Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00426/16.8BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/04/2016
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:VALOR DA ACÇÃO; IMPUGNAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DO PROCEDIMENTO DE CONCURSO PRÉ-CONTRATUAL;
ARTIGO 34º DO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS; FORNECIMENTO DE BENS; COMPOSIÇÃO DE LOTES; PRINCÍPIOS DA CONCORRÊNCIA, IGUALDADE E TRANSPARÊNCIA; ARTIGO 49º DO CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS
Sumário:1. No acto de adjudicação há uma ligação directa e imediata com o contrato, pois este é o objecto da adjudicação, o que permite dar um valor certo à acção, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 33º e 32º, n.º3, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

2. Já no caso em que se impugnam os documentos do procedimento pré-contratual - que podem ser atacados de forma autónoma em relação ao acto de adjudicação, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 103º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos - a regra daqueles preceitos não vale pois não é possível estabelecer uma ligação directa entre o valor do contrato e o valor da acção pois os elementos do contrato que se questionam num processo podem ser, como geralmente são, apenas um aspecto parcelar do contrato a celebrar e o contrato pode até não vir a celebrar-se, nos termos e com o valor posto a concurso, se se concluir que os instrumentos que o conformam são ilegais.
3. Não sendo possível, por qualquer outro modo, estabelecer neste caso um valor exacto para a acção, vale a regra subsidiária, consignada no artigo 34º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, fixando-se à acção o valor (actual) de 30.000,01 € (trinta mil euros e um cêntimo).
4. Os esclarecimentos ou correcções de erros de escrita devem constar das peças do procedimento, face ao disposto no artigo 50º do Código de Contratos Públicos e de acordo, de resto, com os princípios da legalidade, da concorrência, da transparência e da igualdade – artigo 266º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, artigo 3º do Código de Procedimento Administrativo e n.º 4º do artigo 1º do Código de Contratos Públicos.
5. Viola os princípios da concorrência, da igualdade e da transparência, bem como o disposto no artigo 49º do Código dos Contratos Públicos a composição em dois lotes, um de oitos bens e outro de um bem, de bens postos a concurso para adjudicação do respectivo fornecimento, se se verifica que, com esta opção, não justificada objectivamente apesar do pedido de esclarecimentos feito por uma empresa candidata, uma empresa, e só uma, reúne os requisitos exigidos em relação a todos os bens do lote maior, e uma outra empresa, e apenas essa, reúne os requisitos exigidos para o outro bem a fornecer.*
* Sumário elaborado pelo relator.
Recorrente:A... GÁS, S.A.
Recorrido 1:Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, E.P.E.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento a ambos os recursos.
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Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
A... GÁS, S.A. veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 25.07.2016, pela qual foi julgada totalmente improcedente a acção de contencioso pré-contratual, intentada pela ora Recorrente contra Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, E.P.E. em que foram indicadas como Contra-Interessadas, a AL... MEDICINAL, S.A., a G... II e a “Gases Industriais, Unipessoal, L.da” para anulação da “decisão de contratar do Conselho de Administração da Ré, de 12.01.2016, para o procedimento de aquisição n.º 01000616, com as legais consequências” e se assim não for entendido “deverão ser expurgadas do Convite e do Caderno de Encargos as normas, regras e exigências legais (…), anulando-se todos os catos praticados neles fundados e, em consequência, ser a Ré condenada a reiniciar o procedimento sem as apontadas ilegalidades”; foi ainda pedida a suspensão do “procedimento do procedimento de aquisição, impedindo a prática de quaisquer actos subsequentes, de forma a impedir que seja proferida uma decisão de adjudicação ou celebração do contrato antes de ser proferida sentença no processo”.

Em simultâneo interpôs recurso do despacho prévio que alterou o valor atribuído à acção, de 30.000,01, indicado pela Autora, para o valor do preço base estabelecido no convite, 370.455,36 euros.

Invocou para tanto, em síntese, que são ilegais as seguintes exigências, constantes das peças do procedimento: 1ª - a exigência de dispositivo de leitura de autonomia em horas/minutos nas garrafas de oxigénio líquido de 5 litros, por violação do princípio da concorrência, dado apenas a Contra-Interessada “AL...e” comercializar a dita garrafa em território nacional; 2ª - quanto ao critério de adjudicação, à composição dos lotes e modelação do procedimento, por entender que estes violam o AQ 2013/30, ao abrigo do qual este procedimento foi lançado.

Isto ao contrário do decidido na sentença recorrida que, quanto à primeira ilegalidade, entendeu que foi um “lapso de escrita”, violando com este entendimento os princípios da concorrência, transparência e igualdade, consagrados no artigo 1º, n.º 4, do Código dos Contratos Públicos; e, quanto à segunda ilegalidade, por entender que as soluções consagradas se inseriam no âmbito do poder discricionário da Ré para conformar o procedimento como bem entendesse.

Quanto à alteração do valor indicado para acção, a Recorrente defendeu que ao caso não se aplica o disposto nos artigos 32º e 33º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, invocados na decisão recorrida; devendo antes o valor ser fixado em conformidade com o disposto no artigo 34º do mesmo diploma.


A Contra-Interessada “AL...” apresentou contra-alegações apenas quanto à sentença recorrida, defendendo a manutenção desta decisão.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negado provimento a ambos os recursos.

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Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
*
I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto de ambos os recursos jurisdicionais, da sentença que conheceu do mérito da acção e do despacho que fixou o valor à acção.

1ª A sentença recorrida julgou a acção improcedente, entendendo não se verificar qualquer das ilegalidades apontadas pela Autora, porquanto:

- Relativamente à exigência de dispositivo de leitura de autonomia em horas/minutos nas garrafas de oxigénio líquido de 5L, por entender que esta foi um “lapso de escrita”;

- Relativamente ao critério de adjudicação, à composição dos lotes e modelação do procedimento, por entender que estes não violavam o AQ 2013/30, ao abrigo do qual este procedimento foi lançado, e se inseriam no âmbito do poder discricionário da Ré para conformar o procedimento como bem entendesse.

2ª A Recorrente invocou a violação pelas peças do procedimento do princípio da concorrência, designadamente quanto à exigência de garrafa de oxigénio medicinal de 5L, com redutor e debitómetro incorporado e leitura de autonomia da garrafa em horas/minutos (Posição 6 do Anexo III do CE, cfr. página 20 do processo administrativo), por apenas a Contra-Interessada AL...e comercializar a dita garrafa em território nacional.

3ª A sentença recorrida, com base nos factos dados como provados nas alíneas Z), AA), AB) e AC) dos factos provados, entendeu que “assiste neste ponto razão à Autora”.

4ª Pese embora, esta apreciação sobre a ilegalidade invocada relativamente ao bem exigido na posição 6 do Anexo III do Caderno de Encargos, veio o Juiz a quo desconsiderar aquela ilegalidade, entendendo que ocorreu um lapso de escrita, enquadrável no artigo 249º do Código Civil.

5ª Ora, face aos elementos constantes dos autos não se retira a existência de qualquer lapso de escrita e muito menos que aquele seja ostensivo, facilmente detectável e identificável no seu contexto, pelo que não poderia o Juiz decidir pela existência de tal lapso e proceder à sua rectificação ao abrigo do artigo 249º do Código Civil, que assim foi violado.

6ª Por outro lado, porque tal entendimento é proibido por implicar a violação do princípio da concorrência na vertente do princípio da estabilidade das regras e peças do procedimento, estabelecidas no artigo 1º, n.º 4 do Código dos Contratos Públicos.

7ª Por outro lado ainda, porque o Tribunal não se pode substituir às partes na prova dos factos constitutivos das posições jurídicas assumidas: a alegação das partes não faz prova e do processo administrativo remetido aos autos não consta qualquer elemento que faça prova da existência do alegado “lapso de escrita”.

8ª O denominado princípio da estabilidade objectiva do procedimento significa que “De acordo com este princípio, as regras e dados constantes das peças do procedimento, como o seu programa, ou caderno de encargos [e que o Anexo III faz parte] devem manter – se inalterados durante a pendência dos respectivos procedimentos, sendo proibida a sua alteração, (eliminação, aditamento, modificação) ou desconsideração. (pág. 210 da obra ”Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública”, de Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Almedina).

9ª Os co-contratantes do AQ 2013/30, potenciais proponentes neste procedimento tomaram a decisão de apresentar proposta ou não com base nas peças do procedimento, Convite e Caderno de Encargos, na convicção de que estas correspondem ao pretendido pela entidade adjudicante e que condicionam, a própria actuação daquela.

10ª Por isso, qualquer alteração às peças do procedimento tem necessariamente que ser feita antes da apresentação das propostas.

11ª Se a Ré tivesse constatado, após a apresentação das propostas, que existia um lapso nas peças do procedimento – o tal erro de escrita -, teria de anular o procedimento em curso e reiniciar novo procedimento, com as peças devidamente corrigidas, em obediência ao princípio da estabilidade das regras e peças do procedimento.

12ª Aprovadas as peças pelo Conselho de Administração da Ré, só este tem competência para as alterar, mormente para decidir da existência de um erro no Caderno de Encargos.

13ª A Ré não deliberou pela existência de qualquer erro, nem pela alteração do Caderno de Encargos e, por consequência lógica, nenhum dos proponentes foi notificado da existência daquele pretenso erro.

14ª E todos estes actos eram essenciais para que o pretenso erro pudesse ter alguma relevância jurídica no âmbito do procedimento, em obediência ao já referido princípio da estabilidade das regras e peças do procedimento, mas também aos princípios da concorrência e da transparência.

15ª Mal andou também o Juiz a quo ao concluir “tratar-se de lapso de escrita da Ré, que, além do mais, não influenciou/impediu, a proposta da Autora, nem, posteriormente, em sede de relatório preliminar, foi a causa que determinou a proposta da sua exclusão” (cfr. ponto V) do probatório), pois o Relatório Preliminar nada refere relativamente ao pretenso erro.

16ª Pelo que, a única coisa que dele se retira é que, ao não propor a exclusão de propostas com fundamento na não apresentação da referida garrafa com o dispositivo, o Júri não avaliou as propostas nos termos do convite e do caderno de encargos como lhe era imposto, em violação do artigo 70º do Código dos Contratos Públicos.

17ª O princípio da transparência impõe que os sujeitos administrativos actuem às claras, motivando como procedem e porque procedem, dando a conhecer antecipadamente tudo aquilo que possa influenciar a conduta dos concorrentes, documentando oficialmente as opções tomadas e os juízos formulados.

18ª É, pois, também ilegal, por violação do princípio da transparência, a conclusão retirada na sentença sobre o relatório preliminar, de que a omissão de exclusão das propostas por violação dos parâmetros do Anexo III, posição 6, decorre do reconhecimento do erro de escrita que em lado algum é naquele referido. Incorrendo, assim, em erro de julgamento de direito.

19ª Por outro lado, pretende ainda a sentença recorrida que a verificação de tal erro é irrelevante porque este não influenciou a avaliação da proposta da autora.

20ª Ora, a relevância do erro no procedimento não se pode aferir pela sua consequência numa proposta em particular, sob pena de violação dos princípios da igualdade e da transparência.

21ª A Admitir-se o erro, impunha-se averiguar o efeito deste no procedimento, designadamente se o mesmo era susceptível de ter efeitos na concorrência, designadamente de alterar o universo dos potenciais concorrentes.

22ª E se o tivesse feito necessariamente teria de concluir afirmativamente: se não se tivesse exigido a garrafa com o referido dispositivo poderiam ter apresentado proposta os dois co-contratantes que não o fizeram.

23ª A sentença recorrida ao considerar que tal “erro” não tinha influência no procedimento, por não influenciar a proposta da Autora, incorre em erro de julgamento de facto e de direito, por violação dos princípios da concorrência, transparência e igualdade, consagrados no artigo 1º, n.º 4, do Código dos Contratos Públicos.

24ª É que aquele “lapso”, que nunca foi exteriorizado como tal no procedimento, por nunca ter sido rectificado, é susceptível de restringir a concorrência ao afastar potenciais proponentes que poderiam ter decidido apresentar proposta se aquela exigência não constasse no Anexo III do Caderno de Encargos.

25ª Assim, a não rectificação do erro, através da rectificação das peças do procedimento é susceptível de ter condicionado o acesso ao concurso pelos restantes co-contratantes, o que viola os princípios da concorrência, da transparência e da igualdade.

26ª Admitindo-se, sem conceder, que a referida exigência fosse um lapso, a correcção deste implicava a eliminação da exigência estabelecida na posição 6 do Anexo III do Lote 1 do Caderno de Encargos, o que constitui uma alteração substancial do mesmo.

27ª Substancial, porque, como se disse, a eliminação daquela exigência permitiria alargar o leque dos proponentes aos demais co-contratantes do AQ 2013/30, que não apresentaram propostas.

28ª E qualquer alteração substancial ao Caderno de Encargos impõe, em obediência aos princípios da concorrência, da transparência e da igualdade, a republicação das peças e a sua notificação a todos os co-contratantes do AQ 2013/30, nos termos dos artigos 40º, 41º e 42º e bem assim do artigo 50º, todos do Código dos Contratos Públicos.

29ª A Ré ao não actuar desta forma violou os citados princípios e, por consequência, a sentença recorrida que assim não decidiu incorreu em novo erro de julgamento de direito.

30ª Por outro lado, dos elementos do procedimento e dos factos dados como provados não resulta a existência do referido lapso de escrita.

31ª Os fundamentos invocados na sentença para dar como assente o “erro de escrita”, são os seguintes:

• contestações da Ré e da Contra-Interessada AL...e;
• concatenação entre o caderno de encargos e as cláusulas técnicas do AQ 2013/30 e o Caderno de Encargos; e
• os outros elementos do procedimento (Relatório Preliminar, Resposta á Impugnação administrativa da Autora e comparação entre o Anexo I e o Anexo III);

32ª A alegação das partes em sede de Contestação não faz prova, nem o Tribunal se pode substituir às partes na prova dos factos constitutivos das posições jurídicas assumidas.

33ª Assim, a sentença ao decidir com base nos alegados pelas partes nas Contestações, incorre em erro de julgamento de facto e de direito.

34ª Quanto à comparação entre o Caderno de Encargos e as Cláusulas Técnicas do AQ 2013/30, o qual não inclui a garrafa com o citado dispositivo, esta é totalmente inútil para aferir da existência ou não do pretenso erro.

35ª Com efeito, e como se retira das alíneas AD), AE), AF), AG), AH, AI) e AJ) da Factualidade Assente, em todos os referidos procedimentos lançados ao abrigo do AQ 2013/30, as entidades adjudicantes exigiram a apresentação de propostas para garrafas de oxigénio de 5 L com dispositivo indicador de litros e autonomia em horas/minutos.

36ª Esta factualidade, isto é, a reiterada exigência desta garrafa com este dispositivo pelas entidades adjudicantes nos procedimentos lançados ao abrigo do AQ 2013/30, obsta, assim, à conclusão de que esta exigência neste procedimento seja um “lapso de escrita”.

37ª Consequentemente, ao considerar este elemento relevante para apurar a verificação do erro, inquina a sentença em recurso de erro de julgamento de facto e de direito.

38ª Finalmente, quanto aos elementos do procedimento é relevante atentar no facto de a Ré ter sido citada na acção no dia 19.04.2016, ou seja, em data muito anterior à do relatório preliminar – 28.04.2016 - e da resposta à Impugnação administrativa da Autora – 03.05.2016 - e à apresentação das contestações.

39ª Isto permitiu que quer a Ré, quer a Contra-Interessada, AL...e, pudessem adequar as posições a assumir no procedimento e na acção na prossecução do seu objectivo de salvar o procedimento.

40ª A primeira referência à existência do alegado “lapso de escrita” surge na resposta, de 03.05.2016, que decidiu a impugnação administrativa da Recorrente (cfr. pág. 613 do processo administrativo).

41ª No entanto, retira-se da sentença, que o Juiz entendeu que a existência de tal erro resulta já comprovado do facto de, no Relatório Preliminar datado de 28.04.2016, não se ter determinado a exclusão das propostas da A... e da L... por não apresentação da garrafa de oxigénio de 5L com o referido dispositivo.

42ª Ora, no relatório preliminar não se faz qualquer referência ao pretenso erro e até à data da sua elaboração, 28.04.2016, não consta qualquer elemento no processo administrativo que faça qualquer menção a esse pretenso erro.

43ª Consequentemente, concluir que a omissão de referência a um “erro” no relatório preliminar indicia a existência do dito “erro”.

44ª O Juiz assenta a sua decisão também no confronto entre o anexo I – posição 4 – e o anexo III – posição 6 – do caderno de encargos.

45ª Estes anexos não são comparáveis, tendo por base diferentes realidades: o anexo I é uma listagem das estimativas de consumo por produto para a qual não é relevante a indicação exaustiva das especificações dos produtos ali em causa. Por outro lado, é uma estimativa dos consumos da entidade elaborada com base nos produtos consumidos pela Ré. Já o anexo III é a grelha da proposta que tem de ser preenchida e submetida pelos proponentes - mapa de “preenchimento obrigatório” – e, por isso, tem de conter todas as especificações exigidas.

46ª Desta forma, a sentença recorrida ao fundamentar a decisão sobre a existência de um “erro de escrita” no anexo III do caderno de encargos nos referidos elementos, decidiu contra a matéria de facto dada como assente, incorrendo em erro de julgamento de facto e de direito.

47ª Por outro lado, as peças do procedimento são aprovadas pelo órgão competente para a decisão de contratar, nos termos do nº 2 do artigo 40º do Código dos Contratos Públicos.

48ª Do processo administrativo não consta, por isso não existe, uma deliberação do Conselho de Administração da Ré a referir a existência do “erro de escrita”, nem a alterar as peças do procedimento, designadamente com fundamento na correcção do pretenso lapso de escrita. E essa deliberação teria necessariamente de ser aprovada antes da apresentação das propostas (nos termos do disposto nos artigos 50º, nº 3 e 64º do Código dos Contratos Públicos) ou, posteriormente, desde que anulados os actos praticados anteriormente e reiniciado o procedimento.

49ª A douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito ao decidir que a referida exigência da garrafa de oxigénio líquido de 5L com redutor e debitómetro incorporado e dispositivo de leitura da autonomia da garrafa em horas/minutos na posição 6 do Anexo III é um lapso de escrita; e errou também quando, decidindo que é um lapso de escrita, não retirou dele as consequências jurídicas que se impunham de adequação do procedimento aos requisitos legais exigíveis.

50ª Violou desta forma os referidos artigos 50º e 64º do Código dos Contratos Públicos e, bem assim, os princípios da concorrência, da transparência e da igualdade estabelecidos no nº 4 do artigo 1º do mesmo Código, devendo, por isso ser anulada.

51ª A sentença recorrida assenta no pressuposto de que, tendo este procedimento sido lançado ao abrigo do AQ 2013/30 – “no qual foi garantida uma efectiva concorrência e igualdade entre os candidatos” (pág. 29 da sentença) -, basta verificar da conformidade formal entre o AQ e o procedimento sendo despiciendo avaliar o cumprimento daqueles princípios face aos efeitos em concreto do procedimento.

52ª Concluindo existir essa conformidade formal, absteve-se de ponderar os efeitos em concreto da estrutura e normas do procedimento face aos princípios da concorrência, da transparência e da igualdade.

53ª E isto também no errado pressuposto de que a entidade adjudicante tem um poder discricionário na conformação do procedimento e que os interesses desta se sobrepõem aos princípios da concorrência da transparência e da igualdade.

54ª Foi este entendimento que fundamentou a decisão de inexistência das invocadas ilegalidades, porque, segundo o Juiz, assegurada a concorrência no âmbito do AQ, as entidades adjudicantes têm um poder discricionário absoluto na conformação do procedimento, constituição dos lotes, podendo escolher livremente os produtos e suas capacidades, desde que conformes ao AQ.

55ª Relativamente à apreciação geral das ilegalidades invocadas pela Autora na petição, considerou o Juiz ser apenas necessário fazer a concatenação entre o procedimento e o AQ a montante, para verificar se o critério de adjudicação, os lotes, bens e respectivas dimensões/capacidades exigidas e demais serviços exigidos, se conformavam com o estabelecido no AQ 2013/30. Ao concluir que sim, forçoso foi também chegar à conclusão da não verificação das ilegalidades apontadas.

56ªA Recorrente discorda deste entendimento e desta metodologia, pois o cumprimento dos princípios da transparência, da concorrência e da igualdade são exigíveis para qualquer procedimento e têm de ser aferidos em cada procedimento em concreto e ainda porque não tem em linha de conta as diferenças de modelação entre o AQ 2013/30 e este procedimento.

57ª No AQ 2013/30 existe um lote para cada produto e para cada dimensão/capacidade de vasilhame e o critério de adjudicação é o do mais baixo preço. Havendo um lote por produto, a expectativa dos co-contratantes é que as entidades adjudicantes mantivessem nos procedimentos por elas lançados a lógica e estrutura do AQ.

58ª Neste procedimento, com a inclusão de nove produtos num lote desvirtua-se o critério de adjudicação do mais baixo preço fixado no AQ 2013/30, porque a comparação é feita não por produto, mas por lote.

59ª Não estando em causa que neste procedimento a comparação só pode ser feita entre os preços por lote, nem a possibilidade de constituição de lotes, o que se questiona é a não divisão do objecto do procedimento em mais lotes e as consequências dessa não divisão para a concorrência efectiva e nos custos de aquisição para a entidade adjudicante.

60ª O que se verifica neste procedimento em concreto é que a Ré criou um lote, no qual incluiu todos os produtos que pretendia, com as dimensões que entendeu.

61ª Considerando que o Despacho nº 7444/2014, de 6 de Junho (cfr. alínea J) da factualidade assente) tornou pública a lista dos fornecedores, dos produtos e dimensões/capacidades dos vasilhames propostos por cada um dos co-contratantes, a entidade adjudicante sabe de antemão qual é a empresa adjudicatária possível em função dos produtos e capacidades que incluir no lote.

62ª Não era, nem podia ser este, o objectivo do AQ 2013/30 e, por isso, este não pode ser utilizado para legitimar procedimentos que, em concreto, eliminam qualquer hipótese de concorrência, como acontece neste procedimento.

63ª Como refere Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira (obra citada pág. 189) “do respeito pelas regras do jogo”, trata-se de “assegurar uma aplicação sã das “regras do jogo” pré-contratual por parte de todos as sujeitos nele envolvidos””; e ainda que o princípio da concorrência manifesta-se na exigência de que, “dentro da modalidade escolhida, os procedimentos sejam organizados de maneira a suscitar o interesse do maior número de candidatos, ou concorrentes, abrindo-os tendencialmente a todos os que a eles queiram aceder (ou candidatar-se), sem quaisquer condições que tenham por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência (…)”.

64ª A discricionariedade de que as entidades adjudicantes gozam para as escolhas no programa e caderno de encargos em função das suas necessidades ou especificidades tem, nos termos do disposto no artigo 132º do Código dos Contratos Públicos, um limite: o de que as regras específicas a criar para cada caso não podem ter como efeito “impedir, restringir ou falsear a concorrência”.

65ª O próprio AQ 2013/30 que, como se refere na sentença, salvaguarda o princípio da concorrência, não podia pretender que as entidades adjudicantes, de forma enviesada, potenciassem a monopolização do mercado de gases por uma ou duas empresas.

66ª Foi por isso que na sentença inicialmente se considerou ilegal a inclusão no Lote 1 da garrafa de oxigénio líquido de 5L com o referido dispositivo, uma vez que tal exigência restringia o número de possíveis fornecedores a um só. Só que, posteriormente, como se viu, a sentença desconsiderou esta ilegalidade ao entender que aquela era um ”lapso de escrita”.

67ª Pelas mesmas razões, ao contrário do decidido na sentença recorrida, deveria ter sido também considerada ilegal a inclusão no Lote 1 da garrafa de protóxido de azoto B5, que nos termos do AQ apenas duas co-contratantes podiam fornecer (cfr. alínea J) da Factualidade Assente).

68ª A ilegalidade está na constituição do lote com produtos em que apenas um (posição 6 do Anexo III) ou dois (posição 9 do Anexo III) dos cinco co-contratantes podem concorrer, num procedimento em que é imposto responder a todas as posições do lote, sob pena de exclusão da proposta (alínea C) da Factualidade Assente).

69ª Da inclusão do protóxido de azoto B5 num lote que abrangia quase todos os produtos (8 dos 9 a concurso) a fornecer à entidade adjudicante, levou à exclusão de todas as propostas, excepto uma.

70ª Assim, a constituição do Lote 1 tal como a Ré o fez viola frontalmente e de forma evidente o princípio da concorrência, pois limita/impede/restringe a concorrência efectiva e sã, em violação do artigo 1º, n.º 4 do Código dos Contratos Públicos e do Considerando 2 da Directiva 2014/24/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2014.

71ª Desta forma, a entidade adjudicante determinou a priori – ou seja, mesmo antes da apresentação das propostas e da sua avaliação – a entidade adjudicatária; e o único adjudicatário possível, consciente que não vai ter concorrentes, não tem de fazer qualquer esforço para baixar os preços que propõe, necessitando apenas de propor preços abaixo aos dos fixados no AQ para garantir a adjudicação.

72ª O procedimento em causa através das cláusulas impugnadas é, assim, ilegal, por violação dos princípios da concorrência, da transparência e da igualdade, ínsitos no artigo 1º, n.º 4 do Código dos Contratos Públicos, pelo que a sentença recorrida ao não ter assim decido incorreu em erro de julgamento de direito.

73ª A sentença recorrida incorre ainda em novo erro de julgamento ao considerar que os princípios da concorrência, transparência e igualdade, não se podem sobrepor “às efectivas necessidades e razões de operacionalizações da entidade adjudicante” e que “na situação em apreço, é justificável a formação de lotes, para assegurar a boa operacionalidade dos serviços”.

74ª A sentença é ainda também ilegal porque:

- A observância dos princípios da concorrência, da transparência e da igualdade, sobrepõem-se às necessidades e razões de operacionalização da entidade adjudicante. Cabe, sim, a esta conformar as suas necessidades e adaptar as razões de operacionalização de forma a garantir o estrito cumprimento dos referidos princípios.

- Nem a Ré, nem o Júri fundamentaram a constituição dos lotes, nos termos explanados na sentença, conforme se extrai do processo administrativo. Nem aquela fundamentação resulta de qualquer informação, parecer ou qualquer outro documento escrito do processo administrativo.

75ª A única fundamentação constante do processo administrativo é a que se encontra na acta número um e que é tão-somente a seguinte: “A ULSNA, EPE, é livre de fazer os grupos e lotes como bem entender” (cfr. resposta à Questão 2 da A... – documento nº 6 da petição inicial).

76ª Não pode, assim, concluir-se, como se fez na sentença que “na situação em apreço, é justificável a formação de lotes [leia-se, do lote 1] para assegurar a boa operacionalidade dos serviços.” Nem tão pouco a conclusão de que “ de facto, não se revela uma boa decisão de gestão e racionalização de meios a aquisição de bens/artigos da mesma natureza a diversas entidades, já que tal acarretaria uma paragem/desorganização do serviço para o efeito de (re) abastecimento. (…) O que se repercutiria necessariamente no funcionamento daqueles serviços de saúde – saliente-se – e em todos os demais inerentes à execução contratual, como sejam, entre outros relativos a concretização de encomendas/ reclamações / facturações.”.

77ª Estas considerações proferidas na sentença para fundamentar a decisão no sentido da inexistência da ilegalidade na modelação do procedimento e, concretamente, na composição dos lotes, não resultam da matéria provada nos autos, nem tão pouco de qualquer documento do processo administrativo.

78ª O mesmo acontece com a definição da capacidade dos recipientes criogénicos estabelecidos no alínea i) do n.º 1 da Cláusula 17ª do Caderno de Encargos, em que é exigido o fornecimento e colocação de dois recipientes criogénicos de oxigénio, um com a capacidade de cerca de 7.500 metros cúbicos e outro com a de 3.000 metros cúbicos, quando capacidade dos recipientes apenas têm de ser adequadas ao consumo e dimensões das instalações destinadas aos reservatórios em cada hospital.

79ª A exigência de uma dimensão específica limita a concorrência, porque cada co-contratante comercializa os recipientes com as capacidades do respectivo fornecedor e, por isso, só comercializa os recipientes com as capacidades oferecidas por aquele; porque também os recipientes necessitam – nos termos da legislação do INFARMED – de ter AIM; e porque não existe, nem foi dado, qualquer fundamento técnico para as capacidades exigidas pela entidade adjudicante.

80ª No que respeita a este tipo de parâmetros dos produtos, como são as suas capacidades, determina o artigo 49ª do Código dos Contratos Públicos que as especificações técnicas “são fixadas por forma a permitir a participação dos concorrentes em condições de igualdade e a promoção da concorrência”.

81ª Das propostas constata-se que apenas uma das co-contratantes apresentou proposta com as dimensões exigidas no Caderno de Encargos (alínea O), P) e Q) da Fundamentação Assente);

82ª Verifica-se, pois, que a exigência constante da alínea i) da Cláusula 17ª do Caderno de Encargos é ilegal por restringir a concorrência, violando assim o artigo 49º e o artigo 1º, n.º 4, todos do Código dos Contratos Públicos, pelo que a douta sentença recorrida que decidiu em sentido contrário cometeu novo erro de julgamento de facto e de direito.

83ª De tudo isto impõe-se concluir pela ilegalidade do procedimento, da decisão do Conselho de Administração da Ré de 12.01.2016 e das apontadas normas do Convite e do Caderno de Encargos por violação do princípio da concorrência, da transparência e da igualdade, obstando a uma efectiva e sã concorrência.

- ao incluir num lote único 9 produtos, em que apenas uma empresa ou duas podem responder a todas as posições e em simultâneo determinar a exclusão das propostas que não respondam a todas as posições;
- a entidade adjudicante não tem um poder discricionário para conformar o procedimento como entender, quando dessa conformação resulta uma restrição à concorrência;
- a entidade adjudicante não pode determinar as especificações técnicas, designadamente por via da capacidade dos bens, que entender se disso resultar uma limitação da concorrência;

84ª A interpretação perfilhada na sentença que redundou na decisão da não ilegalidade do Convite e do Caderno de Encargos relativamente às normas apontadas e decidiu pela existência de um lapso de escrita na posição 6 do Anexo III do Caderno de Encargos, faz uma interpretação e aplicação do direito em violação do artigo 1º, n.º 4 do Código dos Contratos Públicos e da Directiva 2014/24/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos, que revoga a Directiva 2004/18/CE;

85ª O despacho do Juíz que fixou a esta acção o valor do preço base estabelecido no Convite (que aliás não se sabe se será o valor do Contrato) de € 370.455,36, viola o disposto nos artigos 32º e 33º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que são inaplicáveis à presente acção, pelo que deverá o mesmo ser revogado e ser fixado o valor de € 30.000,01 em conformidade com o disposto no artigo 34º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
*

II – Matéria de facto.


A Recorrente, em temos estritamente literais, parece atacar o julgamento da matéria de facto feito pela Primeira Instância.

São, neste ponto, mais significativas as seguintes conclusões:

23ª A sentença recorrida ao considerar que tal “erro” não tinha influência no procedimento, por não influenciar a proposta da Autora, incorre em erro de julgamento de facto e de direito, por violação dos princípios da concorrência, transparência e igualdade, consagrados no artigo 1º, n.º 4, do Código dos Contratos Públicos.

“46ª Desta forma, a sentença recorrida ao fundamentar a decisão sobre a existência de um “erro de escrita” no anexo III do caderno de encargos nos referidos elementos, decidiu contra a matéria de facto dada como assente, incorrendo em erro de julgamento de facto e de direito”.

Em bom rigor, no entanto, no recurso da sentença não é atacado o julgamento da matéria de facto, mas antes a leitura que aí é feita dos factos provados.

Não se aponta, de resto, qualquer ponto da matéria de facto fixada na sentença que mereça reparo e que, no entender da Recorrente, devesse ter sido julgado de maneira diferente, e em que sentido. Nem, consequentemente, se indica qualquer meio de prova que impusesse julgamento diferente da matéria de facto.

O que sempre implicaria não conhecer do recurso nesta parte - artigo 640º, n.º1, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil (de 2013).

Deveremos assim considerar provados os seguintes factos, considerados na decisão recorrida:


A) Em 12.01.2016, foi proferida deliberação pelo Conselho de Administração da R., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…) Ao abrigo do artigo 259º do Código dos Contratos Públicos, solicita-se autorização para se iniciar procedimento no âmbito do Acordo – Quadro – Concurso Público n.º 30/2013 – “Gases Medicinais e outros” dos SPMS e convidar a apresentar proposta, as seguintes entidades (…)”. –cfr. fls. 1 e 2 do processo administrativo;

B) No dia 08.03.2016, na plataforma informática foi criado documento “Fornecimento de gases medicinais e outros”, que incluía em anexo, o convite e caderno de encargos. - cfr. fls. 66 dos autos (suporte físico);

C) O teor do documento com o “Assunto: Convite para Apresentação de Proposta para o procedimento de aquisição n.º 01000616 no âmbito do Acordo Quadro – Concurso Público n.º 30/2013 – “Gases medicinais e outros” dos SPMS, para o Fornecimento de medicamentos, para a Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, EPE.”, e respectivos anexos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos e, dos quais consta, além do mais, o seguinte:

“(…)

(…)” – cfr. fls. 11 a 29 do processo administrativo;.

D). O teor do “caderno encargos” do procedimento n.º 01000616 que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

(…)

CLÁUSULAS TÉCNICAS

(…)

(…)

(…)

ANEXO I (Mapa de lotes e Quantidades a Concurso)

Previsão de Gases Medicinais e outros para 24 meses

(…)

Anexo II

(…)

Anexo III

(…)”- cfr. fls. 18 a 29 do processo administrativo;

E). O teor do “Programa de Procedimento”, referente ao Concurso Público n.º 2013/30 – “Concurso Público para a celebração de contratos públicos de aprovisionamento para a área da saúde, com vista ao fornecimento de material de gases medicinais e outros às instituições e serviços do serviço nacional de saúde”, que aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. fls. 39 a 68 do processo administrativo.

F). O teor do “Caderno de Encargos”, referente ao Concurso Público n.º 2013/30 – “Concurso Público para a celebração de contratos públicos de aprovisionamento para a área da saúde, com vista ao fornecimento de material de gases medicinais e outros às instituições e serviços do serviço nacional de saúde”, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

(…)

Anexo I

Bens e Serviços

(…)”. – cfr. fls. 69 a 89 do processo administrativo;

G). O teor das “Cláusulas Técnicas”, referente ao Concurso Público n.º 2013/30 – “Concurso Público para a celebração de contratos públicos de aprovisionamento para a área da saúde, com vista ao fornecimento de material de gases medicinais e outros às instituições e serviços do serviço nacional de saúde”, que aqui se dá por integralmente reproduzido.- cfr. fls. 90 a 102 do processo administrativo;

H). O teor das “esclarecimentos e rectificações”, de 07.05.2013, referentes ao Concurso Público n.º 2013/30 – “Concurso Público para a celebração de contratos públicos de aprovisionamento para a área da saúde, com vista ao fornecimento de material de gases medicinais e outros às instituições e serviços do serviço nacional de saúde”, que aqui se dá por integralmente reproduzido.- cfr. fls. 103 a 126 do processo administrativo;

I). O teor das “esclarecimentos e rectificações”, de 06.06.2013, referentes ao Concurso Público n.º 2013/30 – “Concurso Público para a celebração de contratos públicos de aprovisionamento para a área da saúde, com vista ao fornecimento de material de gases medicinais e outros às instituições e serviços do serviço nacional de saúde”, que aqui se dá por integralmente reproduzido.- cfr. fls. 159 a 164 do processo administrativo;

J). O teor do “Despacho n.º 7444/2014” que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…) No âmbito das suas competências a SPMS, EPE, levou a efeito o concurso público para a celebração de contratos públicos de aprovisionamento (CPA) com vista ao procedimento de GASES MEDICINAIS e OUTROS, publicitado (…).

(…)

3 – A aquisição deve ser efectuada nos termos do artigo 259º do Código de Contratos Públicos, com respeito pelo critério do mais baixo preço ou o da proposta economicamente mais vantajosa, nos termos previstos na cláusula 4.a, do caderno de encargos.

(…)

Anexo ao despacho – resumo

(…)

(…)

(…).” – cfr. fls. 33 a 37 do processo administrativo;

K). O teor do “manual de gases medicinais” do Conselho do Colégio de Especialidade de Farmácia Hospitalar que aqui se dá por integralmente reproduzido.- cfr. fls. 167 a 224 do processo administrativo;

L). Os pedidos de esclarecimento apresentados no âmbito do procedimento n.º 01000616, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos. – cfr. fls. 231 a 252 do processo administrativo;

M). Em 01.04.2016, reuniu o júri do procedimento n.º 01000616, tendo sido lavrada a “acta número um”, cujo teor, e do respectivo anexo, aqui se dá por reproduzido e da qual consta, além do mais, o seguinte: “(…) a fim de responder aos esclarecimentos solicitados pela Firma AL...e e A... Gas.

Os esclarecimentos constam do anexo a esta acta, dela fazendo parte integrante (…).” e, ainda: “(…)

(…)

(…)

(…)

(…)” – cfr. fls. 273 a 291 do processo administrativo.

N). Em 15.03.2016 e, em 01.04.2016, pelo Conselho de Administração da R. foi deliberado autorizar a prorrogação do prazo para entrega das propostas, conforme respectivas informações, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos – cfr. fls. 293 e 299 do processo administrativo.

O). A L... Portugal, Lda. apresentou proposta para o Lote 1 e 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 307 a 334 dos autos.

P). A Autora apresentou proposta para o Lote 1 e 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 341 a 412 do processo administrativo.

Q). A contra-interessada AL...e apresentou proposta para o Lote 1, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 415 a 492 do processo administrativo.

R). O teor do “mapa 1” referente à L..., Autora e AL...e, que aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 493 a 497 do processo administrativo.

S). A Autora apresentou impugnação administrativa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. fls. 505 a 512 do processo administrativo.

T). A contra-interessada AL...e exerceu o contraditório quanto ao teor da impugnação administrativa mencionada no ponto que antecede, cujos termos aqui se dão por reproduzidos – cfr. fls. 521 a 524 do processo administrativo.

U). Em 01.04.2016, reuniu o júri do procedimento n.º 01000616, tendo sido lavrada a “acta número dois” cujo teor, e do respectivo anexo, aqui se dá por reproduzido e da qual consta, além do mais, o seguinte: “(…) a fim de dar resposta às questões não jurídicas, de índole técnica solicitados pelo Gabinete Jurídico no âmbito da impugnação das peças do procedimento (…). Os esclarecimentos constam do anexo a esta acta, dela fazendo parte integrante. (…)” e, ainda: “(…)

(…)” – cfr. fls. 549 e 551 do processo administrativo.

V). Em 28.04.2016, foi elaborado “Relatório Preliminar” cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

(…)”, do qual os candidatos foram notificados para o exercício de audiência prévia em 28.04.2016 – cfr. fls. 555 a 559 e 561 do processo administrativo.

W). A Autora exerceu o seu direito de audiência prévia por requerimento apresentado em 04.05.2016, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 563 a 580 do processo administrativo.

X). Em 27.04.2016, foi emitida a Informação n.º 84/2016, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…)

(…)” – cfr. fls. 613 a 616 do processo administrativo.

Y). O “Contrato Público de Aprovisionamento” celebrado entre a Autora e os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, EPE, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…)

(…)” – cfr. fls. 65 dos autos (suporte físico).

Z). Em 27.10.2015, o INFARMED prestou informação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)

(…)” – cfr. fls. 90 a 92 dos autos (suporte físico).

AA). O teor da “solicitação de patente de invenção” com o “nº de registo nacional: 06 51971”, junto do Instituto Nacional da Propriedade Industrial da República Francesa, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…)

(…)” – cfr. fls. 94 a 111 dos autos (suporte físico).

AB). O teor da “patente de invenção B1 – Sistema de válvula para garrafas com fluídos sob pressão” com o “nº de registo nacional: 07 56736”, junto do Instituto Nacional da Propriedade Industrial da República Francesa, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

(…)

(…)”- cfr. fls. 137 a 147 dos autos (suporte físico).

AC). O teor do “folheto de patente europeia” com o “número de depósito internacional: PCT/FR/051229”, junto do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…)

(…)”- cfr. fls. 162 a 173 dos autos (suporte físico).

AD). Com data de 16.06.2015, pelo Centro Hospitalar Tondela – Viseu, EPE, foi dirigido “Convite Apresentação proposta Acordo Quadro Art.º 259 – 4F/02221/14 – Gases Medicinais Acordo Quadro”, aos titulares do Contrato Público de Aprovisionamento 2013/30, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 190 a 203 dos autos (suporte físico).

AE). Pela Unidade Local de Saúde do Nordeste, EPE foi realizado “Convite à Apresentação Propostas para aquisição de Gases Medicinais e Industriais, ao abrigo do CPA 2013/30”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 204 a 214 dos autos (suporte físico).

AF). Pelo Centro Hospitalar do Algarve, EPE foi realizado “Convite à Apresentação de Propostas – Processo n.º 2741/2014”, destinado à “aquisição de Gases Medicinais e Assistência Técnica”, ao abrigo do Acordo Quadro 30/2013, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 215 a 229 dos autos (suporte físico).

AG). Pelo Centro Hospitalar do Médio Tejo, EPE foi realizado “Convite à Apresentação de Proposta tendente à celebração de contrato de fornecimento ao abrigo do contrato público de aprovisionamento celebrado na sequência do procedimento de concurso público n.º 2013/30 – material de gases medicinais e outros às instituições e serviços do SNS”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 231 a 252 dos autos (suporte físico).

AH). Pelo Centro Hospitalar do Oeste, EPE foi realizado “Convite à Apresentação de Proposta – aos fornecedores com os quais tenha sido homologado CPA ao abrigo do CP 2013/30”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 253 a 266 dos autos (suporte físico).

AI). Pelo Centro Hospitalar do Porto, EPE foi realizado “Convite à Apresentação de Proposta ao abrigo do Acordo Quadro CP 2013/30 – Aquisição de Gases Medicinais, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 268 a 286 dos autos (suporte físico).

AJ). Pelo Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, EPE foi realizado “Convite à Apresentação de Propostas – ao abrigo do CP n.º 2013/30 (SPMS, EPE) – Gases Medicinais e outros”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 287 a 304 dos autos (suporte físico).

AK). O teor do resultado da “pesquisa> contrato”, realizada na «base: contratos públicos online» referente à aquisição de gases/oxigénio medicinais, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 306 a 326 dos autos (suporte físico).

AL). Em 01.03.2016, foi elaborado o “relatório de análise de projecto SDGV – relatório n.º 01/2016”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 354 a 366 dos autos (suporte físico).

AM). O teor do documento da “ACSS – Administração Central do Sistema de Saúde, IP – Unidade de Instalações e Equipamentos”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido –cfr. fls. 366 a 368 dos autos (suporte físico).

AN). Em 15.07.2015, a Autora emitiu a informação n.º 217/2015, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, referente ao processo n.º 647/15.0BEAVR, que veio a findar, por extinção da instância devido a inutilidade superveniente da lide – cfr. fls. 374 a 376 e 378 a 380 dos autos (suporte físico).

AO). Em 16.06.2015, os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde emitiram o ofício n.º 2030, sob o “assunto: Esclarecimentos sobre as aquisições ao abrigo do CPA n.º 2013/30”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:

“(…)

(…)” – cfr. fls. 382 e 383 dos autos (suporte físico).

AP). A petição inicial referente à presente lide foi apresentada em juízo, através do «SITAF», no dia 11.04.2016 – cfr. fls. 1 dos autos (suporte físico).


*

III - Enquadramento jurídico.

1. O recurso do despacho que fixou o valor à acção.

Conclui a Recorrente, no recurso contra o despacho que alterou o valor da acção fixado pela Autora, do seguinte modo:

“85ª O despacho do Juíz que fixou a esta acção o valor do preço base estabelecido no Convite (que aliás não se sabe se será o valor do Contrato) de € 370.455,36, viola o disposto nos artigos 32º e 33º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que são inaplicáveis à presente acção, pelo que deverá o mesmo ser revogado e ser fixado o valor de € 30.000,01 em conformidade com o disposto no artigo 34º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”.

Desenvolvendo, diz a Recorrente:

“1. Ora, na presente acção não está em causa a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução de um contrato. Desde logo, quanto mais não fosse, porque não há contrato.

E o que a Autora pretende, com o pedido de anulação da decisão de contratar, é que não possa ser celebrado contrato. O que está em causa é a validade da decisão de contratar e de algumas normas do Convite e do Caderno de Encargos.

2. Nos termos do disposto nos artigos 103º e 103º-A do CPTA, os Interessados podem impugnar os documentos conformadores do procedimento (artigo 103º) e podem também impugnar os actos de adjudicação (artigo 103º A).

Aquando da instauração da presente acção não havia ainda sido proferida decisão de adjudicação – aliás ainda não o foi -, pelo que não está, nem se pode entender estar em causa a apreciação de qualquer contrato.

Assim sendo, a presente acção não é enquadrável no nº 3 do artigo 32º do CPTA.

3. A Recorrente, perante as evidentes ilegalidades que inquinam as peças do procedimento optou por impugná-las directamente, sem aguardar pela decisão de adjudicação.

Decorre daqui que quando for proferida a decisão de adjudicação e, eventualmente, celebrado o respectivo contrato, a Recorrente poderá instaurar a acção para impugnação dessa decisão e do contrato, se for o caso.

E aí, sim, poderá estar em causa a apreciação da validade do contrato e ser então aplicável o nº 3 do artigo 32º do CPTA, que estipula que na atribuição do valor da acção se atenda ao valor do contrato.

4. Na presente acção está apenas em causa, como se disse, não o contrato – porque este não existe -, mas as normas conformadoras do procedimento.

A presente acção não se enquadra, assim, em nenhuma das situações previstas nos artigos 31º, 32º e 33º do CPTA, pelo que tem de recorrer-se ao critério supletivo, estabelecido no artigo 34º do CPTA”

E tem razão.

No acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, citado na decisão recorrida, com o mesmo relator, afirma-se (sumário):

“1 – O critério previsto no artigo 34º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos é especificamente aplicável aos processos de valor indeterminável.

2 – Não é o caso de uma acção em que se impugna o acto de adjudicação de um contrato cujo valor foi expressamente fixado, pois nesta hipótese o valor da acção é o valor do contrato, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 33º e 32º, n.º3, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.*

Ou seja, estava ali em causa, a validade do acto de adjudicação.

O que aqui não sucede pois, tanto quanto consta dos autos, esse acto não foi sequer praticado.

Os pedidos deduzidos a título principal são estes:

a) Deverá ser anulada a decisão de contratar do Conselho de Administração da Ré, de 12.01.2016, para o procedimento de aquisição n.º 01000616, com as legais consequências,

Se assim não for entendido:

b) Deverão ser expurgadas do Convite e do Caderno de Encargos as normas, regras e exigências legais – nomeadamente, a do n.º 1 do ponto 7 do Convite; eliminação da posição 6 e 9 do Lote 1 do Anexo I e III, alínea i) do ponto 1 da Cláusula 23 do CE – anulando-se todos os actos praticados neles fundados e, em consequência, ser a Ré condenada a reiniciar o procedimento sem as apontadas ilegalidades.

O que está em causa na presente acção são, portanto, os documentos do procedimento que podem ser atacados de forma autónoma em relação ao acto de adjudicação – n.º 3 do artigo 103º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de 2015).

Ora no acto de adjudicação há já uma ligação directa e imediata com o contrato, pois este é o objecto da adjudicação, o que permite dar um valor certo à acção, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 33º e 32º, n.º3, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

No caso da impugnação dos instrumentos conformadores do concurso não existe essa ligação directa.

Os elementos do contrato que se questionam num processo podem ser, como geralmente são, apenas um aspecto parcelar do contrato a celebrar e o contrato pode até não vir a celebrar-se, nos termos e com o valor posto a concurso, se se concluir que os instrumentos que o conformam são ilegais.

Não é possível estabelecer, neste caso, portanto, uma ligação directa entre o valor do contrato e o valor da acção.

Nem é possível determinar, de qualquer outro modo, um valor exacto para a acção.

Deve portanto aplicar-se, como pretende a Recorrente, o critério supletivo, estabelecido no artigo 34º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos fixando-se à presente acção o valor indicado pela Autora, de 30.000,01 € (trinta mil euros e um cêntimo).

O que os conduz à procedência deste recurso e à revogação do despacho recorrido, fixando-se à acção o valor indicado pela Autora.


*

2. O recurso da sentença.

2.1. A exigência de garrafa de oxigénio medicinal de 5L, com redutor e debitómetro incorporado e leitura de autonomia da garrafa em horas/minutos (conclusões 1ª a 50ª)

Invoca a Recorrente quanto à exigência de garrafa de oxigénio medicinal de 5L, com redutor e debitómetro incorporado e leitura de autonomia da garrafa em horas/minutos (Posição 6 do Anexo III do Caderno de Encargos) aquilo que sintetiza na conclusão 37ª:

“Do processo administrativo não consta, por isso não existe, uma deliberação do Conselho de Administração da Ré a referir a existência do “erro de escrita”, nem a alterar as peças do procedimento, designadamente com fundamento na correcção do pretenso lapso de escrita. E essa deliberação teria necessariamente de ser aprovada antes da apresentação das propostas (nos termos do disposto nos artigos 50º, nº 3 e 64º do CCP) ou, posteriormente, desde que anulados os actos praticados anteriormente e reiniciado o procedimento.

E, com efeito, dispõe o artigo 50º do Código de Contratos Públicos, sob a epígrafe: “Esclarecimentos e rectificação das peças do procedimento”:

1 – Os esclarecimentos necessários à boa compreensão e interpretação das peças do procedimento devem ser solicitados pelos interessados, por escrito, no primeiro terço do prazo fixado para a apresentação das propostas.

2 – Os esclarecimentos a que se refere o número anterior são prestados por escrito, pelo órgão para o efeito indicado no programa do procedimento ou no convite, até ao termo do segundo terço do prazo fixado para a apresentação das propostas.

3 – O órgão competente para a decisão de contratar pode proceder à rectificação de erros ou omissões das peças do procedimento nos termos e no prazo previstos no número anterior.

4 – Os esclarecimentos e as rectificações referidos nos números anteriores devem ser disponibilizados na plataforma electrónica utilizada pela entidade adjudicante e juntos às peças do procedimento que se encontrem patentes para consulta, devendo todos os interessados que as tenham adquirido ser imediatamente notificados desse facto.

Daqui resulta claro que os esclarecimentos ou correcções de erros de escrita devem constar das peças do procedimento, de acordo, de resto, com os princípios da legalidade, da concorrência, da transparência e da igualdade – artigo 266º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, artigo 3º do Código de Procedimento Administrativo e n.º 4º do artigo 1º do Código de Contratos Públicos.

Só assim se cumpre a lei (o citado artigo 50º do Código de Contratos Públicos), se assegura igualdade e concorrência permitindo a todos os eventuais candidatos que concorram sabendo à partida quais as exactas exigências do contrato e o procedimento concursal fica transparente.

O que no caso concreto não se verificou pois o alegado “erro de escrita” apenas foi suscitado em sede da presente acção e não consta de nenhuma das peças do procedimento elaboradas pela entidade competente para lançar o concurso.

Como se refere no acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 29.08.2016, no processo 02531/15.9 PRT (ponto II do sumário):

“Tendo-se no Programa de Concurso a Entidade Adjudicatária auto vinculado a que as propostas submetidas a concurso de habilitação deveriam fazer-se acompanhar de declarações abonatórias, “sob pena de não admissão da candidatura", não poderá, sem mais, alegar erro de escrita já após o termo do procedimento, para desconsiderar aquele requisito, entendendo-o como mero aspeto de avaliação dos candidatos”.


Em todo o caso, é duvidoso que se trate de mero “erro de escrita” pois a referida exigência de redutor e debitómetro incorporado e leitura de autonomia da garrafa em horas/minutos, tanto pode estar a mais na Posição 6 do Anexo III do Caderno de Encargos como estar a menos na cláusula 23º, ponto 1.3, do Caderno de Encargos.

Ou pode ter sido feita constar a Posição 6 do Anexo III do Caderno de Encargos como explicitação ou desenvolvimento da cláusula 23º, ponto 1.3, do Caderno de Encargos.

Não é patente, evidente, que a entidade que lançou o concurso não tenha querido estabelecer essa exigência.

Sobretudo não resulta claro, evidente, para todos os potenciais interessados no concurso.

Tanto basta para se concluir pela ilegalidade dos instrumentos do concurso nesta parte, ao contrário do decidido.

Pelo que, logo por aqui, procede a acção e, logo, o recurso.

2.2. Os critérios do preço mais baixo e composição dos lotes.

A recorrente sintetiza o seu ataque nesta parte à decisão recorrida nas seguintes conclusões:

“58ª Neste procedimento, com a inclusão de nove produtos num lote desvirtua-se o critério de adjudicação do mais baixo preço fixado no AQ 2013/30, porque a comparação é feita não por produto, mas por lote.

59ª Não estando em causa que neste procedimento a comparação só pode ser feita entre os preços por lote, nem a possibilidade de constituição de lotes, o que se questiona é a não divisão do objecto do procedimento em mais lotes e as consequências dessa não divisão para a concorrência efectiva e nos custos de aquisição para a entidade adjudicante.

83ª De tudo isto impõe-se concluir pela ilegalidade do procedimento, da decisão do Conselho de Administração da Ré de 12.01.2016 e das apontadas normas do Convite e do Caderno de Encargos por violação do princípio da concorrência, da transparência e da igualdade, obstando a uma efectiva e sã concorrência.

- ao incluir num lote único 9 produtos, em que apenas uma empresa ou duas podem responder a todas as posições e em simultâneo determinar a exclusão das propostas que não respondam a todas as posições;

- a entidade adjudicante não tem um poder discricionário para conformar o procedimento como entender, quando dessa conformação resulta uma restrição à concorrência;

- a entidade adjudicante não pode determinar as especificações técnicas, designadamente por via da capacidade dos bens, que entender se disso resultar uma limitação da concorrência”.

Na escolha do critério do preço mais baixo e dos critérios de composição dos bens a adquirir em lotes, encontramo-nos situados no campo da chamada discricionariedade administrativa, no primeiro caso, e técnica, no segundo insindicável, salvaguardados os casos de erro grosseiro, uso de critérios manifestamente desajustados ou desvio de poder (ver, entre muitos outros, os acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 06.06.1995, processo 032225, de 11.02.1998, processo 032073,de 24.11.2000, processo 038707 (Pleno); de 0.04.2003, processo 042197; de 29.04.2003, processo 01505/02; e de 21-09-2006, processo: 0305/06).

Simplesmente, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 01.06.2004, processo n.º 0228/04, “Quando a Administração actua no âmbito da chamada discricionariedade técnica, em que goza de uma certa margem de livre apreciação, não está dispensada de fundamentar os actos, impondo, pelo contrário, o supra citado objectivo da fundamentação, que haja maior rigor nessa fundamentação, precisamente para permitir aferir, em face dessa liberdade, da legalidade do acto sob o ponto de vista substantivo.”

O mesmo vale para a discricionariedade administrativa, em sentido próprio.

Como nos ensina Freitas do Amaral (com a colaboração de Lino Torgal), no Curso de Direito Administrativo, Almedina, volume II, edição 2001, página 79 “… para haver discricionariedade é necessário que a lei atribua à Administração o poder de escolha entre várias alternativas diferentes de decisão…”.

Embora mais adiante, na página 82, esclareça “…a lei não dá ao órgão administrativo competente liberdade para escolher qualquer solução que respeite o fim da norma, antes o obriga a procurar a melhor solução para satisfação do interesse público de acordo com princípios jurídicos de actuação”.

E na página 88, remata com a conclusão de que “…o poder discricionário não é uma excepção ao princípio da legalidade, mas sim uma das suas formas possíveis de estabelecer a subordinação da Administração à lei”.

Sérvulo Correia em “Legalidade e autonomia contratual nos contratos administrativos”, Almedina, edição de 1987, página 479, fala em concreto na “discricionariedade de decisão” como a opção legislativa de “deixar ao órgão titular do poder a decisão sobre se determinados efeitos preditos pela norma serão ou não produzidos no caso concreto”.

Finalizando este intróito como Eduardo García Enterría, Civitas “La lucha contra las immunidades del poder”, Civitas, edição de 1995, página 36: “O que há-de estar suficientemente esclarecido é que não se pode tratar a discricionariedade ou o mérito administrativo como círculos de imunidade de poder. Toda e qualquer actuação estatal, inclusive a discricionária, está sujeita à ordem jurídica e, assim, ao controle jurisdicional da observância de tal submissão”.

No caso, a opção pelo preço mais baixo por lotes e não por bens não se afigura desvirtuar a concorrência, só por si.

As empresas concorrentes se sabem, à partida, que a proposta seleccionada será a que oferecer melhor preço por lote e não por bem, farão os seus cálculos por bem ou por lote mas sempre tendo em vista oferecer o melhor preço por lote.

Com o que se garante a concorrência, a transparência e a igualdade no concurso.

O problema surge – e aqui a Recorrente tem razão – apenas no que toca à composição dos lotes, conjugada com as especificações técnicas dos bens.

O respeito (ou não) pelo princípio da concorrência prende-se com a substância do acto, com a sua validade substancial e não formal, pelo que não pode ser avaliado em abstracto ou formalmente mas em concreto e em substância.

Mais: se em concreto se verifica a eliminação da concorrência, é porque essa possibilidade se verificava já em abstracto e à partida. E basta a mera possibilidade de eliminação de concorrência para, salvo circunstância excepcional que o justifique, a regra do concurso ser ilegal.

E à Administração não basta ser imparcial, tratando, nos concursos, de forma igual os concorrentes: precisa também de o parecer.

No caso mais específico da constituição de lotes, em abstracto, constituiu um resultado normal, expectável, que quanto maior for o número de bens de um lote, com as especificações próprias de cada bem, cada vez menor seja o número de empresas que possa satisfazer todas as exigências cumuladas de todos os bens do lote.

Em concreto, a Entidade Demandada resolveu criar um lote de 8 produtos e, à parte, colocou outro produto.

No lote de 8 bens incluiu um bem, o «Protóxido de azoto medicinal – garrafa 3,0L a 5,0L – código P1140» que apenas dois concorrentes podem fornecer – a AL... e PRAXAIR (ponto J) dos factos provados).

E inclui no mesmo lote outro bem, os dois recipientes criogénicos de oxigénio, um com a capacidade de cerca de 7.500 metros cúbicos e outro com a de 3.000 metros cúbicos, que apenas uma concorrente, a AL... pode fornecer.

Como resultado para o lote maior, de 8 bens, apenas uma empresa está em condições de ver o contrato adjudicado.

Objectivamente foi eliminada a concorrência.

Não foram eliminados todos os concorrentes: ficou uma empresa em condições de satisfazer as exigências relativas a todos os bens desse lote.

Assim como ficou apenas uma empresa que apresentou uma proposta válida para o lote 2, com um bem, a Autora, ora Recorrente (facto provado sob a alínea V).

O que afronta o disposto no artigo 49º do Código dos Contratos Públicos que determina que as especificações técnicas “são fixadas por forma a permitir a participação dos concorrentes em condições de igualdade e a promoção da concorrência”.

Maior restrição só seria possível no caso concreto com a constituição de um único lote.

Mas essa levaria à exclusão de todos os concorrentes, pois para o “lote” 2, com o item 9, apenas a ora Autora apresentou uma proposta que satisfazia os requisitos exigidos, enquanto para lote 1, com os outros 8 bens, apenas a AL... apresentou uma proposta válida.

Convenhamos que é demasiada coincidência que uma empresa satisfaça todas as exigências respeitantes às características dos bens de um lote e apenas uma empresa os satisfaça.

Ora para uma situação objectiva de eliminação da concorrência, e perante o pedido de esclarecimentos de uma candidata, a ora Autora e Recorrente, que estava a ver-se preterida (para o lote maior), a única fundamentação apresentada no processo administrativo para esta opção é a que ficou consignada na Acta número Um:

“A ULSNA, EPE, é livre de fazer os grupos e lotes como bem entender.”

(Resposta à questão 2 da A... – documento nº 6 da petição inicial).

Numa área de discricionariedade, esta fundamentação não basta e não justifica, claramente, a restrição feita através do mecanismo de junção de um único lote de 8 bens de um conjunto de 9.

Por outro lado, se o Tribunal é livre de apreciar os factos e fazer destes a leitura que entende por adequada para correcto enquadramento jurídico, não pode substituir-se à Administração na fundamentação dos actos desta.

A justificação da formação do lote 1 tal com foi feita, com 8 bens, para assegurar a boa operacionalidade dos serviços, apresentada na decisão recorrida, não é uma justificação que conste do procedimento administrativo nem se pode tirar como leitura necessária dos elementos desse procedimento.

A operacionalidade dos serviços, dependendo dos serviços que pretendem o abastecimento dos bens postos a concurso, pode bastar-se com o abastecimento garantido em simultâneo de dois ou três bens, por exemplo.

A Entidade que lançou o concurso devia justificar de forma cabal, precisamente por estar numa área de discricionariedade e, objectivamente, estar a restringir a concorrência, qual a razão de ser de optar por dois lotes, um com 8 bens e outro com 1.

O mesmo se diga relativamente à definição da capacidade dos recipientes criogénicos estabelecidos na alínea i) do n.º 1 da Cláusula 17ª do Caderno de Encargos, em que é exigido o fornecimento e colocação de dois recipientes criogénicos de oxigénio, um com a capacidade de cerca de 7.500 metros cúbicos e outro com a de 3.000 metros cúbicos.

A justificação, constante da decisão recorrida, da “racionalização de meios a aquisição de bens/artigos da mesma natureza” com repercussão necessária no funcionamento daqueles serviços de saúde – saliente-se – e em todos os demais inerentes” não surge nos instrumentos do concurso, onde deviam constar, em obediência ao princípio da transparência.

E não resultam também dos elementos do procedimento pois de nenhum se pode extrair a conclusão necessária de que a divisão em dois lotes, um com 8 bens e outro com um, era a única que satisfazia esse desiderato.

Mas objectivamente teve como resultado deixar uma empresa – e apenas uma – em condições de poder celebrar o contrato relativamente a cada um dos lotes.

De onde se concluir terem sido violadas, nas peças procedimentais em apreço, as normas invocadas pela Autora e acima citadas.

Também por esta via procede a acção e, logo, o recurso.


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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em:

1. CONCEDER PROVIMENTO ao primeiro recurso jurisdicional, do despacho que alterou o valor da acção, pelo que revogam este despacho e fixam à acção o valor indicado pela Autora na petição inicial, de 30.000,01 € (trinta mil euros e um cêntimo).

Não são devidas custas neste recurso por não terem sido apresentadas contra-alegações.

2. CONCEDER PROVIMENTO ao segundo recurso jurisdicional, pelo que revogam a sentença recorrida e julgam a acção procedente.

Custas deste recurso pelas Recorridas, Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, E.P.E. e a Contra-Interessada AL... MEDICINAL, S.A..


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Porto, 04.11.2016
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Hélder Vieira, em substituição
Ass.: Alexandra Alendouro