Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02550/17.0BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/28/2020
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:SUBSÍDIO DE DESEMPREGO; RESTITUIÇÃO; ARTIGO 63º DO DECRETO-LEI Nº 220/2006, DE 03.11.
Sumário:I - Se o artigo 63º do Decreto-Lei nº 220/2006, de 03.11, estabelece a obrigação do empregador, perante a segurança social, do pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego, não se nos afigura como a mais correcta a interpretação do acórdão recorrido de que apenas seria devido o pagamento das prestações efectivamente pagas;

II - De facto, parece que a lei entendeu que se o empregador não cumpriu os pressupostos legais para fazer cessar contratos de trabalho (cfr. art.ºs 9º, nº 1, al d) e 10º, nºs 1 e 4 do DL nº 220/2006) deve ser responsabilizado pelo pagamento da totalidade do período para que é concedida a prestação inicial de desemprego.

III - Solução que parece enquadrar-se nos objectivos do diploma aqui em causa que pretendendo proteger as situações de trabalhadores no desemprego, visa também combater a fraude e promover a poupança de recursos na segurança social (cfr. preâmbulo do referido diploma);

IV - O legislador pretendeu consagrar a responsabilidade do empregador nos termos indicados no art.º 63º referido, assim o expressando nos termos inscritos no preceito, sendo certo que a solução por que o acórdão optou não parece ter na letra da lei um mínimo de correspondência verbal (cfr. art.º 9º, nºs 1 e 3 do Código Civil).

V – Solução que encontra acolhimento no artigo 566º, nº 2, do Código Civil, sobre a indemnização em dinheiro, que determina que esta deve corresponder, por regra, à diferença entre a situação verificada e a que existira se o dano não se tivesse ocorrido, mas ressalva expressamente o “preceituado noutras disposições”. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrido 1:V., Lda
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

A V., Lda veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 02.09.2019, pela qual foi julgada improcedente a acção administrativa que intentou contra o Instituto de Segurança Social, I. P. , Centro Distrital de (…) para anulação dos actos administrativos contidos nas notas de restituição nº 9808912 e nº 9997702 e nos ofícios juntos como documentos nºs 1 e 2 praticados em 30.08.2017, Director do Centro Distrital da Segurança Social de Braga, mediante o qual é exigido à Autora o pagamento de 16.005,60€ correspondente à totalidade da prestação inicial de desemprego atribuída ao trabalhador/beneficiário E.V.S., e 9.716,40€ correspondente à totalidade da prestação inicial de desemprego atribuída ao trabalhador/beneficiário C.A.S.S., nos termos do artigo 63º do Decreto-Lei nº 220/2006 de 3.11.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida enferma de ilegalidade por violação das normas contidas no artigo 63.º do Decreto-Lei 220/2006, de 03.11, nos artigos 483.º e 563.º, do Código Civil, e nos artigos 2.º e 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

O Recorrido não contra-alegou.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

I - Com a devida vénia e consideração pelo Tribunal a quo, a sentença de que se recorre enferma de ilegalidade por violação das normas contidas nos artigos 63.º do DL 220/2006 de 03 de Novembro, 483.º e 563.º do Cód. Civil, 2.º e 266.º n.º 2 da C.R.P..

II - Admitindo que a Recorrente incorreu em ilegalidade ao não respeitar as quotas estabelecidas, a norma que determina esse dever de pagamento (o art.° 63° do diploma citado), não tem natureza sancionatória e como tal regula apenas a obrigação de indemnização perante a Entidade Demandada.

III - A responsabilidade apenas abrangerá, nos termos descritos na lei civil, suficiente para que seja reparado o dano.

IV - Do excerto final da disposição onde se diz que o empregador fica obrigado "ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego", não pode retirar-se que tal obrigação abranja todo o período.

V - Pretende-se unicamente circunscrever o limite máximo de tal indemnização ao montante total do subsídio durante o período inicial e não já fixar essa indemnização, independentemente do montante do prejuízo sofrido, nesse montante total, pois, a ser assim, teria que considerar-se estar em causa uma multa ou coima destinada a sancionar um comportamento que fosse considerado ilícito do ponto de vista penal ou contraordenacional.

VI - Neste caso, a conduta teria que ser tipificada e a aplicação da pena deveria obedecer as exigências legais e constitucionais, garantindo nomeadamente os direitos de defesa do empregador no âmbito desse processo, o que não ocorre.

VII - Não sendo uma sanção pecuniária e não estando sujeita ao regime destas, a indemnização referida, a entender-se ser devida sempre pelo valor máximo aludido, consubstanciaria um acto de confisco gravemente violador da Constituição.

VIII - Sendo o prejuízo sofrido pela Entidade Demandada inferior ao montante total das prestações pela totalidade do período inicial de concessão, se o valor a pagar for esse, haverá uma clara situação de enriquecimento sem causa.

IX - A indemnização é apenas devida para reparar o prejuízo sofrido, pelo que nenhuma razão ou fundamento legal existe que possa justificar o direito a receber valor superior, existindo um enriquecimento patrimonial com o correlativo empobrecimento do empregador que pague.

X - Neste sentido, bem decidiu o STA no acórdão de 19-06-2014, in www.dgsi.pt (Relator Costa Reis): " A resposta a essa interrogação só pode ser a de que o empregador só tem de compensar a Segurança Social pelo valor que esta efectivamente despendeu visto a responsabilidade ora em causa ser indemnizatória e, por essa razão, advir do prejuízo efectivamente sofrido pelo lesado e ter como medida o valor desse dano. Nesta conformidade, e sendo ilegal ressarcir alguém de um prejuízo que ele não teve (art.º 483.º do CC), é forçoso concluir que se a Segurança Social, por qualquer razão, só pagou uma parte do subsídio de desemprego a que o trabalhador tinha direito a entidade responsável pelo ressarcimento dessa quantia só terá o dever de a compensar por esse valor visto, de outra forma, se estar a exceder o dever indemnizatório do empregador e a provocar um enriquecimento sem causa da Segurança
Social.".

XI - Neste sentido, cfr também o acórdão do TCA Norte de 10-10-2014 in www.dgsi.pt, Relator Frederico Macedo Branco.

Termos em que, nos melhores de Direito, e sempre com o V/suprimento, em face de tudo o que ficou exposto, deverá o Venerando Tribunal dar provimento ao recurso, e em consequência:

Ordenar-se a revogação da sentença recorrida, dada a violação directa dos artigos 63.º do DL 220/2006 de 03 de Novembro, 483.º e 563.º do Cód. Civil, 2.º e 266.º n.º 2 da C.R.P, e consequentemente, decretar-se a anulação dos actos administrativos contidos nas notas de restituição n° 9808912 e n° 9997702 e nos ofícios praticados em 30-08-2017, pelo Exmo. Senhor Director do Centro Distrital da Segurança Social de Braga.
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II –Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:

1- A Autora, constituída em sociedade comercial por quotas, tem como objecto social a fabricação de produtos de betão para a construção.

2- O número de trabalhadores ao seu serviço nunca atingiu o número de dez.

3- No dia 31.12.2016, a Autora e os seus trabalhadores E.V.S. e C.A.S.S. outorgaram acordos de cessação do contrato de trabalho – cfr. folhas 1 a 3 do processo administrativo.

4- Em 18.08.2017, foi apresentado requerimento de prestações de desemprego, em nome do trabalhador C.A.S.S., com fundamento na cessação do contrato de trabalho, em 31.12.2016, com a aqui Autora, ao abrigo de um acordo de revogação do contrato de trabalho.

5- Em 30.08.2017, foi apresentado requerimento de prestações de desemprego, em nome do trabalhador E.V.S., com fundamento na cessação do contrato de trabalho, em 31.12.2016, com a aqui Autora, ao abrigo de um acordo de revogação do contrato de trabalho.

6- Aos dois trabalhadores foi deferida a atribuição do subsídio de desemprego.

7- Ao trabalhador /beneficiário C.A.S.S. foi deferido o pagamento das prestações de desemprego no montante diário de €14,34, por um período de 720 dias, com início a 18.01.2017 – cfr. folhas 7 e 8 do processo administrativo.

8- Ao trabalhador /beneficiário E.V.S. foi deferido o pagamento das prestações de desemprego no montante diário de €14,04, por um período de 1140 dias, com início a 30.08.2017 – cfr. folhas 7 e 9 do processo administrativo.

9- Pela Entidade Demandada foram emitidas as notas de restituição n.° 9808912 e n.°9997702.

10- Em Março de 2017, a Autora apresentou defesa escrita onde pugnou pelas dispensas de pagamentos referentes à nota de reposição nº 9808912, alegando, em síntese, que é uma empresa praticamente inactiva e uma vez que não havia condições para se pagarem os salários, as revogações contratuais foram no sentido de ajudar os trabalhadores e que o trabalhador/beneficiário C.A.S.S. já estava inclusivamente a trabalhar para outra entidade – cfr. folhas 14 do cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida.

11- Em 14.03.2017 foi elaborada informação relativa à exposição supra referida, com o seguinte teor: “Esta dívida deve-se ao facto da entidade, a 2016.12.31, ter cessado o contrato de trabalho com o beneficiário … C.A.S.S., com o motivo AE – 15 – Acordo de revogação nos termos do nº 4 do artigo 10º. A prestação continua registada como tendo ultrapassado os limites legalmente estabelecidos, sendo a quarta por acordo, quando a entidade apenas possuía uma quota disponível de 3, conforme anexo. Data de cessação do contrato: 2016.12.31; Data de início do triénio: 2014.01.01; Data de fim do triénio: 2016.12.31; nº de empregados: 7; valor da quota: 3; nº da cessação: 4. (…)” - folhas 17 do processo administrativo cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida.

12- Em 29.08.2017, foi proferido despacho de concordância com a referida informação – cfr. folhas 18 do processo administrativo.

13- Mediante carta datada de 30.08.2017, foi a Autora notificada para pagamento de prestações de desemprego com o seguinte teor: “Notifica-se que vai ser exigido o pagamento de 16.005,60€ … correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecido ao beneficiário acima identificado (E.V.S.) … Os fundamentos para a exigência do pagamento das prestações de desemprego são os a seguir indicados: ter sido deferido o montante das prestações de desemprego … por ter havido cessação do contrato de trabalho por acordo e ter sido criada no trabalhador … a convicção de que se encontrava dentro do limite de quotas estabelecido para acesso às prestações de desemprego, conforme consta na declaração de situação de desemprego entregue ao trabalhador, e tal não se verificou (nº 4 do art. 10º e art. 63º do dl 220/2006). (…)” - cfr. doc. 1 junto com a petição inicial e folhas 8 do processo administrativo cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

14- Mediante carta datada de 30.08.2017, foi a Autora notificada para pagamento de prestações de desemprego com o seguinte teor: “Notifica-se que vai ser exigido o pagamento de 9.716,40€ … correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecido ao beneficiário acima identificado (C.A.S.S.) … Os fundamentos para a exigência do pagamento das prestações de desemprego são os a seguir indicados: ter sido deferido o montante das prestações de desemprego … por ter havido cessação do contrato de trabalho por acordo e ter sido criada no trabalhador … a convicção de que se encontrava dentro do limite de quotas estabelecido para acesso às prestações de desemprego, conforme consta na declaração de situação de desemprego entregue ao trabalhador, e tal não se verificou (nº 4 do art. 10º e art. 63º do dl 220/2006). (…)” - cfr. doc. 2 junto com a petição inicial e folhas 20 do processo administrativo cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

15- Em 10.10.2017, a Entidade Demandada remeteu ofício à Autora, datado de 07.09.2017, com o seguinte teor: “Na sequência da reclamação apresentada por V. Exa. relativamente à Nota de Reposição acima identificada no valor de 9.716,40 euros, informa-se que não foi atendida a fundamentação invocada pelos motivos a seguir indicados: Foi deferido o pagamento das prestações de desemprego relativamente ao beneficiário … C.A.S.S. … sendo excedido o limite estabelecido nos termos do nº 4 do art. 10º do DL nº 220/2006. De acordo com o nº 5 do art. 10º do dl 220/2006, os limites estabelecidos são aferidos por referência aos últimos e 3 anos cuja contagem se inicia na data de cessação do contrato (2016/12/31) inclusive e pelo número de trabalhadores da empresa no mês anterior ao da data de início do triénio. A entidade, no mês anterior ao triénio, tinha 7 trabalhadores vinculados, o que garantia apenas um valor de quota de 3, de acordo com o nº 5 do art. 10º do dl 220/2006. A cessação celebrada com o trabalhador foi a 4ª.” – cfr. folhas 21 e 22 do processo administrativo cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
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III - Enquadramento jurídico.

1. O artigo 63º Decreto-Lei nº 220/2006, de 03.11.

O dissídio entre as partes centra-se na interpretação desta norma legal.

A Recorrente defende que a decisão proferida pelo Tribunal a quo viola o disposto no artigo 63.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03.11, por determinar que proceda ao pagamento das quantias correspondentes à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.

Invoca que só haveria lugar a ordenada restituição se o valor em causa tivesse sido efectivamente suportado pelo Recorrido a título de prestações de subsídio de desemprego.

Vejamos.

Dispõe o artigo 63.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03.11, que:

«Nas situações em que a cessação do contrato de trabalho por acordo teve subjacente a convicção do trabalhador, criada pelo empregador, do preenchimento das condições previstas no n.º 4 do artigo 10.º, e tal não se venha a verificar, o trabalhador mantém o direito às prestações de desemprego ficando o empregador obrigado perante a segurança social ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego».

Entendeu o legislador que se o empregador não cumpre os pressupostos legais do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03.11, deve ser responsabilizado pelo pagamento da totalidade do período para que é concedida a prestação inicial de desemprego (neste sentido, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 19.11.2009, P. 5013/09 (sumário):

“(…)
II - Se o artigo 63º do Decreto-Lei nº 220/2006, estabelece a obrigação do empregador, perante a segurança social, do pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego, não se nos afigura como a mais correcta a interpretação do acórdão recorrido de que apenas seria devido o pagamento das prestações efectivamente pagas;

III - De facto, parece que a lei entendeu que se o empregador não cumpriu os pressupostos legais para fazer cessar contratos de trabalho (cfr. arts. 9º, nº 1, al d) e 10º, nºs 1 e 4 do DL nº 220/2006) deve ser responsabilizado pelo pagamento da totalidade do período para que é concedida a prestação inicial de desemprego;

IV - Solução que parece enquadrar-se nos objectivos do diploma aqui em causa que pretendendo proteger as situações de trabalhadores no desemprego, visa também combater a fraude e promover a poupança de recursos na segurança social (cfr. preâmbulo do referido diploma);

V - O legislador pretendeu consagrar a responsabilidade do empregador nos termos indicados no art. 63º referido, assim o expressando nos termos inscritos no preceito, sendo certo que a solução por que o acórdão optou não parece ter na letra da lei um mínimo de correspondência verbal (cfr. art. 9º, nºs 1 e 3 do Código Civil).”

Assim, não há qualquer enriquecimento sem causa do Recorrido porque a letra da lei é a causa justificativa, que impõe este pagamento (neste sentido, acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 07.03.2013, P. 09466/12 (sumário):

“Nas situações em que a cessação do contrato de trabalho por acordo teve subjacente a convicção do trabalhador, criada pelo empregador, do preenchimento das condições previstas no n.º 4 do artigo 10.º DL 220/2006, e tal não se venha a verificar, o trabalhador mantém o direito às prestações de desemprego, ficando o empregador obrigado perante a segurança social ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego (art. 63º). Mesmo que o período em que efetivamente houve o desemprego seja menor.”.

E como o Recorrido está adstrito a agir em conformidade com o princípio da legalidade impunha-se-lhe o dever de reclamar as importâncias em causa, atinentes à totalidade dos períodos de concessão da prestação inicial de desemprego.

Sendo, por isso, irrelevante se o Recorrido procedeu ou não ao pagamento da totalidade dos valores que reclama.

Na verdade, a ratio do legislador, expressa na letra e no espírito do artigo 63º, e no preâmbulo do referido diploma legal foi a de que, se o empregador não cumpriu os pressupostos legais para fazer cessar contratos de trabalho (cfr. artigo 9.°, n.º 1, alínea d), e 10.°, n.º 4 e 5, do diploma referido), deve ser responsabilizado pelo pagamento da totalidade do período para que é concedida a prestação inicial de desemprego ao trabalhador nessa situação.

Solução que se enquadra, aliás, nos objectivos do diploma, o qual, pretendendo proteger as situações de trabalhadores no desemprego, visa também combater a fraude e promover a poupança de recursos na segurança social, conforme preâmbulo do Decreto-Lei nº 220/2006.

Este entendimento é sufragado também no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 24.01.2013, processo n° 09158/12, e no acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 22.05.2015, processo n° 00527/12. BRG.

Neste último acórdão pode ler-se:

"Em igual sentido, expendeu-se no acórdão do TCAS de 24/01/2013 que «a lei obriga a entidade patronal a pagar a totalidade das prestações à segurança social. Esta obrigação é justa, pois tem como objetivo dissuadir as entidades patronais de convencerem os seus trabalhadores a cessarem os contratos de trabalho em número que ultrapasse as quotas legalmente admissíveis, que o legislador, num juízo de ponderação, entre as necessidades das empresas de concorrerem nos mercados e as necessidades de combater o desemprego, concluiu serem as adequadas. Não tem um efeito meramente reparador, tem também um efeito punitivo. Trata-se de uma medida de combate à fraude.».

Trata-se de uma solução que não comporta qualquer inconstitucionalidade, encontrando-se o ISS, IP adstrito a um agir em conformidade com o princípio da legalidade [art. ° 266/2 da CRP e art. 3.° do Código de Procedimento Administrativo], pelo que, ante situações como a verificada nestes autos, impunha-se-lhe que prosseguisse o interesse público nos termos em que o fez, ou seja, reclamando da autora/Recorrente a referida importância".

Assim como nos acórdãos deste Tribunal Central Administrativo Norte de 04.03.2016, no processo 526/12.3 CBR e de 07.12.2018, no processo 1950/10.1 BRG.

Em sentido contrário ao propugnado se pronunciam os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.06.2014, processo nº 01308/13, e de 13.12.2018, processo n.º 606/15.3 LRA com argumentos que a Recorrente acolhe, mas que não nos convencem, por se alhearem da letra da lei e do seu espírito que ressalta do preâmbulo do Decreto-Lei nº 220/2006.

Posição que se reiterou no mais recente acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 23.05.2019, no processo 531/16.0 PRT.

2. O disposto nos artigos 483.º e 563.º, do Código Civil, e nos artigos 2.º e 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

Defende neste capítulo a Recorrente que - Admitindo que a Recorrente incorreu em ilegalidade ao não respeitar as quotas estabelecidas, a norma que determina esse dever de pagamento, o artigo 63° do diploma citado, não tem natureza sancionatória e como tal regula apenas a obrigação de indemnização perante a Entidade Demandada, pelo que essa responsabilidade apenas abrange, nos termos descritos na lei civil, suficiente para que seja reparado o dano.

Também aqui, entendemos, sem razão.

O artigo 566º, nº 2, do Código Civil, sobre a indemnização em dinheiro, determina que esta deve corresponder, por regra, à diferença entre a situação verificada e a que existira se o dano não se tivesse ocorrido, mas ressalva expressamente o “preceituado noutras disposições”.

Precisamente o que ocorre no caso em que o artigo 63º prevê um valor especial de indemnização, acima da simples reparação do dano, dado ter também como escopo o combate à fraude.

Pelo que, como acima se disse, não há qualquer excesso no valor fixado como indemnização nem enriquecimento ilícito, dado que a ordem de reposição em causa se funda no disposto no artigo 63º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03.11.

Do que se conclui que a decisão recorrida não violou, antes respeitou também estas normas legais.
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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantém a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.
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Porto, 28.02.2020

Rogério Martins
Frederico Branco
Luís Garcia, com declaração de voto

Declaração de voto:
O que a recorrente suscita é apenas exposição de tese, sem que os fundos importem diferente solução.
Luís Migueis Garcia
Porto, 28.02.2020