com as Condições Técnicas aprovadas pela Câmara,“ construção de passeio, incluindo instalação de lancil de 0,20cm de granito e pavimentação a pedras do chão hexagonal de betão b) Instalação de lancis de rampa de granito trabalhado a pico fino para acesso a veículo automóveis
Refere-se no acto impugnado que “ relativamente às obras do domínio público oferece informar que sendo o passeio executado pela Junta de Freguesia, será da sua responsabilidade a colocação da rampa em betão, na zona de acesso à propriedade, visto a mesma alterar o perfil do arruamento…”.
Quanto ao muro de vedação lateral vem referido que poder-se-á dispensar de licenciamento caso a altura não ultrapasse 1,80m. Ou seja, se o muro não tiver mais que esta altura não é preciso licenciamento. Estas questões vêm todas referidas no acto impugnado e nas informações que o fomentaram, razão pela qual não se pode concluir que o acto não esteja fundamentado. Tanto é assim que o recorrente veio impugnar o acto com os fundamentos que apresentou, razão pela qual se considera ter percebido o iter cognoscitivo realizado pela entidade recorrida. A recorrente pode não concordar com o referido, mas não se pode concluir é que o acto esteja fundamentado.
Tendo sido este o entendimento seguido pela decisão recorrida tem de se concluir que não podem proceder as conclusões do recorrente, não merecendo esta a censura que lhe é assacada e, em consequência, nega-se provimento ao recurso jurisdicional interposto.

3 – DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Sem custas, por os responsável pelas mesmas ser a recorrente, que beneficia de apoio judiciário, na modalidade de dispensa do respectivo pagamento

Notifique.

Porto, 30 de Novembro de 2016
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco