Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00151/12.9BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/25/2024
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Margarida Reis
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA; NULIDADE DA SENTENÇA;
PAGAMENTO ESPECIAL POR CONTA; CASO JULGADO; AÇÃO CONDENATÓRIA;
TAXA DE INSPEÇÃO; ART. 93.º, N.º 3, ALÍNEA B) DO CIRC; PORTARIA 923/99, DE 20/10;
Sumário:
I. A nulidade da sentença por falta de fundamentação prevista na alínea b), do n.º 1 do art. 668.º (atualmente, art. 615.º) do CPC, apenas ocorre quando se verifique a total omissão da especificação dos fundamentos de facto da decisão.

II. A nulidade da sentença por contradição da decisão com os respetivos fundamentos ocorre quando os fundamentos invocados pelo Tribunal conduziriam logicamente a um resultado oposto ao que é expresso na decisão, sendo relevante para este efeito a oposição que se verifica no processo lógico que das premissas de facto e de direito que o julgador tem por apuradas, este extrai a decisão a proferir, pelo que não será nula a decisão que contenha os fundamentos que conduzem logicamente à decisão.

III. O caso julgado constitui exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que pressupõe a repetição de uma causa, verificando-se depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admita recurso ordinário.

IV. Ainda que atendendo a que o objeto da ação condenatória é a pretensão do interessado e não o ato de indeferimento, cuja eliminação da ordem jurídica resulta diretamente da pronúncia condenatória, a verdade é que, ainda assim, no caso o pedido condenatório relevante formulado nas duas ações é distinto, o que se explica atento o diverso teor dos dois atos “impugnados” -, pois só nesta ação é pedido que a R. seja condenada a apreciar o pedido de reembolso de PEC, sem pagamento de qualquer taxa.

V. À inspeção prevista na alínea b), do n.º 3, do art. 93.º (anteriormente numerado 87.º), do CIRC não é aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de janeiro, nem a taxa prevista Portaria n.º 923/99, de 20 de outubro, pois estando em causa o exercício de um direito – o de obter o reembolso do PEC que não possa ter sido deduzido à matéria coletável por insuficiência da mesma no período legalmente determinado – e sendo a inspeção tributária necessária para a verificação de um pressuposto desse direito, em causa não está um serviço que deva ser prestado pela Administração tributária aos sujeitos passivos tendo por finalidade a obtenção de uma qualquer vantagem por parte dos mesmos, mas antes a única possibilidade que estes têm de provar o pressuposto da concretização desse mesmo direito.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso da 1.ª recorrente, negar provimento ao recurso da AT.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório
[SCom01...], S.A. e a Fazenda Pública, inconformadas com o acórdão proferido em 2012-06-22 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou verificada a exceção dilatória de caso julgado e absolveu “a Autora da instância”, vêm interpor os presentes recursos independentes.
A Recorrente [SCom01...], S.A. encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
IV - CONCLUSÕES
i. Compulsada a sentença recorrida constata-se que o Tribunal a quo não procedeu à selecção da matéria de facto que considerou provada, sendo que o art. 125.º n.º 1 do CPPT estabelece que uma das causas de nulidade da sentença é a não especificação dos fundamentos (designadamente) de facto da decisão, e fá-lo, igualmente, o art. 668.º/ 1- b) do CPC ao afirmar que a decisão judicial é nula quando não especifique os fundamentos (designadamente) de facto que justificam a decisão.
ii. Como ressuma do acervo documental junto aos autos, complementado pela decisão judicial que o Tribunal a quo invoca - e que adiante se junta como doc. n.º 1 - existiram duas decisões administrativas sobre o mesmo pedido de reembolso de PEC: i) Decisão de 24.10.2008, com base na falta de cumprimento de formalidades essenciais e na intempestividade do pedido de reembolso; e ii) Decisão de 08.08.2011, com base na falta de pagamento da taxa provisória de €47.694,20 para realização de inspecção.
iii. Refere o Tribunal a quo que, pelo acórdão proferido no processo n.a 102/09.SBEPNF «(...) foi o Serviço de Finanças ... condenado a admitir o referido requerimento de pedido de reembolso e condenado a prosseguir os seus ulteriores termos processuais para apreciação e decisão do pedido de reembolso.», que «A apreciação e decisão do pedido de reembolsa, não se mostra compatível com o pagamento da taxa que foi exigida que, pelo seu valor, condiciona, limita, inibe e impede o exercício do direito do A. de ser tributado pelo lucro real» e que, com o trânsito em julgado da decisão proferida no processo n.º 102/09.BBEPNF, transitada em julgado, «(...) considera-se que, por esse motivo, o Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa. como condição de prosseguimento. apreciação e decisão do pedido de reembolso.» (destaque nosso).
iv. Todavia, com base nas referidas premissas, conclui o Tribunal a quo pela existência de excepção dilatória de caso julgado e pela absolvição da Recorrente da instância - o que fez sem proceder à apreciação do mérito da pretensão da Recorrente, embora dando indicação do sentido dessa decisão.
v. Salvo o devido respeito, entende a Recorrente que existe uma manifesta contradição entre os fundamentos e a decisão - a acarretar a nulidade da sentença - porquanto, referindo o Tribunal a quo que a Administração Fiscal deveria ter tramitado o reembolso de PEC peticionado pela Recorrente sem o pagamento de qualquer taxa pela realização de uma inspecção - por força de anterior decisão judicial transitada em julgado deveria ter concluído pela nulidade da decisão administrativa impugnada, por consequente de acto administrativo anteriormente anulado (Art. 133.º n.º 2 i) CPA), que é de conhecimento oficioso (Art. 286.º do Cod. Civ. E 134.º n.º 2 do CPA.).
vi. Em lugar de declarar a nulidade da decisão impugnada, o Tribunal a quo julgou pela verificação de excepção dilatória, e absolveu a Recorrente da instância, pelo que a Recorrente vê denegado o acesso à tutela jurisdicional efectiva, pois não vislumbra que, na sequência da decisão recorrida, dela possa resultar o seu direito a ver processado o reembolso de PEC - vendo finda a instância sem a apreciação do mérito da questão, e sem a formulação de um juízo de anulação ou nulidade sobre o despacho administrativo impugnado.
vii. Ainda que assim não se entendesse, sempre se verificaria um erro de julgamento da matéria de direito, a impor a anulação da decisão recorrida - pelos motivos supra expostos, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais.
viii. A procedência da pretensão da Recorrente afigura-se meramente aparente, na medida em que, sendo a chamado a pronunciar-se sobre a legalidade do despacho de indeferimento do reembolso de PEC com fundamento na falta de pagamento de taxa para realização de inspecção, o Tribunal a quo julgou pela absolvição (da própria Autora) da instância.
ix. Salvo o devido respeito, não foi dada à Recorrente “a mais estável ou eficaz tutelo dos interesses ofendidos”, porquanto a Recorrente apenas tem uma decisão que a absolve da instância, obstando, deste modo, a que a possa retirar um efeito útil da sentença - mormente, pela condenação da Administração Fiscal a tramitar o pedido de reembolso, sem o pagamento de qualquer taxa.
x. É certo que, na parte dispositiva o Tribunal a quo refere que “o Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa, como condição de prosseguimento, apreçiação e decisão do pedido de reembolso”, mas, na parte decisória, e considerando que, na acção administrativa especial, foram cumulados pedidos de anulação e de condenação - o Tribunal não profere decisão anulatória nem condenatória.
xi. Sendo certo que está em causa, nos presentes autos, saber se a Administração Fiscal pode subordinar o reembolso de PEC ao pagamento de uma taxa pela realização de uma inspecção - uma vez que é esse o teor da decisão impugnada, é igualmente certo que, naqueloutro processo n.º 102/09.8BEPRT, a questão do pagamento de taxa pela realização de inspecção, como obstáculo formal ao processamento do reembolso de PEC, não constituía objecto do processo.
xii. Salvo o devido respeito, cabia ao Tribunal a quo optar entre duas alternativas: i) - Ou considerava que a Administração Fiscal não pode vir aditar sucessivos fundamentos, para indeferimento do mesmo pedido de reembolso de PEC - julgado pela sua nulidade; ii) - Ou considerava que, sendo possível esse aditamento, a aplicação do regime da inspecção a pedido do contribuinte aos reembolsos de PEC é ilegal - conhecendo do mérito da causa.
xiii. Caso se entenda que a Administração Fiscal poderia vir aditar novos fundamentos para indeferir o reembolso do PEC - nomeadamente a imposição de pagamento de uma taxa pela realização de inspecção sempre haveria de conhecer-se do mérito da causa - pelo que, por força dos poderes de cassação atribuídos ao Tribunal de Recurso, e uma vez que os autos contêm todos os elementos para o efeito, poderá ser aqui conhecido o mérito da acção (Art. 715.º n.º 2 do CPC) - aqui dada por reproduzida para todos os efeitos legais.

Termina pedindo:
Nestes termos e nos melhores de direito, deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, o que se deverá fazer por obediência à Lei e por imperativo de JUSTIÇA
***
A Recorrida Fazenda Pública apresentou contra-alegações, nas quais conclui como se segue:
V - CONCLUSÕES
I. Determina o artigo 659.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), que: o juiz deve «discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final».
II. A consequência dessa omissão, pode ler-se no artigo 125.º, n.º 1, do CPPT: constitui causa de nulidade da sentença a não especificação dos fundamentos de facto.
IlI. Com efeito, lido o acórdão proferido pelo douto tribunal a quo, forçosa é a conclusão que a procura da especificação da matéria de facto dada como provada é um exercício votado ao insucesso, razão pela qual não se pode, quanto a este ponto, deixar de se concordar com a ora Recorrente - sendo de referir, aliás, que este também é um fundamento do recurso da Administração Tributária.
IV. Sobre a questão subjacente aos presentes autos, pronunciou-se o douto Tribunal, no âmbito do referido processo n.º 109/09.8BEPNF, em termos que se subscrevem na integralidade, o seguinte:
V. «A autora invoca ainda a inconstitucionalidade material do art. 87.º, n.º 3, alínea b), do CIRC, por violação dos princípios do acesso ao direito (artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da proporcionalidade (art. 266.º n.º 2, da CRP), do Estado de Direito Democrático (art. 2.º da CRP) e do princípio da tributação das empresas pelo seu lucro real (art. 104.º n. º 2, da CRP), quando exige o pedido de uma acção inspectiva para o reembolso do pagamento especial por conta paga pelo contribuinte sem atender ao valor do reembolso.
Nesta parte a autora também não tem razão.
A exigência prevista no art. 8.º, n.º 3, afinca b), do CIRC, constitui um requisito ou um pressuposto para a atribuição de um direito.
A acção inspectiva constitui uma exigência procedimental para verificação da fundamentação do direito do sujeito passivo e enquadra-se numa exigência de rigor no controlo dos dinheiros públicos e do controle preventivo da fraude e evasão fiscais.
Daí que não possa dizer-se linearmente que nesta situação o sujeito passivo tem de pagar para receber aquilo a que tem direito. Nestes pedidos, só pode dizer-se que o sujeito passivo tem direito a receber o reembolso, quando se verificar materialmente que a situação que deu origem ao reembolso é considerada justificada. E só nesse momento é que pode dizer-se que o sujeito passivo tem direito ao reembolso pedido.
Nesta situação está em causa a ponderação entre a necessidade da exigência de uma acção fiscalizadora e controladora prévia a eventual reembolso (correspondente a um direito do sujeito passivo) que garanta antecipadamente o direito do Estado a controlar o reembolso a efectuar ou, ao invés, atribuir-se ao sujeito passivo o direito ao reembolso e ir ao Estado verificar posteriormente a sua legalidade.
Nesta ponderação de interesses a garantia do controlo prévio do direito do sujeito passivo ao reembolso, não constitui violação dos princípios do acesso ao direito ou do Estado de direito democrático, nem qualquer desrespeito à presunção de veracidade e boa-fé das declarações dos contribuintes (art. 75.º da LGT).
Por outro lado, esta acção inspectiva para verificar que «a situação que deu origem ao reembolso seja considerada justificada» permite ainda verificar a realidade da situação tributária e patrimonial do inspecionado, pelo que também não constitui qualquer infração ao princípio da tributação do lucro real. Bem pelo contrário. A acção inspectiva verifica a realidade da situação patrimonial e tributária do respectivo sujeito passivo. Ao invés, aqui a acção inspectiva contribui até para o respeito do princípio da tributação do lucro real.
Finalmente também não há qualquer desrespeito ao princípio da proporcionalidade. O valor a pagar pelas acções inspectivas tem em conta o volume de negócios do respectivo sujeito passivo (Portaria n.º 923/ 99, de 20 de Outubro). O seu volume de negócios reflecte-se no valor dos pagamentos por conta a realizar e no imposto a pagar, pelo que respeita a proporcionalidade dos rendimentos do sujeito passivo, do pagamento especial por conta a reembolsar e do IRC a pagar.
O facto de por vezes o valor a pagar poder ser superior ao valor a receber multa ainda da falta de correspondência entre os valores do pagamento especial por conta em causa e os custos que essas acções também envolvem, designadamente, os custos fixos indispensáveis à criação, manutenção e funcionamento da estrutura pessoal e material desses serviços de inspecção, independentemente do volume de serviço que eventualmente possa vir a ter e dos recursos que vai permitir arrecadar com a sua acção.
Estamos aqui mais uma vez, numa ponderação de interesses que não choca a sensibilidade jurídica, motivo pelo qual julgamos não ser inconstitucional o art. 87.º; n.º 3, alínea b), do CIRC, quer por violação dos princípios constitucionais invocados pela autora, quer por quaisquer outros.
Nesta parte, julga-se a acção improcedente».
VI. A douta decisão transitou em julgado, com ela se conformando, pois, a A.
VII. Ou, pelo menos, assim parecia.
VIII. Isto porque, olvidando (?) a A. -ora Recorrente - a douta sentença transitada em julgado, continuando o procedimento de reembolso do pagamento especial por conta os seus termos, conforme a douta decisão judicial, foi a A. notificada através do ofício n.º ...23/05.03, de 08 de Agosto de 2011, que tinha sido autorizada a realização da acção inspectiva mencionada no artigo 87.º do CIRC, aos exercícios de 2003 a 2007, aí se fixando a taxa provisória de inspecção a pagar.
IX. Sobre essa notificação, requereu a A. - ora Recorrente - a indicação dos meios de reacção e respectivos prazos - alegadamente - “contra o indeferimento do pedido de reembolso de PEC” - artigo 5. º da petição inicial
X. Foi sobre essa comunicação (que não se pode qualificar de “indeferimento”), do valor fixado por força do Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de Janeiro e da Portaria n.º 923/99, de 20 de Outubro, efectuada nos termos da Lei e por determinação da douta sentença transitada em julgado supra citada, que a A. deduziu a presente acção administrativa especial.
XI. Perante esta factualidade, entendeu o acórdão ora recorrido, o seguinte:
«Resulta do art. 671.º do CPC que, uma vez, transitada em julgado a sentença que decida o mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fara dele nos limites fixados pelos artigos 497.º e 498.º, do CPC. [...] Da análise dos presentes autos e da acção n.º 102/09.8BEPNF, resulta claramente que existe uma identidade de sujeitos, uma vez que as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
Existe igualmente identidade do pedido, pois numa e noutra causa pretende-se obter o mesmo efeito jurídico - a revogação do despacho que indeferiu o pedido de reembolso.
Existe identidade da causa de pedir, uma vez, que a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico, que foi o supra referido despacho. […]
[a] decisão proferida na acção n.º 102/09.8BEPNF condenou o Serviço de Finanças a admitir o requerimento do pedido de reembolso e a prosseguir os seus ulteriores termos processuais para apreciação e decisão do pedido de reembolso».
XII. Todavia, inexplicavelmente, após considerar que se verifica a existência de caso julgado, concluí o tribunal a quo o seguinte:
«A apreciação e decisão do pedido de reembolso, não se mostra compatível com o pagamento da taxa que foi exigida que, pelo seu valor, condiciona, limita, inibe e impede o exercício do direito da A. de ser tributada pelo lucro real.
Assim, embora, tal como a Administração Fiscal defende em sede de contestação, se entenda que o acórdão respeitante à Acção n.º 102/09.8BEPNF tenha formado caso julgado, considera-se que, por esse motivo, o Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa, como condição de prosseguimento, apreciarão e decisão do pedido de reembolso
XIII. E assim, numa penada, se consegue defender o certo e o seu contrário, por um lado há caso julgado, por outro - a entender o Tribunal a quo - a administração tributária estava impedida de respeitar esse mesmo caso julgado.
XIV. Com efeito, lê-se na decisão do Tribunal a quo que o «Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa, como condição de prosseguimento, apreciação e decisão do pedido de reembolso», não dando a mesma qualquer razão para o desaplicar das normas legais constantes do CIRC - artigo 87.º, n.º 3, al. b) - e da Portaria n.º 923/99, de 20 de Outubro.
XV. Nem explica como é que havendo caso julgado, e determinando essa sentença que:
«O valor a pagar pelas acções inspectivas tem em conta o volume de negócios do respectivo sujeito passivo (Portaria n. º 923/99, de 20 de Outubro). O seu volume de negócios reflecte-se no valor dos pagamentos por conta a realizar e no imposto a pagar, pelo que respeita a proporcionalidade dos rendimentos do sujeito passivo, do pagamento especial por conta a reembolsar e do IRC a pagar.
O facto de por vezes o valor a pagar poder ser superior ao valor a receber resulta ainda da falta de correspondência entre os valores do pagamento especial por conta em causa e os custos que essas acções também envolvem, designadamente, os custos fixos indispensáveis à criação, manutenção e funcionamento da estrutura pessoal e material desses serviços de inspecção, independentemente do volume de serviço que eventualmente possa vir a ter e dos recursos que vai permitir arrecadar com a sua acção.
Estamos aqui mais uma vez, numa ponderação de interesses que não choca a sensibilidade jurídica. motivo pelo qual julgamos não ser inconstitucional o art. 87.º n. º 3, alínea b) do CIRC, quer por violação dos princípios constitucionais invocados pela autora, quer por quaisquer outros.
Nesta parte, julga-se a acção improcedente»
XVI. Este é o caso julgado.
XVII. Declarar que o Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa, é não só desconsiderar a norma aplicável, sendo que nenhum juízo realizou da sua inconstitucionalidade, como, mais grave, é violar o anteriormente julgado por aquele Tribunal!
XVIII. A Administração Tributária não indeferiu qualquer pedido de reembolso.
XIX. A Administração Tributária limitou-se a executar o julgado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel.
XX. A Administração Tributária não decidiu nada, não indeferiu nada, a Administração Tributária limitou-se tão-somente a aplicar a lei.
XXI. Assim, como se disse no nosso recurso, a presente decisão de que ora se recorre, não só viola o caso julgado, porque decide em sentido contrário àquele, como, simultaneamente, desaplica um regime legal sem qualquer fundamento, nomeadamente de constitucionalidade.
XXII. Claro que tal confusão jurídica não podia dar bom resultado, concluindo o acórdão de que se recorre que:
«Pelo exposto, julga-se verificada a excepção dilatória de caso julgado e, em consequência absolve-se a Autora da instância. Custas pela Ré
XXIII. Pergunta-se a Ré, ora Recorrente, como é que, numa acção do tipo declarativo, verificada uma exceção dilatória, se ABSOLVE A AUTORA DA INSTÂNCIA? e CUSTAS PELA RÉ?
XXIV. Então verifica-se uma exceção dilatória à análise da pretensão da Autora, e a Ré, que não deu origem ao processo, é que suporta as custas?
XXV. Deduzindo o mesmo pedido e causa de pedir que já havia efectuado anteriormente, e sobre a qual o douto Tribunal já se havia pronunciado expressamente, a A., na ausência de recurso, conformou-se com a mesma.
XXVI. Sejamos claros: se a A. - ora Recorrente - não se conformou com o decidido, o que tinha a fazer era recorrer do douto acórdão (inicial), não é voltar a intentar uma nova acção, com o mesmo pedido e fundamentos.
XXVII. Das duas uma, ou não há caso julgado, e o acórdão recorrido carece de fundamentação adequada, não justificando nomeadamente a inconstitucionalidade dos normativos legais que desaplica, e então condena-se a Ré, em sede de análise de mérito, mas permite-se-lhe a competente defesa, designadamente recurso para o Tribunal Constitucional;
XXVIII. Ou, verificado que está o caso julgado - como a administração tributária entende -, deverá a Ré - aqui Recorrida - ser absolvida da instância e as custas ser suportadas pela Autora.
XXIX. Contudo, caso entenda este douto Tribunal que não se verifica a excepção dilatória de caso julgado dir-se-á quanto à constitucionalidade do artigo 87.º, do CIRC, que,
XXX. A A. alegou, em sede de petição inicial, que existe uma desproporção entre o valor do PEC a reembolsar e o custo da acção inspectiva, superando a segunda o montante da primeira, facto que por si importa a violação de diversos princípios constitucionais.
XXXI. Gostaríamos de relembrar que o montante do pagamento especial por conta é igual a 1% do volume de negócios relativo ao exercício anterior, com o limite mínimo de (euro) 1250, e, quando superior, será igual a este limite acrescido de 20% da parte excedente, com o limite máximo de (euro) 70 000.
XXXII. Ou seja, o pagamento especial por conta é, por via de regra, inferior a 1% do volume de negócios do sujeito passivo, só assim não sendo quando 1% do volume de negócios daquele for inferior a 1250 euros.
XXXIII. Destarte, não se pode, face aos objectivos prosseguidos, ter o pagamento especial por conta, como uma exigência desproporcional, quando o mesmo se refere a menos de 1 % do volume de negócios de um sujeito passivo.
XXXIV. Essa quantia é, aliás, passível de dedução à colecta durante 5 exercícios (o da sua realização e os quatro seguintes).
XXXV. Só na eventualidade de não ter sido passível de dedução nesses cinco exercícios é que se coloca a situação de reembolso.
XXXVI. O legislador determinou então que, ocorrida a situação referida, o reembolso fosse antecedido de uma acção inspectiva, realizada a pedido do contribuinte, para efeito verificação da veracidade do declarado.
XXXVII. A acção inspectiva não é o “preço do reembolso”.
XXXVIII. O sujeito passivo não tem de pagar para receber aquilo a que tem direito.
XXXIX. O sujeito passivo tem de pagar para se aferir, de facto, se tem esse direito.
XL. Nestes termos, a acção inspectiva assume-se como uma condição de procedibilidade.
XLI. O facto da mesma poder exceder, por vezes, o valor do reembolso, em nada contende com os princípios do acesso ao direito, da proporcionalidade, do Estado de Direito Democrático, da tributação das empresas pelo seu lucro real.
XLII. O sujeito passivo não está a pagar o reembolso, mas sim um serviço de inspecção, que importa custos não despiciendos.
XLIII. Com efeito inspeccionar cinco exercícios, implica semanas ou mesmo meses de trabalho de uma equipa de inspectores tributários.
XLIV. E que comporta vantagens que extravasam o mero reembolso do pagamento especial por conta.
XLV. É que convém ter em conta que uma qualquer auditoria efectuada por auditores privados, além de ser bem mais dispendiosa do que os valores agora exigidos, não garante que aquele tem a sua situação tributária regularizada, face à administração tributária.
XLVI. Não existe qualquer violação dos princípios do acesso ao direito, da proporcionalidade, do Estado de Direito Democrático, do princípio da tributação das empresas pelo seu lucro real ou de qualquer outro preceito constitucional, quando se exige um pedido de uma acção inspectiva para o reembolso do pagamento especial por conta paga pelo contribuinte sem atender ao valor do reembolso.
XLVII. Por fim, não pode o tribunal substituir a notificação do preço da realização de uma inspecção, por uma decisão que condene a Administração Tributária a “reembolsar o sobredito PEC à Autora” - conforme o pedido formulado pelo A. -, sob pena de violação do princípio de separação de poderes, conforme previsto no n.º 1 do artigo 111.º da CRP.
XLVIII. O deferimento desta pretensão implica, de acordo com o estabelecido na alínea b) do n.º 3 do artigo 93.º (ex-87.º) do CIRC, a apreciação da situação que deu origem ao reembolso, por forma a aferir se a mesma se encontra justificada, o que só pode ser aferido em acção de inspecção.
XLIX. É, deste modo, patente que o eventual deferimento da pretensão da A. implica, necessariamente, a emissão de um juízo de valor, de índole técnica, inserido na margem de livre apreciação da Administração Tributária.
L. Significa isto, que o seu reconhecimento envolve a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa, que se inscrevem no âmbito próprio da discricionariedade administrativa, não sendo possível ao Tribunal substituir-se à Administração Fiscal e determinar o conteúdo do acto que a esta cabe praticar - n.º 2 do artigo 71.º e n.º 3 do artigo 95.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
Termina pedindo:
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve-se negar provimento ao presente recurso, revogando-se, contudo, a decisão do TAF de Penafiel, em consideração do alegado pela ora Recorrida no seu recurso.
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A Recorrente Fazenda Pública encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
V - CONCLUSÕES
I. Determina o artigo 659.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), que: o juiz deve «discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final».
II. A consequência dessa omissão, pode ler-se no artigo 125.º, n.º 1, do CPPT: constitui causa de nulidade da sentença a não especificação dos fundamentos de facto.
IlI. No entanto, lido o acórdão proferido pelo douto tribunal a quo, forçosa é a conclusão que a procura da especificação da matéria de facto dada como provada é um exercício votado ao insucesso.
IV. Sobre a questão subjacente aos presentes autos, pronunciou-se o douto Tribunal, no âmbito do referido processo n.º 109/09.8BEPNF, em termos que se subscrevem na integralidade, o seguinte:
V. «A autora invoca ainda a inconstitucionalidade material do art. 87.º, n.º 3, alínea b), do CIRC, por violação dos princípios do acesso ao direito (artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da proporcionalidade (art. 266.º n.º 2, da CRP), do Estado de Direito Democrático (art. 2.º da CRP) e do princípio da tributação das empresas pelo seu lucro real (art. 104.º n. º 2, da CRP), quando exige o pedido de uma acção inspectiva para o reembolso do pagamento especial por conta paga pelo contribuinte sem atender ao valor do reembolso.
Nesta parte a autora também não tem razão.
A exigência prevista no art. 8.º, n.º 3, afinca b), do CIRC, constitui um requisito ou um pressuposto para a atribuição de um direito.
A acção inspectiva constitui uma exigência procedimental para verificação da fundamentação do direito do sujeito passivo e enquadra-se numa exigência de rigor no controlo dos dinheiros públicos e do controle preventivo da fraude e evasão fiscais.
Daí que não possa dizer-se linearmente que nesta situação o sujeito passivo tem de pagar para receber aquilo a que tem direito. Nestes pedidos, só pode dizer-se que o sujeito passivo tem direito a receber o reembolso, quando se verificar materialmente que a situação que deu origem ao reembolso é considerada justificada. E só nesse momento é que pode dizer-se que o sujeito passivo tem direito ao reembolso pedido.
Nesta situação está em causa a ponderação entre a necessidade da exigência de uma acção fiscalizadora e controladora prévia a eventual reembolso (correspondente a um direito do sujeito passivo) que garanta antecipadamente o direito do Estado a controlar o reembolso a efectuar ou, ao invés, atribuir-se ao sujeito passivo o direito ao reembolso e ir ao Estado verificar posteriormente a sua legalidade.
Nesta ponderação de interesses a garantia do controlo prévio do direito do sujeito passivo ao reembolso, não constitui violação dos princípios do acesso ao direito ou do Estado de direito democrático, nem qualquer desrespeito à presunção de veracidade e boa-fé das declarações dos contribuintes (art. 75.º da LGT).
Por outro lado, esta acção inspectiva para verificar que «a situação que deu origem ao reembolso seja considerada justificada» permite ainda verificar a realidade da situação tributária e patrimonial do inspecionado, pelo que também não constitui qualquer infração ao princípio da tributação do lucro real. Bem pelo contrário. A acção inspectiva verifica a realidade da situação patrimonial e tributária do respectivo sujeito passivo. Ao invés, aqui a acção inspectiva contribui até para o respeito do princípio da tributação do lucro real.
Finalmente também não há qualquer desrespeito ao princípio da proporcionalidade. O valor a pagar pelas acções inspectivas tem em conta o volume de negócios do respectivo sujeito passivo (Portaria n.º 923/ 99, de 20 de Outubro). O seu volume de negócios reflecte-se no valor dos pagamentos por conta a realizar e no imposto a pagar, pelo que respeita a proporcionalidade dos rendimentos do sujeito passivo, do pagamento especial por conta a reembolsar e do IRC a pagar.
O facto de por vezes o valor a pagar poder ser superior ao valor a receber multa ainda da falta de correspondência entre os valores do pagamento especial por conta em causa e os custos que essas acções também envolvem, designadamente, os custos fixos indispensáveis à criação, manutenção e funcionamento da estrutura pessoal e material desses serviços de inspecção, independentemente do volume de serviço que eventualmente possa vir a ter e dos recursos que vai permitir arrecadar com a sua acção.
Estamos aqui mais uma vez, numa ponderação de interesses que não choca a sensibilidade jurídica, motivo pelo qual julgamos não ser inconstitucional o art. 87.º; n.º 3, alínea b), do CIRC, quer por violação dos princípios constitucionais invocados pela autora, quer por quaisquer outros.
Nesta parte, julga-se a acção improcedente».
VI. A douta decisão transitou em julgado, com ela se conformando, pois, a A.
VII. Ou, pelo menos, assim parecia.
VIII. Isto porque, olvidando (?) a A. - ora Recorrente - a douta sentença transitada em julgado, continuando o procedimento de reembolso do pagamento especial por conta os seus termos, conforme a douta decisão judicial, foi a A. notificada através do ofício n.º ...23/05.03, de 08 de Agosto de 2011, que tinha sido autorizada a realização da acção inspectiva mencionada no artigo 87.º do CIRC, aos exercícios de 2003 a 2007, aí se fixando a taxa provisória de inspecção a pagar.
IX. Sobre essa notificação, requereu a A. - ora Recorrente - a indicação dos meios de reacção e respectivos prazos - alegadamente - “contra o indeferimento do pedido de reembolso de PEC” - artigo 5. º da petição inicial
X. Foi sobre essa comunicação (que não se pode qualificar de “indeferimento”), do valor fixado por força do Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de Janeiro e da Portaria n.º 923/99, de 20 de Outubro, efectuada nos termos da Lei e por determinação da douta sentença transitada em julgado supracitada, que a A. deduziu a presente acção administrativa especial.
XI. Perante esta factualidade, entendeu o acórdão ora recorrido, o seguinte:
«Resulta do art. 671.º do CPC que, uma vez, transitada em julgado a sentença que decida o mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fara dele nos limites fixados pelos artigos 497.º e 498.º, do CPC. [...] Da análise dos presentes autos e da acção n.º 102/09.8BEPNF, resulta claramente que existe uma identidade de sujeitos, uma vez que as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
Existe igualmente identidade do pedido, pois numa e noutra causa pretende-se obter o mesmo efeito jurídico - a revogação do despacho que indeferiu o pedido de reembolso.
Existe identidade da causa de pedir, uma vez, que a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico, que foi o supra referido despacho. […]
[a] decisão proferida na acção n.º 102/09.8BEPNF condenou o Serviço de Finanças a admitir o requerimento do pedido de reembolso e a prosseguir os seus ulteriores termos processuais para apreciação e decisão do pedido de reembolso».
XII. Inexplicavelmente, após considerar que se verifica a existência de caso julgado, concluí o tribunal a quo o seguinte:
«A apreciação e decisão do pedido de reembolso, não se mostra compatível com o pagamento da taxa que foi exigida que, pelo seu valor, condiciona, limita, inibe e impede o exercício do direito da A. de ser tributada pelo lucro real.
Assim, embora, tal como a Administração Fiscal defende em sede de contestação, se entenda que o acórdão respeitante à Acção n.º 102/09.8BEPNF tenha formado caso julgado, considera-se que, por esse motivo, o Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa, como condição de prosseguimento, apreciarão e decisão do pedido de reembolso
XIII. E assim, numa penada, se consegue defender o certo e o seu contrário, por um lado há caso julgado, por outro - a entender o Tribunal a quo - a administração tributária estava impedida de respeitar esse mesmo caso julgado.
XIV. Com efeito, lê-se na decisão do Tribunal a quo que o «Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa, como condição de prosseguimento, apreciação e decisão do pedido de reembolso», não dando a mesma qualquer razão para o desaplicar das normas legais constantes do CIRC - artigo 87.º, n.º 3, al. b) - e da Portaria n.º 923/99, de 20 de Outubro.
XV. Nem explica como é que havendo caso julgado, e determinando essa sentença que:
«O valor a pagar pelas acções inspectivas tem em conta o volume de negócios do respectivo sujeito passivo (Portaria n. º 923/99, de 20 de Outubro). O seu volume de negócios reflecte-se no valor dos pagamentos por conta a realizar e no imposto a pagar, pelo que respeita a proporcionalidade dos rendimentos do sujeito passivo, do pagamento especial por conta a reembolsar e do IRC a pagar.
O facto de por vezes o valor a pagar poder ser superior ao valor a receber resulta ainda da falta de correspondência entre os valores do pagamento especial por conta em causa e os custos que essas acções também envolvem, designadamente, os custos fixos indispensáveis à criação, manutenção e funcionamento da estrutura pessoal e material desses serviços de inspecção, independentemente do volume de serviço que eventualmente possa vir a ter e dos recursos que vai permitir arrecadar com a sua acção.
Estamos aqui mais uma vez, numa ponderação de interesses que não choca a sensibilidade jurídica. motivo pelo qual julgamos não ser inconstitucional o art. 87.º n. º 3, alínea b) do CIRC, quer por violação dos princípios constitucionais invocados pela autora, quer por quaisquer outros.
Nesta parte, julga-se a acção improcedente»
XVI. Este é o caso julgado.
XVII. Declarar que o Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa, é não só desconsiderar a norma aplicável, sendo que nenhum juízo realizou da sua inconstitucionalidade, como, mais grave, é violar o anteriormente julgado por aquele Tribunal!
XVIII. A Administração Tributária não indeferiu qualquer pedido de reembolso.
XIX. A Administração Tributária limitou-se a executar o julgado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel.
XX. A Administração Tributária não decidiu nada, não indeferiu nada, a Administração Tributária limitou-se tão-somente a aplicar a lei.
XXI. Assim, a presente decisão de que ora se recorre, não só viola o caso julgado, porque decide em sentido contrário àquele, como, simultaneamente, desaplica um regime legal sem qualquer fundamento, nomeadamente de constitucionalidade.
XXII. Claro que tal confusão jurídica não podia dar bom resultado, concluindo o acórdão de que se recorre que:
«Pelo exposto, julga-se verificada a excepção dilatória de caso julgado e, em consequência absolve-se a Autora da instância. Custas pela Ré
XXIII. Pergunta-se a Ré, ora Recorrente, como é que, numa acção do tipo declarativo, verificada uma exceção dilatória, se ABSOLVE A AUTORA DA INSTÂNCIA? e CUSTAS PELA RÉ?
XXIV. Então verifica-se uma exceção dilatória à análise da pretensão da Autora, e a Ré, que não deu origem ao processo, é que suporta as custas?
XXV. E a absolvição da instância é da Autora?
XXVI. Não conhecíamos, até hoje, a possibilidade de absolver a autora da instância.
XXVII. Deduzindo o mesmo pedido e causa de pedir que já havia efectuado anteriormente, e sobre a qual o douto Tribunal já se havia pronunciado expressamente, a A., na ausência de recurso, conformou-se com a mesma;
XXVIII. Sejamos claros: se a A. não se conformou com o decidido, o que tinha a fazer era recorrer do douto acórdão, não é voltar a intentar uma nova acção, com o mesmo pedido e fundamentos.
XXIX. Nestes termos, entende a R. estar perante uma excepção dilatória nominada, face à verificação de caso julgado, conforme disposto nos artigos 494.º, 497.º e 498.º, todos do Código de Processo Civil, cuja consequência legal é a extinção da presente instância, o que, desde já, se requer.
XXX. O que implica a absolvição da Ré da instância.
XXXI. Das duas uma, ou não há caso julgado, e o acórdão recorrido carece de fundamentação adequada, não justificando nomeadamente a inconstitucionalidade dos normativos legais que desaplica, e então condena-se a Ré, em sede de análise de mérito, mas permite-se-lhe a competente defesa, designadamente recurso para o Tribunal Constitucional.
XXXII. Ou, verificado que está o caso julgado - como a administração tributária entende -, deverá a Ré ser absolvida da instância e as custas ser suportadas pela Autora.
XXXIII. Contudo, por dever de patrocínio, caso entenda este douto Tribunal que não se verifica a excepção dilatória de caso julgado, dir-se-á, quanto à constitucionalidade do artigo 87.º, do CIRC, que,
XXXIV. A A. alegou, em sede de petição inicial, que existe uma desproporção entre o valor do PEC a reembolsar e o custo da acção inspectiva, superando a segunda o montante da primeira, facto que por si importa a violação de diversos princípios constitucionais.
XXXV. Gostaríamos de relembrar que o montante do pagamento especial por conta é igual a 1% do volume de negócios relativo ao exercício anterior, com o limite mínimo de (euro) 1250, e, quando superior, será igual a este limite acrescido de 20% da parte excedente, com o limite máximo de (euro) 70 000.
XXXVI. Ou seja, o pagamento especial por conta é, por via de regra, inferior a 1% do volume de negócios do sujeito passivo, só assim não sendo quando 1% do volume de negócios daquele for inferior a 1250 euros.
XXXVII. Destarte, não se pode, face aos objectivos prosseguidos, ter o pagamento especial por conta, como uma exigência desproporcional, quando o mesmo se refere a menos de 1% do volume de negócios de um sujeito passivo.
XXXVIII. Essa quantia é, aliás, passível de dedução à colecta durante 5 exercícios (o da sua realização e os quatro seguintes).
XXXIX. Só na eventualidade de não ter sido passível de dedução nesses cinco exercícios é que se coloca a situação de reembolso.
XL. O legislador determinou então que, ocorrida a situação referida, o reembolso fosse antecedido de uma acção inspectiva, realizada a pedido do contribuinte, para efeito verificação da veracidade do declarado.
XLI. A acção inspectiva não é o “preço do reembolso”.
XLII. O sujeito passivo não tem de pagar para receber aquilo a que tem direito.
XLIII. O sujeito passivo tem de pagar para se aferir, de facto, se tem esse direito.
XLIV. Nestes termos, a acção inspectiva assume-se como uma condição de procedibilidade.
XLV. O facto da mesma poder exceder, por vezes, o valor do reembolso, em nada contende com os princípios do acesso ao direito, da proporcionalidade, do Estado de Direito Democrático, da tributação das empresas pelo seu lucro real.
XLVI. O sujeito passivo não está a pagar o reembolso, mas sim um serviço de inspecção, que importa custos não despiciendos.
XLVII. Com efeito inspeccionar cinco exercícios, implica semanas ou mesmo meses de trabalho de uma equipa de inspectores tributários.
XLVIII. E que comporta vantagens que extravasam o mero reembolso do pagamento especial por conta.
XLIX. É que convém ter em conta que uma qualquer auditoria efectuada por auditores privados, além de ser bem mais dispendiosa do que os valores agora exigidos, não garante que aquele tem a sua situação tributária regularizada, face à administração tributária.
L. Não existe qualquer violação dos princípios do acesso ao direito, da proporcionalidade, do Estado de Direito Democrático, do princípio da tributação das empresas pelo seu lucro real ou de qualquer outro preceito constitucional, quando se exige um pedido de unia acção inspectiva para o reembolso do pagamento especial por conta paga pelo contribuinte sem atender ao valor do reembolso
LI. Por fim, não pode o tribunal substituir a notificação do preço da realização de uma inspecção, por uma decisão que condene a Administração Tributária a “reembolsar o sobredito PEC à Autora” - conforme o pedido formulado pelo A. -, sob pena de violação do princípio de separação de poderes, conforme previsto no n.º 1 do artigo 111.º da CRP.
LII. O deferimento desta pretensão implica, de acordo com o estabelecido na alínea b) do n.º 3 do artigo 93.º (ex-87.º) do CIRC, a apreciação da situação que deu origem ao reembolso, por forma a aferir se a mesma se encontra justificada, o que só pode ser aferido em acção de inspecção.
LIII. É, deste modo, patente que o eventual deferimento da pretensão do A. implica, necessariamente, a emissão de um juízo de valor, de índole técnica, inserido na margem de livre apreciação da Administração Tributária.
LIV. Significa isto, que o seu reconhecimento envolve a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa, que se inscrevem no âmbito próprio da discricionariedade administrativa, não sendo possível ao Tribunal substituir-se à Administração Fiscal e determinar o conteúdo do acto que a esta cabe praticar - n.º 2 do artigo 71.º e n.º 3 do artigo 95.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
Termina pedindo:
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida.
***
A Recorrida [SCom01...], S.A. apresentou contra-alegações, nas quais conclui como se segue:
IV - CONCLUSÕES
i. Como ressuma do acervo documental junto aos autos, complementado pela decisão judicial que o Tribunal a quo invoca - existiram duas decisões administrativas sobre o mesmo pedido de reembolso de PEC: i) Decisão de 24.10.2008, com base na falta de cumprimento de formalidades essenciais e na intempestividade do pedido de reembolso; e ii) Decisão de 08.08.2011, com base na falta de pagamento da taxa provisória de € 47.694,20 para realização de inspecção.
ii. Refere o Tribunal a quo que, pelo acórdão proferido no processo n.º 102/09.SBEPNF «(...) foi o Serviço de Finanças ... condenado a admitir o referido requerimento de pedido de reembolso e condenado a prosseguir os seus ulteriores termos processuais para apreciação e decisão do pedida de reembolso.», que «A apreciação e decisão do pedido de reembolso. não se mostra compatível com o pagamento da taxa que foi exigida que, pelo seu valor, condiciona, limita, inibe e impede o exercício do direito da A. de ser tributada pelo lucro real.» e que, com o trânsito em julgado da decisão proferida no processo n.º 102/09.BBEPNF, transitada em julgado, «(…) considera-se que, por esse motivo. o Serviço de Finanças estava impedido de fixar a referida taxa, coma condição de prosseguimento. apreciação e decisão do pedido de reembolso.» (destaque nosso).
iii. Entende a Fazenda Pública que existe caso julgado, a seu favor, quando é notório que a própria decisão judicial que invoca determinou a anulação do despacho de indeferimento do pedido de reembolso, ordenando a sua ulterior tramitação - sendo que, na sequência dessa tramitação, a AF veio a determinar o pagamento de uma taxa, como condição para o desenrolar do procedimento de reembolso, mais tendo referido que a falta do pagamento dessa taxa teria como consequência que o pedido de reembolso ficaria “sem efeito”.
iv. Parece evidente a qualquer destinatário, colocado na posição da Recorrida, que essa notificação, de que o seu pedido de reembolso ficaria sem efeito, correspondia, na prática, ao seu (novo) indeferimento - sendo que apenas em sede de recurso, vem a Fazenda Pública invocar a inexistência de decisão de indeferimento do PEC, o que não estava em causa nos presentes autos e, por isso, não pode ser agora (serodiamente) conhecido.
v. Estava em causa, nos presentes autos, saber se a Administração Fiscal pode subordinar o reembolso de PEC ao pagamento de uma taxa pela realização de uma inspecção - uma vez que é esse o teor da decisão impugnada - sendo certo que, no processo n.º 102/09.8BEPRT, a questão do pagamento de taxa pela realização de inspecção, como obstáculo formal ao processamento do reembolso de PEC, não constituía objecto do processo.
vi. Aliás, precisamente por esse facto, entendeu o Tribunal a quo que a AF veio levantar “mais um obstáculo formal à apreciação desse requerimento” ou seja, um novo obstáculo que anteriormente não havia levantado.
vii. Se estamos perante um novo obstáculo ao processamento do reembolso do PEC, não se pode pretender, como faz a Fazenda Pública, que a anterior decisão judicial fechou definitivamente a discussão jurídica sobre o tema - sobretudo relativamente a aspectos que não faziam parte da questio decidenda.
viii. Ao contrário do pretendido pela Recorrente, cabia ao Tribunal a quo optar entre duas alternativas: i) - Ou considerava que a Administração Fiscal não pode vir aditar sucessivos fundamentos, para indeferimento do mesmo pedido de reembolso de PEC - julgado pela sua nulidade: ii) - Ou considerava que, sendo possível esse aditamento, a aplicação do regime da inspecção a pedido do contribuinte aos reembolsos de PEC é ilegal - conhecendo do mérito da causa.
ix. Caso se entenda que a Administração Fiscal poderia vir aditar novos fundamentos para indeferir o reembolso do PEC - nomeadamente a imposição de pagamento de uma taxa pela realização de inspecção - sempre haveria de conhecer-se do mérito da causa - pelo que, por força dos poderes de cassação atribuídos ao Tribunal de Recurso, e uma vez que os autos contêm todos os elementos para o efeito, poderá ser aqui conhecido o mérito da acção - aqui dada por reproduzida para todos os efeitos legais. Nestes termos e nos melhores de direito, deve negar-se provimento ao presente recurso, por não padecer dos vícios apontados pela Recorrente, o que se deverá fazer por obediência à Lei e por imperativo de JUSTIÇA!
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A Digna Magistrada do M.º Público junto deste Tribunal foi oportunamente notificada nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146.º, n.º 1 do CPTA, nada tendo vindo requerer ou promover.
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Os vistos foram dispensados, com a prévia anuência dos Ex.mos Juízes Desembargadores-Adjuntos.
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O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, tal como decorre do disposto nos arts. 635.º nºs 4 e 5 e 639.º do Código de Processo Civil (CPC), disposições aplicáveis ex vi art. 1.º do CPTA.
Assim sendo, no caso em apreço, atentos os termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso, há que apurar, quanto ao recurso da [SCom01...], S.A., se a decisão recorrida padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e por contradição entre os fundamentos e a decisão, ou se se encontra ferida de erro de julgamento de direito, pois em vez de se ter considerado verificada a exceção dilatória de caso julgado, o ato impugnado deveria ter sido declarado nulo por ofensa de caso julgado, ou deveria ter sido conhecido o mérito da ação.
Quanto ao recurso da Fazenda Pública, atentos os termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso, haverá que apurar se a sentença padece de erro de julgamento de direito, ao determinar como consequência da verificação da exceção dilatória de caso julgado a absolvição da A. da instância, e a condenação da R. Fazenda Pública no pagamento de custas pelo alegado decaimento na ação.
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II. Fundamentação
II.1. Fundamentação de facto
No acórdão prolatado pela primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz, numerando-se os factos discriminados, para melhor compreensão:
Dos Factos.
Por requerimento apresentado no Serviço de Finanças ..., a Autora solicitou à Administração Fiscal (A.F), aqui Ré, ao abrigo do art. 87.º, n.º 3 do CIRC (actual 93.º) o reembolso de PEC entregue nos cofres do Estado e relativo ao exercício de 2003, no montante de 32.243,00 euros - doc.2.
Nesse requerimento, a Autora invocou que não logrou deduzir aquele PEC à colecta desse exercício nem à colecta dos quatro exercícios seguintes, nos termos do artigo 93.º, n.º 1 do CIRC.
Em resposta, a AF notificou a Autora através do oficio n.º ...23/05.03, de 08.08.2011, que tinha sido autorizada a realização de acção inspectiva aos exercícios de 2003 a 2007, nos termos do art. 2.º, n.º 1 do DL n.º 06/99, de 8/1, e fixada a taxa provisória a que se refere o n.º 2 do art.4°, do mesmo diploma (doc. 3), e que a mesma deveria ser paga no prazo de cinco dias, sob pena de ficar sem efeito o referido pedido de reembolso do PEC.
Por requerimento de 29.08.2011, a Autora solicitou a indicação dos meios de reacção e respectivos prazos, contra o indeferimento do pedido de reembolso de PEC (doc. n.º 4).
Tendo a AF respondido através do ofício n.º 70362/05.03, de 25.11.11 (doc. n.º 1).
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II.2. Aditamento oficioso à fundamentação de facto:
Atento o disposto no art. 712.º, n.º 1, alínea a), primeira parte do CPC, na redação aplicável ao caso ex vi art. 281.º do CPPT, o alegado pela 1.ª Recorrente e a prova documental produzida nos autos, procede-se ao seguinte aditamento à fundamentação de facto:
1. O requerimento referido no primeiro parágrafo da fundamentação de facto do acórdão recorrido deu entrada no Serviço de Finanças ... em 29 de agosto de 2008 (cf. cópia do requerimento, a fls. 124 a 126 dos autos, e a fls. 3 a 5 do PAT).
2. Pelo ofício n.º ...84 do Serviço de Finanças ..., datado de 4 de setembro de 2008, foi comunicado à 1.ª Recorrente “[p]ara efeitos de apreciação do V/ requerimento a solicitar o reembolso do(s) pagamento(s) especi(ais) por conta do(s) exercício(s) de 2003, fica V. Ex.ª por este meio notificado para, no prazo de 15 dias, fazer prova do cumprimento do requisito constante na alínea b) do n.º 3 do artigo 87.º do Código do IRC” (cf. fls. 25 do PAT da Ação Administrativa n.º 102/09.8BEPNF, apensa aos presentes autos).
3. Em outubro de 2008 foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças ... despacho de indeferimento do pedido de reembolso de PEC de 2003, com fundamento na falta de comprovação pela 1.ª Recorrente de que “a situação que deu origem ao reembolso tenha sido considerada justificada por acção de inspeção feita a seu pedido formulado nos 90 dias seguintes ao termo do prazo de apresentação da declaração periódica relativa ao mesmo exercício” e no incumprimento do prazo estabelecido no art. 87.º n.º 3 CIRC, na redação aplicável pelo art. 3.º do art. 26.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro (cf. despacho e informação dos serviços n.º ..4/18 sobre o qual recaiu o despacho, fls. 14 a 16 do PAT da Ação Administrativa n.º 102/09.8BEPNF, apensa aos presentes autos).
4. Em 6 de fevereiro de 2009 a Recorrente intentou ação administrativa especial “para impugnação do despacho, de Outubro de 2008, do Exmo. Chefe do SF de ..., que indeferiu o pedido de reembolso do pagamento especial por conta (PEC) respeitante ao exercício de 2003”, que correu termos no TAF de Penafiel sob o n.º 102/09.8BEPNF, na qual pediu, a final, “Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exa., deve a presente acção ser julgada procedente, por provada, e, consequentemente, anulado ou declarado nulo o despacho ora impugnado e a R. condenada a reembolsar a A. dos PEC's efectuados em 2003, no valor somado de € 32.243,00, acrescido dos juros indemnizatórios legalmente devidos, com as legais consequências(cf. PI a fls. 2 a 13, e email de remessa, a fls. 14, todas da Ação Administrativa n.º 102/09.8BEPNF, apensa aos presentes autos).
5. Na ação administrativa especial n.º 102/09.8BEPNF a 1.ª Recorrente invocou, além do mais, a violação do direito de audiência prévia, o indevido indeferimento por extemporaneidade, e a inconstitucionalidade material do artigo 87.º n.º 3 b) do CIRC, ao exigir o pedido de uma ação inspetiva para o reembolso de PEC (cf. PI a fls. 2 a 13, todas da Ação Administrativa n.º 102/09.8BEPNF, apensa aos presentes autos)
6. Em 26 de julho de 2010 foi proferido Acórdão pelo TAF de Penafiel no processo n.º 102/09.8BEPNF, do qual consta no segmento decisório “A. Anula-se o acto impugnado de indeferimento do pedido de reembolso, por extemporaneidade; B) Condena-se o Serviço de Finanças ... a admitir o referido requerimento do pedido de reembolso e a prosseguir os seus ulteriores termos processuais para apreciação e decisão do pedido de reembolso realizado pela autora (art. 95.º, n.º 3, do CPTA); e C) Absolve-se o Serviço de Finanças ... do pedido de condenação no reembolso à autora dos pagamentos especiais por conta realizados em 2003, no valor de 32.243,00 €, acrescido dos juros indemnizatórios legalmente devidos.” (cf. Acórdão, a fls. 66 a 77 da Ação Administrativa n.º 102/09.8BEPNF, apensa aos presentes autos).
7. A presente ação administrativa foi remetida ao TAF de Penafiel em 27 de fevereiro de 2012, através de email (cf. fls. 2-3 dos autos, numeração do SITAF).
II.2. Fundamentação de Direito
Tal como foi já aqui explicitado, a decisão em crise é objeto de dois recursos independentes, interpostos, respetivamente, pela [SCom01...], S.A., e pela Fazenda Pública.
A [SCom01...], S.A., que doravante será aqui designada 1.ª Recorrente, imputa à decisão recorrida as nulidades por falta de fundamentação e por contradição entre os fundamentos e a decisão, mais alegando que a mesma padece de erro de julgamento de direito.
Quanto à nulidade por falta de fundamentação, alega a 1.ª Recorrente que o Tribunal a quo não procedeu à seleção da matéria de facto que considerou provada, pelo que, atento o disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 668.º (atualmente, art. 615.º) do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA, a decisão recorrida deve ser declarada nula.
Não tem, no entanto, razão.
Com efeito, e embora se conceda que a decisão recorrida se encontra deficientemente fundamentada, tal como é ilustrado pelo aditamento oficioso efetuado à respetiva fundamentação de facto por este Tribunal, a verdade é que não deixa de estar – ainda que parcamente – fundamentada de facto.
Ora, e como vem, de resto, sendo amplamente explicitado pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, o vício de nulidade por falta de fundamentação prevista na alínea b), do n.º 1 do art. 668.º (atualmente, art. 615.º) do CPC, apenas ocorre quando se verifique a total omissão da especificação dos fundamentos de facto da decisão, o que não é aqui o caso.
Com efeito, só a absoluta falta de fundamentação, e já não a sua insuficiência, mediocridade ou erroneidade, constitui nulidade, “cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento” (cf. neste sentido, o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 2016-06-02, no proc. 781/11.6TBMTJ.L1.S1, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Assim sendo, e atendendo a que o que se verifica no caso em apreciação é que, como já foi referido, a fundamentação de facto da decisão recorrida é insuficiente, mas não inexistente, não resta senão concluir que não se verifica a apontada nulidade.
Mais alega a 1.ª Recorrente que a decisão sob recurso padece de nulidade por contradição da decisão com os respetivos fundamentos, nos termos do previsto na alínea c) do n.º 1 do art. 668.º (atualmente, art. 615.º) do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA.
Esta nulidade ocorre quando os fundamentos invocados pelo Tribunal conduziriam logicamente a um resultado oposto ao que é expresso na decisão, sendo relevante para este efeito a oposição que se verifica no processo lógico que das premissas de facto e de direito que o julgador tem por apuradas, este extrai a decisão a proferir, pelo que não será nula a decisão que contenha os fundamentos que conduzem logicamente à decisão.
De facto, importa manter presente que, e como vem sendo esclarecido pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, o regime das nulidades destina-se apenas a remover aspetos de ordem formal que inquinem a decisão, não sendo adequado para manifestar discordância com e pugnar pela alteração do decidido (neste sentido, veja-se, designadamente, o Acórdão proferido pelo STJ em 2021-05-25, no proc. 558/20.8T8GMR.G1.S1, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Ora, no acórdão recorrido não deixou de se identificar a decisão transitada em julgado que no entender do Tribunal a quo decidiu a causa, de se enunciar os pressupostos da verificação da exceção dilatória de caso julgado, o regime jurídico aplicável, e de enquadrar a situação concreta no mesmo, pelo que, e não cuidando agora de apreciar do acerto da aplicação feita ao caso do direito, não deixaram ali de se alinhavar os fundamentos que conduziram logicamente à decisão.
Assim sendo, há que concluir que também não se verifica a nulidade da decisão por contradição com os respetivos fundamentos.
Prossegue a 1.ª Recorrente alegando, em síntese, que o Acórdão sobre recurso padece de erro de julgamento de direito, por concluir erradamente pela verificação da exceção dilatória de caso julgado.
Vejamos então.
O caso julgado constitui exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que pressupõe a repetição de uma causa, verificando-se depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admita recurso ordinário [cf. alínea i) do art. 494.º, atual 577.º, art. 495.º, atual 578.º, e n.º 1 do art. 497.º, atual 580.º, todos do CPC, aplicáveis ex vi art. 1.º do CPTA].
A repetição da causa ocorre quando se proponha uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, pedido e causa de pedir, existindo identidade do pedido quando numa e noutra causa se pretenda obter o mesmo efeito jurídico, e identidade da causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas causas proceda do mesmo facto jurídico [cf. n.ºs 1, 3 e 4 do art. 498.º, atual 581.º do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA].
Ora, o pedido formulado nos presentes autos, no segmento pertinente constante da respetiva alínea d), é distinto do pedido formulado na ação administrativa n.º 102/09.8BEPNF, tanto mais que em causa estão dois atos distintos, o que é quanto basta para que se conclua que o Tribunal a quo errou na interpretação e aplicação ao caso do regime processual que rege o caso julgado.
De facto, nos presentes autos a 1.ª Recorrente impugna o ato que lhe foi comunicado através do ofício n.º 70362/05.03, de 25.11.11 pedindo a final que seja “anulada a decisão de indeferimento do reembolso de PEC em causa nos autos; b) ser a Ré condenada a reembolsar o sobredito PEC à Autora; c) ser a Ré condenada a pagar à Autora os competentes juros indemnizatórios; ou, se assim não se entender; d) ser a Ré condenada a apreciar o pedido de reembolso de PEC, sem pagamento de qualquer taxa; tudo com a seguinte consequência; e) ser a Fazenda Pública condenada a pagar custas e demais encargos com o processo, porque ao mesmo deu causa.” (destacado nosso).
Na ação administrativa n.º 102/09.8BEPNF, a 1.ª Recorrente pediu a anulação ou declaração de nulidade do “despacho Outubro de 2008, do Exmo. Chefe do SF de ..., que indeferiu o pedido de reembolso do pagamento especial por conta (PEC) respeitante ao exercício de 2003”, e que a R. fosse condenada a reembolsar-lhe os PEC's efetuados em 2003, no valor somado de € 32.243,00, acrescido dos juros indemnizatórios legalmente devidos, com as legais consequências (cf. ponto 4, da fundamentação de facto aditada).
Ora, e ainda que atendendo a que nos termos do disposto no n.º 2 do art. 66.º do CPTA, o objeto da ação condenatória é “(…) a pretensão do interessado e não o ato de indeferimento, cuja eliminação da ordem jurídica resulta diretamente da pronúncia condenatória”, a verdade é que, ainda assim, o pedido condenatório relevante formulado nas duas ações é distinto – o que se explica atento o diverso teor dos dois atos “impugnados” -, pois só nos presentes autos é que a 1ª Recorrente pede que a R., aqui Recorrida, seja condenada a apreciar o pedido de reembolso de PEC, sem pagamento de qualquer taxa.
Assim sendo, não pode deixar de se lhe dar razão, devendo o seu recurso ser julgado procedente neste segmento.
Donde, e em face da constatação de que não se verifica a exceção de caso julgado, há aqui que apreciar, em substituição, a pretensão material expressa na PI da 1.ª Recorrente, ficando prejudicado o conhecimento da alegada nulidade do ato impugnado por ofensa de caso julgado [cf. alínea h) do n.º 2 do art. 133.º, renumerada alínea i) do n.º 2 do art. 161.º do CPA], o que decorre do reconhecimento de que a questão da legalidade da taxa requerida pela realização da inspeção não era objeto da ação administrativa n.º 102/09.8BEPNF [cf. n.º 2 do art. 608.º ex vi n.º 2 do art. 663.º, ambos do CPC, aplicáveis ex vi art. 1.º do CPTA].
Com efeito, e ao contrário do que pretende a Administração fiscal, à inspeção prevista na alínea b), do n.º 3, do art. 93.º (anteriormente numerado 87.º), do CIRC não é aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de janeiro, nem a taxa prevista Portaria n.º 923/99, de 20 de outubro, pois estando em causa o exercício de um direito – o de obter o reembolso do PEC que não possa ter sido deduzido à matéria coletável por insuficiência da mesma no período legalmente determinado – e sendo a inspeção tributária necessária para a verificação de um pressuposto desse direito, em causa não está um serviço que deva ser prestado pela Administração tributária aos sujeitos passivos tendo por finalidade a obtenção de uma qualquer vantagem por parte dos mesmos, mas antes a única possibilidade que estes têm de provar o pressuposto da concretização desse mesmo direito.
Esta questão encontra-se, de resto, amplamente dilucidada por jurisprudência constante dos nossos Tribunais superiores (cf. nesse sentido os Acórdãos do STA proferidos em 2017-05-31, no proc. 072/17, em 2017-10-11, no proc. 0581/17, em 2019-11-06, no proc. 03265/11.9BEPRT 0123/17, e em 2022-07-13, no proc. 03261/11.6BEPRT, todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt).
Assim sendo, reproduzem-se os fundamentos que sustentam a supracitada jurisprudência, tal como sintetizados no Acórdão proferido pelo STA em 2019-11-06, no proc. 03265/11.9BEPRT 0123/17, e que aqui se acolhem na integra e sem qualquer reserva, por mera remissão (cf. n.º 3 do art. 94.º do CPTA):
(…)
3. De direito
3.1. A questão aqui em apreço – liquidação pela AT da taxa por acto inspectivo estipulada no Decreto-Lei n.º 6/99 e na Portaria n.º 923/99 na sequência do pedido de reembolso do valor do pagamento especial por conta (PEC) previsto no n.º 3 do artigo 87.º do CIRC – não é nova na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, pois sobre ela já se pronunciaram os acórdãos de 31 de Maio de 2017 (processo n.º 072/17) e de 11 de Outubro de 2017 (processo n.º 0581/17), em sentido do qual aqui não iremos divergir.
De resto, a questão de direito a que há que responder no âmbito do presente recurso é idêntica à que foi analisada e decidida nos acórdãos antes mencionados, pelo que deve aplicar-se o disposto no n.º 3 do artigo 94.º do CPTA, i. e., proceder-se a uma fundamentação sumária da presente decisão, através de remissão para as decisões precedentes e os fundamentos aí expendidos. Optamos, porém, por transcrever excertos do acórdão de 31 de Maio de 2017 (processo n.º 072/17), que se nos afiguram essenciais para a compreensão da fundamentação da decisão aqui adoptada:
“Pretendeu o legislador com a redacção, na altura vigente, do n.º 3, do artigo 93.º, do CIRC, sujeitar o pedido de reembolso do PEC à realização de uma acção de inspecção. Mas tal não significava necessária e imediatamente a sujeição desta acção inspectiva ao previsto no Decreto-Lei n.º 6/99 e Portaria n.º 924/99 e ao inerente pagamento de taxas, como pretende a Administração Tributária.
O preâmbulo deste normativo dispõe que: a inspecção tributária depende exclusivamente, no quadro da legislação actual, da iniciativa da própria administração tributária. No entanto, a certeza e segurança jurídicas e a necessidade de viabilizar negócios jurídicos relevantes do ponto de vista da reestruturação empresarial e da dinamização da vida económica aconselham a flexibilização desse regime, posto que com a devida salvaguarda dos interesses da administração tributária. É, assim, criado um regime especial de inspecção por iniciativa do sujeito passivo, com efeitos vinculativos para a administração tributária, cujo acesso depende da prova de interesse legítimo pelo sujeito passivo ou terceiro, devidamente autorizado por este.
Por isso este normativo tem fins específicos, consubstanciando-se num serviço prestado pela Administração Tributária ao sujeito passivo para apuramento da situação tributária deste e tendo em vista a realização de actos de reestruturação empresarial, de operações de recuperação económica, entre outras.
O conceito de “interesse legítimo” do sujeito passivo está definido no n.º 6, do artigo 2.º, do normativo em análise, que explica que “o interesse legítimo referido no presente artigo consiste em qualquer vantagem resultante do conhecimento da exacta situação tributária do sujeito passivo, proveniente, nomeadamente, de actos de reestruturação empresarial, de operações de recuperação económica ou de acesso a regimes legais a que o requerente pretende ter direito.
Trata-se de um elenco meramente exemplificativo e reforça a ideia de se tratar de um serviço prestado pela Administração Tributária ao sujeito passivo, tendo em vista a obtenção por este de uma qualquer vantagem. E, como serviço que é, está sujeito ao pagamento de uma taxa, de montante variável consoante o âmbito e extensão da acção de inspecção, e cuja tabela vem prevista na já referida Portaria n.º 923/99.
Desta interpretação só se pode concluir, ao contrário do defendido pela Administração Tributária, que não é aplicável este Decreto-Lei n.º 6/99 ao regime de reembolso de PEC de IRC, mormente o seu artigo 4. °, e concomitantemente, a tabela de taxas previstas na Portaria n.º 923/99.
Trata-se de avaliar se existe uma falta de correspondência entre a finalidade inicial das inspecções a pedido com o regime previsto no n.º 3, do artigo 93.º, do CIRC. E, na verdade, inexiste qualquer correspondência.
O regime previsto no Decreto-Lei n.º 6/99 regulamenta um serviço prestado pela administração ao sujeito passivo quando este pretende realizar uma operação ou procurar uma qualquer vantagem, alheia a uma relação tributária preexistente.
Já quanto à inspecção feita a “pedido do sujeito passivo” para efeitos de reembolso de PEC de IRC, não estão em causa as mesmas finalidades. Não se trata de uma inspecção necessária à obtenção pelo particular de uma qualquer vantagem, mas antes de um procedimento necessário ao exercício de um direito.
Determinava o n.º 2, do artigo 106.º, do CIRC, em vigor à data que o montante do pagamento especial por conta é igual a 1% do volume de negócios relativo ao período de tributação anterior, com o limite mínimo de (euro) 1000, e, quando superior, é igual a este limite acrescido de 20% da parte excedente, com o limite máximo de (euro) 70.000 (sendo o volume de negócios correspondente ao valor das vendas e dos serviços prestados).
Estabeleceu o regime de PEC um conceito de “rendimento legal”: o legislador fixa um rendimento sem necessária correspondência com o rendimento real, o único tributável por imposição constitucional. E fê-lo qualificando aquele rendimento legal como uma verdadeira presunção legal, em sentido estrito. Como determina o artigo 349.º do CC, presunções são ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um desconhecido. E a lei, no CIRC, retira uma ilação de um facto conhecido, o volume de negócios do período de tributação anterior, para firmar um desconhecido, o rendimento do ano fiscal a que os pagamentos especiais por conta dizem respeito.
Ora, dispõe o n.º 2, do artigo 350.º do CC que as presunções legais podem ser ilididas mediante prova em contrário, excepto nos casos em que a lei o proibir. No que respeita ao PEC, não existe qualquer proibição legal de ilisão da presunção nem poderia nunca haver, atenta a imposição constitucional de tributação das pessoas colectivas segundo o seu rendimento real (n.º 2, do artigo 104.º, da CRP), estando antes taxativamente consagrada a possibilidade de ilidir tal presunção (artigo 73. ° da LGT).
Consequentemente, e ao contrário do entendimento da AT, não existe aqui qualquer “inversão”, ainda que aparente, da relação jurídica tributária, já que continuam a ser os mesmos o sujeito activo e o sujeito passivo daquela relação (nos termos previstos no artigo 18.º e seguintes da LGT). Também não colhe o argumento de que a acção inspectiva é necessária para a verificação de um “pressuposto legal” do direito ao reembolso: este direito nasce ope legis, se o rendimento dito “legal” for superior ao rendimento real. Ocorre, apenas e tão-só, uma inversão do ónus da prova quanto à determinação do rendimento real do sujeito passivo.
Se normalmente compete à Administração, mediante a operação desta presunção legal passa a caber àquele o ónus de a ilidir, se com a mesma não se conformar. E o meio imposto pelo legislador para ilidir tal presunção, nos termos do previsto naquela norma do n.º 3, do artigo 93.º, do CIRC, é a obrigação de o sujeito passivo pedir que lhe seja feita uma inspecção.
Todavia, não se trata aqui da prestação de um qualquer serviço pela Administração Tributária ao sujeito passivo, tendo por finalidade a obtenção por este de uma qualquer vantagem, mas sim, e exclusivamente, da única possibilidade que lhe é dada para provar que o seu rendimento real não correspondeu, no exercício em causa, ao rendimento legal fixado pelo legislador no supra-referido normativo. Ou seja, trata-se do exercício pelo sujeito passivo de um direito que lhe assiste por lei.
Não tem, por isso, aplicação a esta situação o previsto no Decreto-Lei n.º 6/99”.
(…) [fim de citação].
Assim sendo, e atendendo a que, efetivamente, do disposto no artigo 87.º n.º 3 do CIRC (posteriormente renumerado 93.º) resultava a necessidade da realização da inspeção tributária, há aqui que julgar procedente o pedido formulado na alínea d) do petitório, ou seja, ser a Ré condenada a apreciar o pedido de reembolso de PEC, sem pagamento de qualquer taxa.
Assim sendo, e em face do exposto, deverá a ação ser julgada procedente, condenando-se a Ré a apreciar o pedido de reembolso de PEC, sem pagamento de qualquer taxa.
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Em face do provimento do recurso da 1.ª Recorrente, resulta claro que o recurso da Fazenda Pública deve ser julgado improcedente.
Com efeito, e como foi já explicitado, a decisão sob recurso padece de erro de julgamento de direito na interpretação e aplicação que fez ao caso concreto do regime aplicável à exceção dilatória de caso julgado, pelo que, e não se verificando a mesma, não há que, como pretende, revogar o acórdão na parte em que absolve a Autora da instância e condena a Ré nas custas da ação, substituindo este segmento decisório pela absolvição da Ré da instância e condenação da Autora nas custas da ação.
Assim sendo, é julgado improcedente o recurso da Fazenda Pública.
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Atento o decaimento da Fazenda Pública, é sua a responsabilidade pelas custas, pelos presentes recursos, e na 1.ª instância, nos termos do disposto no art. 527.º, n.º 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA.
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Conclusão:
Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva:
I. A nulidade da sentença por falta de fundamentação prevista na alínea b), do n.º 1 do art. 668.º (atualmente, art. 615.º) do CPC, apenas ocorre quando se verifique a total omissão da especificação dos fundamentos de facto da decisão.
II. A nulidade da sentença por contradição da decisão com os respetivos fundamentos ocorre quando os fundamentos invocados pelo Tribunal conduziriam logicamente a um resultado oposto ao que é expresso na decisão, sendo relevante para este efeito a oposição que se verifica no processo lógico que das premissas de facto e de direito que o julgador tem por apuradas, este extrai a decisão a proferir, pelo que não será nula a decisão que contenha os fundamentos que conduzem logicamente à decisão.
III. O caso julgado constitui exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que pressupõe a repetição de uma causa, verificando-se depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admita recurso ordinário.
IV. Ainda que atendendo a que o objeto da ação condenatória é a pretensão do interessado e não o ato de indeferimento, cuja eliminação da ordem jurídica resulta diretamente da pronúncia condenatória, a verdade é que, ainda assim, no caso o pedido condenatório relevante formulado nas duas ações é distinto, o que se explica atento o diverso teor dos dois atos “impugnados” -, pois só nesta ação é pedido que a R. seja condenada a apreciar o pedido de reembolso de PEC, sem pagamento de qualquer taxa.
V. À inspeção prevista na alínea b), do n.º 3, do art. 93.º (anteriormente numerado 87.º), do CIRC não é aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de janeiro, nem a taxa prevista Portaria n.º 923/99, de 20 de outubro, pois estando em causa o exercício de um direito – o de obter o reembolso do PEC que não possa ter sido deduzido à matéria coletável por insuficiência da mesma no período legalmente determinado – e sendo a inspeção tributária necessária para a verificação de um pressuposto desse direito, em causa não está um serviço que deva ser prestado pela Administração tributária aos sujeitos passivos tendo por finalidade a obtenção de uma qualquer vantagem por parte dos mesmos, mas antes a única possibilidade que estes têm de provar o pressuposto da concretização desse mesmo direito.
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III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso da 1.ª Recorrente, e, em consequência, revogar o acórdão recorrido, e em substituição, julgar a ação procedente, condenado a Ré a apreciar o pedido de reembolso do PEC, sem pagamento de qualquer taxa e em negar provimento ao recurso da Fazenda Pública.
Custas pela Fazenda Pública em ambos os recursos e na primeira instância.
Porto, 25 de janeiro de 2024 - Margarida Reis (relatora) – José Coelho – Ana Paula Coelho dos Santos.