Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00438/12.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/17/2015
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Mário Rebelo
Descritores:FUNDADA DÚVIDA.
Sumário:1. Nos termos do art. 100º/1 do CPPT, sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato impugnado ser anulado.
2. Este preceito constitui aplicação no processo de impugnação judicial da regra geral sobre o ónus da prova, enunciada no art. 74º/1 LGT. Regra que também encontramos no art. 414º do CPC (anterior art. 516º) fazendo recair sobre o onerado com a prova de um facto a desvantagem da dúvida.
3. A norma é aplicável quando da prova produzida resultem fundadas dúvidas sobre a existência do facto tributário.
4. A prova produzida de que há-de resultar a «fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário» deverá ser não só a prova mobilizada pelas partes mas também aquela que o juiz deverá impulsionar (art. 13º/1 do CPPT).
5. A dúvida relevante nunca se poderá considerar fundada se assentar na ausência ou inércia probatória da parte onerada com a prova, especialmente do impugnante, sobre quem recai o dever de comprovar os factos constitutivos do direito alegado (art. 342º/1 do Código Civil). *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:J..., Lda.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

J...– Consultoria Empresarial Lda. interpõe recurso da sentença proferida no TAF do Porto na parte em que julgou improcedente a impugnação deduzida contra as anulações das liquidações adicionais de IRC números 2011 8310076506 e 2011 8500076525, referentes aos exercícios de 2007 e de 2008, e contra a liquidação n° 2011 6420001981, relativa a retenções na fonte respeitantes a rendimentos de 2007, com valores a pagar de €13.975,40, €25.307,94 e €3.842,92 respectivamente.

Conclui as alegações com as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença, proferida em 07/07/2014, que apenas decidiu julgar a impugnação procedente no que concerne à anulação parcial da liquidação de retenções na fonte de IRC do exercício de 2007, improcedendo quanto ao mais peticionado;
2. O presente recurso visa, por conseguinte, a impugnação da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo que decidiu julgar improcedente o que demais havia sido peticionado pela Impugnante, a aqui Recorrente, e abrange tanto aquela que foi a decisão acerca da matéria de facto como ainda a matéria de direito;
3. Ora, naquela que foi a impugnação judicial deduzida a Impugnante, aqui Recorrente, havia peticionado:
i. No tocante a IRC relativo ao ano de 2007, foi peticionado que a coleta liquidada pela Inspeção de Finanças no montante de € 12.256,18 (doze mil duzentos e cinquenta e seis euros e dezoito cêntimos) fosse pura e simplesmente anulada na sua totalidade, o que foi julgado improcedente pelo Tribunal a quo;
j. Quanto a juros compensatórios relativos a IRC de 2007, liquidados no montante de € 1.719,22 (mil setecentos e dezanove euros e vinte e dois cêntimos) face ao pedido na alínea anterior, também foi peticionado fossem os mesmos pura e simplesmente anulados na sua totalidade, o que foi julgado improcedente pelo Tribunal a quo;
k. Quanto ao montante da derrama relativa a 2007, liquidada pela Inspeção de Finanças em € 4.052,45 (quatro mil e cinquenta e dois euros e quarenta e cinco cêntimos), foi peticionado fosse a mesma ser parcialmente anulada e reduzida para o montante de € 3.358,70 (três mil trezentos e cinquenta e oito euros e setenta cêntimos), o que foi julgado improcedente pelo Tribunal a quo;
l. Relativamente ao IRC de 2008, foi peticionado que o montante do imposto devido liquidado pela Inspeção Tributária no montante de € 23.216,55 (vinte e três mil duzentos e dezasseis euros e cinquenta e cinco cêntimos) fosse parcialmente anulado e reduzido para o montante de € 3.858,58 (três mil oitocentos e cinquenta e oito euros e cinquenta e oito cêntimos), o que foi julgado improcedente pelo Tribunal a quo;
m. Quanto a juros compensatórios relativos ao IRC de 2008, liquidados pela Inspecção Tributária no montante de € 2.091,39 (dois mil e noventa e um euros e trinta e nove cêntimos) foi peticionado fosse parcialmente anulado e reduzido, dado o pedido formulado na alínea anterior, para o montante de € 347,59 (trezentos e quarenta e sete euros e cinquenta e nove cêntimos), o que foi julgado improcedente pelo Tribunal a quo;
n. Quanto à derrama relativa ao ano de 2008, liquidada pela Inspecção de Finanças no montante de € 1.897,15 (mil oitocentos e noventa e sete euros e quinze cêntimos), pelas mesmas razões, foi peticionado fosse a mesma parcialmente anulada e ver o seu montante reduzido para € 315,31 (trezentos e quinze euros e trinta e um cêntimos), o que foi julgado improcedente pelo Tribunal a quo;
4. Naquele que é o muito modesto entendimento por parte da Impugnante, aqui Recorrente, o Tribunal a quo não procedeu a uma correcta apreciação da prova que foi produzida no processo e, consequentemente, não procedeu ao seu correcto enquadramento jurídico, pois que se considera que no caso em concreto não estavam verificados os pressupostos de facto e de direito de que dependia o enquadramento jurídico que veio a ser efectuado na douta sentença recorrida, motivo pelo qual se impugna tanto aquela que foi a decisão acerca da matéria de facto como aquela que decisão de direito;
5. Porquanto, no que concerne à impugnação daquela que foi a decisão acerca da matéria de facto, a Impugnante, aqui Recorrente considera que o Tribunal a quo não considerou devidamente toda aquela que foi a prova produzida, tanto a documental como a testemunhal, o que se reflectiu tanto na factualidade que veio a ser dada como provada como na que não foi considerada provada, bem como ainda se reflectiu naquela que veio a ser a subsunção jurídica dos factos ao direito aplicável, o que aqui se não pode deixar de invocar nos termos e para todos os devidos efeitos legais;
6. Assim, no que concerne à factualidade que o Tribunal a quo considerou provada para a prolação de uma decisão no caso concreto, considera-se que a matéria de facto provada e a que se reporta a alínea A) mostra-se insuficiente à tomada de uma boa decisão no caso em concreto na medida em que foi produzida prova documental e testemunhal que impunha um maior rigor e concretização atentas as implicações que da mesma decorrem quanto à sua subsunção jurídica, mais concretamente face ao que decorre do n°3 do art° 7° do CIVA e do art° 18 do CIRC, em articulação com o que decorre do princípio da justiça, e o que aqui se não pode deixar de invocar;
7. É que nesta alínea da matéria de facto provada o Tribunal a quo considerou provado que A) Nos anos de 2007 e 2008, a Impugnante prestou serviços de administração de cursos nas áreas de língua inglesa e informática - cfr. fls. 9 do processo administrativo (PA,) apenso aos autos», quando daquela que é a prova documental existente e daquela que foi a prova testemunhal decorre que o Tribunal a quo deveria ter considerado provado que «A) Nos anos de 2007 e 2008 a Impugnante celebrou vários contratos que tinham por objecto a administração de cursos nas áreas de língua inglesa e informática, mediante pagamento de um preço fixado em razão do curso em causa - cfr. Fls 94 do processo administrativo (PA) junto aos autos», pois que se considera que não é despicienda a distinção que se impõe entre a celebração de vários contratos de venda de um curso mediante pagamento de um preço e a isolada prestação de serviços de administração de cursos mediante um valor mensal, e o que aqui se não pode deixar de invocar nos termos e para todos os devidos efeitos legais;
8. O Tribunal a quo não considerou que a administração de cursos nas áreas de língua inglesa e de informática que foi efectuada pela Impugnante, aqui Recorrente, não decorreu de uma procura isolada, por determinado período de tempo, com vista à prestação de um serviço ocasional e sem qualquer vínculo entre as partes;
9. Sucede que daquela que foi a prova documental junta aos autos no âmbito da acção inspectiva, bem como da prova testemunhal que veio a ser produzida resulta demonstrado que a administração destes cursos de língua inglesa e de informática decorreu de negociações entre as partes, que celebraram um contrato por escrito com vista à contratação de um curso mediante pagamento de um preço, tendo sido desde logo estipulado o seu valor total, pelo que se impõe concluir tratar-se de um normal contrato bilateral e sinalagmático;
10. Ora, se analisado o modelo de contrato que era celebrado pela Impugnante, aqui Recorrente, do mesmo decorre que o preço do curso era desde logo pré-determinado, não estava afecto à frequência ou não da formação, à obtenção de quaisquer resultados ou a quaisquer outras condicionantes, sendo que o preço poderia e deveria ser desde logo pago na sua totalidade aquando da contratação do curso, pois que a circunstância de se prever a possibilidade do seu pagamento faseado em prestações não significa, e ao contrário do que considerou o Tribunal a quo, que se tratasse de uma mensalidade, dependente da efectiva frequência da formação ministrada;
11. No caso concreto a Impugnante, aqui Recorrente, obrigava-se a ministrar um curso (composto por formação presencial, material de apoio e didáctico, etc) e o formando a pagar o preço do curso, independentemente de ter estado ou não presente na formação presencial, independentemente de ter ou não levantado o material, pois que a Impugnante, aqui Recorrente, cumpria com as suas obrigações ao actuar com o que se comprometeu aquando da contratação do curso, independentemente daquela que viesse a ser a actuação por parte do formando, assim se justificando que por acordo entre as partes o pagamento do preço do curso não se tenha processado todos os meses ou que só se tenha verificado numa fase final do curso, bem como assim se justificando que o pagamento do preço do curso tenha sido renegociado entre as partes, tudo tal qual o permite o princípio da liberdade contratual que vigora entre as partes;
12. Não obstante estes factos constem devidamente referenciados e demonstrados ao longo do processo, nomeadamente no que decorre do que foi exposto no relatório da acção de inspecção, e inclusivamente a págs. 8, 9 e 10 da douta sentença, ainda assim o Tribunal a quo apenas decidiu dar como provada a matéria de facto que consta referida na alínea A), a qual se considera que é manifestamente insuficiente à tomada de uma decisão no caso concreto, em especial atento aquele que foi o enquadramento da actividade desenvolvida pela Impugnante, aqui Recorrente, pois que o Tribunal a quo decidiu, e muito mal, subsumir estes factos ao que decorre do n° 3 do artigo 7° do CIVA então em vigor, com os reflexos que tal comportou em relação ao que decorre do artigo 18° do CIRC, e o que só se consegue conceber como sendo o resultado de um erro no julgamento dos factos atenta a prova documental existente;
13. Doutro passo, no que concerne à factualidade que foi alegada no artigo 11º da sua petição inicial, a Impugnante, aqui Recorrente, não pode deixar de invocar que também lhe resulta difícil conceber como é o que o Tribunal a quo não a considerou matéria de facto provada relevante á tomada de uma decisão no caso em concreto, sendo seu modesto entendimento que tal factualidade se afigura imprescindível à tomada de uma decisão, tanto mais que foi demonstrada por meio de prova documental e testemunhal, pelo que se impunha ao Tribunal a quo uma outra decisão acerca desta factualidade, dando-a como provada;
14. Doutro passo, no que concerne à matéria de facto que o Tribunal a quo considerou ser relevante para a decisão da causa mas que decidiu dar como não provada também se considera que houve um erro manifesto e grosseiro na apreciação da prova documental e testemunhal que foi produzida, por tal prova impor decisão com sentido inverso àquele com que veio a ser decidido, e o que aqui se não pode deixar de invocar;
15. Assim, no que concerne à matéria de facto tida como não provada no ponto «1) O campo “vence a” do programa “Ac...”, corresponde a um lançamento automático efectuado aquando do registo do contrato do formando, se qualquer correspondência com uma efectiva frequência da formação/prestação de serviços», o Tribunal a quo deu esta factualidade como não provada mas se percorrida a douta sentença recorrida não é possível apreender o motivo pelo qual considerou que não foi feita prova do alegado, dado que nada é concretamente referido a este propósito, em termos de fundamentação;
16. Não obstante aquela que foi a decisão por parte do Tribunal a quo em relação a este ponto 1) e que se considera completamente infundamentada, a aqui Recorrente não pode deixar de invocar que a prova documental e testemunhal que foi produzida no processo, tanto no âmbito da acção inspectiva como no processo judicial, permite que se conclua que esta factualidade foi demonstrada por meio da consulta conjugada aos elementos constantes na base de dados “Ac...” com os dados constantes contratos celebrados, bem como com base nos esclarecimentos que foram prestados pelas testemunhas C… (a fls. 10 da sentença) e A… (a fls. 19, 20 e 21 da sentença), pelo que se impunha tivesse sido proferida uma decisão em sentido completamente distinto daquele que veio a ser decidido pelo Tribunal a quo, sob pena de violação do que se estabelece em relação ao ónus da prova e ao que decorre do art° 100º do CPPT;
17. Já no que concerne à matéria de facto tida como não provada no ponto «2) O campo “liquidado em”, do programa «Ac...» indica o período efectivo que o formando frequentou a formação/beneficiou da prestação do serviço», considerou o Tribunal a quo que este campo não respeita a frequência de formação mas sim ao pagamento de uma mensalidade, sendo que a sua convicção não resultou de prova inequívoca que tenha sido feita nesse sentido no âmbito da acção de inspecção, mas das incongruências apresentadas em relação ao modo de funcionamento deste programa informático do “Ac...”, o que aqui se não pode deixar de invocar;
18. Ora, da prova documental (contratos) e testemunhal que foi produzida a este propósito, concretamente dos esclarecimentos que foram prestados por C... (a fls. 10 da sentença) e A...(a fls. 19, 20 e 21 da sentença), resulta que foi demonstrado que existe uma discrepância entre a data da celebração do contrato e a data do inicio da formação prevista no contrato, que existem inúmeros formandos que exercem o seu direito de resolução no contrato neste hiato temporal, que existem muitos outros que acabam por desistir da formação, que tudo isto é acompanhado de perto pelos formadores que inserem estes elementos técnico-pedagógicos no sistema informático do “Ac...”, de modo a permitir que o restante pessoal da recepção, do apoio técnico, do departamento jurídico e do departamento financeiro possam acompanhar esta evolução dos acontecimentos, o que por si só demonstra que este programa não tem qualquer componente ou utilização financeira não obstante a terminologia utilizada, pois que se destina a mero controlo interno;
19. Perante aquela que foi a prova produzida, não só em relação a este ponto 2) mas se considerada a globalidade de toda a prova produzida no decurso da acção inspectiva c nos presentes autos, considera a Recorrente que deveria ter sido outra a resposta por parte do Tribunal a quo em relação ao que por si foi alegado a este propósito, por assim o impor o regime da repartição do ónus da prova em articulação com o que decorre do art° 100º do CPPT, pois que se considera que não só não ficou demonstrado que a utilização do programa “Ac...” lhe permitiu omitir proveitos gerados no exercício da sua actividade como, na verdade, existem fundadas dúvidas sobre a quantificação do facto tributário apurado pela Autoridade Tributária;
20. Na senda do que antecede, e ainda a propósito daquela que foi a apreciação dos factos e que levou a que o Tribunal a quo tivesse dado como não provado que «3) a “notificação processual» enviada pelo departamento jurídico da impugnante aos seus clientes no estado de “em cobrança externa” visasse recuperá-los para a formação e não cobrar-lhes os montantes em dívida pela prestação do serviço de formação», dir-se-á que também quanto a esta factualidade se considera que existia prova documental bastante, consubstanciada pela existência dos contratos em conjugação com as cartas remetidas, que em articulação com a prova testemunhal, teria conduzido a outra decisão;
21. Isto porque, com todo o respeito por que lhe merece o Tribunal a quo, e que é muito, não se pode deixar de considerar incongruente que tenha sido dado como provado que as cartas remetidas visassem apenas e tão-só a obtenção de um pagamento por parte de clientes no estado de “em cobrança externa” e que não tenha sido apurada a existência de um único procedimento judicial de injunção intentado pela aqui recorrente com vista á obtenção coerciva do pagamento dos valores contemplados nessas cartas;
22. Contrariamente ao que decidiu o Tribunal a quo, a prova documental e testemunhal que foi produzida, tanto em relação a este ponto 3) como ainda em relação ao vertido no ponto 4), impunha que tivesse sido dado como provado que «Os clientes no estado de “em cobrança externa” são formandos que deixaram de frequentar a formação», bem como que as cartas cujo assunto em epigrafe “notificação processual” tinham apenas por finalidade a de recuperar os formandos para a frequência dos cursos e não a de obter o pagamento dos cursos, pois que caso assim fosse a Recorrente teriam recorrido aos mecanismos legais que a lei coloca ao seu dispor para o efeito e tal teria sido certamente que averiguado no âmbito da acção inspectiva dado que tiveram pleno acesso às instalações, equipamentos e documentos;
23. Sem maiores considerações, naquele que é o muito modesto entendimento por parte da Recorrida, no seu caso concreto a Administração tributária não só não logrou demonstrar os pressupostos da sua actuação, ou seja, de que os fundamentos vertidos no relatório de inspecção são de molde a suportar as correcções que estão na origem das liquidações adicionais de IRC, como, na verdade, a prova documental e testemunhal que foi por si produzida constitui prova bastante da ilegitimidade destes actos de liquidação que impugnou;
24. Porquanto, é pacífico, e nem a aqui Recorrente alguma vez o contestou, que existe uma discrepância entre os elementos informativos e esclarecimentos feitos constar no programa “Ac...” e o programa “Primavera”, que foram utilizados pela Recorrente nos anos de 2007 e de 2008 em simultâneo, para registar diferentes circunstancialismos;
25. Não obstante a discrepância entre estes programas “Ac...” e “Primavera” que foram simultaneamente utilizados pela Recorrente, considera-se que a prova documental e testemunhal produzida perante o Tribunal a quo permitiu ainda assim manter inabalada a presunção decorrente da veracidade das declarações fiscais por si apresentadas bem como nos dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade;
26. Isto porque, uma correcta apreciação dos factos e consequente subsunção dos mesmos ao direito aplicável teria desde logo permitido concluir que no caso concreto sub judice os créditos decorrentes dos contratos celebrados pela Recorrente se devem considerar realizados na data em que o serviço é concluído, ou seja, na data previsível para a conclusão do curso de formação, tal qual decorre da regra geral estatuída no art° 3° do CIVA e 18° do CIRC, e tal qual vinha sendo por si reportado nas declarações fiscais legais, elaboradas em conformidade com os elementos constantes no programa “Primavera” concebido para o efeito, e o que aqui se não pode deixar de invocar para todos os devidos efeitos legais;
27. Perante o que supra vem sendo exposto a propósito daquela que foi a douta sentença recorrida acerca da matéria de facto e que se impugna, considera a Impugnante, aqui Recorrente, que o Tribunal a quo também incorreu num erro de julgamento naquela que foi a subsunção jurídica dos factos ao Direito aplicável, tendo violado o que decorre de várias normas legais e princípios gerais disciplinadores destas questões, entre os quais o que decorre do n° 7 do artigo 3° do CIVA, o que decorre do artigo 18° do CIRC que consagra o princípio da especialização dos exercícios e isto em conjugação com o que decorre do princípio da justiça plasmado no artigo 55° da LGT e no n° 2 do artigo 266° da Constituição da República Portuguesa, e o que aqui se não pode deixar de invocar;
28. Na senda daquele que foi entendimento jurisprudencial a este propósito, também no caso concreto se impõe invocar que a rigidez do que decorre do princípio da especialização dos exercícios vertido no art° 18° do CIRC e que se alude na douta sentença recorrida tem de ser colmatada ou temperada com a invocação do princípio da justiça, o que se requer seja atendido em relação aos demais pedidos que foram deduzidos na impugnação deduzida e que foram julgados improcedentes pelo Tribunal a quo em violação do que se consagra nos artigos 55° da LGT e n° 2 do artigo 266° da CRP;

Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o douto suprimento de V. Exa., respeitosamente se requer seja concedido provimento ao recurso, julgando-se procedente, por provada, a impugnação que foi deduzida pela aqui Recorrente e, em consequência, seja revogada a douta sentença recorrida em conformidade com o que desta impugnação decorre.

CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
O Exmo. PGA junto deste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso na medida em que pretendendo o recorrente manifestar discordância quanto aos factos provados e quanto à convicção do tribunal, não deu cumprimento ao disposto no art. 640º/2,a) do CPC. Por outro lado, não se vislumbra dos factos provados qualquer erro de lógica de ciência, ou regra de experiência, pelo que o recurso não merece provimento.



II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença padece de
Nulidade por falta de fundamentação;
Erro na apreciação dos factos;
Erro na aplicação do direito.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados:
A) Nos anos de 2007 e 2008, a Impugnante prestou serviços de administração de cursos nas áreas de língua inglesa e informática – cfr. fls. 94 do processo administrativo (PA) apenso aos autos.
B) A coberto da ordem de serviço n.º OI201000599, a ora Impugnante foi objeto de uma ação inspetiva externa levada a cabo pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças do Porto, de âmbito geral e com incidência sobre os exercícios de 2007 e 2008 – cfr. fls. 93 verso e 94 do PA apenso aos autos.
C) Na sequência da ação inspetiva mencionada na alínea antecedente, a Autoridade Tributária procedeu, além do mais, a correções de natureza meramente aritmética à matéria tributável do IRC dos exercícios de 2007 e 2008, nos montantes de € 46 249,75 e € 87 609,57, respetivamente, tendo igualmente detetado a falta de pagamento de IRC retido na fonte, referente ao ano de 2007, no valor de € 3 328,27 – cfr. relatório de inspeção, a fls. 92 a 101 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
D) As correções mencionadas na alínea antecedente apresentam a seguinte fundamentação (cfr. fls. 92 a 101 do PA apenso aos autos):
“(…)
II. OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA
(…)
II.3.4 Diligências efectuadas
II.3.4.1 Cópias efectuadas do sistema informático
Na data do 12.01.2011, a pedido dos Serviços de Inspecção, deslocaram-se elementos do Núcleo de Apoio Informático da DAPIT, credenciados com o Despacho nº DI201100007, às instalações da empresa sitas na Rua…- 4050-426 Porto, tendo sido efectuada cópia da base de dados da facturação.
Posteriormente, na data de 07.06.2011 foi efectuada nova recolha de dados, mais especificamente das bases de dados:
“Firebird” com a designação “Ac...-J….fdb”;
“Microsoft SQL Server” com a designação “P…”
Ambas actualizadas à data da recolha.
Da análise da estrutura e conteúdo das tabelas que compõem as referidas bases de dados verificamos o seguinte:
• “Ac...-J….fdb” - esta base de dados contém os registos relacionados com a gestão operacional da actividade da formação inseridos nas seguintes tabelas relevantes para análise:

• “P…” - esta base de dados contém registos relacionados com a emissão da facturação aos formandos, constantes das seguintes tabelas relevantes para análise:
Do confronto dos dados das tabelas acima referidas, detectámos:
um conjunto de formandos com prestações registadas na tabela “CC_PREST_CLI” relativas a mensalidades de cursos frequentados nos anos de 2007 e 2008 sem qualquer correspondência em documentos registados na base de dados “P…”;
um conjunto de formandos com divergências entre o valor total das mensalidades, referentes aos anos de 2007 e 2008 registadas na tabela “CC_PREST_CLI e o total do valor facturado através dos documentos registados na base de dados “P…”.
III.3.4.2 Verificação física dos contratos celebrados com os formandos
No decurso da acção inspectiva, procedeu-se à verificação física dos contratos celebrados com os formandos, a qual permitiu reunir informações quanto aos cursos ministrados, respectivas durações e preços. No decorrer da acção solicitaram-se alguns elementos ao sujeito passivo entre os quais listagens dos certificados emitidos nos anos de 2007 e 2008, cópia de alguns contratos assim como relação dos contratos celebrados em 2006 com implicação de facturação nos anos em análise dado que a duração dos cursos é maioritariamente superior a um ano.
II.3.5 Factos apurados
II.3.5.1 Da análise dos contratos celebrados com os formandos ou encarregados de educação, verificamos que o preço do Curso é pago num determinado nº de prestações, em função do curso em causa, sendo que:
• a primeira vence-se no acto de inscrição e as restantes até o dia 20 de cada um dos meses de duração do curso;
• a falta de pagamento de qualquer prestação até à data do respectivo vencimento confere à empresa o direito de se recusar a prestar ao aluno a formação contratada e o de exigir ao formando o pagamento de todas as prestações vencidas e não pagas, acrescidos dos juros legais.
II.3.5.2 De acordo com elementos recolhidos quer no âmbito da acção inspectiva quer pelo Núcleo de Apoio Informático da DAPIT, detectámos que:
• existiam contratos para os quais não existem quaisquer facturação emitida;
• existiam certificados emitidos a alunos, para os quais a facturação existente nos anos da vigência do curso é inferior ao valor total do curso constante do contrato celebrado;
• da análise da distribuição dos valores facturados, por aluno, existem em inúmeros casos, omissões;
• cerca de 20% dos contratos celebrados no ano de 2008, num total de 1640, têm a indicação no mesmo como tendo sido rescindido;
(…)
Face ao exposto, procedeu-se à notificação do sujeito passivo para obtenção de esclarecimentos, tendo-se apurado que:
- o formando, no início do contrato, tem 15 dias após o início da formação, para poder rescindir o contrato celebrado, sendo que o valor pago no acto do contrato é, nestes casos, devolvido;
- existem nalguns casos, cedências dos direitos a terceiros desde o início, pelo que a facturação é desde logo emitida em nome do terceiro;
Justificam-se assim inúmeros casos de formandos para os quais não existia qualquer facturação emitida, tendo sido fornecido pela empresa documentos comprovativos das situações de rescisões.
Após os esclarecimentos obtidos, e atendendo ao facto da empresa apenas proceder à emissão de factura aquando do recebimento, incidimos a análise, para efeitos de tributação no capítulo III, dos formandos que se encontram nos seguintes estados:
“certificado emitido” - estado dos formandos para os quais já foi emitido certificado do curso frequentado;
“em frequência” - estado dos formando cujos curso estão ainda a decorrer ou, tendo o mesmo finalizado estão a aguardar a emissão de certificado, sendo que as mensalidades estarem todas pagas é requisito para precederem à emissão do respectivo certificado;
“em cobrança externa” - estado em que a cobrança é feita pelo gabinete jurídico da J….
III. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas
III.1 IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS COLECTIVAS (IRC)
III.1.1 PROVEITOS
III.1.1.1 VENDAS/PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS
De acordo com o nº 3 do artº 7 do Código do IVA, e relativamente as prestações de serviço de carácter continuado resultantes de contratos que dêem lugar a pagamentos sucessivos, considera-se que as prestações de serviço são realizadas no termo do período a que se refere cada pagamento. Por outro lado, e atendendo ao exposto nº 1 do artº 36° (Prazo de emissão, formalidades das facturas e documentos equivalentes) do mesmo código, as facturas ou documentos equivalentes devem ser emitidos o mais tardar no quinto dia útil seguinte ao do momento definido no artº 7. Da conjugação dos dois normativos, conclui-se que o sujeito passivo se enquadra nos mesmos, porquanto
administra cursos, na sua maioria, com durações superiores a um ano;
celebra contratos de prestação de serviços, nos quais é referido nas suas cláusulas que o preço estipulado é pago em mensalidades que nos anos em análise variavam entre 19 e 22.
Assim, e de acordo com o enquadramento anterior, o sujeito passivo estava obrigado à emissão de factura nos meses em que o curso decorria. Nesta sequência, apuramos a partir da informação constante dos registos informático o valor dos proveitos omitidos, pela diferença entre os valores constantes das bases de dados Ac... e os constantes da facturação, conforme quadros elaborados constantes do anexo A.
Em resumo, apresentam-se o valor dos proveitos omitidos, por ano,
(…)
III.1.2. CUSTOS
III.1.2.1 CUSTOS DIFERIDOS
Tendo-se verificado a contabilização de custos diferidos na conta 2729122 - Outros custos diferidos - Conservação Plurianual - Edifícios e outras construções c/ IVA não dedutível que originaram os lançamentos de regularização na conta 622321 - Conservação e reparação no montante de € 9.578,89 quer em 2007 quer em 2008, solicitamos esclarecimentos relativamente as estes custos assim como cópias dos documentos suporte. A título de justificação, foi nos referido que as obras reflectidas a partir de 2004 na conta 2729122 - Outros custos diferidos - Conservação Plurianual eram referentes a várias facturas de fornecedores sendo que a contabilização deveu-se ao facto de a J...ter adquirido o edifício em Leasing, tendo em 2004 efectuado uma cedência do Ieasing à G…, ficando estabelecido no contrato que as obras de manutenção seriam da responsabilidade da J…. Assim, e dado que deixaram de ter o edifício no imobilizado, as obras ainda não amortizadas passaram a estar reflectidas na conta 2729122, o custo da “amortização” reconhecido anualmente na conta de custos 622321.
Não obstante o referido, e face aos documentos facultados, consideramos que não comprovaram documentalmente o custo anual reconhecido no montante de € 1.875,56 nos anos de 2007 e 2008 referente aos fornecedores:
B… - Consultores Engenharia, Lda. - € 10.973,55 (taxa amort. 10%);
Fornecedor não identificado - € 6.460,43 (taxa amort. 10%);
Fornecedor não identificado - € 1.321,60 (taxa amort. 10%).
III.1.2.2 OUTROS CUSTOS NÃO ACEITES
Foi contabilizada em 31-12-2007 a factura nº 725 de 19-01-2007 emitida pelo fornecedor Auto…, com a identificação fiscal CH163269, no montante de € 4.000, referente a “ATC Software & Subscription Fee 2007” relativos aos sites de Penafiel e Coimbra pertencentes às empresas J… Formação e Consultoria, Lda., NIPC 5…, e M… Edições Culturais, Lda., NIPC 5….
Assim e dado que nos termos do artº 23º do CIRC apenas se consideram como custo aqueles que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, os custos identificados não são aceites como custo fiscal.
III.1.3. RETENÇÕES EFECTUADAS E NÃO ENTREGUES
No decurso da acção inspectiva, verificou-se que relativamente às facturas a seguir identificadas,
e não obstante terem sido contabilizadas as retenções (conta 2429), não procederam posteriormente à entrega nos cofres do estado dos valores retidos por intermédio de guia de pagamento pelo que se encontra em falta desde 20.01.2008, IRC retido no montante de € 3.328,27.
III.2 IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO (IVA)
Relativamente às facturas constantes do quadro apresentado no ponto anterior, III.1.3, emitidas por empresas que não têm no território nacional sede, estabelecimento estável ou domicílio e atendendo ao enquadramento do sujeito passivo em sede de IVA referido no ponto II.3.3, verificou-se que os serviços debitados se enquadram no estabelecido na alínea a) do nº 8 do artº 6º do CIVA, na redacção à data dos factos, sendo as operações tributáveis em território nacional dado que o adquirente, J…, é sujeito passivo do imposto, dos referidos na alínea a) do nº 1 do artº 2º com sede no território nacional. Assim, deveriam ter liquidado no mês de Dezembro IVA no montante de € 2.795,75 (€ 13.313,08 x 0,21) e procedido na Tesouraria de Finanças competente o respectivo imposto até ao final do mês seguinte àquele em que o imposto se torne exigível, conforme o estipulado no nº 3 do artº 26º.
Face ao enquadramento no regime de isenção do artº 9º do CIVA, o sujeito passivo não pode proceder à dedução do imposto liquidado, pelo que consideramos como custo o IVA não dedutível, a suportar pela empresa relativo às aquisições constantes do ponto anterior, com excepção do imposto suportado referente à factura identificada no ponto III.1.2.2 pelos motivos Iá invocados
Assim, considera-se custo do exercício o montante de € 1.955,75 [€ 2.795,75 - € 840 (€ 4.000 x 0,21)].
(…)
III.4 RESUMO DAS CORRECÇÕES PROPOSTAS À MATÉRIA COLECTÁVEL DE IRC DECLARADA
Face ao constante nos pontos anteriores, procede-se no quadro seguinte, ao apuramento das correcções à matéria tributável de IRC nos exercícios de 2007 e 2008.
(…)
VII - DIREITO DE AUDIÇÃO
Dando cumprimento ao estipulado no artº 60º da LGT e do artº 60º do RCPIT, foi remetido o projecto de relatório notificando-se para no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição relativamente às correcções propostas.
O direito de audição foi exercido pelo sujeito passivo em 28 de Novembro, com base nos seguintes fundamentos:
(…)
Resposta ao direito de audição:
1) Tendo em atenção os conceitos apresentados pela J…, iremos demonstrar no ponto seguinte mediante a exposição de alguns exemplos que as definições apresentadas quer para o estado “em cobrança externa” quer para os campos “data de documento” e “data de liquidação” que a mesma designa como campos “vence a” e “liquidado em” não correspondem às evidências encontradas no decurso da nossa análise.
De referir que não procedemos a qualquer correcção relativamente aos contratos dos alunos desistente nem aos dos que rescindiram, porque entendemos que relativamente aos primeiros não era possível fazer prova da data efectiva de desistência e aos segundos pelo facto de nos terem sido remetidos documentos comprovativos das rescisões. No que diz respeito aos restantes estados temos também a referir que sempre que a correcção a efectuar se traduzia numa ou duas prestações, sendo possível verificar, por comparação à facturação dos anos seguintes, que a(s) mesma(s) se encontravam facturadas, essa correcção não foi considerada, por verificarmos que se tratou de um atraso no início das sessões de formação. (…).
2) No decurso da acção inspectiva foi solicitado à J...o envio relativamente à totalidade dos alunos, 94, que se encontravam no estado “em cobrança externa” nos anos de 2007 e/ou 2008 da informação dos montantes em dívida por aluno, e relativamente a uma amostra de 26, foi também solicitada cópia da carta enviada pela empresa a solicitar o pagamento. Com base na análise dos 26 casos, iremos relativamente a 5 desses casos, demonstrar inequivocamente que o campo “data de liquidação” (‘liquidado em” para a J…) se trata de um campo onde são inscritas as datas de pagamento e não de prestação de serviço. Assim, apresentamos em anexo C, os registos dos alunos que irão ser alvo de análise assim como as cópias das cartas referentes aos mesmos.
Da análise dos elementos, verificamos que o campo de liquidação (“cc_prest_dt_liquidacao”) não se encontra preenchido para quase toda a totalidade das prestações, ao contrário da data de documento (“cc_prest_doc_data”). Ora de acordo com o referido pela J…, isto quer dizer que estes alunos que se encontram no estado “em cobrança externa” apenas frequentaram o curso nos meses em que o campo está preenchido, tendo posteriormente desistido. De referir que os valores referentes àquelas mensalidades se encontram facturados. Não obstante, e da análise do montante referido como estando em dívida assim como do teor da carta enviada pelo Departamento Jurídico da J…, decorre que a empresa exigiu aos alunos o pagamento das restantes rnensalidades. Nesta sequência, consideramos legítimo concluir que se a empresa está a exigir as restantes mensalidades, isso se deverá ao facto de o aluno ter frequentado todas as sessões de formação. Esta conclusão contraria em absoluto o facto de a empresa afirmar que o campo da data de liquidação coincidir com as datas nas quais os serviços eram efectivamente prestados, tornando-se evidente que a data registada nesse campo é o referente ao pagamento.
Em resumo, apresentamos um quadro, onde se torna perceptível que a liquidação deve ser entendida como pagamento.

- imagem omissa
Em acréscimo ao exposto reforçamos as conclusões com os registos das mensalidades referentes aos alunos nºs 4464 e 6992, em anexo D. Da análise dos registos, e atendendo à coluna “cc_prest_dt_Iiquidacao” percebemos que relativamente ao primeiro, existem vários registos nas datas “19-04-2007”, “02-07-2007” e “25-11-2007”, respectivamente, 2, 3 e 4. De acordo com o alegado pelo sujeito passivo, estes factos traduziriam que o aluno faltou e nos meses onde se verificam registos superiores a um, que o aluno teve nesse mês a formação referente aos meses em falta. Ora, atendendo ao sistema organizacional da formação, isto é, ao facto de a formação ser administrada em turmas formadas com vários alunos, parece-nos impraticável, face aos inúmeros casos em que esta situação se verifica, que a empresa pudesse compensar os mesmos, administrando individualmente as sessões em falta. Ao contrário, parece óbvio que o aluno procedeu ao pagamento atrasado de algumas mensalidades, tendo a empresa registado no seu sistema informático que aquelas mensalidades referentes às datas constantes do campo “cc_prest_doc_data” foram pagas na data repetida 2, 3 e quatro vezes. A mesma análise se faz relativamente ao segundo, no qual também se denotam várias repetições de data no campo “cc_prest_dt_liquidacao”.
Face à comprovação que o campo “cc_prest_dt_liquidacao” se refere ao pagamento, todas as conclusões referidas no direito de audição no tocante aos proveitos, nomeadamente os montantes referidos de sobrefacturação e subfacturação assim como os mapas apresentados não tem qualquer validade em termos fiscais na medida em que contraria todos os normativos que fundamentaram os valores corrigidos. Assim, mantemos as correcções apuradas no ponto III.1.1.1.
3) Relativamente ao ponto III.1.2.1 Custos Diferidos, importa esclarecer que quando se refere que não foram comprovados documentalmente, pretende-se dizer que os documentos apresentados não são aceites fiscalmente como tal, porquanto não provam a efectiva realização das obras. Concretizando, consideramos que o Orçamento de Obra, as memórias descritivas assim como documentos a adjudicar a obra não provam a realização da obra. Diferente seria a apresentação de factura ou documento equivalente emitido pelo alegado fornecedor, ou na sua falta um comprovativo de pagamento, pelo que mantemos as correcções à matéria colectável constantes neste ponto.
4) Relativamente ao ponto III.1.2.2, aceitamos o alegado pela J..., pelo que se considerará como custo fiscal o montante de € 4.000,00.
5) Relativamente ao ponto III.1.3. Retenções efectuadas e não entregues, temos a referir que as retenções consideram-se efectuadas no momento em que contabilisticamente lançaram a débito na conta corrente do fornecedor em causa em contrapartida da conta 2429 os montantes em causa. As retenções devem ser contabilizadas no momento em que se paga ou põe à disposição os valores. O facto de a empresa não ter procedido à dedução dos valores retidos é alheio à Administração Fiscal, sendo certo que, independentemente dos pagamentos terem sido feitos pela totalidade, os valores das retenções continuam a afectar os saldos das contas correntes, podendo ser deduzidos em futuros pagamentos. Afirmam também que o projecto indica uma taxa de 25% quando deveria ser 15%. No entanto, a taxa de 25% advém dos valores contabilizados pela própria empresa, decorrente do enquadramento que deu às operações subjacentes às facturas indicadas, por esse motivo mantemos o valor das retenções efectuadas e não entregues por serem as contabilizadas.
6) Face à consideração como custo a factura mencionada no ponto 4), considerar-se-á também como custo o IVA considerado como não dedutível.
(…)
Face ao exposto, procede-se ao recálculo
• da Matéria Colectável Corrigida,
(…)”
E) Dá-se por integralmente reproduzido o teor dos anexos A, C e D do relatório de inspeção, insertos a fls. 102 a 105, 124 e 127 verso do PA apenso aos autos e, bem assim, o teor das notificações enviadas pela Impugnante a alguns dos seus clientes, constantes de fls. 125 a 127 do referido PA.
F) Dá-se por integralmente reproduzido o teor de fls. 100 a 139 dos autos, que correspondem ao exercício do direito de audição sobre o projeto de conclusões do relatório e anexos 1 e 2 a ele juntos.
G) Dá-se por integralmente reproduzido o teor de fls. 280 a 294 dos autos, que correspondem a cartas enviadas pelo departamento jurídico da Impugnante a alguns dos seus clientes e “contas correntes” dos mesmos.
H) Na sequência das correções mencionadas na alínea C) supra, a Autoridade Tributária emitiu as liquidações adicionais de IRC n.os 2011 8310076506 e 2011 8500076525, referentes aos exercícios de 2007 e 2008, com valor a pagar nos montantes de € 13 975,40 e € 25 307,94, respetivamente, e, bem assim, a liquidação de retenções na fonte de IRC n.º 2011 6420001981 e respetivos juros compensatórios, respeitante ao exercício de 2007, com valor a pagar de € 3 842,92, com datas limite de pagamento em 18/01/2012 – cfr. fls. 90 a 92 e 94 a 96 dos autos e fls. 143 a 145 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
I) A presente impugnação deu entrada neste tribunal em 15/02/2012 – cfr. fls. 2 dos autos.

2. FACTOS NÃO PROVADOS
Com relevância para a decisão da causa, não se provou que:
1) O campo “vence a”, do programa “Ac...”, corresponde a um lançamento automático efetuado aquando do registo do contrato do formando, sem qualquer correspondência com uma efetiva frequência da formação / prestação de serviços;
2) O campo “liquidado em”, do programa “Ac...”, indica o período efetivo em que o formando frequentou a formação / beneficiou da prestação do serviço;
3) A “notificação processual” enviada pelo departamento jurídico da Impugnante aos seus clientes no estado de “em cobrança externa” visasse recuperá-los para a formação e não cobrar-lhes os montantes em dívida pela prestação do serviço de formação.
4) Os clientes no estado de “em cobrança externa” são formandos que deixaram de frequentar a formação.

Motivação:
A convicção do tribunal quanto aos factos dados como provados resultou da análise dos documentos juntos aos autos, os quais não foram impugnados.
No que concerne aos factos não provados, a prova produzida, quer documental, quer testemunhal, não logrou convencer o tribunal da verificação dos mesmos.
Foi ouvida a testemunha C…, técnico de informática da Impugnante desde abril de 2006 e responsável pela conceção do programa informático “Ac...”. No seu depoimento referiu que o mencionado programa é utilizado pela Impugnante para a gestão do percurso escolar e pedagógico dos seus alunos, mas que o mesmo foi inicialmente criado com um objetivo mais amplo de fazer uma gestão integral do negócio, ou seja, para além da gestão pedagógica, fazer também a gestão financeira da atividade, daí a existência de campos com a menção “vence a” e “liquidado em”, o que, segundo afirmou, acabou por não ir avante, uma vez que a gerência da Impugnante decidiu fazer a gestão financeira da atividade através do programa “Primavera”.
Mais referiu que o campo “liquidado em” tinha como objetivo, aquando da conceção do “Ac...”, inserir a data do pagamento do serviço, mas que não foi essa a utilização que lhe veio a ser dada, servindo antes para controlar a frequência da formação.
Referiu, ainda, que o campo “vence a” consistia num registo automático, efetuado aquando da inscrição do aluno, que lançava um registo por cada mês de formação do curso.
Em suma, esta testemunha abordou, em termos bastante genéricos, as potencialidades e funcionalidades do programa “Ac...”, que criou, mas não resultou do seu depoimento que conhecesse, em concreto, a aplicação efetiva que dele era feito, sendo que, como salientou, o programa era maioritariamente utilizado por coordenadores pedagógicos e formadores, ou seja, do seu depoimento não resultou, com clareza, se o programa em questão era usado apenas com finalidades pedagógicas ou também com o objetivo de gestão financeira da atividade, sendo que o “Ac...” tinha, como foi referido, potencialidades para levar a cabo também esta última finalidade.
Foi igualmente inquirida a testemunha A…, que exerce, desde outubro de 2009, as funções de gestor de aluno na Impugnante e que utiliza, como ferramenta de trabalho, o programa “Ac...”. Refira-se, desde já, que este depoimento não foi valorado positivamente pelo tribunal, na medida em que esta testemunha não trabalhava na Impugnante nos anos de 2007 e 2008, não podendo atestar, com conhecimento direto, como e com que finalidade eram efetuados os registos no “Ac...” nos anos em questão, podendo apenas dar conta dos procedimentos observados a partir da data em que começou a trabalhar para a Impugnante (outubro de 2009).
Ainda assim, cumpre salientar que esta testemunha não apresentou uma explicação convincente para o facto de os mapas de assiduidade, enviados pelos formadores, não poderem ser utilizados para reportar ao departamento financeiro a presença dos alunos na formação, existindo a necessidade de preencher o campo “liquidado em”, especificamente com essa finalidade.
Foi também inquirida a testemunha A…, diretora financeira da Impugnante desde abril de 2007. O seu depoimento não convenceu o tribunal de que os registos “vence a” e “liquidado em”, efetuados no programa “Ac...”, nada tinham a ver com prestações de serviço e pagamentos, respetivamente. É um facto que esta testemunha referiu que o campo “vence a” respeitava a informação sobre a duração do curso, gerada automaticamente no momento do registo do aluno, e que o campo “liquidado em” resultava do registo interno efetuado pelo gabinete de acompanhamento do aluno, dando indicação da data da frequência efetiva da formação, para reportar posteriormente essa informação ao departamento financeiro, para efeitos de faturação. Todavia, a depoente não explicou, convincentemente, porque é que as folhas de presença dos alunos não satisfaziam essa finalidade, tendo apenas dito que elas tinham de ser inseridas no dossier técnico-pedagógico, o que, refira-se, não era impeditivo de que uma cópia das mesmas fosse enviada ao departamento financeiro, sem necessidade do preenchimento do campo “liquidado em”, que, há que dizê-lo, tem inegáveis conotações, na linguagem financeira e contabilística, com o ato de pagamento. Esta testemunha também não logrou explicar porque é que, respeitando as datas inseridas no campo “liquidado em” a frequência de formação nesse mês, não era mencionado o último dia do mês, não ficando o tribunal convicto de que a menção relevante era apenas, como referiu, a do mês, independentemente do dia indicado, porquanto não parece minimamente lógico que quem pretende dar a conhecer que um determinado aluno frequentou uma formação em certo mês, aluda a um dia do início ou do meio desse mês, sendo que ao optar por mencionar um dia do mês, o lógico seria que indicasse o último dia desse mês (lógica essa com que a testemunha, aliás, concordou). Para além disso, servindo o campo “liquidado em” para reportar a frequência da formação e fazendo-se menção, apenas, a uma única data, não se percebe, nem foi convenientemente explicado, como é que o departamento financeiro tinha conhecimento dos dias efetivos em que houve frequência da formação ao longo do mês, uma vez que existiam, seguramente, faltas de alguns formandos durante o mês, ou seja, a menção a uma data única não permite identificar as faltas à formação. Por outro lado, se a repetição de datas no campo “liquidado em” respeita, como referiu a testemunha, à frequência de aulas de reposição/recuperação, visando compensar faltas à formação, também não se entrevê como é que o departamento financeiro fica a saber qual o número exato de aulas de reposição que foram ministradas em determinado mês, uma vez que a informação que consta do campo “liquidado em” é, também aqui, uma data única. Além disso, também não se vislumbra, nem foi explicado pela depoente, porque é que no caso da “prestação 0” o campo “liquidado em” evidencia a data do pagamento da propina/joia de inscrição no curso e nas restantes prestações já não se refere à data do pagamento, mas sim à frequência da formação. E também não se percebeu porque é que, nas situações em que o cliente vai à receção da Impugnante fazer o pagamento da mensalidade do curso, as funcionárias que fazem o atendimento lançam no “liquidado em” a data em que o cliente pagou, uma vez que este campo, segundo foi afirmado, não representa pagamento mas sim frequência de formação.
Acresce que esta testemunha também não logrou convencer o tribunal quanto ao facto de as cartas enviadas pelo gabinete jurídico da Impugnante visarem, tão só, recuperar o aluno para a formação e não arrecadar mensalidades em falta. Com efeito, se é verdade, como foi referido, que são cobradas apenas as formações efetivamente frequentadas e que os formandos no estado de “em cobrança externa" são formandos que deixaram de frequentar a formação (e que não comunicaram essa desistência), não se alcança como é que a Impugnante envia cartas a estes clientes a cobrar, explicitamente, o valor total das mensalidades em falta para perfazer o montante global do curso, uma vez que, supostamente, estes formandos não frequentaram a totalidade da formação. De facto, não resultou provado que se tratasse de uma última tentativa de obter uma reação do formando, no sentido de o recuperar para a formação, uma vez que também não ficou demonstrado que a Impugnante tivesse feito outras tentativas nesse sentido, sendo certo que essas tentativas, a existirem, resultariam, certamente, do “Ac...”, porquanto foi referido que nele eram registadas todas as “ocorrências” relacionados com os alunos. Para além disso, o teor da notificação em apreço não revela, nem pouco mais ou menos, que se tratasse de uma tentativa de recuperar o aluno, uma vez que para além de não se fazer qualquer referência ao regresso à formação e a outras tentativas de contacto, a carta é explícita ao conceder ao devedor uma semana para saldar a dívida, sob pena de ser acionado judicialmente.
Finalmente, se é verdade que os formandos no estado de “certificado emitido” frequentaram, com aproveitamento, a totalidade da formação, também não se entende, nem foi explicado, como é que o valor faturado no programa “Primavera” fica aquém do valor total do curso.
Na verdade, todas estas questões, que ficaram por esclarecer, impossibilitam que se dê como provado que os registos efetuados nos campos “vence a” e “liquidado em”, do programa “Ac...”, nada têm a ver com prestações de serviço e pagamentos, respetivamente.
Finalmente, a testemunha A…, autora do relatório de inspeção que está na origem das liquidações impugnadas, limitou-se, em suma, a reproduzir o que consta do seu relatório, nada mais de relevante tendo acrescentado.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Nulidade por falta de fundamentação.
A Recorrente conclui que a decisão do MMº juiz «a quo» referente a factualidade não provada (ponto n.º 1) não permite apreender o motivo pelo qual considerou que não foi feita prova do alegado, dado que nada é concretamente referido a este propósito, em termos de fundamentação (Conclusões 15ª e 16ª).

Nos termos do artigo 125º, nº 1 do CPPT: “Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”.

Na mesma linha estabelece a norma do artigo 615º, nº1, alínea b) do CPC, aplicável ex vi artigo 2º, alínea e) do CPPT que: “1. É nula a sentença quando:

(…)

b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão;”

A nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto abrange tanto a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, nº 2 do CPPT, como a falta do exame crítico das provas prevista no artigo 607º, nº 4do CPC.

A fundamentação de facto da sentença não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto de modo a conhecer as razões por que se decidiu num determinado sentido e não noutro - assim, Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, 2011, Áreas Editora, p. 321

No caso, decorre dos autos, que além da prova documental apresentada, foi ainda requerida (e admitida) a produção de prova testemunhal, tendo sido inquiridas as testemunhas indicadas pelo Recorrente (cf. fls. 355 e segs dos autos).

Como resulta da motivação da decisão de facto, os factos dados como assentes na sentença recorrida tiveram como fundamento a posição assumida pelas partes nos articulados e o acervo documental junto aos autos, incluindo os constantes do procedimento administrativo apenso, designadamente o relatório de inspecção (com os respectivos anexos e elementos contabilísticos).

Os depoimentos das testemunhas do Impugnante/Recorrente foram devidamente ponderados na motivação da decisão de facto, expondo o MMº juiz «a quo» as razões pelas quais os seus depoimentos não mereceram inteira credibilidade.

Portanto, podemos concluir que o dever de fundamentar a decisão de facto foi cumprido.

Saber se as razões apresentadas são ou não válidas e razoáveis já não contende com a alegada falta de fundamentação de facto da sentença mas com um eventual erro de julgamento, que, aliás, também vem invocado pelo Recorrente.

A alegação de que a sentença recorrida não considerou toda a factualidade alegada na petição inicial e atendido a todos os elementos probatórios constantes nos autos tendentes a demonstrar essa factualidade, designadamente a prova testemunhal, poderá constituir um eventual erro de julgamento, mas não a nulidade da sentença prevista nos artigos 125º do CPPT e 615º, nº1, alínea b) do CPC.

Mas nem uma coisa nem outra se verifica.

Não só porque a fundamentação de facto revela o «iter cognoscitivo» seguido pelo MMº juiz «a quo», mas também porque expressamente se referiu à questão a propósito do depoimentos das testemunhas C… mas especialmente A…. Apreciando este depoimento acerca dos campos «vence a» e «liquidado em», o MMº juiz «a quo» ponderou detalhadamente a falta de credibilidade dos depoimentos para prova dos factos alegados em termos muito claros.

Não se verifica, pois, a arguida nulidade da sentença, tendo nesta parte de improceder o recurso.

Erro na apreciação da prova
Imputando à sentença o erro na apreciação da prova, a Impugnante/Recorrente defende haver factos que se mostram provados e cujo conteúdo deveria ser modificado (caso do facto provado na alínea A) dos Factos Provados); factos que deveriam ser provados e factos que foram considerados não provados e deveriam ter sido levados ao probatório.

A Impugnante/Recorrente pretende ainda decorrer da prova testemunhal e documental
que o preço dos curso de informática e de inglês era pré determinado, não estava afecto à frequência ou não da formação. O preço deveria ser desde logo pago na sua totalidade a quando da contratação do curso. A circunstância de se prever o pagamento em prestações não significa que se tratasse de uma mensalidade, dependente da efectiva frequência da formação ministrada. Daí que o pagamento do curso não se tenha processado todos os meses ou que só se tenha verificado numa fase final do curso. Assim se justifica também que o pagamento do preço do curso tenha sido renegociado entre as partes, no âmbito do princípio da liberdade contratual.

Pretende ainda que o facto alegado sob o art. 11º da douta petição inicial se deve considerar provado.

Diz a Impugnante neste artigo que «O programa “AC...” é um software desenvolvido pelo departamento informático da impugnante, como plataforma de gestão pedagógica dos diversos grupos formativos e assentou na necessidade de criar um sistema minimamente capaz de rastrear as diversas etapas dos processos individuais de cada formando, desde a inscrição até à finalização do curso, respondendo a questões tais como da criação/organização dos grupos formativos (turmas), cursos dos formandos, dificuldades formativas, mecanismos de recuperação de formandos com atrasos, avaliações e outros parâmetros conexos».

A Recorrente alega que esta factualidade é imprescindível à tomada de decisão, tanto mais que foi demonstrada por meio de prova documental e testemunhal, pelo que se impunha ao tribunal «a quo» uma outra decisão acerca desta factualidade, dando-a como provada.

Também se deveria ter dado como provado que os clientes no estado de “em cobrança externa” são formandos que deixaram de frequentar a formação, bem como que as cartas cujo assunto em epígrafe “notificação processual” tinham apenas por finalidade a de recuperar os formandos para a frequência dos cursos e não a de obter o pagamento dos cursos (conclusão 22º)

Em relação aos factos não provados, a impugnante defende haver erro manifesto e grosseiro na apreciação da prova. Assim, o ponto 1) deveria ter sido provado, uma vez que a prova documental e testemunhal permite dar como provada esta factualidade (conclusão 15 e 16).

Também o facto não provado n.º 2 deveria ter sido provado, pois da prova testemunhal e dos contratos, o facto deveria ter sido provado (Conclusões 17 a 19).

Do mesmo modo, o facto não provado n.º 3 deveria ter sido provado, com base na prova testemunhal e documental (conclusões 20º), sob pena de incongruência por não se ter apurado a existência de um único procedimento judicial de injunção intentado pela Recorrente (21º).

Vejamos, em primeiro lugar, se estão verificados os requisitos para a reapreciação da prova.
A impugnação da matéria de facto está sujeita a regras que o art. º640.º/1 do CPC especifica: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.

Como refere Abrantes Geraldes a propósito desta norma (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, a págs.132) sempre que o recurso envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, «a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) Quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve especificar aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão quanto a cada um dos factos; c) Relativamente a pontos da decisão da matéria de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além das especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos (…); e) O recorrente deixará expressa a decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto (…)».

E como refere o ac. do TCAS n.º 07813/14 de 10-07-2014 Relator: BENJAMIM BARBOSA (ii) O erro de julgamento em matéria de facto pode resultar de errada apreciação do material probatório que contamina a fixação da materialidade fáctica relevante para a decisão, ou emergir da desacertada interpretação dessa materialidade.
(iii) No primeiro caso o erro consubstancia-se numa indevida utilização da livre convicção, erro esse que deve ser demonstrado pelo recorrente através do exercício de um duplo ónus: um, (i) o de delimitar o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem desse erro; outro, (ii) fundamentar as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa.

Da conjugação entre os art.º 639.º e 640.º do CPC resulta que não sendo observado pelo Recorrente o ónus mencionados, há lugar à imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, não sendo defensável que se lance mão do convite ao aperfeiçoamento em tal matéria. (cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, p. 134 e segs).


Tendo a Recorrente omitido quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida incumpriu o disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 640º CPC, pelo que se rejeita o recurso, nesta parte.

Esta rejeição não abrange a reapreciação do facto provado na alínea A) pois este resultando directamente do conteúdo do RIT, está suficientemente identificado para se poder reapreciar.

Naquela alínea A) dos factos provados, o MMº juiz «a quo» considerou provado que «Nos anos de 2007 e 2008, a Impugnante prestou serviços de administração de cursos nas áreas de língua inglesa e informática – cfr. fls. 94 do processo administrativo (PA) apenso aos autos».

A Impugnante/Recorrente insurge-se contra esta caracterização pois considera não ser despicienda a distinção entre a celebração de vários contratos de venda de um curso mediante pagamento de um preço e a isolada prestação de serviços de administração de cursos mediante um valor mensal, e propõe que o facto seja alterado para a seguinte redacção: «Nos anos de 2007 e 2008 a Impugnante celebrou vários contratos que tinham por objecto a administração de cursos nas áreas de língua inglesa e informática, mediante pagamento de um preço fixado em razão do curso em causa - cfr. Fls 94 do processo administrativo (PA) junto aos autos».

As liquidações impugnadas (IRC de 2007 e 2008) tiveram origem numa ação de fiscalização levada a cabo pela DF do Porto, a coberto da OS n.º OI201000599.
O RIT caracteriza a actividade da Impugnante/Recorrente do seguinte modo: Por consulta ao sistema informático da DGCI, verifica-se que o sujeito passivo exerce a actividade de “Outras actividades de consultoria, científicas, técnicas e similares” CAED 74900, desde 01.10.1993, data em que iniciou a actividade. Não obstante o CAE constante do cadastro, verificamos que os serviços que prestam consistem na administração de cursos nas áreas de línguas, mais especificamente da língua inglesa e informática (…) tendo associado o fornecimento do respectivo material didático (14,76% do valor total da mensalidade). De acordo com a informação disponível do artigo 2º da escritura de constituição da sociedade, o sujeito passivo tem como objecto “a consultoria e gestão empresarial, edição e comercialização de livros didáticos e ministrar cursos de formação profissional”


Tendo em conta que o se pretende com o facto provado na alínea A) é a caracterização dos serviços prestados pela Impugnante/Recorrente, afigura-se-nos que aquele facto reflecte de forma nítida a actividade da Impugnante/Recorrente, em consonância com o apurado no RIT, não havendo razões para a sua alteração. E isso não significa que o facto provado conduza à qualificação da impugnante como uma «escola», ou como um «centro de ensino ou de estudos», retirando-lhe a natureza de uma sociedade comercial.
De facto, é uma sociedade comercial que administra cursos nas áreas de informática e inglês.

Quanto ao erro de Direito.
O erro na aplicação do direito foi alegado pela Recorrente com incidência em três segmentos. (i) Por não ter sido considerada a existência de fundadas dúvidas sobre a quantificação do facto tributário (Conclusão 19ª); (ii) por não se permitir manter inabalada a presunção decorrente da veracidade das declarações fiscais por si apresentadas bem como nos dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade (iii) e por não se ter considerado que os créditos decorrentes dos contratos celebrados pela Recorrente se devem ter por realizados na data em que o serviço é concluído, ou seja na data previsível para a conclusão do curso de formação, violando-se o disposto nos arts 3/7 do CIVA e 18º do CIRC.

Quanto ao primeiro erro:
Nos termos do art. 100º/1 do CPPT, Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato impugnado ser anulado.
Este preceito constitui aplicação no processo de impugnação judicial da regra geral sobre o ónus da prova, enunciada no art. 74º/1 LGT nos termos do qual o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recaem sobre quem os invoque. Regra que também encontramos no art. 414º do CPC (anterior art. 516º) fazendo recair sobre o onerado com a prova de um facto a desvantagem da dúvida.

A norma é aplicável quando da prova produzida resultem fundadas dúvidas sobre a existência do facto tributário. Provando-se a existência ou inexistência de um facto tributário, não haverá lugar à aplicação desta norma, porque não há dúvidas (num ou noutro sentido).

A prova produzida de que há-de resultar a «fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário» (incluindo a dúvida sobre a legalidade da actuação da administração tributária: cfr. Ac. do TCAS n.º 04417/10 de 01-02-2011 (Relator: JOSÉ CORREIA) I) - É de admitir a possibilidade de operar com a fundada dúvida a que se refere o art.º 100º do CPPT, quando a dúvida se refere à legalidade da actuação da administração e não à existência dos factos tributários que são afirmados pelo contribuinte como tendo acontecido e em que funda a dedução de imposto) deverá ser não só a prova mobilizada pelas partes mas também aquela que o juiz deverá impulsionar (art. 13º/1 do CPPT).

A dúvida relevante nunca se poderá considerar fundada se assentar na ausência ou inércia probatória da parte onerada com a prova, especialmente do impugnante, sobre quem recai o dever de comprovar os factos constitutivos do direito alegado (art. 342º/1 do Código Civil).
Não tendo a Impugnante /recorrente cumprido o seu ónus probatório, não pode reclamar a aplicação da regra prevista no art. 100º/1 do CPPT.

Quanto ao segundo erro.
Para a Recorrente a prova documental e testemunhal produzida permitiu manter inabalada a presunção decorrente da veracidade das declarações fiscais por si apresentadas bem como nos dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade (conclusão 25º).

Porém, não é verdade que os dados e apuramentos inscritos na contabilidade da impugnante sejam verdadeiros, como bem resultou da prova produzida.

Como tal, não pode reclamar a seu favor a presunção estipulada no art. 75º/1 da LGT, porque esta presunção cessou nos termos da alínea a) do n.º 2 deste preceito.

Quanto ao terceiro erro.
Também este alegado erro na aplicação do direito não pode proceder.
Desde logo porque a Recorrente baseia o alegado erro em factos que não conseguiu provar, ou seja, que as prestações não são «mensalidades» pagas pela prestação de serviço, mas sim pagamento de um curso vendido em prestações. Estes factos não ficaram provados, antes pelo contrário.
Assim, nos termos do Art. 18º do CIRC (e também 7º/3 do CIVA), como assinalou o MMº juiz «a quo», os proveitos devem considerar-se realizados no fim de cada mês, uma vez que ficou contratualmente estipulado o pagamento dos custos em mensalidades. Desta forma, caberia à aqui Impugnante contabilizar os proveitos à medida que a formação ia sendo ministrada, independentemente do recebimento das mensalidades devidas, o que não sucedeu, uma vez que se verificou um desfasamento entre os serviços prestados e a faturação emitida.


V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Porto, 17 de Setembro de 2015

Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira