Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00684/17.0BECBR-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/30/2020
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Luís Migueis Garcia
Descritores:MODIFICAÇÃO DA INSTÂNCIA. ASSÉDIO MORAL.
Sumário:I) – “Quando, na pendência de processo de impugnação de ato que tenha determinado a imposição de deveres, encargos, ónus ou sujeições, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos, for proferido ato com o alcance de sanar os efeitos do ato impugnado, o autor pode requerer a anulação dos efeitos lesivos produzidos por aquele ato durante o período de tempo que precedeu a respetiva sanação.” – art.º 64º, nº 6, do CPTA; se o novo acto não tem esse alcance de sanação, não cabe essa faculdade.

II) – “Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.” – art.º 29º, nº 2, do CT; se não há tal objectivo ou efeito, não há assédio.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:S.
Recorrido 1:Instituto Politécnico (...)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:

S. (R. (…)), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra em acção administrativa intentada contra Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico (...) e Instituto Politécnico (...) (R. (…)),

Conclui:

I. Os novos atos praticados, após anulação dos atos administrativos impugnados, enquadram-se no artigo 173º, nº 3, do CPA, pois pensamos estar perante uma substituição do ato anulado por outro do mesmo conteúdo, porquanto estava em causa o ato de distribuição do serviço de docente e o ato de aplicação à Recorrente do Regulamento do Horário de Trabalho não docente que foram substituídos por outros atos sem as invalidades que inicialmente feriam estes atos impugnados, ou seja, substituindo por outro que efetivamente distribui serviço à Recorrente e por outro que desaplica aquele Regulamento;
II. Os atos substituídos impunham deveres e restrições à Recorrente, nomeadamente a restrição de exercício da profissão e o dever de sujeição a um horário de trabalho não correspondente com a função de docente desempenhada, tendo causado efeitos lesivos que a sua anulação não sanou, nomeadamente o encurtamento do tempo de período experimental em exercício efetivo de funções para a aquisição das valências necessárias;
III. Nessa medida, deverá considerar-se estarmos perante uma situação do artigo 173º, nº 3, do CPA e, como ensina LUIZ S. CABRAL MONCADA, ob. cit., p. 624, de acordo com o nº 3, se o acto substituído for desfavorável aos interessados por lhes impor deveres, ónus, encargos ou sujeições, a renovação do ato não impede a destruição administrativa (ou judicial) retroactiva dos efeitos gerados antes da substituição do acto nem, acrescentaríamos, um pedido de indemnização por responsabilidade civil extracontratual da Administração por acto ilícito pelos danos produzidos durante esse período anterior à substituição» - no mesmo sentido veja-se o comentário de ELIANA ALMEIDA PINTO, ISABEL SILVA e JORGE COSTA, Juízes de Círculo, Código de Procedimento Administrativo Comentado, Quid Juris, 2018, Lisboa, p. 432, que, em comentário ao nº 3 do artigo 173º referem que este preceito admite «(…) a possibilidade de, além da destruição retroativa dos efeitos por aquele entretanto produzidos, os interessados podem ser indemnizados por responsabilidade civil extracontratual da Administração por ato ilícito, caso o ato substituído tenha gerado»;
IV. Caso assim não se entenda, isto é, caso se entenda que os atos que vieram substituir os atos impugnados não se enquadram em nenhuma das situações do artigo 164º, nº 5, e do artigo 173º, nº 3, do CPA, por não serem atos sanatórios com o mesmo conteúdo dos atos substituídos, entendemos que deverá fazer-se uma interpretação extensiva do preceito constante do artigo 64º, nº 6, do CPTA – para abranger não só aquelas situações mas situações semelhantes à da Recorrente –, nomeadamente uma interpretação conforme a Constituição, uma vez que a não aplicação do preceito ao caso violará, de forma clara, o princípio da tutela jurisdicional efetiva, pois impede a Recorrente de anular os efeitos lesivos do ato ou substituir tal anulação por um pedido indemnizatório, caso tal anulação não seja possível, sendo que em relação a este último pedido, obriga a que a Recorrente intente nova ação para o efeito;
V. Haverá, assim, uma interpretação inconstitucional do artigo 64º, nº 6, do CPTA, por violação do artigo 20º e 268º, nº 4, do CRP, que impõe, nas palavras de GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4ª Edição Revista, Coimbra Editora, 2006, Coimbra, p. 416, “ (…) uma compreensão unitária da relação entre direitos materiais e direitos processuais, entre direitos fundamentais e organização e processo de protecção e garantia”;
VI. Procura-se, assim, também, que a parte que recorre aos tribunais não se tenha que desdobrar em múltiplos processos, com as suas naturais delongas, para ver o seu direito efetivamente reconhecido, referindo aqueles constitucionalistas, em relação à justiça administrativa, a «(…) prevalência da decisão de fundo sobre a mera decisão de forma e com a adopção do princípio da adequação formal (cfr. Cód. Proc. Civil, art. 265º2)» bem como a «adopção de decisões que julguem adequadamente todas as pretensões dos particulares dirigidas à defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos»;
VII. Concretamente em relação aos deveres do juiz da causa e ao artigo 268º, nº 4, face a este direito à tutela jurisdicional efetiva, ensina GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª Edição, 20ª Reimpressão, Almedina, 2003, Coimbra, p. 503, «[o] facto de se tratar de uma imposição legiferante não significa que o juiz não possa aplicar directamente este preceito interpretando o direito ordinário em conformidade com a Constituição. Isso terá desde logo relevância prática: (1) na desaplicação por inconstitucionalidade de normas erguidas como impedimento legal a uma protecção adequada de direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares; (2) na formatação judicial constitucionalmente adequada de instrumentos processuais existentes (..)» (o sublinhado é nosso);
VIII. Ou seja, in casu, perante uma situação de anulação de ato e substituição por um novo ato que se entenda não se enquadrar nos artigos 164º, nº 5, e 173º, nº 3, do CPA, deveria a douta sentença recorrida ter aplicado o instrumento processual previsto no artigo 64º, nº 6, do CPTA, por forma a não deixar desprotegidos os direitos e interesses legais da Recorrente, não a obrigando a intentar nova ação administrativa, multiplicando os meios necessários à sua pretensão única com os correspondentes custos que lhe estão adjacentes, para ver a totalidade da sua pretensão satisfeita;
IX. A entender-se, ainda, não ser possível a interpretação extensiva ora defendida e conforme a constituição, o que também não se concede, então deverá considerar-se estarmos perante uma lacuna do legislador e, perante a mesma, nos termos do disposto no artigo 10º, nº 1, do Código Civil, regulá-la pela lei aplicável aos casos análogos;
X. No caso sub judice é possível perceber que as situações previstas nos artigos 164º, nº 4, e 173º, nº 3, do CPA, são semelhantes à da Recorrente, no sentido em que, colocando a hipótese de não serem iguais, as semelhanças são mais relevantes que as diferenças e que, por isso, deverá ser aplicável o regime do artigo 64º, nº 6, do CPTA;
XI. Para além do erro de julgamento quanto à aplicabilidade do artigo 64º, nº 6, do CPTA, considera a Recorrente que a douta sentença recorrida incorreu também em erro de julgamento quanto à ilegalidade dos novos atos impugnados por constituírem assédio moral, ao considerar que «não caberá ao Tribunal sindicar, de fundo, a bondade ou conveniência da justificação apresentada para manter o exercício de funções ao sábado, de modo contínuo, já que tal está reservado ao domínio da atividade discricionária da Administração, salvo casos de erro manifesto ou ilegalidade grosseira, o que não ocorre in casu» e que «à luz da factualidade assente, no 2º semestre do ano letivo de 2017/2018, também ao docente C. foi atribuído um horário em que o mesmo leciona a unidade curricular de Análise Matemática II aos sábados, de modo contínuo (cfr. Ponto 33 dos factos provados), pelo que não é a A. a única docente do IPG sem horário rotativo aos sábados»;
XII. A deliberação de 02.02.2018, do Conselho Técnico Científico (CTC) determinou a distribuição do serviço docente para o 2º semestre do ano letivo de 2017/2018, resultando esta distribuição na lecionação, por parte da Recorrente, de aulas ao sábado, sem rotatividade, nos períodos da manhã e da tarde;
XIII. Interpelada em 21.02.2018 a sugerir alterações ao horário ainda provisório a Recorrente de imediato solicitou as mesmas sugerindo substituir o sábado por quinta e sexta notando que os demais colegas usufruíam de horários rotativos ao sábado, cf. Ponto 30 dos factos dados como provados pela douta sentença recorrida, pretensão que foi negada com fundamento na «disponibilidade dos alunos trabalhadores estudantes».
XIV. Ora, a douta sentença recorrida não atenta às regras do ónus da prova no contexto da invocação do assédio moral com intuito discriminatório, constante do artigo 25º, nº 5, do Código do Trabalho, no sentido do douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 01.06.2017, proferido no âmbito do processo nº 816/14.0T8LSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt;
XV. Nessa medida, tendo fundamentado a Entidade Recorrida a atribuição de tal horário na conciliação com o horário dos trabalhadores estudantes bem como na existência de um outro docente com igual horário ao sábado, sem rotatividade, não podia a douta sentença recorrida, sem mais, considerar tal se enquadrar no âmbito da discricionariedade decisória da Administração Pública, exigindo que tal fundamentação fosse devidamente provada, para que pudesse afastar a imputação da existência de assédio moral contra a Recorrente com fundamento em discriminação;
XVI. Assim, considerando o enquadramento legal do assédio moral, tinha a Entidade Pública que provar (i) o horário proposto pela Recorrente ou outro equivalente com exclusão do sábado era impossível de concretizar em parte ou no todo por conciliação de interesses dos intervenientes e que era o horário que melhor se conciliava com os trabalhadores estudantes; (ii) e ainda que os alegados trabalhadores estudantes usufruíam efetivamente do estatuto de trabalhador estudante por se terem inscrito de forma comprovada como tal; e ainda que (iii) os factos que demonstram que ao outro docente foi distribuído o horário nas mesmas circunstâncias;
XVII. Note-se, em relação a este último aspeto, que não basta referir que há outro docente, pois o horário pode ter sido atribuído porque o mesmo o solicitou, por ser mais conveniente para a gestão da sua vida pessoal, familiar e profissional, ou por outro motivo distinto, mas que terá a potencialidade de o colocar em diferentes circunstâncias em relação à situação da Recorrente;
XVIII. Além disso sempre a Recorrente poderia ter sido incluída nos horários rotativos ao sábado com as duas docentes já neste regime que lecionavam Unidades Curriculares ao ano da Recorrente pelo que, houve efetiva discriminação em relação às docentes do ano da licenciatura da Recorrente;
XIX. A ausência de justificação da não inclusão na rotação acentua a existência da discriminação, bem como fere o ato de ilegalidade por violação do dever de fundamentação;
XX. A apreciação da existência de assédio moral não poderia ser analisada somente em relação aos novos atos impugnados, mas também em articulação com os atos que foram substituir, aliado ao processo disciplinar e, por isso, a sentença recorrida não podia concluir simplesmente pela inexistência de assédio moral considerando o exercício do poder disciplinar como um acto isolado, pois, para a análise e conclusão pela existência ou não de assédio moral, todos os factos teriam de ser considerados no seu conjunto;
XXI. A douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento quando considera que não se verifica o vício da falta de fundamentação, afirmando que «do teor da ata da reunião do CTC da ESTG do IPG de 02/02/2018, na qual foi aprovada a distribuição do serviço docente para o 2º semestre do ano letivo de 2017/2018, é possível compreender plenamente as razões subjacentes à decisão assim tomada, o mesmo se podendo afirmar no que respeita à informação prestada sobre a viabilidade das pretensões da docente quanto à definição do horário definitivo para o 2º semestre de 2017/2018 (cf. Pontos 27 e 31 dos factos provados)»;
XXII. Em 16.01.2018, em reunião da Área Disciplinar de Engenharia Civil foi aprovada por votação uma distribuição de serviço docente à Recorrente que incluía uma unidade curricular de Infraestruturas Hidráulicas e Recursos Hídricos do curso de Engenharia Topográfica, uma unidade curricular de Implantação de Obras de Engenharia Civil do Curso de Licenciatura em Engenharia Topográfica e uma unidade curricular de Arquitetura e Design dos cursos de Gestão Hoteleira e Restauração e Catering, cf. Ponto 23 dos factos dados como provados pela douta sentença recorrida.
XXIII. Em 29.01.2018, em reunião da Unidade Técnico Científica de Engenharia e Tecnologia foi aprovada por votação uma distribuição de serviço docente à Recorrente que incluía uma unidade curricular de Infraestruturas Hidráulicas e Recursos Hídricos, uma unidade curricular de Implantação de Obras de Engenharia Civil, uma unidade curricular de Arquitetura e Design e ainda uma unidade curricular de Ambiente e Recursos Naturais, cf. ponto 26 dos factos dados como provados pela douta sentença recorrida.
XXIV. Esta proposta foi aprovada por Deliberação do CTC de 02.02.2018 (cf. Ponto 27 dos factos dados como provados pela douta sentença recorrida), que, porém, é ilegal por violar o dever de fundamentação imposto pelo nº 3 do artigo 268º da CRP, pelo artigo 152º, nº 1, alínea a), do CPA, e, concretamente em relação à distribuição de serviço letivo do Instituto Politécnico (...), pelo artigo 7º, nº 7, do Regulamento nº 400/2016, publicado em Diário da República, 2ª Série, nº 79, de 22 de abril de 2016, que determina que «[p]or norma, um docente não deve ministrar, em cada semestre, mais do que três unidades curriculares com conteúdos programáticos significativamente diferentes, podendo, fundamentada e excecionalmente, este limite ir até às 4 unidades curriculares»;
XXV. No caso sub judice, muito embora se refira que existe necessidade excecional na lecionação da Unidade Curricular de Arquitetura e Design, por força da baixa do Professor J., não é possível compreender o iter cognoscitivo da decisão que levou à atribuição de 4 unidades curriculares em detrimento das 3 inicialmente propostas (e que são a regra imposta pelo já mencionado nº 7 do artigo 7º do Regulamento), sendo que na referida ata não é feita alusão à unidade curricular de Infraestruturas Hidráulicas e Recursos Hídricos. Seria até difícil justificar porque é que se distribuía a unidade curricular de infraestruturas hidráulicas e recursos hídricos para a qual não era possível requisitar para a Recorrente formação continuada atempadamente (a Recorrente iria lecionar a Unidade Curricular uma semana depois), cf. ponto 26 dos factos dados como provados pela douta sentença recorrida;~
XXVI. Efetivamente, a excecionalidade dessa atribuição tem de ser necessariamente fundamentada com a impossibilidade de outros professores lecionarem estas Unidades, nomeadamente por impossibilidade pessoal (como por exemplo a baixa médica) ou porque os mesmos já lecionam no limite de carga horária máxima anual ou porque aos mesmos foi distribuído o mesmo número de unidades curriculares sendo que porventura haveria até professores com possibilidade de acomodar mais uma unidade curricular sem exceder o limite normal de três unidades curriculares diferenciadas ou de partilhar a unidade curricular porque já a lecionavam. De outra forma, fica-se sem saber se há docentes que tenham a possibilidade de abarcar mais uma Unidade Curricular, sem exceder o limite imposto pelo nº 7 do artigo 7º do Regulamento ou o limite de horas previsto no nº 1 do referido artigo 7º, o que, implica, necessariamente, uma carência de fundamentação que, repete-se, no caso é devida de forma acrescida;
XXVII. Face ao exposto, a douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento quando decide que do teor da ata de 02.02.2018 «é possível compreender plenamente as razões subjacentes à decisão assim tomada, o mesmo se podendo afirmar no que respeita à informação prestada sobre a viabilidade das pretensões da docente quanto à definição do horário definitivo para o 2º semestre de 2017/2018»;
XXVIII. Deste modo, e face a todo o exposto, não subsistem dúvidas que a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo sofre de erro de julgamento nas três vertentes indicadas, devendo ser, como tal, substituída por outra que decrete o prosseguimento da ação tendo em vista a anulação dos efeitos lesivos produzidos pelos atos impugnados, nos termos do disposto no artigo 64º, nº 6, do CPTA e a procedência da ação quanto à impugnação dos novos atos proferidos na sua pendência, ao abrigo do artigo 64º, nº 1, do CPTA, com fundamento na ilegalidade por constituírem assédio moral e por padecerem do vício de falta de fundamentação.

Contra-alegaram os recorridos, tirando em conclusões:

PRIMEIRA – Não ocorrem as ilegalidades, nem a nulidade, nem os vícios formais apontados pela recorrente à douta sentença de 1ª instância.
SEGUNDA – Por consequência, por judiciosa e ponderada, dever-se-á manter nos seus precisos termos, assim se fazendo
JUSTIÇA.
*
A Exmª Procuradora-Geral Adjunta, notificada nos termos do art.º 146º do CPTA, não emitiu parecer.
*
Dispensando vistos, cumpre decidir.
*
Na compreensão da ordem de segmentação quanto ao que foi decidido e agora sob recurso, situemos o que foi desenvolvimento da lide:
– em original pretensão a autora intentou a acção pedindo que fossem declarados nulos ou anulados actos consubstanciados nas deliberações do Conselho Técnico-Científico da ESTG de 26/07/2017, 15/09/2017 e 29/09/2017, que não lhe atribuíram qualquer carga horária lectiva para o ano lectivo de 2017/2018, bem como nos despachos do Presidente do IPG de 16/10/2017 e 19/10/2017, que determinaram a aplicação à A. do Regulamento do Horário de Trabalho do pessoal não docente e a obrigatoriedade de registar a sua permanência nas instalações do IPG no período compreendido entre as 8.30 e 18.30 horas de cada dia útil;
– já na pendência da presente ação, veio a ser proferido despacho, em 12/12/2017, pelo Presidente do IPG, que determinou a anulação, entre outros, dos seus despachos de 16/10/2017 e 19/10/2017, que impunham a sujeição da A. ao Regulamento do Horário de Trabalho do pessoal não docente; bem assim proferida deliberação, pelo Conselho Técnico-Científico (CTC) da ESTG, em 14/12/2017, que aprovou a anulação das deliberações do mesmo CTC, tomadas em 26/07/2017, 15/09/2017 e 29/09/2017, na parte em que não atribuíram à A. qualquer carga horária lectiva para o ano lectivo de 2017/2018; bem como foi proferido despacho, em 14/12/2017, pelo Presidente do IPG, que determinou a anulação dos despachos de homologação das referidas deliberações do CTC, na parte em que se referem à não atribuição à A. de serviço docente em 2017/2018; e em reunião do dia 02/02/2018, o CTC da ESTG deliberou a atribuição à A. de 10 horas letivas para o 2.º semestre do ano de 2017/2018, tendo-lhe sido fixado, em consequência, um novo horário, considerando a distribuição de serviço docente efectuada;
– ao que o tribunal “a quo” deixou de apreciar mérito quanto ao que em primeiro estava em objecto, mas simultaneamente acolhendo a prossecução dos autos para impugnação dos novos actos proferidos na sua pendência, ao abrigo do art.º 64.º, n.º 1, do CPTA;
– vindo a julgar a acção improcedente.
Vejamos.
Ø Sobre a modificação da instância
O discurso fundamentador do julgado:
«(…)
Da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide e do pedido de prosseguimento da ação para efeitos de anulação dos efeitos lesivos produzidos pelos atos inicialmente impugnados e para efeitos de impugnação dos novos atos administrativos praticados na sua pendência (art.º 64.º, n.os 1 e 6, do CPTA):
Na petição inicial apresentada em juízo, a A. veio pedir a declaração de nulidade ou anulação das deliberações do Conselho Técnico-Científico da ESTG de 26/07/2017, 15/09/2017 e 29/09/2017, que não lhe atribuíram qualquer carga horária letiva para o ano letivo de 2017/2018, bem como dos despachos do Presidente do IPG de 16/10/2017 e 19/10/2017, que determinaram a aplicação à A. do Regulamento do Horário de Trabalho do pessoal não docente e a obrigatoriedade de registar a sua permanência nas instalações do IPG no período compreendido entre as 8.30 e 18.30 horas de cada dia útil.
Sucede que, já na pendência da presente ação, veio a ser proferido despacho, em 12/12/2017, pelo Presidente do IPG, que determinou a anulação, entre outros, dos seus despachos de 16/10/2017 e 19/10/2017, que impunham a sujeição da A. ao Regulamento do Horário de Trabalho do pessoal não docente (cfr. doc. de fls. 157 do processo físico).
Mais resulta dos autos que veio a ser proferida deliberação, pelo Conselho Técnico-Científico (CTC) da ESTG, em 14/12/2017, que aprovou a anulação das deliberações do mesmo CTC, tomadas em 26/07/2017, 15/09/2017 e 29/09/2017, na parte em que não atribuíram à A. qualquer carga horária letiva para o ano letivo de 2017/2018, bem como foi proferido despacho, em 14/12/2017, pelo Presidente do IPG, que determinou a anulação dos despachos de homologação das referidas deliberações do CTC, na parte em que se referem à não atribuição à A. de serviço docente em 2017/2018 (cfr. docs. de fls. 159, no verso, a 163 do suporte físico do processo). Acresce que, em reunião do dia 02/02/2018, o CTC da ESTG deliberou a atribuição à A. de 10 horas letivas para o 2.º semestre do ano de 2017/2018, tendo-lhe sido fixado, em consequência, um novo horário, considerando a distribuição de serviço docente efetuada (cfr. docs. de fls. 166, no verso, 167 e 206, no verso, a 209 do suporte físico do processo).
É, pois, com base na sucessão de atos acima descrita que os RR. vêm pugnar pela inutilidade da lide, considerando que os atos aqui sindicados já foram anulados, e que a A. vem requerer o prosseguimento da ação nos termos do art.º 64.º, n.os 1 e 6, do CPTA.
Vejamos.
Segundo o art.º 64.º, n.º 6, do CPTA, “quando, na pendência de processo de impugnação de ato que tenha determinado a imposição de deveres, encargos, ónus ou sujeições, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos, for proferido ato com o alcance de sanar os efeitos do ato impugnado, o autor pode requerer a anulação dos efeitos lesivos produzidos por aquele ato durante o período de tempo que precedeu a respetiva sanação”.
A situação dos autos não se enquadra, porém, a nosso ver, no normativo citado.
Trata-se, aqui, da previsão de um mecanismo processual de modificação da instância adaptado aos regimes de direito substantivo que decorrem do n.º 5 do art.º 164.º e do n.º 3 do art.º 173.º do CPA. Ou seja, estão abrangidas no n.º 6 do art.º 64.º do CPTA quer as situações de sanação resultantes da prática dos atos de sanação previstos no art.º 164.º do CPA (ratificação, reforma ou conversão), quer as situações de renovação sanatória a que se refere o art.º 173.º, n.º 3, do CPA, que têm como pressuposto a substituição do ato administrativo anulável por um ato válido com o mesmo conteúdo. Em suma, o que o n.º 6 do art.º 64.º do CPTA permite é a prossecução do processo quando o ato impugnado tenha sido objeto de um ato com alcance sanatório (ratificação, reforma ou conversão, ou, ainda, renovação sanatória) (cfr., neste sentido, M. Aroso de Almeida e C. A. Fernandes Cadilha, Comentário a Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª ed., Almedina, 2017, pp. 445-448).
Ora, os novos atos administrativos praticados na pendência da presente ação – que anularam os atos originariamente impugnados e que deram nova regulação à situação da A. – não configuram atos com alcance sanatório dos atos anteriormente praticados (e visados inicialmente nestes autos), pelo que a pretensão da A. no sentido do prosseguimento da ação para anulação dos efeitos lesivos produzidos pelos atos impugnados (e entretanto anulados e substituídos por outros) não pode ter acolhimento, por não se enquadrar na previsão contida no art.º 64.º, n.º 6, do CPTA.
Solução diferente merece o requerimento de prossecução dos autos para impugnação dos novos atos proferidos na sua pendência, ao abrigo do art.º 64.º, n.º 1, do CPTA.
Com efeito, dispõe este preceito que, “quando, na pendência do processo, o ato impugnado seja objeto de anulação administrativa acompanhada ou sucedida de nova regulação, pode o autor requerer que o processo prossiga contra o novo ato com fundamento na reincidência nas mesmas ilegalidades, sendo aproveitada a prova produzida e dispondo o autor da faculdade de oferecer novos meios de prova”.
É, precisamente, o que sucede no caso concreto.
Como vimos, os despachos de 16/10/2017 e 19/10/2017, que impunham a sujeição da A. ao Regulamento do Horário de Trabalho do pessoal não docente, foram objeto de anulação, em 12/12/2017, por despacho do Presidente do IPG. Também as deliberações do mesmo CTC, tomadas em 26/07/2017, 15/09/2017 e 29/09/2017, na parte em que não atribuíram à A. qualquer carga horária letiva para o ano letivo de 2017/2018, foram anuladas por deliberação do CTC da ESTG de 14/12/2017.
Na sequência da anulação de tais atos e deliberações, o CTC da ESTG veio a deliberar, em reunião do dia 02/02/2018, a atribuição à A. de 10 horas letivas para o 2.º semestre do ano de 2017/2018, tendo-lhe sido fixado, em consequência, um novo horário, considerando a distribuição de serviço docente efetuada.
É contra estes últimos atos – atribuição de carga letiva e definição de novo horário – que a A. pretende que o processo prossiga, já que a sua pretensão inicial perdeu utilidade e razão de ser, tendo os atos impugnados sido objeto de anulação administrativa. Alega, com efeito, a A. que tais atos enfermam das mesmas ilegalidades apontadas aos atos inicialmente impugnados, como também lhe impõem que preste trabalho docente todos os sábados, sem ter em consideração a sua disponibilidade familiar e sendo a única docente do IPG sem horário rotativo aos sábados, constituindo, por isso, práticas suscetíveis de consubstanciarem assédio moral. Pugna, assim, pela declaração de nulidade ou anulação destes novos atos, com a consequente revisão do seu horário em condições de igualdade com os seus pares.
Por conseguinte, considerando que a pretensão de prossecução dos autos para impugnação dos novos atos proferidos na sua pendência tem cobertura legal, nos termos do art.º 64.º, n.º 1, do CPTA, defere-se o assim requerido, pelo que o presente processo prosseguirá para conhecimento das ilegalidades apontadas a tais atos.
Fica, por outro lado, forçosamente prejudicada a questão da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, atendendo a que os autos vão prosseguir nos termos e com os fundamentos acima expostos.
(…)»
O comando legal:
Artigo 64.º
Anulação administrativa, sanação e revogação do ato impugnado com efeitos retroativos
1 - Quando, na pendência do processo, o ato impugnado seja objeto de anulação administrativa acompanhada ou sucedida de nova regulação, pode o autor requerer que o processo prossiga contra o novo ato com fundamento na reincidência nas mesmas ilegalidades, sendo aproveitada a prova produzida e dispondo o autor da faculdade de oferecer novos meios de prova.
2 - O requerimento a que se refere o número anterior deve ser apresentado no prazo de impugnação do ato anulatório e antes do trânsito em julgado da decisão que julgue extinta a instância.
3 - O disposto no n.º 1 é aplicável a todos os casos em que o ato impugnado seja, total ou parcialmente, alterado ou substituído por outro com os mesmos efeitos, e ainda no caso de o ato anulatório já ter sido praticado no momento em que o processo foi intentado, sem que o autor disso tivesse ou devesse ter conhecimento.
4 - Se o ato anulado pela Administração na pendência do processo só vier a ser substituído por outro após a extinção da instância, o interessado pode requerer, dentro do prazo de impugnação contenciosa, a reabertura do processo contra o novo ato com fundamento na reincidência nas mesmas ilegalidades, sendo aproveitada a prova produzida e dispondo o autor da faculdade de oferecer novos meios de prova.
5 - O disposto nos números anteriores é também aplicável aos casos de revogação do ato com efeitos retroativos.
6 - Quando, na pendência de processo de impugnação de ato que tenha determinado a imposição de deveres, encargos, ónus ou sujeições, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos, for proferido ato com o alcance de sanar os efeitos do ato impugnado, o autor pode requerer a anulação dos efeitos lesivos produzidos por aquele ato durante o período de tempo que precedeu a respetiva sanação.
Na situação, perante revogação(ões) anulatória(s), foram suprimidos efeitos dos actos inicialmente impugnados.
Não estamos “perante uma substituição do ato anulado por outro do mesmo conteúdo”, com toda a notoriedade bem diferenciados, não se percebendo como a recorrente possa ter outra percepção.
Ainda que a recorrente rejeite que “os atos que vieram substituir os atos impugnados não se enquadram em nenhuma das situações do artigo 164º, nº 5, e do artigo 173º, nº 3, do CPA, por não serem atos sanatórios com o mesmo conteúdo dos atos substituídos”, nada se alcança de sua argumentação que demonstre nesses novos actos um “alcance sanatório”, como bem na decisão recorrida se supôs como necessário à adopção de outra solução.
Não há que proceder a uma interpretação extensiva (em que apesar de não vertido na letra da lei, o sentido da disposição mostra que a regulamentação jurídica recolhe o caso) do art.º 64º, n.º 6, do CPTA, a modos de abarcar a situação procurada pela recorrente, pois isso seria negar o sentido lógico da norma, que exige que os novos actos estejam prenhes do apontado “alcance sanatório”; nem há que recorrer à proposta analogia para suprir lacuna, pois que, como ensinou Ferrara (Interpretação e Aplicação das Leis, tradução de M. Andrade, 2.ª ed., pág. 160) para se recorrer à analogia, é necessário faltar uma precisa disposição da lei para o caso a decidir, que portanto a questão não se encontre já regulada por uma norma de direito, e no caso essa regulamentação existe, amadurecida numa disciplina própria.
Sendo de falso passo que o assim visto “impede a Recorrente de anular os efeitos lesivos do ato”, e sem legítimo queixume o não “substituir tal anulação por um pedido indemnizatório, caso tal anulação não seja possível, sendo que em relação a este último pedido, obriga a que a Recorrente intente nova ação para o efeito”; quando tais efeitos (já) se encontram destruídos; e perante o paradoxal que seria quando, deixando de se deixar de apreciar a título principal as originais pretensões impugnatórias, houvesse que enveredar em mesmo âmbito de discussão a título incidental de suporte a pedido indemnizatório que nunca foi accionado, quando poderia, não sendo obstáculo desproporcionado à tutela que a recorrente haja que intentar acção para o efeito, não tendo de se “desdobrar em múltiplos processos” para uma pretensão que, de uma ou outra forma, num só processo tem lugar, não deixando “desprotegidos os direitos e interesses legais da Recorrente”, quando ao dispor de meio para julgando adequado ao seu mérito, em conformidade constitucional ao direito à tutela jurisdicional efetiva; “Os direitos à tutela jurisdicional efetiva e a um processo justo, imparcial e equitativo não impedem a definição pelo legislador dos meios de tutela jurisdicional, daquilo que são as suas regras em termos de tramitação, dos poderes e dos ónus que recaem sobre as partes e dos poderes e deveres do julgador, não resultando dos direitos em referência a atribuição aos sujeitos processuais de um direito a poderem, livremente e de modo irrestrito, socorrer-se de todo e qualquer meio processual que considerem adequado para a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, nem que estejam desonerados do respeito pelas regras que, sendo equilibradas e proporcionais, contenham deveres e ónus processuais e/ou que estejam isentos das consequências que derivem do seu incumprimento” (Ac. do STA, de 11-07-2019, proc. n.º 01403/18.0BELSB).
Ø Sobre o julgamento dos novos actos
Em termos factuais, julgou-se provado:
1) A A. exerce, desde 28/07/2016, funções docentes na categoria de Professora Adjunta na Escola Superior de Tecnologia e Gestão (ESTG) do Instituto Politécnico (...) (IPG), ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, com período experimental de cinco anos, nos termos das disposições conjugadas dos n.os 7 e 8 do art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31/08, na redação dada pelo art.º 3.º da Lei n.º 7/2010, de 13/05 (cfr. doc. de fls. 86 a 89 do suporte físico do processo).
2) Do contrato de trabalho que a A. celebrou com o R. IPG em 02/02/2017, com efeitos a 28/07/2016, constam, entre outras, as seguintes cláusulas:
“Cláusula 2.ª: Atividade Contratada
1. - Constitui objeto do presente contrato por tempo indeterminado o desempenho pelo Segundo Outorgante, sob a autoridade e direção do Primeiro Outorgante, e sem prejuízo da autonomia técnica inerente à respetiva atividade, das funções inerentes à categoria de Professora Adjunta, da carreira do pessoal docente do Ensino Superior Politécnico, cujo conteúdo funcional se encontra descrito no artigo 3.º, n.º 4, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico.
(…)
Cláusula 3.ª: Local de Trabalho
O Trabalhador desenvolve a sua atividade profissional na Escola Superior de Tecnologia e Gestão, integrada no Instituto Politécnico (...), sem prejuízo do regime de mobilidade geral aplicável às relações jurídicas de emprego público constituídas por tempo indeterminado, encontrando-se, em qualquer circunstância, adstrito às deslocações inerentes ao exercício das funções para que é contratado ou indispensáveis à sua formação profissional.
Cláusula 4.ª: Período Normal de Trabalho
O Segundo Outorgante fica sujeito ao regime de tempo integral, com dedicação exclusiva, sendo o horário de trabalho definido pelo Primeiro Outorgante, dentro dos condicionalismos legais.
(…)
Cláusula 8.ª: Casos Omissos
Tudo o que não estiver expressamente previsto no presente contrato é regido pelo disposto no Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico e na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho”
(cfr. docs. de fls. 86 a 89 do suporte físico do processo).
3) Em 12/07/2017 realizou-se reunião da área disciplinar de Engenharia Civil da ESTG do IPG, no decurso da qual o respetivo Coordenador referiu que recebeu um pedido do Diretor do Curso de Energia e Ambiente para que a A. não lecionasse o curso no ano letivo de 2017/2018 e, bem assim, a Coordenadora da área disciplinar de Ciências Geográficas/Diretora do Curso de Engenharia Topográfica solicitou que não fosse atribuída nenhuma Unidade Curricular de Engenharia Topográfica à A. para o referido ano letivo (cfr. doc. de fls. 46 a 48 do suporte físico do processo).
4) Da ata n.º 20/2017 da referida reunião de 12/07/2017 consta o seguinte:
“(…) a Coordenadora da Área Disciplinar de Ciências Geográficas informou os presentes sobre alguns problemas registados na lecionação da UC de Topografia Geral, da licenciatura de Engenharia Civil, atribuída à docente S., designadamente: elaboração insatisfatória de sumários, GFUC em desacordo com o programa oficial da UC, não cumprimento do programa da UC, alteração não autorizada do método de avaliação. Tendo em consideração estes factos, o Diretor de Curso de Engenharia Civil solicitou que não fosse atribuída esta UC à docente S.. De modo a minorar as lacunas na lecionação da UC de Topografia Geral à licenciatura de Engenharia Civil, ocorridas em 2016/2017, foi solicitado à Coordenadora da Área Disciplinar de Ciências Geográficas que no próximo ano fossem desenvolvidas atividades curriculares por docentes da sua área envolvendo os alunos visados.
Os docentes que lecionaram ao 1.º Ano do curso de Engenharia Civil referiram que tiveram conhecimento verbal, por parte dos alunos, do mau funcionamento da UC de Topografia Geral lecionada pela docente S.. O Coordenador da AD referiu que estes problemas vêm ao encontro de outros que aconteceram na lecionação de outras UC por parte da docente S., em anos anteriores, designadamente: na lecionação da UC de Direção Técnica de Obras no ano 2015/2016 que motivou a não atribuição desta UC no ano seguinte à mesma docente, os graves problemas na lecionação da UC de Gestão de Riscos ao curso de MSIG 2014/2015, os problemas na lecionação da UC de Geografia Ambiental ao curso de Energia e Ambiente 2012/2013, para além dos problemas ocorridos na colaboração com a ESTH nas UC de Segurança e Higiene no Trabalho (curso de Restauração e Catering 2012/2013) que resultaram no pedido da Direção da ESTH para a não continuidade da lecionação da docente naquela escola. Vários destes problemas resultaram na ocorrência de não conformidades de índole pedagógica, referenciadas no sistema de avaliação e qualidade.
Foi sugerido pelos membros da AD que o Coordenador solicitasse à Direção da ESTG o agendamento de uma reunião onde participassem a Direção da ESTG e os Coordenadores das AD responsáveis por UC lecionadas pela docente S., no sentido de poderem ser resolvidos problemas relativos à lecionação por parte desta docente.
O Coordenador da AD de Engenharia Civil informou que desde maio de 2015 até a presente data, a docente S. apenas participou numa única reunião da AD em 15 novembro de 2015.
(…)
Na sequência da discussão os presentes deliberaram não propor atribuição de serviço à docente S.”
(cfr. doc. de fls. 46 a 48 do suporte físico do processo).
5) Em reunião do Conselho Técnico-Científico (CTC) da ESTG do IPG de 26/07/2017, foi emitida deliberação pela qual se determinou, quanto à distribuição de serviço docente para o ano letivo de 2017/2018, o seguinte:
“O Presidente do CTC informou que ficaria anexa à ata (Anexo VI) a justificação
apresentada pela área disciplinar de Engenharia Civil, relativa à não indicação da carga horária letiva relativa à docente S..
Resultado da votação: 5 (cinco) votos sim 4 (quatro) abstenções e 5 (cinco) votos contra. Perante o empate resultante e depois de utilizado o voto de qualidade do presidente, concluiu-se pela aprovação da DSD apresentada pela UTC de Engenharia e Tecnologia.
Os professores Manuela Natário, A., A. e M., subscreveram a seguinte declaração de voto: ‘Não posso votar favoravelmente um serviço docente em que um docente não tem horas atribuídas’ (…)”
(cfr. doc. de fls. 24 a 31 do suporte físico do processo).
6) Na reunião de 26/07/2017, referida no ponto anterior, estiveram presentes, entre outros, L. e N., os quais eram à data, respetivamente, mestre e assistente do 2.º triénio, e especialista e professor adjunto (cfr. docs. de fls. 32 e 100 a 102 do suporte físico do processo).
7) Em 15/09/2017 realizou-se reunião do CTC da ESTG do IPG, na qual foi decidida a não atribuição de carga letiva à A. para o ano letivo de 2017/2018 e de cuja ata consta, além do mais, o seguinte:
“O Presidente do CTC apresentou a DSD da UTC de ET, tendo alertado para o facto de que a Professora S. não constar dos mapas. Isto deve-se ao facto de a docente não ter serviço docente atribuído. A justificação para esta não atribuição foi apresentada na última reunião.
Após os esclarecimentos prestados pelo Coordenador da UTC de ET passou-se à votação.
A Professora M. ausentou-se da reunião.
Resultado da votação aprovado por maioria com 9 votos favoráveis, 4 abstenções e 4 votos contra.
Os professores M., A. e A. subscreveram a seguinte declaração de voto: ‘Não posso votar favoravelmente um serviço docente em que um docente não tem horas atribuídas, sem que seja solicitado uma dispensa de serviço’ (…)”
(cfr. doc. de fls. 49 a 54 do suporte físico do processo).
8) Na reunião referida no ponto anterior estiveram presentes, entre outros, L. e N., os quais eram à data, respetivamente, mestre e assistente do 2.º triénio, e especialista e professor adjunto (cfr. docs. de fls. 55 e 100 a 102 do suporte físico do processo).
9) Em 29/09/2017 realizou-se reunião do CTC da ESTG do IPG, na qual foi decidida a não atribuição de carga letiva à A. para o ano letivo de 2017/2018 e de cuja ata se extrai, além do mais, o seguinte:
“O Presidente do CTC apresentou a DSD da UTC de Engenharia e Tecnologia, tendo alertado novamente para o facto de que a Professora S. não constar dos mapas.
Isto deve-se ao facto de a docente não ter serviço docente atribuído.
(…)
Os professores M., A. e A. subscreveram a seguinte declaração de voto: ‘Não posso votar favoravelmente um serviço docente em que um docente não tem horas atribuídas, sem que seja solicitado uma dispensa de serviço’.
Ausentaram-se da reunião a Professora M. e a Professora H..
Cumprindo com o especificado no n.º 4 do Art.º 31.º do Código do Procedimento Administrativo (Decreto Lei 4/2015, de 7 de janeiro) que refere ‘Não podem estar presentes no momento da discussão nem da votação os membros do órgão que se encontrem ou se considerem impedidos’ ausentaram-se da reunião os seguintes professores: M., N., L., D. e T.. (…)”
(cfr. doc. de fls. 70 a 74 do suporte físico do processo).
10) Na reunião referida no ponto anterior estiveram presentes, entre outros, L. e N., os quais eram à data, respetivamente, mestre e assistente do 2.º triénio, e especialista e professor adjunto (cfr. docs. de fls. 75 e 100 a 102 do suporte físico do processo).
11) Do anexo VIII à ata da reunião de 29/09/2017 consta o documento justificativo da não atribuição de carga letiva à A. para o ano letivo de 2017/2018, dirigido ao Presidente do IPG, nos seguintes termos:
“O Coordenador da AD de Engenharia Civil informou que desde maio de 2015 até à presente data, a docente S. apenas participou numa reunião da AD em 15 de novembro de 2015;
A docente sistematicamente falta às reuniões onde o assunto é a Distribuição de Serviço Docente, impedindo a auscultação da sua opinião no que concerne este assunto;
(…)
(…) no sentido de poderem ser resolvidos problemas relativos à lecionação por parte desta docente. Foi agendada uma reunião para o dia 18 de setembro de 2017, à qual a docente mais uma vez faltou.
Posteriormente foi agendada, para o dia 25 de setembro de 2017, uma reunião com a docente S.. Estiveram presentes, para além da docente, a Diretora e o Subdiretor da Escola Superior de Tecnologia e Gestão, o Coordenador da UTC de ET, o Coordenador da Área Disciplinar de Engenharia Civil e a Coordenadora da Área Disciplinar de Ciências Geográficas. A Docente confrontada com os factos supracitados respondeu: ‘alguma coisa hei-de fazer bem’.
Dado que a docente é um recurso humano do Instituto Politécnico (...), e considerando, pelo exposto, que a docente não reúne as condições para assegurar a lecionação, solicitava que se tomassem as medidas que achar adequadas”
(cfr. doc. de fls. 82 e 83 do suporte físico do processo).
12) Em 16/10/2017 foi emitido despacho pelo Presidente do IPG, nos termos do qual se determinou que, não tendo a A. componente letiva atribuída, deveria reger-se pelo Regulamento do Horário de Trabalho do IPG (Regulamento n.º 632/2016), com as necessárias adaptações, podendo usufruir do regime de “horário flexível” e devendo registar a sua assiduidade nos relógios de ponto (cfr. doc. de fls. 84 do suporte físico do processo).
13) Em 19/10/2017 o Presidente do IPG enviou um e-mail à A., através do qual lhe foi dado conhecimento da informação/despacho n.º IPG/IDIV/166/2017, do qual consta o seguinte:
“A informação já foi prestada à interessada pelos meios adequados (gestão documental e em email) e que se resume:
1. Os docentes são abrangidos pelas regras aplicáveis aos restantes trabalhadores públicos, nomeadamente o horário de trabalho semanal de 35h/semana;
2. Não tendo o docente serviço letivo atribuído e por consequência não existindo outros meios de controle das presenças/assiduidade, nem circunstâncias que justifiquem a não presença em determinados dias da semana ou o alargamento de horários, determinei que, com as necessárias adaptações, seja aplicado o regulamento de horários aplicável aos trabalhadores não docentes do IPG;
3. As regras, no essencial, resumem-se no seguinte:
i) a docente deve registar o cumprimento do horário de trabalho (35h/semana) através do sistema de leitura biométrico;
ii) a docente tem flexibilidade de horário, devendo registar semanalmente (pelo menos) 35 horas de trabalho, em 5 dias/semana, devendo cumprir diariamente um horário mínimo de 5 horas diárias, entre as 8:30 e as 18:30 horas;
iii) não dispensa a trabalhadora do cumprimento das obrigações que lhe forem fixadas, designadamente da comparência a reuniões de trabalho, nem representa qualquer prejuízo para o serviço;
iv) a docente pode usufruir, com as necessárias adaptações, do regime de compensação previsto no artigo 8.º do regulamento, desde que cumprido o horário mínimo diário referido atrás (alínea ii) (…)”
(cfr. doc. de fls. 85 do suporte físico do processo).
14) Em 20/10/2017 foi enviado, pelo Presidente do IPG, novo e-mail à A., nos termos do qual lhe foi confirmada a decisão constante do e-mail referido no ponto anterior (cfr. doc. de fls. 85 do suporte físico do processo).
15) Através do ofício n.º SAS/SOI/56/2017, de 08/11/2017, a ESTG do IPG deu conhecimento à A. de que havia sido deduzida acusação no processo disciplinar que lhe fora mandado instaurar por despacho do Presidente do IPG, com fundamento no facto de aquela ter participado durante vários anos em congressos, programas de trabalho e estudo, ter frequentado cursos ou estágios, para os quais foi sempre autorizada pelo IPG, mas sem nunca fazer referência a este Instituto como afiliação, assim como por ter escrito vários artigos científicos assinando como pertencendo a outras Universidades, não fazendo referência ao IPG (cfr. docs. de fls. 95 a 99 do suporte físico do processo).
16) A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 07/12/2017 (cfr. doc. de fls. 1 do suporte físico do processo).
17) Em 12/12/2017 o Presidente do IPG emitiu despacho pelo qual procedeu à “anulação do despacho datado de 16.10.2017 inserto no Sistema de Gestão Documental (…) e dos despachos referentes ao requerimento Ref. IPG/IDIV/166/2017, datados de 19.10.2017 e de 20.10.2017 (…), na medida em que se determinava a sua sujeição [da A.], com as necessárias adaptações, ao Regulamento de horário de Trabalho do Pessoal não Docente desta instituição, por os mesmos se encontrarem feridos de invalidade”, despacho que foi notificado à A. através do ofício n.º IPG/SOI/1009/2017, de 14/12/2017 (cfr. docs. de fls. 157, frente e verso, do suporte físico do processo).
18) Em reunião do CTC da ESTG do IPG, realizada em 14/12/2017, foi aprovada a proposta do Presidente do CTC de anulação das deliberações do mesmo CTC de não distribuição de carga letiva à A. para o ano letivo de 2017/2018, tomadas nas reuniões de 26/07/2017, de 15/09/2017 e de 29/09/2017, e respetivas fundamentações (cfr. docs. de fls. 160 a 163 do suporte físico do processo).
19) No âmbito da reunião mencionada no ponto anterior, foi referido pela docente H. que a anulação do ato só seria válida para o futuro, tendo a mesma apresentado uma declaração de voto, que foi anexa à ata da reunião e igualmente subscrita pela docente N., da qual consta o seguinte:
“(…) - a DSD (Distribuição de Serviço Docente) é um assunto que não se encontra fechado ou finalizado enquanto não terminar o ano letivo; assim, a DSD da docente e de qualquer outro docente não se pode considerar definitiva enquanto o ano letivo esteja a decorrer e muito menos antes do início do segundo semestre. Não podendo haver, por evidente prejuízo dos alunos, substituição relativa ao primeiro semestre, a anulação não tem quaisquer efeitos para o passado, podendo apenas assumir efeitos para o futuro em termos de DSD. Neste sentido, com a previsível necessidade de distribuição adicional de novo serviço, a situação poderá ainda ser alterada relativamente a todos os docentes da UTC (Unidade Técnico Científica) de ET (Engenharia e Tecnologia)”
(cfr. doc. de fls. 163, no verso, do suporte físico do processo).
20) Através do ofício n.º IPG/SOI/1012/2017, de 14/12/2017, foi a A. notificada da deliberação referida no ponto 18), referente à anulação das deliberações do CTC de não distribuição de carga letiva para o ano letivo de 2017/2018 (cfr. doc. de fls. 164 do suporte físico do processo).
21) Em 14/12/2017 o Presidente do IPG emitiu despacho pelo qual procedeu à anulação parcial, porque feridos de invalidade, dos despachos de homologação das deliberações do CTC que recaíram sobre a distribuição de serviço docente na parte em que se referem à A., nos termos das quais não lhe foi distribuído serviço docente, contidas na ata da reunião do CTC de 26/07/2017 e respetiva fundamentação, constante da ata da reunião da área disciplinar de Engenharia Civil da ESTG de 12/07/2017, bem como nas atas das reuniões do CTC de 15/09/2017 e de 29/09/2017, e respetivas fundamentações, mais se convidando o CTC a reanalisar a respetiva distribuição de serviço docente (cfr. doc. de fls. 159, no verso, do suporte físico do processo).
22) Em 29/12/2017 foi proferida sentença, no âmbito do processo cautelar n.º 684/17.0BECBR, nos termos da qual os ora RR. foram intimados a proceder à atribuição imediata de, pelo menos, seis horas letivas à A. e, bem assim, a permitir que esta efetue investigação científica fora das instalações do IPG, fixando-lhe, dentro das 35h semanais, um período proporcional para a realização de atividade de investigação científica, e a permitir que assista aos eventos científicos nacionais e internacionais necessários ao seu desenvolvimento, aperfeiçoamento e valorização científica (cfr. sentença de fls. 146 a 161 do suporte físico do processo cautelar apenso n.º 684/17.0BECBR).
23) Em reunião de 16/01/2018 da área disciplinar de Engenharia Civil da ESTG do IPG, na qual esteve presente a A., foi discutida a distribuição de serviço docente no ano em curso (2017/2018), constando da respetiva ata (n.º 21/2018), além do mais, o seguinte:
“(…) O Coordenador da AD de Engenharia Civil solicitou aos presentes que apresentassem propostas para alteração da DSD 2017/2018 para o 2.º semestre. Após um breve debate, os presentes propuseram as seguintes alterações à DSD (…):
(…)
f) A docente S. passa a lecionar a UC de Infraestruturas Hidráulicas e Recursos Hídricos do curso de Engenharia Topográfica, a UC de Implantação de Obras de Engenharia Civil do curso de Licenciatura em Engenharia Topográfica e a UC de Arquitetura e Design dos cursos de Gestão Hoteleira e Restauração e Catering.
A docente S. referiu que as UC propostas para a sua distribuição de serviço docente não eram da sua especialidade de formação e que não lhe tinha sido previamente enviada a proposta da distribuição de serviço.
O Coordenador da AD-EC referiu que dando cumprimento ao Regulamento de distribuição de serviço docente do IPG, não havia UC do Grupo Disciplinar de Geotecnia em número suficiente a distribuir por todos os docentes pertencentes a esse Grupo. Referiu ainda que não tinha sido facultado previamente a nenhum docente da AD-EC essa proposta, pois ela foi concebida na presente reunião”
(cfr. doc. de fls. 192 e 195 do suporte físico do processo).
24) Consta em anexo à ata da reunião que antecede uma declaração de voto, subscrita pela A., relativamente à distribuição do serviço docente para 2017/2018 (cfr. doc. de fls. 196, no verso, e 197 do suporte físico do processo).
25) Em resposta à solicitação da Diretora da ESTG, de 15/01/2018, no sentido de os docentes comunicarem a existência de eventuais restrições aos horários para o 2.º semestre de 2017/2018, a A. enviou à Direção da ESTG, em 19/01/2018, o respetivo formulário preenchido, constando do campo “Restrição pretendida” o seguinte: “O horário deve concordar com a sentença do Processo n.º 684/17.0BECBR o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra. Informa-se ponderação de avaliação de desempenho: dimensão técnico-científica 50%; dimensão pedagógica 45%; dimensão organizacional 5%” (cfr. docs. de fls. 227 e 228 do suporte físico do processo).
26) Em reunião da Unidade Técnico-Científica de Engenharia e Tecnologia da ESTG do IPG de 29/01/2018, na qual a A. esteve presente, foi aprovada a proposta de distribuição de serviço docente para o 2.º semestre do ano letivo de 2017/2018, da qual consta a atribuição à A. de 10h semanais de carga letiva, extraindo-se da respetiva ata (n.º 157), além do mais, o seguinte:
“A docente S. votou negativamente tendo apresentado a sua argumentação detalhada durante o período de audiência. Informou ainda que irá enviar documentação complementar para o Conselho Técnico-Científico. A docente S. informou que não é possível requisitar formação continuada atempadamente quanto à Unidade Curricular de Infraestruturas Hidráulicas e Recursos Hídricos. Informou ainda que a Unidade Curricular de Implantação de Obras de Engenharia Civil, na sua opinião, embora esteja integrada na Área Disciplinar de Engenharia Civil, contém conteúdos de Ciências Geográficas”
(cfr. docs. de fls. 203, no verso, a 206 do suporte físico do processo).
27) Em reunião do CTC da ESTG do IPG de 02/02/2018, foi deliberado aprovar a distribuição de serviço docente para o 2.º semestre do ano letivo de 2017/2018 conforme propostas da área disciplinar de Engenharia Civil e da Unidade Técnico-Científica de Engenharia e Tecnologia da ESTG do IPG, podendo ler- se na respetiva ata (n.º 03/2018), além do mais, o seguinte:
“(…) o Presidente do Conselho Técnico-Científico informou que recebeu informação, remetida pela Professora S. ao Conselho Técnico-Científico (Anexo IV), tendo-a lido aos conselheiros. O Presidente do Conselho Técnico-Científico, que é simultaneamente Coordenador da Unidade Técnico-Científica de ET, prestou os seguintes esclarecimentos ao órgão: (1) já foi entregue à docente a ata por ela solicitada (da reunião plenária da UTC de ET do dia 29/01/2018); (2) a proposta de Distribuição de Serviço Docente da Unidade Técnico-Científica de ET previa que a docente S. lecionasse três Unidades Curriculares;
(3) A docente S. solicitou lecionar a Unidade Curricular de Ambiente e Recursos Naturais, pelo que lhe foi distribuída; (4) Dado que o Curso Técnico Superior Profissional de Cadastro Predial começou tardiamente, a Unidade Curricular de Geometria Cotada não será lecionada este ano letivo; (5) A Unidade Curricular de Estruturas de Suporte e Fundações será assegurada pelo Professor C., que pertence ao mesmo grupo disciplinar da Professora S., mas que tem uma categoria profissional superior à sua; (6) As Unidades Curriculares de Infraestruturas Hidráulicas e Recursos Hídricos; Implantação de Obras de Engenharia Civil; e Arquitetura e Design pertencem à área disciplinar de Engenharia Civil. Área a que a Professora S. pertence e a qual possui os graus de licenciada, mestre e doutor; (7) Embora sejam apenas 10 horas letivas semanais, na reunião plenária da Unidade Técnico-Científica de ET foram explicados os motivos da excecionalidade da docente lecionar quatro unidades curriculares: i) O curso de Engenharia Topográfica está em avaliação, logo a existência de doutores a lecionar é fundamental; ii) As três unidades curriculares atribuídas inicialmente são da Área de Engenharia Civil; iii) Na unidade curricular de Arquitetura e Design a docente irá lecionar apenas um terço da carga horária (módulo de Desenho Técnico correspondente a uma hora por semana); iv) A Docente S. já lecionou a Unidade Curricular de Implantação de Obras de Engenharia Civil em anos anteriores sem que tivesse referido que necessitava de formação para a assegurar; v) A lecionação de parte da Unidade Curricular de Arquitetura e Design resulta de uma necessidade excecional, pois o docente que estava previsto que a assegurasse, o Professor J., está de baixa; vi) A quarta unidade curricular, Ambiente e Recursos Naturais, foi distribuída pois foi solicitada pela docente S.”
(cfr. doc. de fls. 189, no verso, a 191 do suporte físico do processo).
28) Na reunião de 02/02/2018, referida no ponto anterior, esteve presente, entre outros, L., que, à data, já detinha a categoria de Professor Adjunto (cfr. docs. de fls. 190, no verso, e 205, no verso, do suporte físico do processo).
29) Através de e-mail enviado aos docentes da ESTG do IPG em 21/02/2018, foi-lhes dado conhecimento dos horários provisórios para o 2.º semestre do ano letivo de 2017/2018, mais lhes tendo sido solicitado que qualquer sugestão de alteração fosse enviada, impreterivelmente, até ao final da manhã do dia seguinte (cfr. doc. de fls. 206, no verso, do suporte físico do processo).
30) Em resposta à solicitação que antecede, a A. enviou e-mail, ainda no dia 21/02/2018, do qual consta o seguinte:
“Verifiquei que elaborou o meu horário utilizando os sábados de forma contínua e não rotativa sem me consultar primeiramente acerca da minha atual condição pessoal e familiar, não sendo normal que um curso regular de licenciatura não funcione à segunda e terça.
Para alterar a minha situação sem permutar outros docentes para o sábado o dia todo sugiro que ocupe a quinta entre 9,30-11,30 com infraestruturas hidráulicas e recursos hídricos e a sexta entre 9-13 com infraestruturas hidráulicas e recursos hídricos e ambiente e recursos naturais, eliminando a sexta à tarde e o sábado o dia todo.
Deve ainda manter a segunda sem horário”
(cfr. doc. de fls. 207 do suporte físico do processo).
31) O Gabinete de Apoio à Direção da ESTG do IPG respondeu à A., por e-mail de 22/02/2018, comunicando-lhe o seguinte:
“Quando elaboramos o seu horário e uma vez que irá lecionar ao sábado tivemos logo o cuidado de lhe deixar a segunda e a terça-feira livres. Por outro lado, não é possível satisfazer o seu pedido porque os horários foram feitos de acordo com a disponibilidade dos alunos trabalhadores estudantes”
(cfr. doc. de fls. 207 do suporte físico do processo).
32) No mesmo dia 22/02/2018, foi dado conhecimento à A., via e-mail, do respectivo horário letivo do 2.º semestre de 2017/2018, do qual consta a lecionação das unidades curriculares de Ambiente e Recursos Naturais e de Infraestruturas Hidráulicas e Recursos Hídricos aos sábados, de modo contínuo (cfr. docs. de fls. 208 e 209 do suporte físico do processo).
33) No 2.º semestre do ano letivo de 2017/2018, o docente C. leciona a unidade curricular de Análise Matemática II aos sábados, de modo contínuo (cfr. doc. de fls. 229, frente e verso, do suporte físico do processo).
Já quanto ao direito.
Foram vários os pontos abordados na decisão recorrida, destacando-se agora aqueles que são objecto de censura do recurso, sobre assédio moral e fundamentação, que foram tratados da seguinte forma:
«(…)
Alega a A. que o horário que lhe foi fixado impõe que a mesma preste trabalho todos os sábados, sem ter em consideração a sua disponibilidade familiar, sendo a mesma a única docente do IPG sem horário rotativo aos sábados, o que gera uma situação de desigualdade face aos seus pares. Entende que é alvo de um tratamento discriminatório, que atenta contra os seus direitos à integridade moral e à proteção contra qualquer forma de discriminação, demonstrando uma atitude desvalorizadora da sua pessoa e que despreza o seu bem-estar.
Conclui, por isso, que os atos em crise encerram práticas suscetíveis de se enquadrarem em assédio moral, numa clara perseguição à A. por não ter colocado no seu perfil qualquer referência ao IPG e por não ter publicitado o nome do IPG nas conferências e congressos em que vinha participando (não serão aqui, uma vez mais, apreciadas as alegações tecidas na petição inicial na medida em que se refiram à não atribuição de componente letiva e à sujeição ao Regulamento do Horário de Trabalho do pessoal não docente do IPG, pois que tais pressupostos já não se verificam nos novos atos entretanto praticados).
Carece, porém, a A. de razão.
Segundo o art.º 29.º, n.º 2, do Código do Trabalho [aplicável ex vi art.º 4.º, n.º 1, alínea d), da LGTFP], “entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em fator de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador”.
Tais fatores de discriminação são, por exemplo, a ascendência, idade, sexo, orientação sexual, estado civil, situação familiar, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência ou doença crónica, nacionalidade, origem étnica, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical, conforme enumeração exemplificativa constante do n.º 1 do art.º 24.º do Código do Trabalho.
Em todo o caso, o assédio moral implica comportamentos (em regra, oriundos do empregador ou de superiores hierárquicos do visado, mas que também podem advir de colegas) real e manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador, aos quais estão normalmente associados mais dois elementos: certa duração e determinadas consequências. A doutrina tem identificado, à luz do texto da lei e dos contributos da jurisprudência, os seguintes traços estruturais da noção de assédio no trabalho: (i) um comportamento (não um ato isolado) indesejado, por representar incómodo injusto ou mesmo prejuízo para a vítima; (ii) uma intenção imediata de, com esse comportamento, exercer pressão moral sobre o outro; (iii) um objetivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável, consistente na obtenção de um efeito psicológico na vítima, desejado pelo assediante (cfr., entre muitos outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01/03/2018, proc. n.º 4279/16.8T8LSB.L1.S1, publicado em www.dgsi.pt).
Ora, a factualidade apurada nos autos não reúne indícios mínimos que permitam sustentar estarmos perante uma típica situação de assédio moral (mobbing).
Por um lado, a circunstância de o horário que foi fixado à A. impor que a mesma preste trabalho todos os sábados, alegadamente sem ter em conta a sua disponibilidade familiar, sendo a mesma a única docente do IPG sem horário rotativo aos sábados – alegações que sempre careciam de uma maior densificação pela A., sendo certo que nem sequer se sabe quais são as invocadas “disponibilidades familiares” da docente, porquanto nada foi alegado nesse sentido – é manifestamente insuficiente para que se conclua que a A. foi alvo de práticas suscetíveis de serem enquadradas em assédio moral. Aliás, não resulta dos factos analisados – em particular, das reuniões dos órgãos competentes da ESTG do IPG acerca da distribuição do serviço docente no 2.º semestre de 2017/2018 – qualquer carácter persecutório, com intuito vexatório, dirigido contra a A., nem se vislumbra, dos factos assentes, que os RR. tenham cometido, em relação à docente, quaisquer factos ilícitos com o verdadeiro intuito de a prejudicar ou humilhar.
Por outro lado, o que decorre da factualidade apurada é que, se, inicialmente, não foi atribuída qualquer carga horária letiva à A. para o ano letivo de 2017/2018 e, bem assim, foi a mesma sujeita ao Regulamento do Horário de Trabalho do pessoal não docente, com a obrigatoriedade de registar a sua permanência nas instalações do IPG no período compreendido entre as 8.30 e 18.30 horas de cada dia útil, não menos certo é que os RR. vieram, porém, de modo voluntário (é certo que na sequência da interposição do processo cautelar apenso), “corrigir” a situação existente, eliminando da ordem jurídica os atos correspondentes, mais tendo deliberado atribuir à A. 10 horas letivas semanais para o 2.º semestre do ano de 2017/2018, com a consequente fixação de um novo horário, considerando a distribuição de serviço docente entretanto efetuada.
Também não procede, neste âmbito, o argumento de que a A. é a única docente do IPG sem horário rotativo aos sábados, o que gera uma situação de desigualdade face aos seus pares e a torna alvo de um tratamento discriminatório, que atenta contra os seus direitos à integridade moral e à proteção contra qualquer forma de discriminação, demonstrando uma atitude desvalorizadora da sua pessoa e que despreza o seu bem-estar.
Note-se que a A. esteve presente na reunião de 16/01/2018 da área disciplinar de Engenharia Civil da ESTG do IPG, na qual foi discutida a distribuição de serviço docente no ano em curso (2017/2018), e esteve igualmente presente na reunião da Unidade Técnico-Científica de Engenharia e Tecnologia da ESTG do IPG de 29/01/2018, na qual foi aprovada a proposta de atribuição de serviço docente para o 2.º semestre do ano letivo de 2017/2018, com atribuição à A. de 10h semanais de carga letiva, tendo em ambas as reuniões exposto, sem qualquer impedimento ou perturbação, os seus pontos de vista e as suas posições (cfr. pontos 23, 24 e 26 dos factos provados).
Ademais, em resposta à solicitação da Diretora da ESTG, de 15/01/2018, no sentido de os docentes comunicarem a existência de eventuais restrições aos horários para o 2.º semestre de 2017/2018, a A. teve a oportunidade de expor e relatar eventuais impedimentos relacionados com o exercício de funções aos sábados, pese embora não o tenha feito nesse momento. E, quando teve conhecimento dos horários provisórios (dos quais constava a ocupação dos sábados), a A. também teve oportunidade de manifestar a sua posição e de propor alterações, apesar de as mesmas não terem sido, a final, atendidas na elaboração dos horários definitivos (mantendo-se os sábados contínuos), com a justificação (que, a nosso ver, não suscita perplexidades evidentes) de que era impossível não lecionar aos sábados, “porque os horários foram feitos de acordo com a disponibilidade dos alunos trabalhadores estudantes” (cfr. pontos 25, 29, 30 e 31 dos factos provados) – não perdendo de vista que, neste aspeto em particular, não caberá ao Tribunal sindicar, de fundo, a bondade ou conveniência da justificação apresentada para manter o exercício de funções pela A. aos sábados, de modo contínuo, já que tal está reservado ao domínio da atividade discricionária da Administração, salvo casos de erro manifesto ou ilegalidade grosseira, o que não ocorre in casu.
De referir, ainda, que, à luz da factualidade assente, no 2.º semestre do ano letivo de 2017/2018, também ao docente C. foi atribuído um horário em que o mesmo leciona a unidade curricular de Análise Matemática II aos sábados, de modo contínuo (cfr. ponto 33 dos factos provados), pelo que não é a A. a única docente do IPG sem horário rotativo aos sábados.
Por conseguinte, não se vislumbra em que medida os atos em crise geraram uma situação de desigualdade da A. face aos seus pares e a tornaram alvo de um tratamento discriminatório, violador dos seus direitos à integridade moral e à proteção contra qualquer forma de discriminação, e demonstrando uma atitude desvalorizadora da sua pessoa e que despreza o seu bem-estar – e era à A., e não aos RR., que competia fundar esta sua alegação em factos minimamente concretos e densificados, para que se pudesse concluir, com segurança, que a mais nenhum docente do IPG tinha sido distribuído serviço aos sábados, de modo contínuo. Aliás, sempre se diga que, mesmo que fosse esse o caso (isto é, mesmo que a A. fosse, comprovadamente, a única docente a exercer funções aos sábados, sem rotatividade), tal não constituiria, por si só, uma violação do princípio da igualdade face à situação dos demais colegas, por referência aos quais esta docente estaria a ser discriminada, já que seria exigível que essa situação fosse injustificada ou, pelo menos, baseada em fatores de discriminação legalmente inadmissíveis – o que, como vimos, não ocorre na situação dos autos (atendendo às razões atinentes à disponibilidade dos alunos trabalhadores estudantes).
Por último, quanto à alegação de que a A. tem sido alvo de conduta persecutória por não ter colocado no seu perfil qualquer referência ao IPG e por não ter publicitado o nome do IPG nas conferências e congressos em que vinha participando, dir-se-á apenas que tais condutas determinaram a instauração de um processo disciplinar contra a docente, sendo certo que o exercício (isolado) do poder disciplinar também não é suscetível de levar à conclusão de que a A. foi vítima de assédio (cfr. ponto 15 dos factos provados).
Por conseguinte, e com os fundamentos acima aduzidos, improcede a nulidade, por ofensa de direitos fundamentais, imputada aos atos impugnados pelo facto de os mesmos constituírem uma “inadmissível forma de assédio moral e uma intolerável discriminação da A.”.
(…)
Relativamente à invocada falta de fundamentação, do teor da ata da reunião do CTC da ESTG do IPG de 02/02/2018, na qual foi aprovada a distribuição de serviço docente para o 2.º semestre do ano letivo de 2017/2018, é possível compreender plenamente as razões subjacentes à decisão assim tomada, o mesmo se podendo afirmar no que respeita à informação prestada sobre a viabilidade das pretensões da docente quanto à definição do horário definitivo para o 2.º semestre de 2017/2018 (cfr. pontos 27 e 31 dos factos provados).
(…)».
Na conceptualização constante do art.º 29.º, n.º 2, do Código do Trabalho, o assédio moral supõe um “comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em fator de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador”.
Norma que teve em vista a transposição da Diretiva 2006/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 05 de Julho de 2006, relativa à aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à atividade profissional, quer a Diretiva 2000/43/CE do Conselho, de 29 de Junho de 2000, que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica; formulação que segue de perto a definição que lhe é dada por esta última Diretiva, no seu artigo 2º, n.º 3: “O assédio é considerado discriminação na aceção do n.º 1 sempre que ocorrer um comportamento indesejado relacionado com a origem racial ou étnica, com o objetivo ou o efeito de violar a dignidade da pessoa e de criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.”.
Da polimorfia do assédio advém muitas das vezes a dificuldade em distingui-lo dos conflitos normais em qualquer relação de trabalho.
Mesmo se tais conflitos se multiplicam, a impulso de qualquer parte na relação.
Como enfatiza Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 17ª edição, 2014, pág. 173 e ss.) “a definição do art. 29º não parece constituir o instrumento de diferenciação que é necessário”, uma vez que “nela cabem, praticamente, todas as situações que o mau relacionamento entre chefes e empregados pode gerar”, apontando que deva ser prestada atenção aos seguintes traços estruturais da noção de assédio no trabalho:
“a) Um comportamento (não um ato isolado) indesejado, por representar incómodo injusto ou mesmo prejuízo para a vítima (…);
b) Uma intenção imediata de, com esse comportamento, exercer pressão moral sobre o outro (…);
c) Um objectivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável, consistente na obtenção de um efeito psicológico na vítima, desejado pelo assediante (…).”.
O tribunal “a quo” julgou que “a factualidade apurada nos autos não reúne indícios mínimos que permitam sustentar estarmos perante uma típica situação de assédio moral (mobbing)”; não deixando de atender ao pano de fundo histórico de os novos actos virem «“corrigir” a situação existente», e nem mesmo olvidou a existência um processo disciplinar.
Sem erro de julgamento.
As circunstâncias não ditam de um “objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador”; por objectivo ou em efeito, não resulta o assédio, nem se depreende; mesmo sem perder contexto maior, de antecedência de procedimento “corrigido” (motu proprio), e de acção disciplinar (sem nota de ilegítimo recurso de autoridade).
Muito menos por discriminação, em que está em causa o princípio da igualdade.
O princípio não é violado só por se nos depararem situações desiguais.
A desigualdade, em função, nomeadamente, da “ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical” (art.º 23º, n.º 1, do CT) é vedada.
Mas não é um diferente escalonamento de funções, que no exercício do seu poder directivo e organizacional a entidade empregadora fixa - que necessariamente cria situações que não são iguais -, que viola o princípio, sendo mister que, para tanto, se identifique um factor de discriminação.
A autora silencia-o.
Se cabe a quem alega discriminação indicar o trabalhador ou trabalhadores em relação a quem se considera discriminado, incumbindo ao empregador provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer factor de discriminação, certo é que verdadeiramente a autora não chega a consubstanciar essa discriminação.
Portanto, sem refluir afectação das regras de ónus da prova.
Antes até resulta que justifica a conciliação com o horário dos trabalhadores estudantes (viu o tribunal “a quo”, em conforto de índice, que acresce constatação de um outro docente com igual horário ao sábado, sem rotatividade).
Assim, e em relação à arvorada falta de fundamentação.
Pode acolher-se que “do teor da ata da reunião do CTC da ESTG do IPG de 02/02/2018, na qual foi aprovada a distribuição de serviço docente para o 2.º semestre do ano letivo de 2017/2018, é possível compreender plenamente as razões subjacentes à decisão assim tomada, o mesmo se podendo afirmar no que respeita à informação prestada sobre a viabilidade das pretensões da docente quanto à definição do horário definitivo para o 2.º semestre de 2017/2018”.
Conquanto o julgado, relativo à fundamentação formal, está de acordo com que essa seja a da enunciação dos motivos que determinaram o autor a proferir a decisão com um concreto conteúdo; que, para ter essa fundamentação não tem de conter a negação de proposições contrárias.
A fundamentação substancial - da real verificação dos pressupostos de facto invocados e a correta interpretação e aplicação das normas -, o tribunal de recurso só conhece na mesma medida do dever de pronúncia do tribunal “a quo”.
*
Pelo exposto, acordam em conferência os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
*
Custas: pela recorrente.
*
Porto, 30 de Outubro de 2020.

Luís Migueis Garcia
Frederico Branco
Nuno Coutinho