Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03091/19.7BEPPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/30/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Luís Migueis Garcia
Descritores:DECLARAÇÃO DE INEFICÁCIA DE ACTOS DE EXECUÇÃO INDEVIDA. SUSPENSÃO DE EFICÁCIA. PERICULUM IN MORA.
Sumário:I) – O incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida só tem sentido se tais actos existirem.

II) – O êxito da providência cautelar requer afirmação de um “periculum in mora”. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:C., Lda
Recorrido 1:Município de (...)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento aos recursos.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:

C., Lda. (Rua (…), (…)) interpõe recursos jurisdicionais de decisões do TAF do Porto, que, em providência cautelar de suspensão de eficácia intentada contra o Município de (...) (Rua (…), (…)), indeferiu requerida declaração de ineficácia de actos de execução indevida e julgou improcedente a providência cautelar

Conclui, quanto ao incidente:

1ª O recorrente não se conforma com a decisão proferida, porquanto se considera que ocorreu incorreto julgamento da matéria de facto, assim como fez o Tribunal recorrido uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.
2ª Por força do disposto no artigo 195.º n.º 1 do CPC, ex vi art.º 1º do CPTA, a decisão recorrida padece de Nulidade Processual, que se invoca para as devidas e legais consequências, por ter ocorrido a omissão ou preterição de uma formalidade legal, que, no caso, se consubstancia na falta de notificação e omissão do direito de resposta e impugnação de documentos imposta pelo artigo 3.º, n.º 3 e 415º do CPC, ex vi 1º do CPTA.
3º A decisão recorrida é ainda Nula por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. – Cfr. artigo 615º, n.º 1, al. b), e n.º 4, do CPC, ex vi 1º do CPTA.
Sem prescindir, caso assim não se entenda, o que não se concebe nem concede, mais se alega o seguinte:
4º No entendimento da recorrente, a decisão do Tribunal a quo é manifestamente errada, porquanto a recorrente considera que as Resoluções do Município não se encontram devidamente fundamentadas, para além de existirem razões que deviam ter levado o tribunal a quo a proceder à sua rejeição imediata.
5º Só e apenas em situações em que o deferimento da execução do ato suspendendo seja gravemente prejudicial para o interesse público se mostra justificado, nos termos do artigo 128º do CPTA, o afastamento da regra geral da proibição da execução.
6º Trata-se, por conseguinte, de uma regra excecional, aliás, absolutamente excecional, como ficou consignado no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, proferido em 4 de Outubro de 2007 (disponível in www.dgsi.pt).
7º Só em casos de uma gravidade extrema se deverá lançar mão deste tipo de resolução, tal como se decidiu no mencionado Acórdão: "a emissão de uma "resolução fundamentada" por parte da Administração constitui o exercício duma prerrogativa que apenas faz sentido ser utilizada na medida em que seja indispensável para dar resposta a situações de especial urgência".
8º Acontece que, na prática, a proibição da execução não funciona, uma vez que se assiste por parte da Administração à invocação sistemática e não fundamentada de que o deferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público, transformando em regra situações que o legislador ponderou como excecionais.
9º Na verdade, quando o artigo 128º, n.º 1 (2ª parte) do CPTA, confere à autoridade requerida a faculdade de reconhecer que o deferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público, não está a referir-se à invocação genérica do interesse público que há-de presidir à prática de qualquer ato administrativo. Se assim fosse, a proibição de execução não faria sentido.
10º Do que se trata é de indicar quais as razões que, em concreto, justificam a execução inadiável do ato administrativo em causa como forma de evitar grave prejuízo para o interesse público.
11º Ao fazer uso abusivo da resolução fundamentada, como foi o caso, a Administração conseguiu esvaziar por completo a garantia que o legislador quis instituir de tutela da própria suspensão, com repercussões negativas no direito à tutela judicial efetiva dos cidadãos.
12º Com efeito, de acordo com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, com data de 15-12-2017, Processo 948/17.3BEBRG-A: “II – Em eventual incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida o tribunal deve controlar, de forma particularmente exigente, os fundamentos em que se sustenta a Resolução Fundamentada, aferindo se tal Resolução se baseou em razões formal e materialmente procedentes para demonstrar que o deferimento da execução lesaria gravemente o interesse público, ou improcedentes por as não conter ou por tais serem inidóneas ou inviáveis ou insuficientes para justificar o prosseguimento urgente da execução do acto suspendendo”.
13º O controlo judicial da “validade” da fundamentação da resolução fundamentada deve ser aferido pelo critério estabelecido no artigo “125.º do CPA” (cfr. Acórdão do STA, de 03.04.2008, P. 01029/07), não se bastando com a verificação da existência de um discurso justificativo da decisão tomada, em termos claros e congruentes, mas exigindo também que os motivos apontados sejam suficientes, por conterem elementos bastantes, capazes ou aptos a basear a decisão (J. C. Vieira de Andrade em O Dever de Fundamentação Expressa de Actos Administrativos, Almedina, 2003, 232 e s.), ou seja, elementos suficientes para fundamentar a afirmação de que há “grave prejuízo para o interesse público no diferimento da execução do ato”.
14º Simultaneamente, este controlo jurisdicional das razões em que assenta a resolução fundamentada é também um controlo sobre o preenchimento, pela Administração, dos conceitos indeterminados contidos na previsão do artigo 128.º do CPTA – “grave prejuízo no diferimento” e “interesse público” – que traduzem uma habilitação normativa para o exercício de “juízos de avaliação, prognose e ponderação próprios do exercício da função administrativa” (v. Sérvulo Correia, “Conceitos jurídicos indeterminados e âmbito do controlo jurisdicional”, CJA, 70, 32-57,49).
15º Face a todo o exposto, o juiz administrativo, ao proceder à fiscalização dos fundamentos em que se sustentam as resoluções emitidas ao abrigo da previsão da segunda parte do n.º 1 do artigo 128.º do CPTA, deve ser particularmente exigente, aferindo se a Resolução fundamentada se baseou em razões procedentes para demonstrar que o deferimento da execução lesaria gravemente o interesse público, ou improcedentes por as não conter ou por tais razões serem inidóneas ou inviáveis ou insuficientes para justificar o pretendido prosseguimento urgente da execução do ato suspendendo.
16º Revertendo este entendimento para o caso concreto, diga-se já que a decisão recorrida procedeu a uma incorreta interpretação e aplicação do disposto no artigo 128.º do CPTA ao admitir que a suspensão provisória dos efeitos dos atos em causa possa determinar inconvenientes ou mesmo prejuízos gravemente prejudiciais para o interesse público.
17º De facto, se atentarmos bem as razões apontadas pelo Recorrido Município para executar os atos cuja suspensão se requereu, e que foram aceites no despacho recorrido, o Recorrido, em suma, invocou que:
- Está em causa a oportunidade e conveniência em preservar e depender a prossecução do interesse público no âmbito das políticas públicas de planeamento e ordenamento do território, nomeadamente em termos urbanísticos, que se perspetiva com a previsível revisão e aprovação do POOC (Plano de Ordenamento da Orla Costeira) entre Caminha e Espinho;
- Que a manter-se a suspensão, tal ocasionaria grave prejuízo para o interesse público, na medida em que permitiria a continuação dos trabalhos de construção, sem que fosse requerida a renovação da admissão de comunicação prévia e promovidas as obrigatórias consultas às entidades externas com efeitos vinculativos, em especial à APA e a verificação da sua conformidade com o atual Plano de Ordenamento da Orla Costeira, e a consequente proposta de revisão, em fase de aprovação, o que implica a suspensão dos efeitos da Providência Cautelar;
- Que retomar os trabalhos ocasionaria perigo para a circulação pedonal e rodoviária no local, com as consequências daí advenientes.
18º Com efeito, verificamos que o Recorrido falou numa previsível revisão e aprovação do POOC, e ainda de consultas às entidades externas para verificar a conformidade da obra com esse previsível plano e propostas de revisão, para além do perigo para a circulação pedonal e rodoviária no local. Razões que o tribunal aceitou e utilizou para justificar a sua decisão.
19º Sucede, porém, que o tribunal a quo procedeu a uma incorreta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto ao não julgar que o Recorrido estava obrigado a indicar factos concretos, reais, existentes, atuais, que justificassem a execução inadiável dos atos administrativos como forma de evitar graves prejuízos, concretos, para o interesse público, e não podia limitar-se a invocar genericamente o interesse público, utilizando para fundamentar a sua Resolução Planos urbanísticos que ainda nem foram revistos e nem sabe se vão ser, e veja-se, que alegam que será “previsível a previsão e aprovação do POOC”.
20º Tais razões, mais não configuram do que o interesse público que esteve subjacente à prática dos atos administrativos suspendendos – cumprimento da legalidade urbanística.
21º O tribunal a quo possibilitou assim que o recorrido atuasse à margem da obrigação de prossecução do interesse público que sobre a mesma impende, pois nos autos não estão em causa prejuízos extremamente graves, qualificados, sabendo-se ainda que o diferimento da execução tem que ser gravemente prejudicial para o interesse público, e não para terceiros.
22º O Tribunal a quo ratificou o uso abusivo da resolução fundamentada por parte do recorrido, esvaziando por completo a garantia que o legislador quis instituir de tutela da própria suspensão, violando o direito à tutela judicial efetiva da recorrente, violando os artigos 128º, n.º 1, II parte, do CPTA, e ainda os artigos 20º e 268º da Constituição da República Portuguesa.
Sem prescindir,
23º Como resulta do nº 3 do citado art.º 128º do CPTA, a Administração procede a uma execução indevida do ato administrativo, numa das seguintes situações:
c. Quando execute o acto sem ter emitido a resolução fundamentada;
d. Quando execute o acto com base em resolução fundamentada que o tribunal venha a considerar que se fundou em razões improcedentes, por entender que o diferimento da execução não seria, no caso concreto, gravemente prejudicial para o interesse público, pelo que não havia urgência na execução do acto.
24º Ora, no caso em apreço, repete a recorrente que as Resoluções Fundamentadas não estão fundamentadas no sentido de demonstrar e provar que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.
25º Em causa nos autos está essencialmente uma decisão de embargo de obras de uma moradia que a Recorrente estava a levar a efeito.
26º O ato que fundamenta esse embargo assentou no facto de “dos trabalhos em curso ter resultado como é visível e notório a derrocada parcial do arruamento público confinante a Nascente, e que põe em causa a segurança de pessoas e bens”. - Cfr. Doc. 1 junto com o r.i. de procedimento cautelar
27º Portanto, o embargo foi fundamentado, à data, apenas e só por este motivo.
28º Por conseguinte, o Recorrido Município não podia, depois de emitido o ato administrativo, aditar, posteriormente, mais fundamentos à decisão de embargo, e com isso prolatar uma Resolução fundamentada em factos e direito que não constam dos atos administrativos impugnados.
29º Mas o tribunal a quo admitiu essa situação, ao contrário do que ficou consignado no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 06-01-2005, Proc. 459/04, onde se referiu que: “...não sendo sequer de admitir a fundamentação a posterior dos actos administrativos, ou seja, aquela que vier a ser efectuada depois de praticado o acto”.
30º Pelo que a decisão recorrida também contraria o vertido no referenciado Acórdão.
Sem prescindir,
31º O Tribunal a quo não podia ter valorado e ratificado os fundamentos apontados pelo Município para justificar as suas resoluções fundamentadas, desde logo no que concerne a uma qualquer desconformidade urbanística por referência ao POOC ainda não revisto.
32º Não existe qualquer ilegalidade, irregularidade ou inconformidade urbanística, desde logo qualquer violação do POOC entre Caminha e Espinho.
33º Aliás, mesmo que academicamente se admitisse uma qualquer desconformidade com a “previsível revisão e aprovação do POOC (Plano de Ordenamento da Orla Costeira) entre Caminha e Espinho”, tal como alegado na Resolução Fundamentada, a verdade é que o POOC, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 25/99, na sua versão atual, já prevê no artigo 79º, sob a epígrafe de “Direitos Adquiridos” que: “As disposições constantes do POOC não põem em causa direitos adquiridos à data da sua entrada em vigor”.
34º Portanto, mesmo que haja uma qualquer revisão do POOC e que essa revisão coloque a moradia em causa como desconforme com o Plano (e veja-se que falamos apenas em suposições), tal não pode colocar em causa os direitos adquiridos da Recorrente.
35º Sendo a Informação e/ou Comunicação Prévia, bem como o projeto de arquitetura, anteriores a uma qualquer revisão do POOC, revisão que ainda nem vigora e da qual ainda nem se conhece a proposta, o ato de licenciamento da obra e construção e todos os demais são válidos e não podem deixar de ser válidos, sob pena de ocorrer uma “expropriação” de um direito à edificação.
36º Desta forma, não há obrigação de cumprir a revisão de um POOC que ainda nem está em vigor, e mesmo que estivesse, e sob pena de violação do princípio tempus regit actum. – Artigo 67º do RJUE.
37º Não aceita a recorrente a fundamentação dada pelo tribunal a quo quanto a esta questão, quando, para além de não ter conhecido qualquer proposta de revisão, não existe efetivamente qualquer revisão, e nem foram adotadas pelo Município quaisquer medidas preventivas ao abrigo do RJIGT, desde logo proibindo, limitando ou sujeitando a parecer vinculativo certas operações urbanísticas.
38º Assim sendo, pergunta-se, a recorrente terá de esperar quantos anos para conhecer a proposta de revisão do POOC… E quantos anos teremos um arruamento aluído, fora da propriedade da recorrente, só para justificar a suspensão de uma obra?
45º A regra geral é a de que as normas dos planos apenas produzem efeitos para o futuro, não afetando situações juridicamente consolidadas antes da sua entrada em vigor.
39º Aliás, como consignado e comprovado em sede de incidente de declaração de ineficácia, o próprio Recorrido Município admitiu e corroborou o que se vem alegando, porquanto em email de 6 de Novembro de 2019, a própria Presidente da Câmara de (...) remeteu um email ao PS de (...), sublinhando “…que, num estado de direito, a lei que se aplica é a que está em vigor, pelo que só por manifesto desconhecimento ou má-fé se invoca o novo Plano de Ordenamento da Orla Costeira, o qual, por não ter sido aprovado, não tem eficácia jurídica”. - Cfr. Doc. 2, junto com a p.i. de incidente.
40º Também errou o tribunal a quo quando deu relevância a uma eventual renovação da Comunicação Prévia N.º 2/17, o que originaria nova consulta às entidades externas.
41º Ora, no presente caso, a Comunicação prévia N.º 2/17 foi concedida à Recorrente nos termos do artigo 74º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, na redação que lhe foi conferida pelo DL 26/2010 de 30 de Março.
42º Em 11 de janeiro de 2019, foi obtido junto da Câmara Municipal de (...) o averbamento do titular do processo com o nº 121/2019 e com Admissão de Comunicação Prévia nº 2/17.
43º Verifica-se, assim, que o Recorrido averbou a Comunicação Prévia, não se referindo a qualquer impedimento, legal ou outro, para a continuação da obra, permitindo assim que o titular do processo continuasse confiante e com as mesmas expectativas relativamente à obra.
44º O R. Município não tem assim margem para colocar sequer obstáculos à extensão dos prazos, tal como previsto no artigo 1º, n.º 3, do DL 120/2013 de 21 de Agosto, pois a verdade é que em Janeiro de 2019 foi deferido o averbamento da Admissão da Comunicação Prévia, ocorrendo a extensão dos prazos também com o averbamento ao título inicial. - Artigo 58.º, n.º 8, do RJUE.
45º Na verdade, o conteúdo da informação prévia tem efeitos vinculativos para as entidades competentes para a decisão, até porque os atos em causa são atos constitutivos de direitos. – Cfr. Art. 73º do RJUE e 167º, n.º 3, do CPA.
46º Sendo que, mesmo a existir uma qualquer caducidade, o que veemente se impugna, a verdade é que a caducidade declarada não implicará a reavaliação de toda a situação, pois o artigo 72º, n.º 2, do RJUE, é bem claro ao referir que serão utilizados no novo processo os elementos que instruíram o processo anterior.
47º Face ao exposto, violou o tribunal recorrido a correta interpretação e aplicação dos artigos 58º, n.º 8, 71º, 72º, n.º 2, 73º, todos do RJUE, e ainda dos artigos 167º do CPA e 1º, n.º 3 do DL 120/2013 de 21 de Agosto.
Por outro lado,
48º Para além do ato de embargo, errou também o tribunal a quo quando entendeu que existem igualmente razões para não admitir a suspensão dos atos de posse administrativa e de caducidade da admissão prévia.
49º A recorrente discorda, não só pelo alegado supra, mas também porque não existe qualquer perigo para a circulação pedonal e rodoviária no local.
50º Ora, segundo consta do Auto de Embargo, a motivação do embargo prendeu-se com o facto de dos trabalhos em curso ter resultado a derrocada parcial do arruamento público confinante a Nascente, o que colocará em causa a segurança de pessoas e bens.
51º Todavia, a derrocada parcial alegada não coloca em causa pessoas e bens.
52º Aliás, no dia 8 novembro de 2019, na rua de acesso à obra, foi colocado um novo sinal de trânsito, proibindo o trânsito a pesados, exceto por referência aos pesados do Recorrido.
53º Tal proibição não estará, nem pode estar, relacionada com a segurança de pessoas e bens, uma vez que não foi esta rua que ficou danificada, dado que o aluimento se verificou numa rua perpendicular a esta, sem saída.
54º O aluimento verificou-se a cerca de 11 metros desta rua onde foi colocado o sinal, não se justificando a propalada salvaguarda de pessoas e bens que justifique tal sinal.
55º Neste conspecto, e caso seja indeferida a junção documental no âmbito da Nulidade arguida no presente recurso, a recorrente requer novamente a junção aos autos do Documento N.º 1, consubstanciado nas fotografias representativas do estado atual da obra e representativas do arruamento que aluiu. – Cfr. Doc. 1
56º Se analisarmos a documentação ora junta, desde logo verificamos que o levantamento topográfico junto pelo Recorrido na sua resposta ao incidente de declaração de ineficácia não representa a obra no estado adiantado em que ela já está, não sendo, por isso, representativo da situação atual.
57º Por outro lado, também a estimativa orçamental que o Recorrido apresentou com o seu requerimento de resposta ao incidente pressupõe a reposição integral das condições iniciais,
como se a construção já realizada não existisse, o que não faz sentido.
58º Isto porque existia um murete com cerca de 50 cm acima da cota de pavimento que delimitava o terreno particular ao longo de quase toda a extensão do arruamento danificado.
59º Com a cedência de 53 m2 da propriedade da Recorrente ao domínio público para execução de um passeio ao longo de toda a confrontação com o arruamento, esse murete tem de ser demolido para nesse alinhamento ser colocado o lancil que delimitará o referido passeio público a construir.
60º O muro de suporte é necessário porque o arruamento colapsou, porque não tinha fundação adequada.
61º Em face disso, é necessária uma estrutura de contenção que permita refazer o arruamento.
62º Essa estrutura de contenção é o muro de suporte que constitui a parede da cave da moradia, e que já está executado. - Doc. 1
63º Após a cedência de terreno para executar o passeio, é esse muro que materializa o limite entre o espaço público e o privado, porquanto o isolamento e impermeabilização das peças enterradas (sapatas e parede) é inerente à construção da moradia. – Doc. 1
64º Tal como comprovou em sede de incidente, a recorrente que sempre aceitou os trabalhos de reconstrução do arruamento, comunicou ao Recorrido a sua vontade e a disponibilidade para repor o caminho no seu estado inicial, sabendo-se que as condições iniciais a repor são as da plataforma do arruamento (com 5,0m de largura) para repor a circulação automóvel e respeitando, em absoluto, o projeto aprovado.
65º Mas o Recorrido nada autorizou, ou sequer respondeu.
66º Veja-se que o Recorrido tem sempre de autorizar, pois estamos a falar de um arruamento que faz parte do domínio público, estando fora da propriedade da recorrente.
67º A rua onde se verificou o aluimento não tem saída. – Cfr. Doc. 1
68º A recorrente sinalizou o local do aluimento, quer com os sinais de trabalhos em curso, quer com o sinal de proibição. – Doc. 1
69º A recorrente vedou completamente o local que aluiu, fazendo uso de grades que fixou no local com ferros apostos à vedação da obra. – Doc. 1
70º A recorrente no chão que aluiu colocou ainda plásticos para salvaguarda de qualquer eventualidade. – Doc. 1
71º E isto apesar de estar em causa uma rua sem saída onde não transitam com frequência veículos ou pessoas. – Doc. 1
72º Aliás, no local específico do aluimento, não foram, passados quase 3 meses, tomadas quaisquer outras medidas adicionais por parte do Recorrido para sinalizar o local ou desviar o trânsito, sinal que o Recorrido entendeu conveniente e suficiente a vedação e sinalização colocada pelo construtor, compreendendo perfeitamente não estarem em risco pessoas e bens. – Doc. 1
73º Sem prescindir, como facilmente se percebe, é a parede da moradia, depois de construída, que ficará á face do passeio a construir, e é o muro de suporte com 20 cm de espessura em betão armado, constante do projeto de estabilidade, e que será enterrado na parede da cave, que ficará à face do passeio. – Cfr. Doc. 1
74º Significa isto que a escavação para executar a obra conforme o projeto aprovado e, em concreto, o muro de suporte do projeto, consiste em fazer um corte no terreno que permita fazer o trabalho de modo a que o muro executado fique exatamente no local previsto, assegurando assim a estabilidade do arruamento.
75º Em termos técnicos, ou outros, não existe qualquer outro risco de derrocada, ou perigo para pessoas e bens, tanto que com a prossecução da construção da moradia assim que entrou a providência cautelar, a recorrente estava já a assegurar a estabilidade do arruamento a reconstruir pois é a parede da cave da moradia que serve de contenção ao arruamento.
76º Sendo até caricato que se embargue a totalidade de uma obra por um aluimento que o Município pretende que não se reponha…
77º Até porque a Recorrente não executou qualquer trabalho fora dos limites do terreno da obra.
78º Portanto, se até ao momento o caminho ainda não foi reposto, tal se deve apenas à conduta do Município, pois é a esse motivo que se agarram para parar totalmente a obra.
79º A continuação da obra não originou, nem irá originar, qualquer outra derrocada ou o agravamento da existente, e muito menos qualquer perigo para a circulação pedonal ou rodoviária.
80º Aliás, o conveniente até é que a obra continue com os demais trabalhos para finalização do muro de suporte e que constitui a parede da cave da moradia, e porque são tais trabalhos que permitem agora a reposição das condições iniciais do arruamento, e tudo para que se facilite ainda mais a circulação pedonal ou rodoviária no local.
81º Não obstante se entender que a vedação e sinalização do local que ruiu operada pelo construtor mostrou-se, como se mostra, como suficiente e adequada para evitar qualquer perigo para pessoas e bens.
Finalmente,
82º Os danos que resultariam para a Recorrente C., Lda da recusa da providência são superiores aos danos que resultam, para o interesse público, da sua concessão, já que a satisfação do interesse público sempre será alcançado com a demolição da obra eventualmente ilegal ou, mesmo a admitir-se esta terminologia, de uma obra futuramente ilegal.
83º Acresce que quanto à ponderação de interesses são ainda facilmente inteligíveis os interesses privados em presença: pelo lado da recorrente, a defesa da sua propriedade, a defesa dos interesses necessários à sua atividade finalística, pugnando a recorrente pela manutenção da sua posse e do direito a continuar com a obra, que considera observarem as exigências legais relativas à construção e/ou outras.
84º O deferimento da Resolução Fundamentada pelo Tribunal a quo implica assim a destruição dos direitos da Requerida.
85º Pelo que violou o Tribunal recorrido os artigos 128º, n.º 1, II parte, do CPTA, e ainda os artigos 20º e 268º da Constituição da República Portuguesa.

E quanto ao julgamento da providência:

A recorrente não se conforma com a decisão proferida, porquanto se considera que ocorreu incorreto julgamento da matéria de facto, assim como fez o Tribunal recorrido uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.
2ª A recorrente não se conforma com o despacho de dispensa de produção de prova, na medida em que nele se fez errada apreciação dos factos e igualmente errada interpretação e aplicação do artigo 118º, número 3 do CPTA, que se mostra, assim, violado, até porque no seu r.i. a recorrente requereu a produção de vários meios de prova.
3ª A recorrente requereu a produção dos meios de prova também para demonstrar os prejuízos resultantes dos atos, pois invocou no seu requerimento inicial factos concretos tendentes a demonstrar os prejuízos resultantes dos atos cuja suspensão de eficácia requereu, nomeadamente os elencados nos artigos 271° a 311º do requerimento inicial.
4ª E o que é facto é que a prova desses prejuízos era, como é, imprescindível para se proceder à análise do requisito do "periculum in mora ", traduzido no fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de dificil reparação previsto na alínea b) do n° 1 do artigo 120° do CPTA, que tem de se verificar cumulativamente com o "fumus boni iuris".
5ª A recorrente alegou e determinou os prejuízos, pretendendo prová-los, designadamente através da produção de prova testemunhal e ainda através das declarações de parte. No entanto, tal prova enunciada e a cargo da requerente, foi inviabilizada pelo próprio Tribunal "a quo" ao indeferir - sem qualquer fundamentação válida, diga-se - a produção de prova, e designadamente a produção de prova testemunhal, o que determinou, a final, que não se tivesse conseguido estabelecer, em concreto, se estavam verificados, ou não, os prejuízos de difícil reparação invocados pela recorrente.
6ª Ou seja, o Tribunal a quo, em primeiro lugar recusa a produção de prova, e depois vem alegar que não pode proceder à apreciação dos requisitos exigidos pela alínea b) do n° 1 e pelo n° 2 do artigo 120° do CPTA porque não foi feita prova. E, mais se diga que, ao contrário do entendimento constante do despacho recorrido e que visou justificar a desnecessidade da produção de prova, os documentos não eram de todo suficientes como prova dos danos alegados.
7ª Ademais, a prova por documentos pode ser feita em qualquer altura do processo, desde que se respeite o vertido no artigo 423° do C.P.C, ex vi art.° 1º do CPTA, até porque existem diversos documentos cuja apresentação não é possível oferecer com o articulado.
8ª Nestes termos, ao dispensar a produção de prova quando esta se mostrava indispensável à correta apreciação dos requisitos da providência cautelar requerida, o despacho recorrido fez uma errada interpretação e aplicação do artigo 118°, n° 3 do CPTA, impondo-se a respetiva anulação e a baixa dos autos ao TAF do Porto para aí se proceder à produção de prova, nomeadamente com as declarações de parte e a inquirição das testemunhas arroladas pela requerente. (Neste sentido já se pronunciou o TCA Norte, no seu dou Aresto no Proc. n° 276/1 1.8BEVIS, 2 Sec. do Cont. Tribut., de 12.01.2012)-
9ª Quanto ao ponto do “periculum in mora”, a inquirição das testemunhas ai-roladas pela recorrente, e ainda as suas declarações de parte, revestia-se de extrema relevância para a descoberta da verdade material e consequentemente para a boa decisão da causa, na medida em que os elementos carreados pelas partes para os autos se mostram insuficientes à prolação de uma decisão.
10ª O Tribunal a quo não poderia dispensar a produção de prova testemunhal e decidir a insuficiência de prova dos factos alegados atento o disposto no n° 1 do art. 367º do CPC, aplicável por força do art.º 1º do CPTA, que confere ao juiz o poder de ordenar oficiosamente as diligências probatórias que considerar necessárias ao apuramento dos pressupostos de decretamento das providências cautelares requeridas. É este o poder que está, aliás, vertido no n°3 doart. 118° do CPTA.
11ª O poder discricionário que é concedido ao julgador cautelar pelo artigo 118°, nº 3, do CPTA, não poderá ser um poder discricionário tout court, sendo antes um poder-dever, isto é, um poder que está vinculado à exigência da busca da verdade material e ao respeito pelo princípio da tutela jurisdicional efetiva.
12ª Assim, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, ao ter proferido decisão sem permitir à recorrente demonstrar a veracidade das afirmações produzidas em sede de requerimento inicial, violou o direito à tutela jurisdicional efetiva, previsto no artigo 2° do CPTA.
13ª E, sem prescindir, a recorrente cumpriu o artigo 114°, n°3 alínea g) do CPTA, pois formulou e especificou os fundamentos do pedido, oferecendo prova sumária da respetiva existência. A recorrente invocou o direito, fez prova dos factos e requereu a produção de prova. A recorrente respeitou o artigo 342º do Código Civil. A recorrente não esqueceu o seu ónus de articulação e de prova dos «factos concretos» que permitam e legitimem o julgador cautelar a realizar o «juízo de ponderação de interesses e danos» que é previsto e exigido. A recorrente alegou factos concretos relevantes para aferir do preenchimento do periculum in mora, os quais se mostram controvertidos, factos que foram omitidos no julgamento que o TAF do Porto fez da matéria de facto, não tendo sido sobre os mesmos produzida prova.
14ª O despacho recorrido, proferido pelo TAF do Porto, mostra-se errado, o que determina a existência de nulidade processual, decorrente da omissão de ato processual que deveria ter tido lugar, com influência sobre a decisão da causa. - Cfr. artigo 195.º, n.° 1, do CPC, ex vi art. 1° do CPTA.
15ª O que deve motivar a anulação da sentença recorrida, devendo os autos baixar ao TAF do Porto para que aí sejam levadas a cabo as diligência de prova omitidas, com vista a possibilitar à recorrente a prova dos factos que alegou com vista à demonstração do requisito do periculum in mora, ficando assim prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos do recurso.
16ª Face ao exposto, a recorrente entende que a recusa da produção de prova e a recusa de inquirição das testemunhas por si arroladas acarreta a violação do disposto no artigo 118°, n°3, do CPTA, e implica a anulação da sentença recorrida (Cfr. Acórdão do TCA Sul de 15.09.2011, Rº 07957/11), até porque, tal como entendido no Ac. do TCA Sul, Proc. n.° 10394/13, CA2° Juízo, de 24.10.2013, disponível em www.dgsi.pt:
"Na verdade, não pode o Tribunal a quo prescindir de prova testemunhal e julgar não verificado o requisito do periculum in mora com base no facto de o mesmo não resultar provado”.
17ª A dispensa da prova influiu na boa decisão da causa incorrendo a sentença recorrida na violação do disposto no art.º 2°, n° 3, 114°, nº 3 alínea g), e art. 118° do CPTA, e ainda na violação dos artigos 367º do CPC e 342º do Código Civil, devendo, em consequência, ser julgado procedente o presente recurso, também nesta parte.
Sem prescindir, no que respeita à sentença recorrida,
18ª Ocorre uma situação de facto consumado prevista no art° 120°/1 /b) do CPTA quando, a não ser deferida a providência, o estado de coisas que a ação quer influenciar fique inutilizada ex ante.
19ª Por seu turno, danos de dificil reparação são aqueles cuja reintegração no planos dos factos se perspetiva dificil, seja por que pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar ou, pelo menos, de reparar integralmente.
20ª In casu, a recorrente também alegou estarem preenchidos os critérios de concessão da providência estipulados na 2ª parte do artigo 120º, nº 1, b) do C.P.T.A., e tudo, de acordo com a factualidade vertida em 271° a 311° da p.i..
21ª Mas o tribunal a quo, entendeu ter-se “por inverficado o periculum in mora.. ". Contudo, a recorrente discorda, pois não alcança a razão pela qual entendeu o Tribunal "a quo" não ter sido demonstrado o "periculum in mora", quando ele próprio dispensou a produção de prova ao abrigo do n.° 3 do artigo 118° do CPTA.
22ª Particularmente, no caso de o Tribunal considerar que os elementos juntos com o requerimento inicial da providência cautelar não eram suficientes para demonstrar a existência de "periculum iii mora” o que não se concede, então sempre teria de lançar mão da prova por declarações de parte e da prova testemunhal que foi oportunamente indicada pela recorrente nesse mesmo requerimento.
23ª Não é possível que o Tribunal dispense as declarações de parte e as testemunhas oportunamente indicadas pela recorrente e depois indefira a providência cautelar, faltando a produção de prova sobre os factos efetivamente invocados e relativamente aos quais a parte e as testemunhas estariam habilitadas para prestar declarações e testemunhar, enfermando a sentença do Tribunal "a quo" de manifesta deficiência instrutória, não fazendo uso adequado do disposto no n°3 do artigo 118° do CPTA.
24ª Isto é inclusivamente defendido pelo Acórdão do TCA Sul, Processo 10105/13, de 11-07­-2013: "Mostrando-se indispensável para a apreciação dos requisitos previstos na alínea b) do n°1 do artigo 120º do CPTA a produção de prova testemunhal oferecida pelos recorrentes, a sua recusa imporia a violação do disposto no artigo 118º n°3 do CPTA, e implica a anulação da sentença recorrida”.
25ª A recorrente indicou as suas declarações de parte e a produção de prova testemunhal, sendo que através delas, se o tribunal tivesse permitido a produção de prova quanto ao periculum in mora, podia o tribunal a quo entender em que medida a recorrente realizou um avultado investimento na aquisição do terreno, vendo-se agora em perigo de perder todo esse investimento.
26ª Podia o tribunal entender quais os termos do Contrato de Empreitada celebrado com a sociedade "N., Lda", no montante de 638.000,00 €, até porque o tribunal a quo não prescinde de invocar que o pagamento da totalidade do preço só ocorrerá em caso de Insolvência, e que isso é um raciocínio errado.
27ª Com o devido respeito, raciocínio errado é o do tribunal a quo, pois na Cláusula Quinta do Contrato de Empreitada as partes estipularam condições para o incumprimento definitivo e culposo. - Cfr. Cláusula Quinta, Doc. 17 junto com o ri.
28ª Nessa Cláusula 5ª, n.° 1, ficou estipulado que a violação grave e reiterada das obrigações estipuladas e assumidas no contrato conferem ao contratante não faltoso o direito de o resolver com justa causa e produção imediata dos respetivos efeitos extintivos e de exigir do inadimplente uma indemnização por todos os danos que vier a sofrer, por via desse incumprimento, e tendo por limite o preço total da empreitada previsto na Cláusula Segunda do presente Contrato. - Doc. 17, junto ao ri.
29ª Ficou ainda clausulado que"Constitui incumprimento definitivo e culposo do Dono de Obra, designadamente, mas sem limitação, a falência, insolvência ou recuperação pré-falimentar deste, a penhora, arresto, o embargo a que deu causa, ou qualquer outro meio judicial de apreensão de bens e direitos da titularidade do mesmo e que o impeçam de deles livremente dispor, assim como a falta de pagamento das prestações a que se obrigou ao empreiteiro ". - Doc. 17, junto ao r.i.
30ª Ou seja, o incumprimento do contrato não está só previsto em caso de insolvência, mas também em caso de embargo ou qualquer outro meio judicial de apreensão de bens e direitos da titularidade do mesmo...
31ª Significa isto que ficou fixado no Contrato que em caso de incumprimento, constituindo incumprimento definitivo o embargo, a Recorrente terá de pagar o valor total da empreitada de 638.000,00 € a título de indemnização pelo incumprimento.
32ª Não se entende porque razão o tribunal a quo "esqueceu" as demais situações que podem implicar o incumprimento definitivo e culposo do Dono de Obra, salvaguardando-se na situação de Insolvência com argumentos que, com o devido respeito, não parecem partir de um raciocínio correcto.
33ª O tribunal a quo se admitisse a produção de prova, também poderia entender em que condições a recorrente poderia perder o investimento já realizado, e também poderia entender quais os custos fixos, com trabalhadores e outros, para além dos apresentados no Contrato com a empreiteira.
34ª E, obviamente, com a obra parada nem a recorrente, nem a empreiteira, necessitam de tantos trabalhadores, o que acarretará situações de dispensa de serviço e até despedimentos.
35ª Veja-se a suspensão da construção e a consequente impossibilidade de o concluir em prazo razoável implicará a inutilidade dos investimentos realizados e ainda o incumprimento dos contratos celebrados pela ora recorrida, causando-lhe gravissimos prejuízos, resultantes, nomeadamente da paralisação das obras por longos anos, possibilidade da devolução de sinais em dobro, indemnizações e aplicação de cláusulas penais.
36ª Ora, avultados prejuízos, insolvência, despedimento de trabalhadores, enfim tudo o que se alegou no r.i., tudo isto será a consequência, não apenas provável, de acordo com a experiência comum ou a normalidade das coisas (Cfr. Acs. do STA de 1986.07.17, AD 300/1512 e de 1986.11.25, AD 306/818; cfr. Ac. STA de 2003.02.26, Proc. 0149A103, www.dgsi.pt), mas também a consequência certa, pois tendo a recorrente investiu praticamente todos os seus recursos próprios, pelo que se irá ver na impossibilidade de satisfazer os encargos contraídos. A paralisação da obra por largos anos e o consequente desemprego e risco de subsistência de grande número de trabalhadores e respetivas famílias constituem inquestionavelmente prejuízos de difícil reparação, pois são, "segundo um juízo de normalidade e pelas regras da experiência comum, consequência adequada, típica ou provável" do embargo decretado, não sendo prejuízos "facilmente quantificáveis e susceptíveis, a priori, de uma exacta avaliação pecuniária", assumindo valores que são atualmente incalculáveis (Cfr. art. 569° do C. Civil). - Cfr. sobre esta matéria o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, Processo 3087/15.8BEPRT, com data de 04.11-2016.
37ª Todavia, o tribunal a quo não quis entrar na discussão de todas estas questões... O tribunal a quo também poderia entender de que forma a recorrente perderá o lucro projetado com a venda da moradia, e quais as razões que a levaram a projetar esse lucro mínimo.
38ª A recorrente apresentou ainda testemunhas habilitadas, pelas funções que desempenham (Engenheiros, empreiteiros, trabalhadores da obra, testemunhas que trabalham no ramo do imobiliário) capazes de explicar ao tribunal tudo o que supra se indicou.
39ª A recorrente arrolou ainda testemunhas pertencentes à dona da obra, à empreiteira e aos trabalhadores, o que tudo provaria minuciosamente o referido requisito do periculum in mora.
40ª A parte e as ditas testemunhas, caso tivessem sido ouvidas, poderiam facilmente demonstrar ao Tribunal que existem factos com interesse para a decisão da causa.
41ª Assim, enferma a sentença recorrida de deficiência instrutória, violando designadamente o disposto na alínea g) do n° 3 do artigo 114° do CPTA, bem como o disposto do n° 3 do artigo 118º do CPTA.
42ª A contradição entre uma decisão que dispensa a audição de testemunhas e que depois julga não provados determinados factos que estas mesmas testemunhas poderiam provar já foi, de resto, identificada e condenada pelo STA [ver AC de 02.11.2007, R° 471/07].
43ª Devidamente ponderado o requerimento cautelar, verifica-se que a recorrente alegou haver manifesto perigo de constituição de uma situação de facto consumado, ou pelo menos de produção de prejuízos de dificil reparação.
44ª A fundamentação da sentença recorrida, relativa à alegada falta de cumprimento do requisito do "periculum in mora”, enferma de inarredáveis vícios porquanto os pressupostos em que baseia a inexistência de "periculum in mora" revelam-se, salvo o devido respeito, despíciendos e infundados.
45ª O requisito do "periculum in mora" existe, pois com a não suspensão do acto suspendendo e com a não autorização requerida na providência, a recorrente verá insatisfeitas as suas finalidades sociais e empresariais, e que não se compadecem com a demora que certamente o processo principal terá, e verá insatisfeitas as suas pretensões na continuação da sua atividade empresarial.
46ª No caso dos autos, a recorrente da providência alegou determinados factos [cfr. artigos 271 a 311º do requerimento inicial], arrolou testemunhas, pediu as suas declarações de parte, visando demonstrar que a imediata execução dos atos suspendendos era suscetível de produzir na sua esfera jurídica prejuízos de dificil, senão impossível reparação, ou seja, para o que aqui importa, alegou factos tendentes a demonstrar que a execução dos actos suspendendos era adequada a originar prejuízos de dificil reparação.
47ª Com efeito, para a análise e apreciação dos requisitos previstos na alínea b) do n° 1 do artigo 120º do CPTA, sempre se imporia considerar os factos alegados pela recorrente no seu requerimento inicial, nomeadamente através da admissão da produção da prova testemunhal por aquele indicada.
48ª Deste modo, a prova desses factos mostra-se imprescindível para que se possa proceder à análise, ainda que perfunctória, dos requisitos previstos na alínea b) do n° 1 do artigo 120º do CPTA. E, se o ónus de tal prova recaía sobre a ora recorrente {cfr. artigo 342°, n° 1 do Cód. Civil], o certo é que tendo o mesmo indicado as suas declarações de parte e ainda as testemunhas no requerimento inicial, a prova pretendida sobre os factos tendentes a demonstrar os requisitos exigidos pela alínea b) do n° 1 do artigo 120° do CPTA podia - e devia, acrescente-se- ter sido feita através da inquirição das testemunhas arroladas, o que foi inviabilizado pelo Tribunal "a quo", que proferiu sentença sem que tivesse lugar uma fase de produção de prova quanto ao “periculum in niora", nomeadamente por declarações de parte e testemunhal.
49ª Não pode ainda a recorrente deixar de afirmar - embora a declaração de nulidade acarrete que seja produzida prova, em 1ª instância, relativamente aos demais requisitos da providência cautelar - que o facto indicado em 12) da Matéria de Facto dada como provada não corresponde à verdade, e não poderia ser dado como provado (até porque não se produziu prova), sendo falso que o Auto de Embargo tenha sido notificado ao J. no dia indicado, e muito menos notificado à Dona da Obra, como exige a lei, ou sequer à empreiteira.
50ª Em conclusão, mostrava-se indispensável para a apreciação dos requisitos previstos na alínea b) do n° 1 do artigo 120° do CPTA a produção de prova por declarações de parte e testemunhal oferecida pelo recorrente.
51ª O Tribunal recorrido violou o disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 120°, e nos artigos 118°, n°3, e 120°, todos do CPTA.

Contra-alegou o réu Município em ambos os recursos, pugnando pela manutenção do decidido.
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O Exm.º Procurador-Geral Adjunto foi notificado nos termos do art.º 146º do CPTA, não emitindo parecer.
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Com legal dispensa de vistos, vêm os autos a conferência, cumprindo decidir.
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O recurso do julgamento do incidente.
Em termos factuais vem fixado o seguinte:
1) Por despacho da Senhora Presidente da Câmara de (...) no uso de competências delegadas, datado de 24/10/2019, foi determinado o embargo da obra que a sociedade comercial “C., Lda.” estava a levar a cabo na Rua (...), (...), em (...), do qual se extrata com relevo para os presentes autos: “Por danos causados no arruamento público adjacente, dos quais resultaram o aluimento parcial do mesmo, pondo em causa, de forma notória a segurança de pessoas e bens”. (fls. 604 da parte VI do p. a.).
2) Por despacho de 11/11/2019 da Senhora Presidente da Câmara de (...) foi declarada a caducidade da admissão de comunicação prévia n.º 2/17 de 4/7. (fls. 677 da parte VI do p. a.).
3) No dia 14/11/2019 foi lavrado o auto de posse administrativa do terreno sito na Rua (...), (...), em (...) e do estaleiro de construção civil aí implantado de que é proprietária a sociedade comercial “C., Lda.”, do qual se extrata com relevo para os presentes autos:
“(…) dando assim cumprimento ao despacho da Ex. Ma. Sra. Presidente da Câmara, datado de 13 de novembro de 2019, o qual se fundamenta no fato de a obra ter sido embargada, por despacho de 24 de outubro de 2019, em virtude de a sua execução ter provocado a derrocada parcial do arruamento público confinante e essa ordem e suspensão de trabalhos não estar a ser respeitada, na medida em que, conforme decorre das participações efetuadas pela Policia Municipal e Fiscalização Municipal, as obras de construção continuam a ser executadas, estando a ser efetuados trabalhos ao nível do piso da cave.” (fls. 767/777 da parte VI do p. a.).
4) Em 3/12/2019 a Requerida foi citada (pág. 1008 do sitaf).
5) Em 5/12/2019 foram emitidas as resoluções fundamentadas das quais se extrata com relevo para os presentes autos: “ocasiona grave prejuízo para o interesse público na medida que permitiria a continuação dos trabalhos construção, sem que fosse requerida a renovação da admissão de comunicação prévia e promovidas as obrigatórias consultas às entidades externas com efeitos vinculativos, em especial, no caso concreto, em razão da sua localização, à “Agência Portuguesa do Ambiente — APA" entidade que tutela o domínio público marítimo e a verificação da sua conformidade com o atual Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) entre Caminha Espinho. e a consequente proposta de revisão, em fase de aprovação o que implica a suspensão dos efeitos da Providência Cautelar.” e “ocasionaria grave prejuízo para o interesse público, medida em que o retomar dos trabalhos recolocaria a questão da perigosidade da circulação no local, pedonal e rodoviária, com as consequências dai advenientes, nomeadamente, em sede de responsabilidade civil decorrente de eventuais sinistros, o que implica a suspensão dos efeitos da Providência Cautelar.” (fls. 768/771 do p. a.).
6) Em 17/12/2019 foram remetidas ao tribunal, juntamente com o processo administrativo, as resoluções fundamentadas mencionadas em 5) (pág. 734 do sitaf).
Sobre o direito, o tribunal “a quo” verteu o seguinte:
«(…)
Nos termos do n.º 1 do artigo 128º do CPTA, quando seja requerida a suspensão da eficácia de um ato administrativo, a entidade administrativa e os beneficiários do ato não podem, após a citação, iniciar ou prosseguir a execução, salvo se, mediante resolução fundamentada na pendência do processo cautelar, reconhecer que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.
De acordo com o n.º 4 do mesmo artigo, o interessado pode requerer ao tribunal onde penda o processo de suspensão da eficácia, até ao trânsito em julgado da sua decisão, a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida.
Cumpre ao tribunal verificar apenas se a resolução existe e se está fundamentada no sentido de demonstrar e provar que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público. “O incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida não comporta na sua letra e finalidade a obtenção de declaração de invalidade da resolução à luz das ilegalidades assacadas à mesma tal como resultaria no contexto de pretensão formulada numa ação administrativa especial” (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17/2/2012, proferido no processo 01292/10, publicado em www.dgsi.pt).
Considera-se indevida a execução quando falte a resolução prevista no n.º 1 ou o tribunal julgue improcedentes as razões em que aquela se fundamenta, nos termos do n.º 3 do art.º 128º do CPTA.
São duas as razões que permitirão ao julgador considerar indevidos determinados atos de execução já praticados na pendência do processo cautelar: por um lado a eventual falta da resolução fundamentada a que alude a 2ª parte do n.º 1, do artigo 128º do CPTA e, por outro lado, a improcedência das razões em que se funda a referida resolução fundamentada.
No caso sub judice, o Requerido proferiu resoluções fundamentadas, carecendo de sentido a invocação da sua tempestividade porquanto a atual redação do art.º 128º, n.º 1 do CPTA (aplicável in casu nos termos do art.º 13º, n.º 2 da Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro) determina a sua remessa a juízo “na pendência do processo cautelar” (o que sucedeu) e não apenas, como anteriormente se previa, “no prazo de 15 dias”.
Cumpre assim, como se evidenciou, analisar o teor das resoluções fundamentadas, apreciando se as razões aí invocadas o foram de modo a consubstanciar o grave prejuízo para o interesse público, que resultaria da imediata suspensão do embargo, da posse administrativa e da declaração de caducidade da admissão de comunicação prévia n.º 2/17, atos emanados pela Senhora Presidente da Câmara de (...). Compulsadas as resoluções fundamentadas juntas aos autos, nas razões aí invocadas é claramente assumido como grave prejuízo para o interesse público o facto de, por um lado e caso se suspendam os efeitos da declaração de caducidade da comunicação prévia, se permitir a continuidade das obras em desrespeito pela proposta de revisão do atual Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) entre Caminha Espinho em fase de aprovação, e, por outro lado, o facto da continuidade das obras, suspendendo-se os efeitos do embargo e da tomada de posse administrativa, pôr em risco a circulação no local, pedonal e rodoviária, com as consequências dai advenientes, nomeadamente, em sede de responsabilidade civil decorrente de eventuais sinistros.
Mas, como já se afirmou reiteradamente, o que está aqui em causa, o que importa aferir, é apenas se aquelas concretas razões – da forma como foram invocadas e explicitadas – constituem fundamentação bastante da gravidade do prejuízo para o interesse público que causaria a suspensão do daqueles atos.
Ora, o julgamento de improcedência das razões em que se funda a resolução fundamentada, indicado no n.º 3, do artigo 128º do CPTA é um julgamento que apela a um critério de evidência.
Deste modo, ao apreciar as razões vertidas na resolução fundamentada não pode o tribunal, por um lado, entrar na análise da bondade e legalidade substancial do ato suspendendo nem, por outro lado, invadir aquilo que é margem de livre decisão da Administração, os poderes discricionários de que a mesma dispõe para valorar a melhor forma de prosseguir o interesse público e a oportunidade do ato suspendendo no seu contexto e tempo.
Não é evidente e manifesto que as razões invocadas nas resoluções fundamentadas estejam erradas ou inexistem. Antes resulta das mesmas que tais razões foram expressas de forma congruente, lógica e objetiva – por um lado, a prática de atos contrários à proposta de revisão do POOC que, a entender-se caducada a admissão da comunicação prévia levaria à sua ilegalidade e, por outro lado, o perigo para a circulação no local da obra, tanto pedonal como rodoviária e isto naturalmente por efeito da derrocada parcial do arruamento público (cfr. pontos 1 e 3 ).
Considera-se, portanto, fundada a execução dos atos, nos termos do art.º 128º, n.ºs 1 e 3 do CPTA.
Em face do exposto indefere-se a requerida declaração de ineficácia de atos de execução indevida.
(…)».
Apreciando.
Sobre a nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (art.º 615º, nº 1, b), do CPC), é pacífico que essa só ocorrerá se a falta for absoluta.
E o que se pode ver é que a decisão especifica a factualidade que julgou provada; e quanto à fundamentação jurídica da própria decisão, também ela nela consta.
A assacada nulidade não existe, pois.
Como não existe a nulidade processual que a recorrente aponta (art.º 195º, nº 1, do CPC), sob alegação de que além do tribunal não ter notificado a recorrente da resposta do réu, não foi dada a hipótese de autora responder ao requerimento daquele, desde logo com impugnação dos documentos que juntou (levantamento topográfico e estimativa orçamental) e por força dos artigos 3º, n.º 3, e 415º do CPC, ex vi 1º do CPTA.
Desde logo nada do que aponta teve influência na decisão.
E não tinha de ter.
A autora abriu o incidente de ineficácia de actos de execução; o réu respondeu; a resposta da autora (resposta à resposta) não tinha que ter lugar na tramitação (art.º 128º, nº 6, do CPTA), pelo que a falta de notificação da resposta do réu, só por si é inócua para a decisão do incidente; os documentos que a acompanharam foram também indiferentes à decisão, e bem, não teriam de ter influência, sem respaldo para a agora requerida junção de documento em causa, em sede de recurso, por aplicação dos artigos 425º e 651º do CPC, ex vi 1º do CPTA, antes se determinando o seu desentranhamento, condenando a recorrente no pagamento de 1 (uma) UC de taxa de justiça.
E melhor se compreende essa falta de influência no desenvolvimento do seguinte.
O CPTA dispõe:
Artigo 128.º
Proibição de executar o ato administrativo
1 – Quando seja requerida a suspensão da eficácia de um ato administrativo, a entidade administrativa e os beneficiários do ato não podem, após a citação, iniciar ou prosseguir a execução, salvo se, mediante remessa ao tribunal de resolução fundamentada na pendência do processo cautelar, reconhecer que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.
2 – Sem prejuízo do previsto na parte final do número anterior, deve a entidade citada impedir, com urgência, que os serviços competentes ou os interessados procedam ou continuem a proceder à execução do ato.
3 – Considera-se indevida a execução quando falte a resolução prevista no n.º 1 ou o tribunal julgue improcedentes as razões em que aquela se fundamenta.
4 – O interessado pode requerer ao tribunal onde penda o processo de suspensão da eficácia, até ao trânsito em julgado da sua decisão, a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida.
5 – O incidente é processado nos autos do processo de suspensão da eficácia.
6 – Requerida a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, o juiz ou relator ouve a entidade administrativa e os contrainteressados no prazo de cinco dias, tomando de imediato a decisão.
Como o tribunal “a quo” avançou “O incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida não comporta na sua letra e finalidade a obtenção de declaração de invalidade da resolução à luz das ilegalidades assacadas à mesma tal como resultaria no contexto de pretensão formulada numa ação administrativa especial” (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17/2/2012, proferido no processo 01292/10, publicado em www.dgsi.pt).”. [igualmente em Ac. deste TCAN, de 21-10-2016, proc. n.º 99188/16.9BEMDL]
No citado aresto também se coloca em sumário que “O objecto do pedido de declaração de ineficácia de actos de execução, não abrange, directa ou indirectamente, a apreciação dos pressupostos adjectivos ou substantivos relativos ao pedido de suspensão da eficácia do acto.”.
O recurso interposto incorre nesse desvio, ausente na decisão recorrida, sobrando censura sobre o que não foi julgado, e que não pode agora acolher provimento.
Por outro lado, «O incidente que se encontra previsto no art. 128º n.ºs 3 a 6, do CPTA, não visa a declaração de ilegalidade da resolução fundamentação, mas antes a declaração de ineficácia de actos de execução indevida, a qual só pode ser pedida após a prática desses actos, devendo os mesmos ser concretamente identificados (isto é, com indicação da data, do autor e do sentido e fundamentos da decisão), sendo no âmbito desse incidente que são apreciadas – a título incidental - as razões em que assentou a resolução fundamentada.” (Ac. do TCAS, de 16-02-2017, proc. n.º 283/16.4BELLE-A)»; «I. O foco do incidente previsto nos n.os 3 a 6 do artigo 128.º do CPTA centra-se nos atos de execução indevida, sendo certo que o seu julgamento implica a apreciação incidental das razões em que se fundamenta a resolução fundamentada. II. Por se tratar, antes do mais, de uma pronúncia sobre os atos de execução, o incidente apenas pode ser suscitado após a prática dos mesmos, que devem estar devidamente identificados, cabendo ao requerente demonstrar a sua verificação. .” (Ac. do TCAS, de 10-12-2019, proc. n.º 539/19.4BELSB-S1)».
E atentemos no que a autora veio solicitar:
a) Que. face ao alegado no presente Incidente, seja declarada a caducidade da Resolução Fundamentada e/ou considerada improcedente;
b) Que seja declarada a ineficácia dos atos de cxecuçào indevida indicados acima no artigo 1° e junto à presente como Doc. 1, bem como dos demais praticados indevidamente ao abrigo dos atos suspendendos, nos termos e com os fundamentos supra alegados, o que se requer ao abrigo do art.° 128°, números 3, 4, 5 e 6. do CPTA, e até trânsito em julgado da decisão que o Tribunal venba a proferir.
Encontramos os ditos actos “indicados no artigo 1º e junto à presente como DOC.1”, no seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Fica claro que é contra os actos de resolução fundamentada proferidos ao abrigo do art.º 128º, n.º 1, do CPTA, que vem deduzido o incidente.
E isso, como visto, não é o que aqui cabe.
Conforme decidido em Ac. deste TCAN de 11-01-2019, proc. n.º 02031/18.5BEPRT-S1, «A expressão “execução do acto”, constante do n.º 2 do artigo 128º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, deve ser tomada em sentido restrito ou próprio, de execução do acto administrativo para prossecução de um interesse público.» (e, de todo o modo, a entidade administrativa só fica impedida de iniciar ou prosseguir na execução após a citação, e assim não deve declarar-se a ineficácia de actos de execução praticados antes).
Sendo que continua actual que «A resolução fundamentada não é objeto de impugnação autónoma desligada da existência de atos concretos de execução, sendo inadmissível que o requerente do incidente reaja contra tal resolução peticionando a declaração de ineficácia de eventuais e futuros atos de execução» - Ac. do STA de 06-11-2014, proc. n.º 0858/14.
O recurso do julgamento da providência.
A requerente procura a suspensão cautelar dos efeitos (i) do despacho da Senhora Presidente da Câmara Municipal de (...) datado de 24/10/2019, que determinou o embargo das obras que a Requerente estava a executar (no prédio urbano sito na Rua (...), na freguesia de (...), em (...), composto por parcela de terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1821 e descrita na conservatória do registo predial de (...) sob o n.º 280/19890706), (ii) do despacho da Senhora Presidente da Câmara Municipal de (...) datado de 11/11/2019 que converteu em definitivo o projeto de decisão de declaração de caducidade da admissão de comunicação prévia n.º 2/17, e (iii) do despacho da Senhora Presidente da Câmara Municipal de (...) datado de 13/11/2019, que ordenou a posse administrativa do mesmo prédio.
Em termos factuais vem fixado o seguinte:
1) A Requerente “C., Lda.” é, desde 4/5/2018, proprietária do prédio urbano sito na Rua (...), na freguesia de (...), em (...), composto por parcela de terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1821 e descrita na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º 280/19890706 (fls. 524/526 do p. a.).
2) Em 4/7/2017 foi emitida a “Admissão de Comunicação Prévia n.º 2/17”, em nome de V., que titula a aprovação de obras que incidem sobre o prédio sito na Rua (...), da freguesia de (...), descrita na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º 280/19890706 e inscrito na matriz urbana sob o artigo 1821 da respetiva freguesia, da qual se extrata com relevo para os presentes autos: “A obra deve ser executada até: 2020/07/04, tendo início nesta data.”. (fls. 521 do p. a.).
3) Por requerimento de 13/12/2018 a sociedade “C., Lda.” requereu ao Presidente da Câmara Municipal de (...) o seu averbamento como Requerente. (fls. 522 do p. a.)
4) Por despacho de 11/1/2019 foi deferido o averbamento da Requerente como titular do processo. (fls. 523/524 do p. a.)
5) Por despacho de 17/10/2019 foi proferido projeto de decisão de declaração de caducidade da admissão de comunicação prévia n.º 2/17 e determinada a audiência prévia da Requerente. (fls. 546 do p. a.).
6) A Requerente exerceu audiência prévia quanto à declaração de caducidade da admissão de comunicação prévia. (fls. 625/638 do p. a.)
7) A Requerente foi notificada do projeto de decisão mencionado em 5 através do ofício n.º 5397/19 de 18/10/2019. (fls. 547/548 do p. a.)
8) Por requerimento datado de 18/10/2019 e rececionado pela Câmara Municipal de (...) na mesma data, a Requerente requereu a substituição do diretor técnico da obra. (fls. 549 do p. a.)
9) Em 24/10/2019, em deslocação ao local da obra em causa nestes autos, o funcionário da fiscalização da Câmara Municipal de (...) informou ter verificado “(…) que, com as escavações em causa, parte do arruamento públicos Nascente desmoronou, o que pode por em causa a segurança de pessoas e bens.” (fls. 595 do p. a.).
10) Em decurso da informação mencionada em 9 foi proposto à Senhora Presidente da Câmara de (...), que concordou por despacho de 24/10/2019, que “(…) com a maior urgência, de forma a prevenir riscos maiores, que se proceda ao embargo da obra, cuja caducidade aliás, já foi declarada, aguardando-se o decurso do prazo de audiência prévia.” (fls. 595 do p. a.).
11) Por despacho da Senhora Presidente da Câmara de (...) foi determinado o embargo da obra em causa nestes autos “por danos causados no arruamento público adjacente, dos quais resultaram o aluimento parcial do mesmo, pondo em causa, de forma notória, a segurança de pessoas e bens.” (fls. 604 do p. a.)
12) Em 25/10/2019 foi elaborado o “Auto de Embargo N.º 13/2019”, notificado a J., contribuinte fiscal n.º (...). (fls. 600/601 do p. a.).
13) Por escrito datado de 25/10/2019 A., na qualidade de diretora técnica da obra comunicou à Senhora Presidente da Câmara de (...) o aluimento de terras, a delimitação de um perímetro de segurança e a colocação de barreiras, bem como o inicio dos trabalhos necessários à reposição da situação. (fls. 609 do p. a.).
14) Do endereço eletrónico de V. foi enviada mensagem de correio eletrónico para o endereço act@---.pt em 29/10/2019 dirigida à Senhora Engenheira A. da qual se extrata com relevo para os presentes autos:
“A obra, conforme oportunamente comunicado, foi embargada em razão dos graves danos causados ao arruamento público adjacente, os quais põe em causa a segurança de pessoas e bens. Neste enquadramento, a realização de quaisquer trabalhos constitui crime de desobediência, o que será, de imediato, para os devidos efeitos participado ao Ministério Público. Quanto ao teor do presente e-mail, só após a especificação dos trabalhos a realizar para suster o aluimento verificado, será passível equacionar, para este efeito, a suspensão da ordem de embargo.” (fls. 610 do p. a.)
15) Em 6/11/2019 o funcionário da fiscalização da Câmara Municipal de (...) verificou que “estão a decorrer obras, não dando assim cumprimento ao embargo.” (fls. 674/676 do p. a.).
16) Por despacho de 11/11/2019 da Senhora Presidente da Câmara de (...) foi declarada a caducidade da admissão de comunicação prévia n.º 2/17 de 4/7 (fls. 677/680 do p. a.).
17) Por despacho de 13/11/2019 foi determinada a posse administrativa do terreno (fls. 701/702 do p. a.).
18) No dia 14/11/2019 foi lavrado o auto de posse administrativa do terreno sito na Rua (...), (...), em (...) e do estaleiro de construção civil aí implantado de que é proprietária a sociedade comercial “C., Lda.”, do qual se extrata com relevo para os presentes autos:
“(…) dando assim cumprimento ao despacho da Ex. Ma. Sra. Presidente da Câmara, datado de 13 de novembro de 2019, o qual se fundamenta no fato de a obra ter sido embargada, por despacho de 24 de outubro de 2019, em virtude de a sua execução ter provocado a derrocada parcial do arruamento público confinante e essa ordem e suspensão de trabalhos não estar a ser respeitada, na medida em que, conforme decorre das participações efetuadas pela Policia Municipal e Fiscalização Municipal, as obras de construção continuam a ser executadas, estando a ser efetuados trabalhos ao nível do piso da cave.”. (fls. 767/777 do p. a.).
19) Por escritura de compra e venda T., na qualidade de gerente da aqui Requerente declara aceitar a venda do imóvel aqui em causa pelo montante de € 225.000,00. (documento 13 junto com a petição inicial).
20) Pelo averbamento do diretor de obra e livro de obra a Requerente pagou a quantia de € 16,30. (documento 14 junto com a petição inicial).
21) A Requerente celebrou com a sociedade comercial “N., Lda.” o contrato que designaram de “contrato de empreitada”, do qual se extrata: “(…) Segunda: 1. O preço da empreitada será de €638.000,00. (…) Quarta: São da exclusiva responsabilidade do empreiteiro todas as obrigações relativas ao pessoal empregado na empreitada (…) Quinta: 1. A violação grave e reiterada das obrigações estipuladas e assumidas no presente contrato conferirão ao contratante não faltoso o direito de o resolver com justa causa e produção imediata dos respetivos efeitos extintivos e de exigir do inadimplente uma indemnização por todos os danos que vier a sofrer, por via desse incumprimento, e tendo por limite o preço total da empreitada previsto na Cláusula Segunda do presente Contrato.” (…) 3. Constitui incumprimento definitivo e culposo do Dono de Obra, designadamente, mas sem limitação, a falência, a insolvência ou recuperação pré-falimentar da empresa (…).”. (documento 16 junto com a petição inicial);
22) Em 1/10/2018 foi transferido o montante de € 40.000,00 da conta n.º 242.10.006286-6 para a conta n.º 242.10.006263-5, cujo 1º titular é a sociedade “N., Lda.”, ambas abertas no banco “Montepio SA” (documento 18 junto com a petição inicial).
23) Em 3/10/2018 foi transferido o montante de € 40.000,00 da conta n.º 242.10.006286-6 para a conta n.º 242.10.006263-5, cujo 1º titular é a sociedade “N., Lda.”, ambas abertas no banco “Montepio SA” (documento 19 junto com a petição inicial).
24) A Requerente declarou na IES respeitante ao exercício de 2017 um resultado líquido de € 127.381,64. (documento 20 junto com a petição inicial).
25) A Requerente declarou na IES respeitante ao exercício de 2018 um resultado líquido de € 139.892,30. (documento 21 junto com a petição inicial).
Sobre o direito, o tribunal “a quo” deu um enquadramento geral de critério e centrou atenção no “periculum in mora”, vertendo o seguinte:
«(…)
A este propósito a Requerente alega, que o direito que pretende fazer valer na ação principal se consubstancia no seu direito a continuar a construção da obra e aceder ao estaleiro e terreno para esse efeito, pelo que se não forem suspensos os atos aqui em causa irá produzir-se uma situação de facto consumado, uma vez que a decisão da ação principal surgirá demasiado tarde (cfr. pontos 271 a 276 da petição inicial).
Como supra se evidenciou, a situação de facto consumado só ocorreria caso, não suspensos os efeitos do embargo da obra, da posse administrativa e da caducidade da admissão da comunicação prévia não fosse possível, com a decisão da ação principal que determine a anulação ou nulidade dos atos administrativos suspendendos, repor a situação de legalidade.
O que claramente não é o caso dos presentes autos.
Cumpre atentar que, na ação principal, a Requerente pretenderá evitar os efeitos definitivos do embargo, da posse administrativa e da caducidade da admissão de comunicação prévia que se traduzirão na impossibilidade definitiva de realização da obra.
Ora, em caso de decisão favorável à Requerente, determinando a nulidade ou anulabilidade desses atos, a reposição da legalidade implicará que esta possa continuar a obra, acedendo ao estaleiro e ao terreno para esse efeito.
Deste modo, o não decretamento da presente providência cautelar não determinará uma situação de facto consumado que inutilize os efeitos da sentença a proferir no processo principal.
Contudo, a Requerente alega ainda a constituição de prejuízos de difícil reparação.
Ora, os prejuízos de difícil reparação serão os que advirão do não decretamento da pretensão cautelar requerida e que, pela sua irreversibilidade, tornam extremamente difícil a reposição da situação anterior à lesão, gerando danos que, mesmo sendo suscetíveis de quantificação pecuniária, cuja compensação se revela insuficiente para repor ou reintegrar a esfera jurídica do requerente.
O critério para se aferir da probabilidade de se produzirem prejuízos de difícil reparação é o da maior ou menor dificuldade que envolve o restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar, devendo o tribunal ponderar as concretas circunstâncias do caso em função da utilidade da sentença e não decidir com base em critérios abstratos.
Assim, a Requerente alega que realizou um avultado investimento na aquisição do terreno e outras despesas que se vê em perigo de perder sem possibilidade de recuperação.
Por outro lado, alega que celebrou um contrato de empreitada com a sociedade “N., Lda.” no montante de € 638.000,00, sendo que no mesmo se prevê a possibilidade de, em caso de insolvência da Requerente ter de vir a pagar a totalidade do preço acordado para a empreitada, o que acrescido ao investimento que já realizou representa um prejuízo de € 959.959,14.
Por fim, alega que realizou um investimento muito superior aos seus lucros, em virtude de ter projetado a obtenção de um lucro superior a € 200.000,00 com a venda da moradia que irá perder caso não seja decretada a presente providência cautelar, ao que acrescem os custos fixos, nomeadamente com os trabalhadores próprios, podendo mesmo ver-se numa situação de insolvência e sendo obrigada a despedir os seus trabalhadores.
Quanto à primeira alegação, sendo esta meramente conclusiva, a Requerente não concretiza qual o motivo que levará a que se veja na condição de perder o investimento já realizado, tanto mais que, com a procedência da ação principal irá retomar as obras e continuar a construir a moradia aqui em causa.
Já no que respeita à possibilidade de se vir a encontrar numa situação de insolvência por efeito do não decretamento da presente providência cautelar, diga-se desde já, que a Requerente parte de um raciocínio viciado logo quando refere a possibilidade de vir a ter que pagar à sociedade “N., Lda.” o montante total acordado para a empreitada caso se veja numa situação de insolvência, para depois concluir que esse prejuízo a poderá colocar numa situação de insolvência. Ora, ou a situação de insolvência determina o pagamento do total do montante acordado para a empreitada sem que a mesma se realize, ou esse pagamento é condição da situação de insolvência da Requerente.
Outro dos argumentos da Requerente consiste no facto de ter realizado um avultado investimento em virtude de ter projetado um lucro superior a € 200.000,00 com a venda da moradia que irá perder caso não seja decretada a presente providência cautelar assim como os custos fixos que manterá, nomeadamente com os trabalhadores próprios.
Diga-se desde, já que toda esta alegação é conclusiva.
A Requerente não concretiza de que forma e porque motivo irá perder o lucro projetado com a venda da moradia, pois que sendo a sentença proferida na ação principal favorável à sua pretensão poderá prosseguir com a obra e alienar a moradia obtendo o projetado lucro ou outro que poderá até ser superior.
Por outro lado, a Requerente não demonstra qual o peso dos custos fixos que mantém por conta da obra em causa nestes autos, tanto mais que celebrou com a sociedade “N., Lda.” um contato de empreitada para a construção da moradia no qual ficou estipulado que aquela sociedade “N., Lda.” ficaria responsável pelos custos com o pessoal afeto à empreitada (cfr. ponto 21 dos factos indiciariamente provados), o que, pelo contrário, permite concluir que os referidos custos serão diminutos. Acresce ainda que, a situação que se originará com a execução do ato suspendendo não é irreversível, na medida em que, caso a Requerente obtenha vencimento na ação principal, sempre poderá exigir a restituição do montante despendido com esses custos produzidos por efeito da paralisação da obra.
Destarte, na ausência de alegação de factos, não é possível concluir pela existência de uma situação de facto consumado nem pela criação de prejuízos de difícil reparação. Conforme preconiza o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 30/10/2014 proferido no processo 0681/14 e disponível para consulta em www.dgsi.pt, “a concessão das providências cautelares, no tocante ao requisito do periculum in mora exigido pelo artigo 120º nº 1 al. b) e c) do CPTA, assenta nos factos alegados pelas partes. Uma alegação insuficiente e meramente conclusiva não é adequada para a averiguação do preenchimento de tal requisito”.
Em face do exposto, impõe-se concluir pela improcedência do peticionado por ausência de periculum in mora, resultando prejudicado o conhecimento dos demais requisitos cumulativos para o seu decretamento.
(…)»
Vejamos.
Sobre o facto supra enunciado em 12) (que o tribunal “a quo” suportou em fls. 600/601 do p. a.) a recorrente afirma que ele não corresponde à verdade; mas não indica meio probatório que permita tirar diferente juízo.
Para além desta específica censura ao julgamento de facto, o que está em questão é o julgamento vertido quanto ao “periculum in mora”.
Como se sabe, “(…) as providências cautelares são adoptadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente” (art.º 120º, nº 1, do CPTA).
Sob o prisma da verificação, ou não, de uma situação de facto consumado, mais não aponta a recorrente que a persistência dos efeitos do embargo, caso a suspensão de eficácia não seja concedida.
E isso nada dita de facto consumado.
Já quanto à possibilidade de produção de prejuízos de difícil reparação, a recorrente declina argumentação vária.
Como refere, foi sob artigos 271 a 311º do requerimento inicial que alegou o que, no seu entender, perspectivava um periculum in mora”.
Assinalar-se-á que aí, em parte, se encontram referências que são de direito, e no que com propriedade se refere à matéria factual parte também foi até consignada no elenco de matéria de matéria de facto que vem supra.
Ainda assim, assinala a recorrente que haverá uma insuficiência factual, que deveria ser suprida pela produção de prova a que se propôs.
Agora apreciando, essa é possibilidade que só joga com a prova por declarações de parte e por testemunhas que indicou; não uma ulterior junção documental que agora vem colocada como hipótese do que ainda poderia estar ao alcance, de mera especulação.
Mas, prova sobre que factos?
A recorrente aponta em bloco ao narrado sob artigos 271 a 311º do r. i., sendo que, como e pelo que já se notou, logo se evidencia não caber razão para uma censura total..
O recurso concretiza alguns pontos.
Sobre o “avultado investimento na aquisição do terreno, vendo-se agora em perigo de perder todo esse investimento”, essa foi uma ideia contrariada na decisão recorrida que a recorrente não demonstra agora que esteja errada e a necessitar da produção de prova.
Sobre os “termos do Contrato de Empreitada”, eles são os da prova documental constituída.
Aponta a recorrente que “o tribunal a quo não prescinde de invocar que o pagamento da totalidade do preço só ocorrerá em caso de Insolvência, e que isso é um raciocínio errado”.
Mas nem o tribunal “a quo” afirma que “o pagamento da totalidade do preço ocorrerá em caso de Insolvência”, nem há que erigir fundado receio que a recorrente venha a incorrer nesse total valor a pagar.
Certo que se centrou atenção na possibilidade de insolvência, e que essa não é a única causa definida como incumprimento defintivo e culposo do Dono da obra (previstas no art.º 5º, nº 3, do contrato de empreitada, abrangendo o embargo); mas compreende-se essa atenção quando é também a recorrente que sublinha a hipótese na alegação feita no r. i..
Por outro lado, a eventual resolução por banda do empreiteiro e exigência de indemnização, tendo por limite o preço total da empreitada previsto na Cláusula Segunda do contrato, de modo algum significa, como a recorrente pretende concluir, que irá necessariamente (ou com maior probabilidade) pagar essa indemnização, e de semelhante montante, que “a Recorrente terá de pagar o valor total da empreitada de 638.000,00 € a título de indemnização pelo incumprimento”; e assim é quando, mais a mais, a própria vê como legal a sua actuação, a modos de refutar um quaquer incumprimento culposo, e a colocar em crise a presunção de culpa contratualmente prevista; vindo agora em recurso gratuito o aceno de aplicação de clásulas penais ou de devolução de sinais em dobro.
Não se estranha, pois, que o tribunal “a quo” tenha colocado em dúvida “porque motivo irá perder o lucro projetado com a venda da moradia”, mesmo sem evidenciar que esse lucro, no montante apontado (superior a € 200.000,00), mais não obter peso duma expectativa; num primeiro olhar, na escala do investimento e tempos vividos, deveras optimista.
Sobre os custos fixos, efectivamente nada a recorrente alegou que concretize “qual o peso dos custos fixos que mantém por conta da obra em causa nestes autos” (no r. i. referidos como “custos fixos inerentes às obrigações”), de onde se possa extrapolar uma dispensa ou despedimento de funcionários; e isto na abrangência do que lhe poderia importar.
E, assim, nesta constelação - sequer para um alegado risco de insolvência, desprovido de factos índice -, não se vê erro em não ter sido empreendida produção de prova e se ter concluído “pela improcedência do peticionado por ausência de periculum in mora, resultando prejudicado o conhecimento dos demais requisitos cumulativos para o seu decretamento.”, requisitos cumulativos.
*
Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento aos recursos.
Custas, em ambos os recursos: pela recorrente.

Porto, 30 de Abril de 2020.


Luís Migueis Garcia
Frederico Branco
Nuno Coutinho