Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03001/11.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/25/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Cristina da Nova
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO DE LIQUIDAR IMPOSTO, PRAZO E REPORTE DE PREJUÍZOS.
Sumário:De acordo com o art. 45.º, n. º3, da LGT, no caso de ter sido efetuado reporte de prejuízos o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.

Tratando-se de IRC, determinava o art. 47.º, n. º1, do CIRC, que os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício, nos termos das disposições anteriores, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos seis exercícios posteriores.

Assim, o prazo conta-se a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário, no caso o ano a que respeitam o apuramento dos prejuízos (1999 e 2002), deve ser reportado ao ano a que respeitam as correções, e não ao ano em que se reportaram os prejuízos (2005).*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:C.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO

Fazenda Pública, inconformada com a sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial da liquidação adicional do IRC referente ao exercício de 2005 por caducidade do direto à liquidação.

Formula nas respetivas alegações (cfr. fls. 379-387) as seguintes conclusões que se reproduzem:

« A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida, de forma mediata, contra a liquidação de IRC n.º 20108310002881 e a nota compensação n.º 20103031083 no montante de €942.734,07 referente ao exercício de 2005 e contra a liquidação n.º 20108310002888 e nota de compensação n.º 20103755955 no montante de €37.383,60 referente ao IRC do exercício de 2006, emitidas em nome de B. SA.
B. As liquidações postas em crise tiveram como origem dois procedimentos inspectivos levados a cabo ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI200905411, que teve por âmbito o IRC do ano de 2005 e por objectivo a validação dos prejuízos fiscais deduzidos neste exercício, e da Ordem de Serviço n.º OI200803799 que teve por âmbito o IRC do exercício de 2006, que teve por objectivo o ajustamento da matéria colectável de IRC, nos termos do artº. 58º - A, ao valor patrimonial.
C. A sentença ora recorrida (parcialmente procedente) declarou procedente a impugnação quanto à liquidação de 2005, determinando-se a anulação da liquidação impugnada e improcedente a impugnação quanto à liquidação do ano de 2006, com custas por ambas as partes pelo decaimento, 96,18% a cargo da Fazenda Pública e 3,82% a cargo da Impugnante.
D. É pois da parte (segmento decisório) em que a Fazenda Pública (FP) decaiu (Da falta de notificação da liquidação antes de decorrido o prazo de caducidade) que ora se recorre, ressalvado o sempre devido respeito, com o desta forma decidido, não se conformando a Fazenda Pública.
E. Entendeu o douto Tribunal a quo que o prazo de caducidade ocorreria em 1.01.2010 relativamente ao exercício de 2005, e que tendo sido emitida a liquidação n.º 2010 8310002881 do exercício de 2005 em 20.05.2010 (cfr. ponto 16) da factualidade assente), à data já havia ocorrido o prazo de caducidade
F. Para assim decidir, constata-se que prima facie, a meritíssima Juíza do Tribunal a quo, suportada pela jurisprudência que dimana do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20.05.2015, proferido no rec. 029/14, entendeu aplicar ao presente caso o prazo geral de caducidade (4 anos) previsto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT, desconsiderando o preceituado no n.º 3 do mesmo artigo.
G. Ora, com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente assim decidido, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento de facto e de direito.
H. Antes de mais, considera a Fazenda Pública que para uma boa apreciação da presente questão se verifica uma insuficiência na matéria de facto dada como provada, devendo-se acrescentar ao probatório os seguintes factos:
A Ordem de Serviço n.º OI200905411 que tem por âmbito o IRC e extensão o ano de 2005, teve por objectivo a validação dos prejuízos fiscais deduzidos neste exercício, tendo sido corrigidos PREJUÍZOS FISCAIS APURADOS NO ANO DE 1999 e 2002 (cfr. Relatório Inspectivo, fls. 34 a 43 do processo de RG junto aos autos),
A notificação da liquidação e da nota de compensação respeitantes ao IRC de 2005 ocorreu em 4 de junho de 2010 (cfr. fls. 29 do PRG e requerimento e elementos probatórios juntos aos autos via SITAF em 01/03/2019 pela Fazenda Pública, a fls...do processo físico)
I. Nos termos do n.º 3 do art.º 45.º da LGT “Em caso de ter sido efectuado reporte de prejuízos, bem como de qualquer outra dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.”.
J. Preceituava o n.º 1 do artigo 47.º do CIRC, na redacção à data, que “os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício, nos termos das disposições anteriores, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos seis exercícios posteriores”.
K. Nesta medida entende a Fazenda Pública que in casu o prazo de caducidade a ser considerado deveria ser o de 6 anos, e não o prazo geral de 4 anos.
L. Sobre esta mesma questão jurídica, já se pronunciou em consonância a mais recente jurisprudência dos tribunais superiores, entre outros veja-se por todos o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul datado de 01/22/2013, proferido no processo 02857/09, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 11/11/2015, proferido no processo 01353/14, bem como o mais recente Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 12/04/2019, proferido no processo 0927/16.8BEPRT (todos disponíveis in www.dgsi.pt),
M. não sendo de aplicar aqui nos presentes autos, quer seja pela situação fáctica divergente quer seja por se mostrar ultrapassada, a jurisprudência citada na sentença recorrida que dimana do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 20/05/2015, proferido no rec. 029/14.
N. Da jurisprudência citada, retira-se que no caso de ter sido efectuado reporte de prejuízos, o prazo de caducidade é o do exercício do direito de reporte (art.º 45º, n.º 3, da LGT), que é o de 6 anos (art.º 47º, n.º 1, do CIRC), instituindo-se a regra da equivalência ao prazo do exercício desse direito de reporte,
O. (...) para os impostos periódicos, como o IRC, o prazo de caducidade, casuisticamente, relevante, há-de ser, sempre, contado “a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário”, ou seja, tal prazo conta-se a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário (art.º 45º, n.º 4, da LGT).
P. Não oferece pois quaisquer dúvidas, que o prazo de caducidade da liquidação a aplicável, numa situação de reporte de prejuízos como é a dos presentes autos, é de seis anos e não de quatro, como erroneamente foi considerado na sentença recorrida. Nesta medida, o prazo de caducidade ocorreria em 01/01/2012 relativamente ao exercício de 2005, e não em 01/01/2010 como foi considerado.
Q. Acresce ainda dizer, sem conceder, mesmo que não se considerasse que a notificação da liquidação e da nota de compensação respeitantes ao IRC de 2005 ocorreu em junho de 2010 (por eventual insuficiência probatória), o raciocínio lógico dedutivo efectuado pela meritíssima Juíza do douto Tribunal a quo no que diz respeito ao IRC de 2016 tem aqui plena aplicação (apropriamo-nos pois da sua fundamentação).
R. A liquidação foi emitida em 20.05.2010 (cfr. ponto 16) da factualidade assente).
S. Ora, apesar de eventualmente não decorrer dos autos a data de notificação da liquidação, resulta comprovado que a Impugnante deduziu reclamação graciosa em 27.10.2010 (cfr. ponto 17) da factualidade assente).
T. Assim, sabendo-se que a Impugnante foi seguramente notificada da liquidação previamente à apresentação da reclamação graciosa, não ocorreu a caducidade da liquidação que somente ocorria em 01/01/2012.
U. Decidindo como se decidiu, é nossa convicção que a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito devendo ser revogada com todos os efeitos legais.
V. Subsidiariamente, sem conceder, mesmo que doutamente se entenda que in casu o prazo legal de caducidade a considerar não seria o de 6 anos, mas o prazo geral de 4 anos, continuava a não se mostrar caduca a liquidação de IRC atinente a 2005.
W. Salvo o devido respeito que é muito, não concordamos com a meritíssima Juíza do douto Tribunal a quo, ao não ter considerado como assente o facto de que a notificação do relatório final ocorreu em 17/05/2010.
X. Com efeito a data de conclusão do procedimento inspectivo, que ocorreu com notificação pessoal do relatório final em 17/05/2010 precisamente no último dia do prazo de 6 meses para operar a suspensão do prazo de caducidade previsto no art.º 46.º da LGT, não era um facto controvertido!
Y. Veja-se que a impugnante nunca veio impugnar (nem sequer controverter) tal facto, quer em sede administrativa (nas suas petições de Reclamação Graciosa e de Recurso Hierárquico) quer já em sede judicial.
Z. E, pelo contrário, já em sede de Reclamação Graciosa (nomeadamente no projecto de decisão, cfr. fls. 108 e seg. do PRG) a AT avança expressamente que considera o facto de que o procedimento inspectivo se concluiu em 17 de Maio de 2010 com a assinatura da certidão de notificação e entrega do Relatório Final da Inspecção e ofício nº 32640/0505, de 17 de Maio de 2010, tendo o mesmo sido recepcionado pela administradora Fátima Bezerra (cfr. fls. 49 e fls. 114vs do PRG),
AA. facto igualmente plasmado pela Fazenda Pública no art.º 27º da nossa Contestação.
BB. Ora, não tendo sido este facto impugnado, não se mostrando controverso, a meritíssima Juíza do douto Tribunal a quo deveria o ter considerado como assente, dado tout court como provado.
CC. Tendo o procedimento inspectivo, iniciado em 17 de Novembro de 2009 e terminado em 17 de Maio de 2010 conforme notificação pessoal, precisamente uma duração de 6 meses, mostrava-se operada a suspensão que decorre do n.º 1 do artigo 46.º da LGT.
DD. E, nesta medida, atendendo-se à suspensão dos seis meses de duração da acção inspectiva, o prazo de caducidade do direito à liquidação terminaria em 30 de Junho de 2010, uma vez que a liquidação adicional foi notificada a 4 de Junho de 2010 (conforme resulta do documento de fls. 29 do PRG e requerimento e elementos probatórios juntos aos autos via SITAF em 01/03/2019 pela Fazenda Pública, a fls...do processo físico), não ocorreu a caducidade do direito à liquidação.
EE. Sem conceder, mesmo que doutamente se entenda que não se deveria dar como assente que o relatório final de inspecção foi notificado pessoalmente à administradora M. em 17 de Maio de 2010, incorreu o doutro Tribunal a quo em erro de julgamento consubstanciado na errónea apreciação dos factos e elementos probatórios juntos aos autos, défice instrutório e violação do principio do inquisitório e da verdade material previsto no art.º 13.º do CPPT.
FF. Embora não decorra da certidão da notificação pessoal em crise, por mera deficiência de redação, expressamente a data em que a mesma ocorreu, e mesmo sendo livre a apreciação da prova, atendendo:
à situação em concreto (contexto) em que esta foi efectuada,
a que 17 de Maio de 2010 era o último dia do prazo dos 6 meses de duração do procedimento inspectivo, para operar a suspensão do prazo da caducidade da liquidação;
à importância de que a notificação não ocorresse após essa data limite,
a inspectora tributária que levou a cabo o procedimento inspectivo fez-se acompanhar de duas testemunhas (dois colegas inspectores da DF do Porto), para que não fosse possível subsistirem dúvidas acerca desse facto;
a que o envio da notificação a dar conta do relatório do procedimento inspectivo ter ocorrido no dia seguinte em 18.05.2010
GG. de acordo com as regras de experiencia comum, tinha-se que concluir que, com a expressão “certifico que, hoje entreguei em mão própria, pelas 17,30 horas (...) a Notificação do Relatório de Inspecção Tributária (1 folhas, Ofício n.º 32640/0505 de 17 de Maio de 2010 e o Relatório de Inspecção Tributária(...), se pretendia dizer que era em 17 de Maio de 2010, o dia em que se estava a efectuar a notificação pessoal.
HH. A inspectora que levou a cabo o procedimento inspectivo (G.) foi arrolada como testemunha pela Fazenda Pública; a meritíssima Juíza titular do processo à data da inquirição (que não foi a mesma que proferiu a decisão), considerou absolutamente necessária a inquirição da testemunha indicada pela Fazenda Pública (cfr. ata de inquirição de testemunhas datada de 24 de Abril de 2013 mas por não ser um facto controvertido, em nenhum momento da inquirição de testemunhas, datada de 22 de maio de 2013, foi a inspectora tributária G. questionada quer pela meritíssima Juíza titular do processo à data, quer pela Fazenda Pública ou pelo mandatário da impugnante acerca da data em que foi efectuada a notificação pessoal.
II. Não podia a meritíssima Juíza do douto Tribunal a quo que proferiu a decisão recorrida (e que não foi a que presidiu à inquirição de testemunhas, violando-se o princípio da plenitude da assistência do juiz), pura e simplesmente considerar que não estava provada a factualidade alegada, in casu a data em que ocorreu a notificação pessoal.
JJ. Tendo sido alegados pelas partes factos com relevo para o exame e a boa decisão da causa, mas não tendo sido juntos elementos considerados suficientes para a sua prova, por força do princípio do direito à prova, deveria o Tribunal informar a parte (in casu a Fazenda Pública) que tal facto permanecia controvertido, permitindo-lhe produzir, repetir, aperfeiçoar a correspondente prova testemunhal
KK. Deveria ordenar todas as diligências consideradas necessárias, nomeadamente a inquirição novamente da testemunha, conforme o disposto no art.º 114.º, 115.º n.º 1 e 119.º do CPPT, na medida em que esse facto era essencial face à decisão que perspectivava vir a proferir e veio a ser proferida.
LL. A resposta à questão da data em que ocorreu a notificação pessoal do Relatório Final, esse esclarecimento, apenas poderia ser trazidos aos autos pelas pessoas envolvidas nessa notificação pessoal.
MM. A relevância deste facto no desfecho da causa, determinava a que o Tribunal a quo tivesse a necessidade de uma maior investigação, não se quedando pela já ocorrida inquirição de testemunhas, devendo oficiosamente e ao abrigo do Princípio do Inquisitório, chamar para prestar depoimento a inspectora tributária G., e/ou a própria notificada M. e até, se considerasse estritamente necessário, as duas testemunhas que presenciaram e assinaram a Certidão de Notificação.
NN. Conclui-se assim, que o julgamento da matéria de facto se encontra inquinado por défice instrutório.
OO. No âmbito dos poderes consignados no art.º 13.º do CPPT e 99.º da LGT competia ao Juiz realizar as diligências de apuramento da situação concreta, não o tendo feito tem de proceder o presente recurso na medida em que não se pode manter o decidido, devendo os autos voltar à 1ª instância para a realização das diligências tendentes a apurar o facto controvertido.
Termos em que,
deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença na parte que ora se recorre, com as legais consequências.»
*

Os recorridos, C. apresentaram contra-alegações, cujas conclusões se transcreve:

A. Vêm as presentes Alegações apresentadas no âmbito do recurso interposto pela Fazenda Pública da sentença proferida no processo n.º 3001/11.0BEPRT do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pela Impugnante, ora Alegante, que aí pugnava pela anulação dos atos tributários de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, referentes aos períodos de tributação de 2005 e 2006, no valor global de €942.734,07 e €37.383,60, respetivamente.
B. Compulsada a Sentença a quo constata-se que a procedência parcial da impugnação se ficou a dever, prima facie, à falta de notificação da liquidação respeitante ao período de tributação de 2005 antes de decorrido o prazo de caducidade.
C. Todavia, a Fazenda Pública não se conforma com a Douta decisão que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial alegando, em suma, que “G. (...) não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente assim decidido, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento de facto e de direito.” a ainda que “EE. (...) incorreu o douto Tribunal a quo em erro de julgamento consubstanciando na errónea apreciação dos factos e elementos probatórios juntos aos autos, défice instrutório e violação do princípio do inquisitório e da verdade material previsto no art.º 13.º do CPPT”.
D. No entanto, e pelas razões que infra se alinharão, entende a Recorrida que a parte da sentença objeto de recurso não merece qualquer censura, pelo que deverá ser mantida qual tale.
E. A primeira questão que se coloca à apreciação do Tribunal ad quem é precisamente a de saber se o prazo de caducidade aplicável no caso em apreço é o prazo geral de 4 anos, previsto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT, ou o prazo excecional previsto no n.º 3 daquele preceito, contudo, a resposta a tal questão não é suscetível de abalar o bem decidido pela sentença recorrida, porquanto, ainda que se verifique que o prazo de caducidade aplicável é o prazo excecional de 6 anos, também este estaria largamente ultrapassado aquando da notificação da liquidação à Impugnante.
F. Com efeito, ainda que se conceda, que o prazo de caducidade aplicável ao caso em apreço é o prazo excecional de seis anos, a que se refere o nº 3 do artigo 45.º da LGT, tal prazo haverá de contar-se a partir do exercício em que se apuraram os prejuízos reportados, e não do período em que efetivamente se reportaram os prejuízos fiscais apurados nos anos anteriores, como pretende a Recorrente, só assim se assegurando a certeza e a segurança jurídicas que subjazem ao instituto da caducidade (cfr. 298.º, n.º 2 do Código Civil ex vi artigo 2.º alínea d) da LGT) que subjazem ao instituto da caducidade.
G. A questão sub judice está antecipadamente facilitada pela existência de um “caso jurisprudencial” anterior de contornos idênticos sancionado pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no Acórdão de 22.01.2013, proferido no âmbito do processo n.º 02857/09, disponível in www.dgsi.pt, onde se concluiu o quanto se transcreve: “(...) como decorre patente da factualidade apurada (entre outros, alíneas c. e r. do ponto C) dos factos provados), para concretizar, nos moldes constantes do processo, a liquidação referente a 1995, os intervenientes serviços da AT introduziram correções várias e com significativo alcance monetário, aos prejuízos declarados, pela sociedade impugnante, no momento próprio, quanto ao pretérito ano de 1991. Ora, em relação aos factos tributários ocorridos neste ano, como sejam os proveitos auferidos e os custos incorridos, de cuja operação puderam resultar prejuízos fiscais, em 1999, estava interdita qualquer alteração capaz de mudar a sua expressão numérica, quantificação, por caducidade do direito de liquidar.” (destaque da responsabilidade da Recorrida)
H. Da análise da jurisprudência citada, cremos que para aferir do prazo de caducidade aplicável, em abstrato, haverá que distinguir, em primeira instância, duas realidades distintas com soluções igualmente dispares.
I. Por um lado, se a liquidação em crise resultou de efetivas correções aos prejuízos fiscais apurados e declarados em anos anteriores, o prazo que a administração tributária tinha para corrigir a matéria tributável da declaração relativa ao ano em que os mesmos foram reportados, desconsiderando os prejuízos declarados e proceder à liquidação adicional, era o prazo excecional previsto no n.º 3 do artigo 45.º da LGT, ou seja, o prazo de seis anos, contados a partir do termo do ano em que se verificou o apuramento dos prejuízos reportados (cfr. Acórdão do TCA Sul, de 22.01.2013, processo n.º 02857/09, já citado).
J. Se, por outro lado, não se verificar qualquer correcção à expressão numérica dos resultados e prejuízos dos períodos anteriores e reportados ao exercício em exame, baseando-se o ato de liquidação apenas na realidade tributária do sujeito passivo respeitante ao exercício em causa, não há razão para aplicar outro prazo de caducidade que não o geral, previsto no n.º 1 do art. 45.º da LGT, ou seja, o prazo de quatro anos, contado a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário (cfr. Acórdão do STA, de 11.11.2015 e 20.05.2015, processo n.º 01353/14 e n.º 029/14, respetivamente, já citados).
K. Regressando ao caso em apreço, como resulta da materialidade probatória, designadamente do Relatório de Inspeção Tributária (RIT), a liquidação impugnada resulta de correções técnicas realizadas pela Administração Fiscal à matéria coletável declarada pela Impugnante, em 1999 e 2002.
L. Assim, o prazo de caducidade de seis anos, relativamente aos prejuízos contabilizados/declarados nos exercícios de 1999 e 2002, conta-se, respetivamente, desde 31/12/1999 e 31/12/2002, terminado, respetivamente, em 31/12/2005 e 31/12/2008, pelo que, quando a liquidação impugnada nos autos é emitida [maio de 2010 (cfr. ponto 16) do probatório)], já se encontrava largamente ultrapassado o prazo de caducidade.
M. Perante o exposto, sempre se dirá que, independentemente do entendimento do Tribunal ad quem sobre o prazo de caducidade aplicável, não merece censura a sentença recorrida ao concluir pela caducidade da liquidação em mérito.
N. Assim, não merece provimento o recurso apresentado, devendo ser confirmada a decisão recorrida, ainda que com uma fundamentação diferente, mantendo-se, em consequência, a anulação da liquidação adicional, respeitante ao período de 2005, por falta de notificação da liquidação antes de decorrido o prazo de caducidade.
O. Por outro lado, não assiste razão à Recorrente quando alega que a data da notificação pessoal do relatório de inspeção em 17/05/2010 precisamente no último dia do prazo de 6 meses para operar a suspensão do prazo de caducidade previsto no art.º 46.º da LGT, não era um facto controvertido, porquanto
P. Na verdade, para que tal faco se considerar-se controvertido, não era necessário, como parece fazer crer a Fazenda Pública, que a Recorrida o impugnasse diretamente ou expressamente, antes bastando que a tese por si apresentada não fosse compatível com o facto alegado pela Recorrente, e o certo é que ao invocar em sede de petição inicial, a falta de notificação da liquidação antes de decorrido o prazo de caducidade, a Recorrente assumiu claramente uma posição incompatível com o factualidade alegada pela Fazenda Pública.
Q. Ademais, a Recorrente avança, ainda, com um naipe argumentativo que em mais não se resume do que a um ataque desmesurado à sentença recorrida, tendo em apontar-lhe um invocado erro de julgamento.
R. Assim, alega a Fazenda Pública que “EE.(...) mesmo que doutamente se entenda que não deveria dar como assente que o relatório de inspeção foi notificado pessoalmente à administradora M. em 17 de maio de 2010, incorreu o douto Tribunal a quo em erro de julgamento consubstanciado na errónea apreciação dos factos e elementos probatórios juntos aos autos (...)”
S. Porém, a Recorrente não põe em causa a credibilidade dos depoimentos prestados, nem questiona a suficiência probatória dos documentos carreados para os autos e que fundamentaram a convicção do Tribunal a quo, o que questiona são as ilações que deles se retiraram pelo Tribunal recorrido e que, em sua opinião, deviam ter conduzido a uma decisão diversa, pelo que não pode colher o sentido da decisão proposta pela Fazenda Pública.
T. Por fim, e numa última tentativa de abalar o mérito da sentença recorrida, a Fazenda Pública invoca o vício de défice instrutório e violação do princípio do inquisitório e da verdade material.
U. Como se demonstrou, ao abrigo do princípio do inquisitório, e para prova do invocado vício de caducidade, o Tribunal a quo já notificara a Fazenda Pública para a junção de diversos documentos, além da realização da prova testemunhal, onde a Fazenda Pública teve a oportunidade de inquirir convenientemente a testemunha por si arrolada, pelo que, não era exigível ao Tribunal a quo a adoção de mais diligências probatórias, atenta as oportunidades de prova concedidas à Recorrente.
V. Como já se referiu, não pode o Tribunal substituir-se às partes nem pode o princípio do inquisitório ser interpretado com um alcance tal que implique que o Tribunal tenha a seu cargo uma obrigação de investigação prévia, para determinar que diligências deve ordenar (cfr. Ac. TCA Sul, de 16-09-2019, processo n.º 2346/18.2BELRS, já referido).
W. Nesta conformidade, só poderá concluir-se que a sentença recorrida não incorreu em nulidade, nem mesmo ocorreu erro de julgamento por défice instrutório ou por violação do principio do inquisitório ou da investigação, devendo improceder a pretensão da Recorrente.
X. Isto posto, todos os argumentos que vêm de se expor são bem elucidativos da legalidade da decisão proferida, pelo que Sentença recorrida não merece qualquer censura, pelo que deverá manter-se a decisão recorrida, nos termos da qual se determinou julgar parcialmente procedente a impugnação judicial e, nessa medida, manter-se a anulação dos ato tributário de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, referente ao período de tributação relativo a 2005.
Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão deverá ser rejeitado o recurso em resposta e confirmada a Sentença Recorrida, com o que V. Exas. farão a sã e costumada»
*

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se pela improcedência do presente recurso «(…)Ora tal como considera a recorrida e suporta esse entendimento em jurisprudência que cita “se a liquidação em crise resultou de efetivas correções aos prejuízos fiscais apurados e declarados em anos anteriores, o prazo que a administração tributária tinha para corrigir a matéria tributável da declaração relativa ao ano em que os mesmos foram reportados, desconsiderando os prejuízos declarados e proceder à liquidação adicional, era o prazo excecional previsto no n.º 3 do artigo 45.º da LGT, ou seja, o prazo de seis anos, contados a partir do termo do ano em que se verificou o apuramento dos prejuízos reportados (cfr. Acórdão do TCA Sul, de 22.01.2013, processo n.º 02857/09, já citado).
Pese embora entendimento da Fazenda Pública parece-nos correcta a posição assumida e defendida pela recorrida que se mostra devidamente fundamentada ainda que por justificação diferente aceita a decisão proferida pelo M.mo Juiz recorrido.
Como resulta dos autos estamos perante interpretações diferentes do disposto no nº 3 do artigo 45º da LGT quando estabelecia um prazo especial de 6 anos para a caducidade nos casos em que ocorria reporte de prejuízos em determinado ano fiscal.
E como se entende no Parecer citado na douta sentença “o prazo de caducidade previsto no n.º 3 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária se refere ao prazo que a administração tributária tem para realizar as correcções ao exercício onde foram apurados os prejuízos deduzidos e nessa medida poder alterar essas deduções”
Pelo que sempre seria de concluir que a AT poderia corrigir o exercício dos anos onde foram reportados prejuízos, mas, no caso dos autos, há muito tempo que havia caducado esse direito quando foram efectuadas as liquidações dos anos de 2005 e 2006, pelo que bem andou o tribunal em considerar que o prazo de caducidade para as correções em causa, era de 4 anos nos termos gerais, artigo 45º nº 1 da LGT.
De igual forma nos parece correcta na parte em que considerou não ter havido prova de que a notificação do relatório final da inspecção tenha sido efectuada a dentro do prazo de seis meses do procedimento inspectivo.»
*
Sem vistos dos Exmos. Juízes adjuntos, por assim se ter acordado, foi o processo à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR.

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, ou seja, se a sentença incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito.
[a]Saber se a sentença errou ao aplicar o prazo de 4 anos de caducidade a que alude o art. 45.º, 1, da LGT em vez do prazo de caducidade de 6 anos a que alude o art. 47.º, n. º1 do CIRC.
[b] subsidiariamente,
- saber se havia que dar como assente: “que a notificação do relatório final ocorreu em 17/05/2010” Pelo que há que atender à suspensão do prazo decorrente do início da inspeção e não ter sido ultrapassado o prazo de seis meses na sua duração;
- saber se o julgamento da matéria de facto encontra-se inquinado por défice instrutório, incorreu em violação do princípio do inquisitório e da verdade material do art. 13.º do CPPT pois que considerando não haver elementos suficientes quanto à data da notificação do relatório, deveria o Tribunal informar a Fazenda de que tal facto permanecia controvertido, permitindo-lhe produzir prova, repetir, aperfeiçoar a correspondente prova testemunhal. Deveria ordenar todas as diligências consideradas necessárias, nomeadamente a inquirição novamente da testemunha, conforme o disposto no art.º 114.º, 115.º nº1 e 119.º do CPPT, na medida em que esse facto era essencial face à decisão que perspetivava vir a proferir e veio a ser proferida.
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3. FUNDAMENTOS de FACTO

Em sede de probatório a 1ª Instância, fixou os seguintes factos:

«1) Os membros de Administração da sociedade B. SA desde 1999 até à sua dissolução foram, C., M.; E., J. e I. – cfr. fls. 30 e 31 do processo físico e fls. 19 do processo de reclamação graciosa (RG) junto aos autos.
2) A sociedade B. SA foi dissolvida e encerrada para liquidação em 29.12.2006 com cancelamento da matrícula na mesma data – cfr. fls. 30 e 31 do processo físico.
3) Em 17.11.2009 foi notificado a C., na qualidade de administradora da sociedade B. SA, a Ordem de Serviço n.º OI200905411 – cfr. fls. 84 do processo de RG junto aos autos.
4) No cumprimento da ordem de Serviço n.º OI200905411 e n.º OI200803799, foi efectuado procedimento inspectivo à sociedade B. SA, tendo sido efectuadas correcções à matéria colectável de IRC do exercício de 2005 no montante de €3.265.834,38 e ao exercício de 2006 no montante de €120.100,11 – cfr. 34 do processo de RG junto aos autos.
5) Em 1.04.2010, C. foi notificada para no dia 15.04.2010, pelas 10:00 horas apresentar elementos e esclarecimentos relativos ao procedimento inspectivo descrito em 3) – cfr. fls. 44 e 45 do processo de RG junto aos autos.
6) Em 23.04.2010, a Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto remeteu a B. SA na pessoa de C., na qualidade de administradora, o ofício n.º 26548/0505 relativo à notificação do projecto do relatório do procedimento inspectivo descrito em 4) para o exercício do direito de audição – cfr. verso de fls. 46 e fls. 47 do processo de RG junto aos autos.
7) Em 23.04.2010, a Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto remeteu a B. SA na pessoa de C., na qualidade de administradora o ofício n.º 26439/0505 respeitante a nota de diligência relativa ao terminus da inspecção legitimada pela Ordem de serviço n.º OI200905411 – cfr. fls. 32 e 33 do processo físico.
8) Em 17.05.2010 foi elaborado o relatório do procedimento inspectivo a que se alude em 4) – cfr. fls. 34 a 43 do processo de RG junto aos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido.
9) Em 18.05.2010, a Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto remeteu o relatório do procedimento inspectivo a que se alude em 4) a B. SA, na pessoa de C., na qualidade de administradora, Rua (…), pelo ofício n.º 32640/0505 de 17.05.2010 – cfr. fls. 49 e 50 do processo de RG junto aos autos
10) O ofício a que se alude em 9) foi recepcionado por C. – cfr. verso de fls. 50 do processo de RG junto aos autos.
11) G.s entregou em mão a M. a notificação do relatório da inspecção tributária a que se alude em 10), e o relatório de inspecção tributária – cfr. verso de fls. 47 e fls. a 53 do processo físico.
12) Em 18.05.2010, a Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto remeteu a B. SA na pessoa de C., na qualidade de administradora, Rua (...), o ofício n.º 33078/0505 de onde decorre o seguinte. “(...) Fica V. Ex.a por este meio notificado, (...) das correcções resultantes da acção de inspecção, cujo relatório de Inspecção Tributária se anexa como parte integrante da presente notificação, respeitante às ordens de serviço OI200803799 e OI200905411 (...). Comunica-se ainda que, nos termos do artigo 62º do RCPIT, o Relatório de Inspecção foi entregue pessoalmente a M. (...)” – cfr. fls. 90 a 92 do processo de RG junto aos autos
13) O ofício a que se alude em 12) foi recebido por C. em 31.05.2010 – cfr. fls. 92 do processo de RG junto aos autos.
14) Em 21.05.2010 C. apresentou em nome de B., SA direito de audição – cfr. fls. 54 a 58 do processo de RG junto aos autos.
15) Em 8.06.2010 foi remetido pela Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto a C., na qualidade de administradora, Rua (...), o ofício n.º 37926/0505 respeitante à informação produzida na sequência do exercício do direito de audição – cfr. fls. 51 a verso de fls. 53 do processo de RG junto aos autos.
16) Na sequência das correcções descritas em 4) foi emitida em nome da sociedade B. SA, em 20.05.2010 a liquidação n.º 2010 8310002881 do exercício de 2005 no montante de €813.655,65 e respectiva nota de compensação n.º 2010 3031083 no montante de €942.734,07 e a liquidação n.º 2010 8310002888 do exercício de 2006 no valor de €32.983,74, e respectiva nota de compensação n.º 20103755955 no montante de €37.383,60 – cfr. fls. 60 e 63 do processo físico e fls. 20 a 26 do processo de RG junto aos autos
17) Das liquidações descritas em 16), C. deduziu em 27.10.2010 reclamação graciosa – cfr. fls. 3 a 12 do processo de RG junto aos autos.
18) Por despacho de 11.04.2011 foi indeferida a reclamação graciosa a que se alude em 17) – cfr. fls. 127 do processo de RG junto aos autos.
19) Do indeferimento da reclamação graciosa, C. apresentou recurso hierárquico – cfr. fls. 134 a 161 do processo de RG junto aos autos.
20) Por despacho de 24.02.2012 foi determinada a apensação do recurso hierárquico à impugnação intentada – cfr. fls. 213 e 214 do processo de RG junto aos autos.
21) A sociedade B. SA elaborou balanços relativos a 31 de Dezembro de 2002 e de 2001 – cfr. verso de fls. 59 e fls. 60 do processo de RG junto aos autos.
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Factos não provados
Não se mostram provados outros factos, além dos supra referidos.
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Motivação da decisão de facto
O Tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados [cfr. artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)], também são corroborados pelos documentos juntos, cfr. predispõe o artigo 76.º n.º 1 da LGT e artigo 362.º e seguintes do Código Civil e ainda face à prova testemunhal produzida.
Com efeito, foi a análise crítica e conjugada de todos os meios de prova conjugada que, à luz da experiência, sedimentaram a convicção do Tribunal.
Os depoimentos foram livremente apreciados pelo Tribunal, nos termos do que dispõe o artigo 396.º do Código Civil atendendo, para tal efeito, à razão de ciência apresentada por cada uma das testemunhas inquiridas.
D., engenheiro, marido da Impugnante, foi questionado aos factos constantes dos artigos 44.º a 48.º e 66.º a 70.º da petição inicial.
Ao Tribunal declarou que quanto ao imóvel vendido pela sociedade, somente foi vendida a raiz, nua propriedade, porque a casa tem um usufrutuário vitalício
O testemunho mostrou-se sério e credível.
C., ROC, foi ROC da sociedade B. entre 2005/2006.
Foi questionada os factos constantes nos artigos 66.º a 99.º da petição inicial. Afirmou que acompanhou o acto inspectivo e participou na análise do relatório do procedimento inspectivo.
Declarou que para a AT apurar as menos-valias fiscais teriam que ter sido efectuados cálculos.
Afirmou que foi constituída uma provisão porque era um activo irrecuperável, tendo-a subscrito como ROC e validou-a.
Questionada se havia sido feita alguma diligência com vista à cobrança do crédito, respondeu somente que a dívida era muito antiga.
Prestou depoimento de forma espontânea e credível.
G., inspectora tributária a exercer funções na Direcção de Finanças do Porto, realizou a inspecção tributária à sociedade B., SA.
Foi inquirida a toda matéria de facto.
Ao Tribunal reiterou as conclusões extraídas ao longo do procedimento inspectivo efectuado à sociedade.
O depoimento mostrou-se claro, perentório e credível»
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4.anÁlise jurídica do recurso

A primeira questão suscitada no recurso da Fazenda Pública prende-se com o facto de a sentença ter julgado a caducidade do direito à liquidação com o pressuposto de que o prazo é de 4 anos decorrente do n. º1 do art. 45.º da LGT.

A sentença na parte que releva para a caducidade discreteou assim: «(…) a caducidade é o instituto por via da qual os direitos, que, por força da lei ou por vontade das partes têm de exercer-se em determinado prazo, se extinguem pelo seu não exercício nesse prazo.

Nesta senda, estatui o n.º 1 do artigo 45.º da LGT que “O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.”
Por sua vez o n.º 4º do mesmo normativo legal estatui que “O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.”
Assim, face à redacção do predito artigo 45.º da LGT, tanto o exercício do direito à liquidação, como a notificação, tem que sobrevier no prazo de quatro anos contados a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, sob pena de ocorrer a caducidade.
Acresce que, como decorre do n.º 3 do mesmo normativo legal “Em caso de ter sido efectuado reporte de prejuízos, bem como de qualquer outra dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.”.
O alargamento do prazo de caducidade na situação prevista no n.º 3 do artigo 45.º da LGT refere-se ao direito de liquidação do tributo do ano em que foi efectuada a dedução de prejuízos, isto é, será alargado o prazo de caducidade relativamente ao ano em que foram apurados os prejuízos deduzidos.
Com efeito, “os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício, nos termos das disposições anteriores, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos seis exercícios posteriores” – cfr. n.º 1 do artigo 47.º do CIRC.
Ademais, como decorria à data dos factos do n.º 4 do artigo 47.º do CIRC “Quando se efectuarem correcções aos prejuízos fiscais declarados pelo sujeito passivo, devem alterar-se, em conformidade, as deduções efectuadas, não se procedendo, porém, a qualquer anulação ou liquidação, ainda que adicional, do IRC, se forem decorridos mais de seis anos relativamente àquele a que o lucro tributável respeite”.
Assim, as correcções ao exercício de 2002 não tinham, obrigatoriamente que originar uma liquidação adicional.
Neste sentido decidiu o STA em Acórdão de 20.05.2015, rec. 029/14, seguindo o parecer proferido pelo Magistrado do MP junto desse Tribunal ao considerar que “A interpretação literal das normas do artigo 45.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária, e da 2.ª parte do n.º 1 do artigo 47.º do CIRC, vai no sentido de que o prazo excepcional de caducidade ali previsto se refere ao direito de liquidação do tributo do ano em que foi efectuada a dedução de prejuízos. Só que a razão de ser da consagração da especialidade do prazo vai contra essa interpretação, pois só faz sentido alargar o prazo de caducidade ao prazo do direito de dedução se estiver em causa a correcção do apuramento dos prejuízos (ainda que na prática se a administração tributária só der por alguma incorrecção na declaração relativa ao sexto ano já não lhe seja possível proceder a qualquer correcção desse apuramento). Ora, a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas deve ter em consideração os elementos teleológico, sistemático e racional – artigo 9.º do Código Civil. E o elemento teleológico vai no sentido de o referido prazo respeitar ao direito de correcção do apuramento do prejuízo. Afigura-se-nos, assim, que o prazo de caducidade previsto no n.º 3 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária se refere ao prazo que a administração tributária tem para realizar as correcções ao exercício onde foram apurados os prejuízos deduzidos e nessa medida poder alterar essas deduções”
Retornando ao caso dos autos e como resulta vertido no acervo probatório, ponto 8), os SIT procederam à correcção dos prejuízos fiscais reportados do exercício de 2002 aos exercícios de 2005 e 2006.
Como tal, o prazo de caducidade ocorreria em 1.01.2010 relativamente ao exercício de 2005 e em 1.01.2011 relativamente ao exercício de 2006.
No entanto, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 46.º da LGT “O prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da acção de inspecção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, caso a duração da inspecção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação.”
Assim, o início da acção inspectiva é determinado pela notificação da ordem de serviço - cfr. n.º 1 do artigo 51.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) - e para a conclusão do procedimento de inspecção e de acordo com o RCPIT é elaborado relatório final com vista à identificação e sistematização dos factos detectados e sua qualificação jurídico - tributária, tendo o relatório de ser notificado ao contribuinte inspeccionado, considerando-se concluído o procedimento na data em que ocorrer tal notificação, nos termos do determinado pelo artigo 62º do RCPIT.
Neste sentido veio o STA em Aresto de 16.09.2009, rec. 993/05 decidir que o prazo de caducidade “(...) suspende-se com a notificação ao contribuinte de inicio de acção inspectiva externa, cessando este efeito suspensivo, contando-se aquele prazo de caducidade desde o início, caso a inspecção ultrapasse seis meses contados a partir daquela notificação; II - Nos demais casos, isto é, quando a acção inspectiva se conclua antes de decorridos aqueles seis meses, o efeito suspensivo do prazo de caducidade mantém-se até à notificação ao contribuinte da conclusão do procedimento inspectivo, pela elaboração do relatório final, notificação que, assim, o legislador elegeu como termo do prazo de suspensão do prazo de caducidade do direito de liquidar o imposto respectivo, tudo conforme dispõe o artigo 60º n.º 1 e 2 do RCPIT.”
Retornando ao caso dos autos, e como nos informa o probatório, ponto 3), em 17.11.2009 foi notificado a C., na qualidade de administradora da sociedade B. SA, a Ordem de Serviço n.º OI200905411.
O relatório do procedimento inspectivo, por sua vez, elaborado em 17.05.2010, foi remetido em 18.05.2010 pela Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto à sociedade na pessoa da aqui Impugnante (cfr. pontos 8) e 9) da factualidade assente).
Com efeito, apesar do ofício n.º 32640/0505 estar datado de 17.05.2010, o registo tem data aposta de 18.05.2010 (ponto 9) do probatório).
Por outro lado, apesar da inspectora do procedimento inspectivo ter entregue em mão a M. a notificação do relatório da inspecção tributária (cfr. ponto 11) do probatório), com referência ao envio do ofício n.º 32640/0505 de 17.05.2010, não decorre da certidão da notificação a data em que a mesma ocorreu.
Assim, mesmo não decorrendo dos autos a data do recebimento do relatório do procedimento inspectivo (por inteligibilidade da data aposta no aviso de recepção), certo é que à data do envio da notificação a dar conta do relatório do procedimento inspectivo (18.05.2010) já haviam decorrido mais de 6 meses desde o início do procedimento inspectivo (17.05.2010), não se verificando a suspensão que decorre do n.º 1 do artigo 46.º da LGT.
Ora, tendo sido emitida a liquidação n.º 2010 8310002881 do exercício de 2005 em 20.05.2010 (cfr. ponto 16) da factualidade assente), à data já havia ocorrido o prazo de caducidade.»

Não obstante a sentença ter convocada as normas aplicáveis ao caso, tratando-se de reporte de prejuízos, concluiu que o prazo era de 4 anos.
Ora,
De acordo com o art. 45.º, n. º3, da LGT, no caso de ter sido efetuado reporte de prejuízos o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.
Tratando-se de IRC, determinava o art. 47.º, n. º1, do CIRC, que os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício, nos termos das disposições anteriores, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos seis exercícios posteriores.
Da conjugação de tais normativos resulta que no caso de haver reporte de prejuízos o prazo será de seis anos, atendendo-se ao que se estatui no n.º4 do art. 47.º do CIRC, se efetuarem correções aos prejuízos declarados pelo sujeito passivo, devem alterar-se, em conformidade, as deduções efetuadas, não se procedendo, porém, a qualquer anulação ou liquidação, ainda que adicional, do IRC, se forem decorridos mais de seis anos relativamente àquele a que o lucro tributável respeite.

No caso, como resulta do relatório inspetivo, houve menos-valias em 1999 e 2002 que não foram acrescidas e o prejuízo fiscal a considerar deve ser ajustado do valor da menos-valia contabilística, o que implica que valor do prejuízo fiscal reportado a ser deduzido seja menor, pelo que procedeu às respetivas correções, com imposto a liquidar em 2005.

Assim, o prazo conta-se a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário, no caso o ano a que respeitam o apuramento dos prejuízos, deve ser reportado ao ano a que respeitam as correções, e não ao ano em que se reportaram os prejuízos (2005).

Ora, ao contrário, do que alega a recorrente relativamente ao acórdão em que se esteia Acórdão do STA de 11-11-2015 e 04-12-2019, nos recursos 01353/14 e 0927/16., neste caso, em apreciação houve correção dos prejuízos dos anos de 1999 e 2002 pelo que tem aplicação o n. º4 do art. 47.º do CIRC e deste modo, a jurisprudência que decorre do acórdão do TCA Sul Acórdão de 22-01-2013 no processo 02857/09. é, também aplicável quanto ao momento em que se inicia a contagem do prazo de caducidade,, “(…)decorre óbvio, por consequente, afirmar que, nos casos de ser efetuado reporte de prejuízos, a contagem do competente prazo de caducidade do direito à liquidação tem de processar-se no estrito cumprimento das regras, comuns, aplicáveis a todos os prazos de caducidade tributária, positivadas no n.º 4 do mesmo art. 45.º LGT. Deste modo, para os impostos periódicos, como o IRC, o prazo de caducidade, casuisticamente, relevante, há de ser, sempre, contado “a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário”. Ou seja, as situações de reporte de prejuízos não pressupõem qualquer tipo de especificidade ao nível da forma de computar o prazo de caducidade, determinado por correspondência com o período de permissão do exercício da possibilidade de dedução protelada.
Posto isto, no regresso à situação julganda, quanto ao IRC de 1991 e aos prejuízos contabilizados/declarados nesse exercício, para a hipótese de o sujeito passivo acionar reporte deles, o prazo de caducidade do direito a liquidação,
v.g. adicional, era de 5 anos, a contar desde 31.12.1991; isto é, na ausência de interrupções e/ou suspensões, com terminus no dia 31.12.1996 (3). Face a este espaço temporal, disponível, para a at, legalmente, atuar, a liquidação de IRC, impugnada nos autos, efetivada no decurso do ano de 1999, não respeitou, portanto, de forma manifesta, o pertinente prazo de caducidade.
E, não podemos acolher a, contornante, proposta da Rte, no sentido de que não houve liquidação adicional relativamente ao exercício de 1991, mas, somente ao de 1995, querendo significar a respectiva legalidade, pelo respeito do prazo de caducidade contado a partir deste último ano. Efetivamente, se o visado ato de liquidação apenas tivesse entrado em linha de conta com a realidade tributária, da impugnante, concernente ao exercício de 1995, nada se poderia opor ao raciocínio veiculado. Porém, como decorre patente da factualidade apurada (entre outros, alíneas c. e r. do ponto C) dos factos provados), para concretizar, nos moldes constantes do processo, a liquidação referente a 1995, os intervenientes serviços da at introduziram correções várias e com significativo alcance monetário, aos prejuízos declarados, pela sociedade impugnante, no momento próprio, quanto ao pretérito ano de 1991. Ora, em relação aos factos tributários ocorridos neste ano, como sejam os proveitos auferidos e os custos incorridos, de cuja operação puderam resultar prejuízos fiscais, em 1999, estava interdita qualquer alteração capaz de mudar a sua expressão numérica, quantificação, por caducidade do direito de liquidar. De forma, talvez, mais perceptível, queremos sustentar que a at podia, na liquidação adicional para o ano de 1995, concretizada em 1999, operar os prejuízos verificados em 1991, por a impugnante ter procedido, nesse ano, ao respectivo reporte, sem, contudo, os poder sujeitar a correção, em desfavor da contribuinte, sob pena de, encapotadamente, levar a efeito liquidação abrangendo exercício protegido pela caducidade, completada no final do ano de 1996.”

Na verdade, no acórdão do STA 01353/14 de 11-11-2015. nada resulta em contrário do que se vem de expor, pois que, se consignou o seguinte: (…)Portanto, a AT não procedeu a qualquer correcção aos prejuízos declarados relativamente a exercícios anteriores a 2001, e a liquidação sindicada apenas teve em conta a realidade tributária do exercício de 2001, não tendo ocorrido, como se afirma na sentença, qualquer alteração à expressão numérica dos resultados da impugnante nos exercícios de 1996 a 2000 (nomeadamente em termos de proveitos auferidos e custos incorridos) dos quais pudessem resultar prejuízos fiscais em 2001. (…) Nos termos do disposto no artigo 45.º/3 da LGT, no caso de ter sido efectuado reporte de prejuízos, como sucedeu no caso em análise, o prazo de caducidade é o do exercício do direito de reporte, que é de 6 anos (artigo 47.º/1 do CIRC). Tal prazo, no caso, conta-se a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário (artigo 45.º/4 da LGT), ou seja a partir de 2001.12.31. Ora, como resulta do probatório, a recorrida foi notificada da liquidação por carta registada de 9 de Fevereiro de 2007, portanto, manifestamente, antes do decurso do prazo de caducidade de 6 anos.» (fim de citação).

Deste modo, não se pode deixar de afirmar que quando se iniciou a inspeção, ao exercício de 2005, há muito havia decorrido o prazo de caducidade do direito de liquidar IRC com fundamento em correções aos prejuízos fiscais declarados pelo sujeito passivo relativamente aos exercícios de 1999 e 2002.

Assim, embora com diversa fundamentação, nomeadamente, quanto ao prazo de caducidade, a liquidação é ilegal, não merecendo neste particular censura a conclusão a que chegou o tribunal a quo que assim se confirma.

5. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
*
Notifique-se.
*
Porto, 25 de março de 2021



Cristina da Nova
Ana Paula Santos
Margarida Reis
_______________________________________
i) Acórdão do STA de 11-11-2015 e 04-12-2019, nos recursos 01353/14 e 0927/16.

ii) Acórdão de 22-01-2013 no processo 02857/09.

iii) 01353/14 de 11-11-2015.