Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00145/13.7BECBR |
Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
Data do Acordão: | 10/20/2023 |
Tribunal: | TAF de Coimbra |
Relator: | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
Descritores: | PROCEDIMENTO CONCURSAL; PERFIL DE COMPETÊNCIAS; NÃO NULIDADE DA SENTENÇA; IMPROCEDÊNCIA; |
Votação: | Unanimidade |
Meio Processual: | Acção Administrativa Especial |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-: RELATÓRIO «AA», residente em ..., n.º 1, ..., ... ..., propôs ação administrativa especial contra o MUNICÍPIO ..., com sede na Av. ... ..., indicando, na qualidade de Contrainteressada, «BB», com domicílio profissional na sede do R., pedindo (i) que seja declarado nulo ou anulado o ato impugnado, consubstanciado no despacho do Presidente da Câmara Municipal ..., de 10/12/2012, que indeferiu o recurso hierárquico interposto pela A., determinando a sua exclusão do procedimento concursal para preenchimento de um posto de trabalho na carreira de Técnico Superior – área de Planeamento Regional e Urbano, do mapa de pessoal do R., (ii) que seja reconhecido e declarado que a A. reúne as competências essenciais para o exercício das funções próprias do posto de trabalho em causa e (iii) que o R. seja condenado a avaliar a A. nos termos referidos na petição inicial e, em consequência, a mantê-la no concurso em causa. Por decisão proferida pelo TAF de Coimbra foi julgada improcedente a acção e absolvida a Entidade Demandada dos pedidos. Desta vem interposto recurso. Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões: 1ª A sentença em recurso confirmou a exclusão da Recorrente do concurso em causa nos presentes, assim incorrendo em vários erros jurídicos e atropelos à lei, não só porque julgou legal a Entrevista de Avaliação de Competências realizada à Recorrente quando a mesma não só assentou em critérios subjectivos, como foi realizada sem se ter definido o “perfil de competências” imposto por lei (v. nº 4 do artº 12º da Portaria 83-A/2009) e sem que se identificasse as matérias a que a Recorrente respondeu ou o que respondeu, em clara violação dos princípios da divulgação atempada dos critérios de selecção e da imparcialidade. Para além disso, 2ª Aquela Entrevista concluiu pela incompetência da Recorrente para o exercício das funções postas a concurso quando foi a própria entidade recorrida quem a julgou perfeitamente competente para exercer tais funções em anterior concurso (v. doc. junto) e quando está provado que a Recorrente exerce estas mesmas funções noutra Autarquia há já vários anos, pelo que sempre o aresto que confirmou a exclusão da Recorrente terá que ser anulado. Com efeito, 3ª O aresto em recurso começa por enfermar da nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do artº 615º do CPC por não ter especificado nem dado por provado um facto que era absolutamente essencial para a decisão de direito que alcançou, uma vez que para poder concluir pela legalidade, isenção, imparcialidade e correcta duração da Entrevista era absolutamente essencial que se tivesse dado por provada a duração da mesma e factos que comprovassem a legalidade, isenção e imparcialidade com que a mesma decorreu. Para além disso, 4ª Também o Saneador e o Despacho que indeferiu a prova pericial peticionada são claramente ilegais, pois ao rejeitar tal prova e ao ordenar a notificação das partes para produzirem alegações quando havia matéria de facto controvertida que era essencial para a boa decisão da causa à luz das várias soluções plausíveis da questão de direito e sem antes ter determinado a abertura de um período destinado à prova de tais factos violou-se frontalmente o disposto na alínea c) do nº 1 do artº 87º do CPTA, o direito fundamental à tutela judicial efectiva, e o princípio da igualdade das partes, consagrados nos artºs 2º e 6º do CPTA. 5ª Na verdade, a matéria de facto alegada na p..i que fundamentava e integrava os vícios de violação de lei assacados ao acto impugnado (v. artºs 25º, 27º 30º, 57º e ss. da p.i.) foi impugnada em sede de contestação (v. artº 2º da contestação do Município e artºs 18º, 20º, 40º, 50º e 51º da contestação da contra-interessada), pelo que eram factos controvertidos cujo apuramento era essencial para a boa solução da causa à luz das várias soluções plausíveis da questão de direito, sendo fundamental para que se pudesse proferir uma decisão justa e esclarecida que se apurasse, no mínimo, se a Recorrente executava diariamente as funções postas a concurso; se tinha as competências comportamentais necessárias para as executar e se a Entrevista que determinou a sua exclusão tinha efectivamente decorrido com a forma e duração necessárias ao apuramento das suas competências. 6ª Neste mesmo sentido, veja-se que o Tribunal Central Administrativo Sul já decidiu que havendo matéria de facto controvertida tem de ser aberto um período destinado à sua prova (v. Acº de 2003, Proc. nº 10868/01, da 1ª Secção, 2ª Subs.; v. igualmente o Acº do TCANORTE de 28/3/2014, Proc. nº 316/10.8BECBR), defendendo a doutrina que a decisão judicial que denegar a uma das partes a possibilidade de provar os factos por si alegados e que são controvertidos e essenciais para o julgamento da causa viola frontalmente o princípio da tutela judicial efectiva (v. CARLOS CADILHA, A prova em contencioso administrativo, in CJA nº 69º, págs. 46 a 49, COLAÇO ANTUNES, O juiz administrativo, súbdito da prova procedimental, in CJA nº 56, págs. 3 e segs.), tanto mais que o processo instrutor não faz fé em juízo e a sua valoração como meio de prova não pode implicar uma ofensa aos princípios da igualdade de armas nem desobrigar o juiz administrativo de definir os temas de prova à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito e de abrir o correspondente período de prova (v. CARLOS CARVALHO, O juiz administrativo e o controlo jurisdicional da prova procedimental do processo disciplinar, in CJA nº 101, pág. 23). 7ª Consequentemente, é por demais notório que ao não submeter a prova factos que eram controvertidos e essenciais para demonstrar a procedência dos vícios imputados ao acto recorrido, o saneador não cumpriu o que lhe era imposto pelo artº 87º /1/c do CPTA e atentou de forma inadmissível contra os princípios da igualdade das partes e da tutela judicial efectiva, tanto mais que julgou a acção improcedente por não se ter provado a matéria de facto por ela alegada para sustentar a procedência dos vícios invocados. 8ª Significa isto que para o Tribunal a quo a palavra de uma das partes e os documentos particulares que ela coloca no processo administrativo fazem prova plena de toda a factologia essencial para a decisão da causa, de tal forma que apesar de o administrado alegar factos que demonstram o erro nos pressupostos em que se baseou a decisão impugnada nem sequer vale a pena permitir-lhe provar o que alegara e demonstrar o erro da prova considerada pela Administração, o que temos por seguro representar um claro erro de julgamento e uma interpretação claramente contrária ao princípio da igualdade das partes e ao direito à tutela judicial efectiva. Para além disso, 9ª O aresto em recurso incorreu em erro de julgamento ao julgar legal a Entrevista que exclui a Recorrente com base em itens como a “avaliação comportamental em contexto de trabalho”, o “relacionamento interpessoal” ou a “motivação” e sem sequer se ter identificado as matérias a que a Recorrente respondeu ou as suas respostas às mesmas, em clara violação do princípio da aplicação de critérios objectivos de avaliação, do dever de fundamentação e dos princípios da imparcialidade, transparência e prossecução do interesse público. Acresce que, 10ª O desacerto do aresto em recurso resulta ainda do facto de não ter considerado violado o artº 12º/3 da Portaria 83-A/2009 e o princípio do mérito ao realizar uma Entrevista de Avaliação de Competências com um único técnico de RH, pois a verdade é que tais Entrevistas devem ser realizadas por um órgão colegial de forma a garantir total eficácia na avaliação do mérito demonstrado pelos candidatos, não devendo por isso tal juízo avaliativo estar dependente de uma só pessoa. 11ª Com efeito, o nº 3 do artº 12º da Portaria nº 83-A/2009 refere que tal prova deva ser efectuada por “...técnicos de gestão de recursos humanos (...) ou outros técnicos...”, ou seja, refere-se a tais técnicos sempre no plural (e não no singular), impondo assim que tal avaliação seja efectuada por um colégio, tal e qual, aliás, como nas outras Entrevistas – “entrevista profissional de selecção” e “avaliação psicológica” – em que o mérito é sempre avaliado por um colégio. 12ª A esta mesma conclusão se chega por outra ordem de razões. Com efeito, se a “Entrevista Profissional de Selecção”, que é um método de selecção facultativo, exige, no mínimo, 2 avaliadores (v. artº 13º/3 da Portaria 83-A/2009), por maioria de razão também a “Entrevista de Avaliação de Competências” que é um método obrigatório, tem que ser realizada por, pelo menos, 2 técnicos, pois nada justificaria que um método de selecção obrigatório pudesse ser levado a cabo por 1 único técnico, enquanto um facultativo tivesse que o ser obrigatoriamente por 2, tanto mais que ambas as Entrevistas têm o mesmo objectivo: a análise comportamental em sede de experiência profissional. Por outro lado, 13ª O aresto em recurso incorreu em flagrante erro de julgamento ao não anular o acto impugnado por violação do artº 12º/4 da Portaria 83-A/2009 e os princípios da imparcialidade e da prévia divulgação das regras do jogo que presidiriam à avaliação da Recorrente, pois contrariamente ao que impunha o citado preceito, não foi previamente definido qual o “perfil de competências” a aplicar na Entrevista de Avaliação, sendo certo que à Administração não basta ser imparcial, antes tendo também que parecer imparcial (v. MARIA TERESA RIBEIRO, in O Princípio da Imparcialidade da Administração Pública, 1996, pág. 98). Na verdade, 14ª Apesar de o nº 4 do artº 12º da Portaria nº 83-A/2009 exigir claramente que seja definido um “perfil de competências” previamente à elaboração do próprio guião da Entrevista de Avaliação de Competência, nunca tal “perfil” foi definido, tendo a Recorrente acabado por ser excluída do concurso na sequência de uma Entrevista que não cumpriu os formalismos impostos por lei, 15ª O que é francamente ilegal e injusto, tanto mais que é jurisprudência pacífica dos nossos Tribunais que, por imperativos de igualdade e, sobretudo, de transparência e isenção, a Administração está vinculada em todos os procedimentos concursais a definir e a dar a conhecer previamente as “regras do jogo” e os critérios que justificarão a admissão ou exclusão de um candidato, sendo suficiente para a anulação do acto o incumprimento desta regra (v. o Acº do Pleno do STA de 13/11/2007, Proc. nº 1140/06;. v. Acsº do STA de 07/12/94, Acórd. Dout. 409/16, de 6/10/99, Acórd. Dout 458/178 e de 14/05/96, Acórd. Dout. 419/1265; v. Acº STA de 15/2/2005, publicado no publicado no Apêndice do DR de 18/11/2005, pág. 1269), 16ª Tendo o TAF de Coimbra já defendido, no âmbito do Proc. nº 1176/10.4BECBR, a ilegalidade do acto de exclusão dos candidatos por não ter sido previamente definido o “perfil de competências” necessário à aplicação daquele método de selecção. 17ª Por fim, ao julgar improcedente o vício de violação de lei por erro grosseiro na avaliação com o argumento de que não havia qualquer erro manifesto ou grosseiro, o aresto em recurso não só violou frontalmente o direito à tutela judicial efectiva e o princípio da igualdade das partes, como seguramente incorreu ele próprio num manifesto erro de julgamento, pois não só era manifesto que a Recorrente não merecia uma nota negativa na avaliação das suas competências para o cargo a concurso – como, aliás, resultava à evidência do facto de 3 anos antes esta mesma entidade recorrida lhe ter atribuído 14 valores na Entrevista que realizou para este mesmo posto de trabalho com contrato a termo, conforme doc. junto -, como jamais poderia o Tribunal arvorar-se em especialista em Psicologia e Recursos Humanos e, antes de permitir a uma das partes provar os factos integrantes do vício invocado, concluir ab initio que não havia qualquer erro manifesto na avaliação. 18ª Salvo o devido respeito, com teses como a sufragada pelo Tribunal a quo não há seguramente tutela judicial nem igualdade das partes que possa resistir, sendo mesmo evidente que nunca um administrado conseguirá demonstrar que uma decisão proferida pela Administração no uso de poderes discricionários enfermava de erro manifesto ou grosseiro, pelo simples razão de que quem é leigo na matéria e não tem quaisquer conhecimentos sobre o tema entende não submeter a prova os factos alegados pela parte que invoca o vício e, ab initio, sem ouvir qualquer especialista ou permitir a produção de qualquer outra prova, logo concluiu não haver qualquer erro manifesto, o que denota que o que merece credibilidade e aquilo em que se acredita fielmente é no que diz a Administração e não no que alega o particular, ao ponto de contra o que diz a Administração nem sequer ser necessário submeter a prova o que diz o administrado. Nestes termos, Deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se o Saneador, o Despacho de 15/11/2016 e a sentença em recurso, com as legais consequências. Assim será cumprido o Direito e feita JUSTIÇA! O Réu juntou contra-alegações, concluindo: I. O despacho saneador, pelo qual se considerou não haver matéria de facto controvertida relevante, foi proferido em 25/06/2013, altura em que, por força do previsto no nº 3 do art. 40º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e considerando o valor da acção, o tribunal funcionava em formação de 3 juízes, ao qual competia o julgamento da matéria de facto e de direito. II. O despacho saneador foi proferido pelo então relator, ao abrigo da competência que lhe era conferida pelo artigo 87º do CPTA, sendo que de tais despachos do relator cabia reclamação para a conferência, nos termos do artigo 27º/2 do CPTA no prazo de 10 dias (art. 29º/1 do CPTA); III. Não tendo a autora feito uso da competente reclamação para a conferência, pedindo a reapreciação do despacho do relator que considerou desnecessária a produção de prova, ficou precludida a possibilidade de, nesta fase, pôr em causa tal despacho, que transitou em julgado, sendo neste momento irrecorrível. Aponta neste sentido, designadamente, o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência proferido no processo 01469/16 de 8/6/2017. IV. A nulidade prevista na al. b) do nº 1 do art. 615º do CPC só se verifica quando há uma total ausência de fundamentação de facto ou de direito, e não quando estamos perante uma motivação deficiente, errada ou incompleta, situações que não afectam o valor da sentença que, no caso dos autos, até é bastante exaustiva quer na indicação dos factos dados como provados quer na análise crítica dos mesmos e das questões suscitadas pela autora. As discordâncias manifestadas pela autora constituem, quanto muito, erro de julgamento, não uma nulidade da decisão. V. Não se verifica igualmente qualquer violação do art. 87º, 1, al. c) do CPTA. Tal como se decidiu no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 19/01/2012 (processo 07779/11) “Não se produz prova sobre factos alegados nos articulados mas sobre factos levados à base instrutória”, pelo que se não foi organizada a base instrutória não havia como admitir qualquer requerimento de prova. Só se o tribunal superior “entender que entender que há factos controvertidos que dependem de prova a produzir, anulará o processado e ordenará a baixa dos autos a fim de ser organizada a base instrutória. Então, se isto acontecer, é que se vai levantar a questão de sabermos se a prova (...) é ou não admissível havendo base instrutória. VI. A matéria de facto alegada pela autora na petição inicial sob o título “Dos Factos” começa no artigo 8° e termina no artigo 21°, não se compreendendo como possa vir indicar os artigos 25º, 27º, 30º e 57º e ss. da pá. como factos carenciados de prova, quando estes estão integrados na matéria que a recorrente destinou às considerações de “Direito”, iniciadas no art. 22° do petitório. VII. Por outro lado, impunha-se que autora indicasse especificadamente quais os artigos que considera carenciados de prova, ónus que apenas é cumprido aos artigos 25º, 27º, 30º e 57º, sendo que, analisados estes, apura-se que apenas versam matéria conclusiva ou de direito. VIII. Não cabe ao Tribunal analisar cada um dos 73 artigos que se seguem ao art. 57º e ponderar se os mesmos deviam ou não ser levados à base instrutória. Era à autora que cabia esse ónus e não o tendo feito é líquido concluir, pelo menos, da irrelevância ou da reduzida importância para a decisão da acção. IX. O artigo 12º/3 da Portaria 83-A/2009 não exige a intervenção de 2 técnicos. Com efeito, o plural é utilizado num sentido generalizante, com o sentido de definir o perfil dos entrevistadores: a entrevista só pode ser realizada por todos aqueles técnicos que, fazendo parte da gestão de recursos humanos, tenham formação adequada para o efeito, ou por todos aqueles técnicos que tenham sido previamente formados para a utilização desse método. X. Se o legislador, a propósito da entrevista profissional de selecção (art. 13º), teve o cuidado de determinar que a mesma seja feita obrigatoriamente pelo júri ou por, pelo menos, dois técnicos, e não teve esse cuidado na entrevista de avaliação de competências, não pode o intérprete deduzir que fosse essa também a sua intenção. XI. Não colhe o argumento de que a entrevista profissional de selecção é um método facultativo que exige, no mínimo, dois avaliadores e que, por maioria de razão, também a entrevista de avaliação de competências, que é um método obrigatório, também o exigirá. A prova de conhecimentos e a avaliação psicológica também são métodos obrigatórios e não exigem a intervenção de mais de um avaliador. XII. Aos argumentos atrás enumerados, acresce outro decisivo. Sempre que a decisão a tomar é colegial o legislador determina que a classificação final é obtida através da média aritmética simples ou ponderada atribuída por cada um dos elementos do júri. Assim acontece com a avaliação curricular (nº 3 do art. 11º e nº 4 do art. 18º da Portaria) e com a entrevista profissional de selecção (art. 13º/3 e art. 18º/7, al. a) e b). XIII. Se a entrevista de avaliação de competências fosse forçosamente a realizar por mais do que um técnico, por que motivo não estabeleceu o legislador que a classificação final seria também obtida por média aritmética? Porque quando se impõe a intervenção de mais do que um elemento avaliador em certo método avaliativo, considera a hipótese dos avaliadores não estarem em sintonia com a pontuação a atribuir ao candidato. Nesses casos, a classificação final para esse método é obtida através da média aritmética de cada uma das classificações atribuída por cada um dos elementos do júri ou por cada um dos técnicos. XIV. Inverifica-se também qualquer violação do nº 4 do art. 12º da portaria 83-a/2009. Tal como decorre taxativamente do ponto 24 do aviso de concurso (aviso 2557/2012, dr, ii série, nº 34, 16/02/2012), “As atas do júri, onde constam os parâmetros de avaliação e respectiva ponderação de cada um dos métodos de selecção a utilizar, a grelha classificativa e o sistema de valoração final do método, são facultadas aos candidatos sempre que solicitadas.” Por sua vez, no ponto 4.7 da primeira acta do júri, prévia ao lançamento do concurso (cfr. fls. 1248 do PA), consta que “As competências a avaliar na EAC (Entrevista de Avaliação de Competências) serão extraídas da lista de competências, previstas na Portaria 1633/2007 de 31 de Dezembro e respectivas carreiras”. Não há dúvidas, portanto, que foram previamente definidas as competências a avaliar na EAC. XV. Como se sabe, a avaliação feita no procedimento concursal em crise integra-se no quadro da chamada justiça administrativa, pois as decisões proferidas baseiam-se essencialmente em critérios de justiça material. Na hipótese dos autos, tal como na de classificação de alunos em exames escolares ou de propostas em concursos públicos, de graduação de penas em processos disciplinares ou na apreciação de queixas, “os órgãos competentes (...) tomam uma decisão cujo critério não pode ser impugnado no Tribunal. Ninguém pode ir a Tribunal reclamar da nota que lhe foi dada, ou da classificação em que foi colocado, ou da notação que lhe foi atribuída pelo seu superior hierárquico, com fundamento em que devia ter sido outra e não aquela”. Direito Administrativo, Volume II, Diogo Freitas do Amaral, Lisboa, 1988, página 183). XVI. Com muito interesse para os autos veja-se também o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, processo 0308/08 de 27/05/2009, disponível em www.dgsi.pt, cujo sumário se transcreve: “VII - Na avaliação do mérito do serviço dos seus agentes a Administração age no âmbito da chamada justiça administrativa, dispondo de uma ampla margem de livre apreciação, envolvendo a aplicação em concreto de conceitos jurídicos indeterminados, a emissão de juízos de valor ou prognose, necessariamente subjectivos, nessa medida jurisdicionalmente insindicáveis, não podendo o tribunal, em tais casos, substituir pelos seus os juízos formulados pela Administração, circunscrevendo-se a sindicabilidade contenciosa, em tais situações, à existência de erro grosseiro ou manifesto ou à adopção de critérios claramente desajustados. VIII - Assim, a singela invocação de que a avaliação levada a efeito nos diversos factores classificativos não reflectiu o trabalho desenvolvido pelo interessado ao longo do período objecto de avaliação, por não ser de molde a evidenciar erro grosseiro ou manifesto, ou adopção de critério ostensivamente desajustado, não só não faz incorrer o acto em afronta aos poderes que a Administração detém no âmbito em causa como não corporiza erro sobre os pressupostos.” Termos em que, com o suprimento, deve o recurso improceder. A Senhora Procuradora Geral Adjunta, notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer. Cumpre apreciar e decidir. FUNDAMENTOS
Os candidatos a seguir identificados não compareceram à prova Escrita de Conhecimentos Teóricos, considerando-se excluídos do procedimento concursal, nos termos do ponto 18, do respetivos Aviso de abertura, com o n.º 2557/2012, de 16 de fevereiro, o que equivale à desistência do concurso vertente: - «DD» e «EE». Lista de Classificação na Avaliação Curricular (...)
E por último, o júri deliberou que os candidatos aprovados serão notificados para serem submetidos ao próximo método de seleção (...)” (cfr. doc. de fls. 1085 e 1086 do volume III do processo administrativo). 11) Através de e-mail enviado em 24/07/2012, foi a A. notificada, na sequência da reunião do júri que antecede, de que a mesma foi considerada em condições de ser submetida ao segundo método de seleção obrigatório, a Entrevista de Avaliação de Competências (EAC), a realizar no dia 01/08/2012, pelas 15h30, no Edifício ... (cfr. doc. de fls. 1088 a 1090 do volume III do processo administrativo). 12) A Técnica Superior da Direção de Recursos Humanos «FF», vogal efetiva do júri do concurso, elaborou o guião de entrevista para efeitos do método de seleção da EAC, com o objetivo de “permitir a recolha de informação através de um guião para uma entrevista semiestruturada que encoraje a falar sobre experiências relevantes, no âmbito da função desempenhada atualmente, se for o caso, ou da última experiência relevante” (cfr. doc. de fls. 1098 do volume III do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido). 13) Do referido guião de entrevista consta a data de 03/08/2012, bem como a seguinte nota manuscrita e assinada pela Técnica Superior da Direção de Recursos Humanos «FF»: “Onde se refere a data de 3 de agosto de 2012, por lapso, pretende-se referir a data de 1 de agosto de 2012” (cfr. doc. de fls. 1098 do volume III do processo administrativo). 14) A entrevista foi realizada, no dia 01/08/2012, pela Técnica Superior da Direção de Recursos Humanos «FF», tendo sido emitida declaração pelo R., na mesma data, da qual consta que a A. “esteve presente nos Paços do Município para prestação da prova de entrevista no âmbito do procedimento concursal de técnico superior de Planeamento Regional e Urbano entre as 15,00h e as 17,30 horas” (cfr. doc. de fls. 1099 a 1103 do volume III do processo administrativo e doc. de fls. 192 do suporte físico do processo). 15) A A. obteve a classificação de 8 valores na EAC, em resultado da média aritmética das seguintes pontuações parcelares obtidas em cada uma das competências e parâmetros avaliados: - Avaliação comportamental em contexto de trabalho: 12 valores; - Capacidade de comunicação: 4 valores; - Relacionamento interpessoal: 12 valores; - Motivação: 4 valores; - Sentido crítico: 8 valores (cfr. doc. de fls. 1103 do volume III do processo administrativo). 16) Da grelha de avaliação individual da A. no método de seleção da EAC, elaborada pela Técnica Superior da Direção de Recursos Humanos «FF», constam os respetivos comentários e observações de suporte à atribuição de cada uma das classificações nas competências avaliadas (cfr. doc. de fls. 1104 a 1108 do volume III do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido). 17) No dia 03/08/2012 reuniu o júri do concurso a fim de deliberar sobre o resultado da aplicação do segundo método de seleção, a avaliação psicológica ou a entrevista de avaliação de competências, e elaborar as respetivas listas de classificação, tendo na reunião sido aprovadas as seguintes listas: “Lista de Classificação na Prova de Avaliação Psicológica (...)
Lista de Classificação na Entrevista de Avaliação de Competências (...)
O Júri em conformidade com os Artigos 31.° e 36.° da portaria n.° 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada pela Portaria n.° 145-A/2011, de 6 de abril, nos termos do artigo 101.° do Código do Procedimento Administrativo, proceder à audiência prévia dos interessados, a qual deverá ser efetuada por escrito, sendo que, findo aquele prazo, convocará as candidatas aprovadas para o próximo método de seleção, a Entrevista Profissional de Seleção” (cfr. doc. de fls. 1113 e 1114 do volume III do processo administrativo). 18) Através de e-mail enviado em 10/08/2012, foi a A. notificada, na sequência da reunião do júri que antecede, da sua exclusão do procedimento concursal em apreço, por não ter obtido valoração superior a 9,5 valores no método de seleção da EAC, tendo-lhe sido concedido o prazo de 10 dias úteis para, por escrito, se pronunciar (cfr. doc. de fls. 1117 e 1118 do volume III do processo administrativo). 19) Em 23/08/2012 a A. exerceu o respetivo direito de audiência prévia, mediante requerimento no qual expôs os seus argumentos contra a nota que lhe foi atribuída em sede de EAC, alegando que “o projeto de decisão é manifestamente ilegal e injusto, quer por erros na realização da entrevista de avaliação de competências quer por erro grosseiro na apreciação das competências da ora interessada”, e requerendo, a final, que sejam “reapreciados os parâmetros à luz dos aspetos ora mencionados e alterada a avaliação de cada competência e, consequentemente, (...) alterada a nota da entrevista de avaliação de competências” (cfr. doc. de fls. 1123 a 1138 do volume III do processo administrativo). 20) No dia 10/09/2012 reuniu o júri do concurso a fim de deliberar sobre as alegações apresentadas pela A. no âmbito do exercício do direito de audiência prévia, tendo os seus argumentos sido analisados e ponderados, com auscultação da Técnica Superior da Direção de Recursos Humanos que realizou a entrevista, «FF», tendo o júri deliberado, por unanimidade, no sentido do indeferimento de tais alegações e da manutenção da classificação final da A., com a sua consequente exclusão do concurso, e da anterior ordenação dos candidatos, nos termos que resultaram da reunião de 03/08/2012 (cfr. doc. de fls. 1236 a 1239 do volume III do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido). 21) Através de e-mail enviado em 11/09/2012, foi a A. notificada, na sequência da reunião do júri que antecede, de que a exposição por si apresentada, em sede de audiência prévia, foi indeferida (cfr. doc. de fls. 1159 e 1160 do volume III do processo administrativo). 22) As candidatas «BB», ora Contrainteressada, e «CC» foram notificadas, através de e-mails enviados em 11/09/2012, para comparecerem no Edifício ..., no dia 14/09/2012, a fim de prestarem prova de Entrevista Profissional de Seleção, tendo as referidas candidatas obtido neste método, respetivamente, as classificações de 12,00 e 16,00 valores (cfr. docs. de fls. 1161 a 1166 e 1174-1175 do volume III do processo administrativo). 23) No dia 18/09/2012 reuniu o júri do concurso a fim de deliberar sobre o resultado da aplicação do terceiro método de seleção, a Entrevista Profissional de Seleção, e elaborar a respetiva lista de classificação, nos seguintes termos: “Lista de Classificação na Entrevista Profissional (...)
(cfr. doc. de fls. 1234 e 1235 do volume III do processo administrativo). 24) No mesmo dia, em 18/09/2012, reuniu novamente o júri do concurso a fim de elaborar a lista unitária de ordenação final, após aplicação dos diferentes métodos de seleção, bem como da respetiva fórmula para obtenção da classificação final, nos seguintes termos: “Lista unitária de ordenação final
Em conformidade com o n.° 1 do artigo 36.° da Portaria n.° 83 -A/2009, de 22 de janeiro, alterada pela Portaria n.° 145-A/2011, de 6 de abril, o júri deliberou notificar os candidatos sobre a Ordenação Final obtida e dar-lhes 10 dias úteis para se pronunciarem (...)” (cfr. doc. de fls. 1232 e 1233 do volume III do processo administrativo). 25) Através de requerimento que deu entrada nos serviços do R. em 01/10/2012, a A. apresentou recurso da decisão do júri de manutenção da sua classificação final e consequente exclusão do concurso, dirigido ao Presidente da Câmara Municipal ..., reiterando que “a decisão é manifestamente ilegal e injusta, quer por erros na realização da entrevista de avaliação de competências quer por erro grosseiro na apreciação das competências da ora interessada”, e requerendo, a final, que sejam “reapreciados os parâmetros à luz dos aspetos ora mencionados e alterada a avaliação de cada competência e, consequentemente, (...) alterada a nota da entrevista de avaliação de competências e (...) dada a oportunidade para a interessada completar as fases seguintes do procedimento de concurso” (cfr. doc. de fls. 1181 a 1187 do volume III do processo administrativo). 26) No dia 31/10/2012 reuniu o júri do concurso a fim de proceder ao registo das alegações apresentadas em sede de audiência prévia, bem como das respetivas respostas, resultando da ata da referida reunião o seguinte: “Realizada a audiência prévia dos interessados, nos termos dos artigos 31.° e 36.° da Portaria n.° 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada pela Portaria n.° 145-A/2011, de 6 de abril e artigo 101.° do Código do Procedimento Administrativo, verificou-se que foram levantadas várias questões pela candidata, «CC», as quais foram dirimidas em tempo útil, ficando assim concluídos os atos administrativos dependentes do júri. Face ao exposto e em conformidade com o n.° 2 do artigo 36.° da Portaria n.° 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada pela Portaria n.° 145-A/2011, de 6 de abril, o júri deliberou submeter a homologação do Presidente da Câmara Municipal a lista de ordenação final dos candidatos aprovados” (cfr. doc. de fls. 1223 do volume III do processo administrativo). 27) Em 10/12/2012 foi proferida, pelo Presidente da Câmara Municipal ..., decisão de indeferimento do recurso interposto pela A. da decisão do júri de manutenção da sua classificação final e consequente exclusão do concurso, tendo-se concluído, após uma análise e ponderação dos argumentos da A., o seguinte: “- Nestes termos e após análise detalhada do Recurso apresentado pela candidata e de acordo com a ata do júri de 10 de setembro de 2012, conclui-se que foram cumpridos os requisitos legais, previstos no artigo 12.° da Portaria n.° 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada pela Portaria n.° 145-A/2011, de 6 de abril, relativamente à realização da Entrevista de Avaliação de Competências, que decorreu de forma isenta e imparcial, tal como se pode verificar pela clareza e objetividade do guião de questões, e pela grelha de avaliação individual, respeitando-se desta forma as exigências de objetividade e de fundamentação exigidas pelo princípio da imparcialidade. - Assim, encontrando-se esclarecidos os factos e verificando-se que se encontra garantido o cumprimento dos princípios da imparcialidade e da transparência na realização da Entrevista de Avaliação de Competências, determino que se mantenha a classificação final da entrevista de avaliação de competências atribuída à candidata e a sua consequente exclusão, nos termos devidamente esclarecidos na referida deliberação do júri” (cfr. doc. de fls. 1215 a 1219 do volume III do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido). 28) A A. foi notificada da decisão de indeferimento do recurso que antecede através de e-mail enviado no dia 14/12/2012 (cfr. doc. de fls. 1221 e 1222 do volume III do processo administrativo). 29) Por despacho do Presidente da Câmara Municipal ... de 14/12/2012, foi homologada a lista de ordenação final dos candidatos aprovados, nos termos definidos pelo júri na reunião de 18/09/2012, da qual resulta ordenada em primeiro lugar a Contrainteressada, com a classificação final de 14,89 valores (cfr. docs. de fls. 1220 e 1223 do volume III do processo administrativo). 30) Pelo Aviso n.° 17053/2012, de 14/12/2012, publicado em Diário da República, 2.ª Série, n.° 247, de 21/12/2012, foi publicitada a referida lista unitária de ordenação final das candidatas ao concurso em apreço (cfr. doc. de fls. 1255 do volume III do processo administrativo). 31) A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 22/02/2013 (cfr. doc. de fls. 2 do suporte físico do processo). Em sede de factualidade não provada o Tribunal exarou: Não há factos que cumpra julgar não provados com interesse para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito. E, em sede de motivação da factualidade assente, consignou que os factos que foram considerados provados resultaram do exame dos documentos supra identificados, constantes dos autos e do processo administrativo apenso, nos termos expressamente referidos no final de cada facto. DE DIREITO Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT. Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o Tribunal, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, e decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”. Assim, Da irrecorribilidade do Despacho Saneador - A presente acção foi intentada em 22/2/2013, tendo o A. atribuído à mesma o valor de 5000,01€, valor que depois veio a ser fixado em 30 000,01€. Ao tempo, determinava o nº 3 do art. 40º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais que nas acções administrativas especiais de valor superior à alçada, o tribunal funcionava em formação de 3 juízes, ao qual competia o julgamento da matéria de facto e de direito. Actualmente, em razão das alterações provocadas pelo DL n.º 214-G/2015, de 02 de outubro, o tribunal de círculo passou a funcionar, em regra, apenas com juiz singular, situação que teve efeitos apenas a partir de 3 de outubro de 2015. Para o que se dirá de seguida, releva a redacção anterior ao DL 214-G/2015. Conjugando a regra do nº 3 do art. 40º do ETAF com o disposto no nº 3 do art. 6º do mesmo diploma e ainda com o art. 31º/1 da LOFTJ (aprovada pela Lei 52/2008 de 28/08), conclui-se que até à alteração operada pelo DL 214-G/2015 a presente acção era decidida com formação do tribunal colectivo. Estipulava o artigo 27º, nº 1, do CPTA, como competências do relator, as enumeradas nas várias alíneas daquele n.º 1, e ainda, todos os «demais poderes que lhe são conferidas» pelo CPTA. Entre estes poderes estava, designadamente, o indicado no artigo 87º, n.º 1: proferir despacho saneador. Assim, ao tempo em que foi proferido o despacho saneador (25/6/2013) o Tribunal funcionava em formação de 3 juízes, o que significa que o despacho saneador foi proferido pelo então relator, ao abrigo da competência que lhe era conferida pelo artigo 87º do CPTA. Ora, dos despachos do relator cabia reclamação para a conferência, nos termos do artigo 27º/2 do CPTA no prazo de 10 dias (artº 29º/1 do CPTA). Com efeito, estes poderes do relator, alguns verdadeiramente decisivos - porque não apenas moldam mas, às vezes, definem o destino do processo ou do pedido, a sua procedência ou decadência - tinham de ter uma “válvula de escape” para assegurar que quem controla ou julga o processo é, em última instância, o tribunal colectivo, não um dos seus juízes. Daí que a possibilidade prevista neste nº 2 de as partes reclamarem para a formação de juízes, para a conferência dos actos e despachos do relator, a fim de os fazer reapreciar [e revogar ou substituir] em acórdão subscrito por todos os juízes, incluindo o reclamado - (Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, no CPTA Anotado, 2ª edição revista, 2007, sobre o artigo 27º, nº 2, páginas 223 e 224). Não tendo feito uso da competente reclamação para a conferência, pedindo a reapreciação do despacho do relator que considerou desnecessária a produção de prova, ficou precludida a possibilidade de, nesta fase, pôr em causa tal despacho. Só o uso prévio da reclamação para a conferência viabilizaria o recurso do despacho saneador no recurso a interpor da decisão final. Se assim é, o despacho saneador é insusceptível de ser revogado, pelo que não há como determinar a sua revogação em ordem a determinar a abertura de período de produção de prova. A reforma operada pelo DL 214-G/2015 não belisca o que vem dito. Se ao tempo se exigia a reclamação para a conferência, não tendo a Autora lançado mão da mesma, tal significa que ficou definitivamente precludida a possibilidade de recorrer de tal despacho; as alterações posteriores à lei não fazem renascer essa possibilidade, até porque a lei só dispõe para o futuro. Concluindo: o despacho saneador, por não ter sido objecto de reclamação para a conferência quando a lei o impunha, à data da sua prolação, transitou em julgado, sendo neste momento irrecorrível. Aponta neste sentido, designadamente, o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência proferido no processo 01469/16 de 8/6/2017: “Do despacho saneador proferido em ação administrativa especial de valor superior à alçada do tribunal administrativo de círculo cabe prévia dedução de reclamação para a conferência do próprio tribunal de 1.ª instância, por aplicação dos arts. 27.º, n.º 2, 29.º, n.º 1, e 87.º do CPTA e 40.º, n.º 3, do ETAF na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 214-G/2015, de 02 de outubro, e não imediata interposição de recurso jurisdicional”. Da nulidade da sentença - Sustenta a Autora/Recorrente que por ter a sentença concluído que a entrevista decorreu com isenção e imparcialidade incorreu em nulidade prevista no art. 615º, 1, al. b) do CPC, uma vez que “em parte alguma da matéria de facto assente se deu por provados quaisquer factos que descrevessem a forma como decorreu a entrevista e que permitissem concluir por tal isenção”. Defende ainda a Recorrente que a sentença incorre em nulidade quando conclui que a entrevista não se resumiu a 20 minutos quando “em parte alguma da matéria de facto assente se deu como provado quanto tempo demorou, efectivamente a entrevista”. Crê-se, no entanto, que a sentença não enferma das invocadas nulidades. É consabido que a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do art. 615º do CPC só se verifica quando há uma total ausência de fundamentação de facto ou de direito, e não quando estamos perante uma motivação deficiente, errada ou incompleta. Estas situações não afectam o valor da sentença. Neste sentido veja-se o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 14/05/2015 (processo 414/13.6TBVVD.G1) ou do Supremo Tribunal de Justiça de 02/06/2016 (processo 781/11.6TBMTJ.L1.S1) ambos disponíveis em www.dgsi.pt. Ora, a sentença posta em crise é até bastante exaustiva quer na indicação dos factos dados como provados quer na análise crítica dos mesmos e das questões suscitadas pela Autora. Se a Autora entende que os factos dados como provados são insuceptíveis de se concluir que a entrevista decorreu com isenção e imparcialidade e não demorou menos de 20 minutos, tal configura, quanto muito, um erro de julgamento, não uma nulidade, pelo que se desatende este segmento do recurso. Em suma, A sentença não enferma da nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, porquanto da mesma constam os fundamentos de facto que permitiram alicerçar a fundamentação de direito e a decisão final proferida, nomeadamente no que concerne à realização da entrevista em causa nos autos. Segundo o artigo 615º do NCPC (artigo 668º CPC 1961), ex vi artigo 1º do CPTA, sob a epígrafe “Causas de nulidade da sentença”,
Dos incontáveis arestos dos tribunais superiores que reiteram a mesma doutrina jurisprudencial nesta matéria, retemos o Acórdão do Pleno da Secção do CA do Supremo Tribunal Administrativo, de 15/11/2012, proc. 0450/09, que sumariou: “(…) II - A estrutura da sentença está concebida no artº 659º do CPC, devendo a mesma começar por identificar as partes, o objecto do litígio (fixando as questões que que ao tribunal cumpre solucionar), os fundamentos (de facto e de direito) e concluindo com a decisão. Delineada a estrutura deste acto jurisdicional (por excelência), o desvio ao figurino gizado pelo legislador ocasiona uma patologia na formação e estruturação da decisão susceptível de a inquinar de nulidade (artº 668º nº 1 do CPC). III - Um dos elementos estruturantes da sentença é a fundamentação. Esta tem duas funções: uma função endoprocessual e uma função extraprocessual. A função endoprocessual é aquela que desenvolve a motivação da sentença, entendido como requisito técnico da pronúncia jurisdicional, no interior do processo; a função extraprocessual da motivação está ligada com a natureza garantista da absoluta generalidade e na consequente impossibilidade de a entender como derrogável ad libitum pelo legislador ordinário (e muito menos como derrogável ad libitum pelo juiz ou pelas partes. IV - A nulidade da sentença por falta de fundamentação só ocorre quando haja ausência absoluta de motivação, ou seja, total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que a decisão assenta. (…)”. Já a nulidade da alínea c) pressupõe um vício real no raciocínio expresso na decisão, consubstanciado na circunstância de a fundamentação explicitada na mesma apontar num determinado sentido, e, por seu turno, a decisão que foi proferida seguir caminho oposto, ou, pelo menos, diferente, ou ainda não ser perceptível face à fundamentação invocada. Isto é, a fundamentação adoptada conduz logicamente a determinada conclusão e, a final, o juiz extrai outra, oposta ou divergente (de sentido contrário). Questões, para este efeito, são, pois, as pretensões processuais formuladas pelas partes no processo que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer ato (processual), quando realmente debatidos entre as partes - v. Antunes Varela in RLJ, Ano 122.º, pág. 112 e Teixeira de Sousa in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220/221. Por seu turno, a nulidade por excesso de pronúncia verifica-se quando na decisão se conhece de questão que não foi suscitada por qualquer uma das partes, nem pelo Ministério Público, e não é do conhecimento oficioso. Na jurisprudência, sobre esta temática, vide, entre outros, os Acórdãos deste TCAN, de 30/03/2006, proc. 00676/00 - Porto, de 23/04/2009, proc. 01892/06.5BEPRT-A e de 13/01/2011, proc. 01885/10.8BEPRT, dos quais retiramos as seguintes coordenadas: Ocorre excesso de pronúncia quando o Tribunal conhece de questões de que não pode tomar conhecimento por utilizar um fundamento que excede a causa de pedir vazada na petição, ou por extravasar o elenco legal do conhecimento ex officio ou, ainda, por conhecer de pedido quantitativa ou qualitativamente distinto do formulado pela parte, isto é, conhece em quantidade superior ou objecto diverso do pedido. A delimitação do âmbito sancionatório da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC exige que se distinga entre questões e fundamentos, dado que, se a lei sanciona com a nulidade o conhecimento de nova questão (porque não suscitada nem de conhecimento oficioso), ou a omissão de conhecimento de questão suscitada (ou de conhecimento oficioso), já não proíbe que o julgador decida o mérito da causa, ou questões parcelares nela suscitadas, baseando-se em fundamentos jurídicos novos; Questões, para esse efeito sancionatório, repete-se, serão todas as pretensões formuladas pelas partes no processo, que requeiram a decisão do tribunal, bem como os pressupostos processuais de ordem geral, e os específicos de qualquer acto especial, quando debatidos entre elas. Efectivamente, como corolário do princípio da disponibilidade objectiva (arts. 264.º, n.º 1 e 664.º 2.ª parte), a decisão é nula quando o tribunal conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (art. 668.º, n.º 1, al. d) 2.ª parte), ou seja, quando a decisão esteja viciada por excesso de pronúncia. Verifica-se este excesso sempre que o tribunal utiliza, como fundamento da decisão, matéria não alegada ou condena ou absolve num pedido não formulado, bem como quando conhece de matéria alegada ou pedido formulado em condições em que está impedido de o fazer. Assim, somente haverá nulidade da decisão, por excesso de pronúncia, quando o juiz tiver conhecido de questões que as partes não submeteram à sua apreciação, de que não pudesse conhecer, exceto se forem de conhecimento oficioso. In casu, a causa de nulidade tipificada na alínea b), do n.º 1, do art. 615.º do Código de Processo Civil (CPC), ocorre (só ocorre) quando não se especifiquem os fundamentos de facto e de direito em que se funda a decisão. |