Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00078/14.0BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/08/2022
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:EMPREITADA – CORREÇÃO FINANCEIRA -SUPRESSÃO DE TRABALHOS – MODIFICAÇÃO DO OBJETO DO CONTRATO
Sumário:I- À mingua de previsão de repartição de responsabilidade no âmbito do contrato de concessão de incentivos de financeiros, a Autora não pode julgar-se dispensada da intervenção abrangida no financiamento pelo facto de, por acordo de cessação de posição contratual, ter atribuído à Ré a responsabilidade pela execução de cerca de 2/3 das obras relativas à empreitada visada nos autos.
II- A aplicação da correção financeira censurada nos autos derivou da circunstância da Ré ter considerado, com reporte ao contrato de empreitada celebrado pelo montante de € 880,702,63, existir uma supressão de trabalhos correspondente a € 439,295,59, e, qua tale, uma redução de 51,41% do objecto físico do contrato, no seu entendimento, atentatória dos princípios da livre concorrência, igualdade e transparência.
III- Não legitimando matéria de facto dada como provada a referência a qualquer elemento no sentido da “supressão de trabalhos” no âmbito do contrato de empreitada visada nos autos, mas antes e apenas a “inexecução parcial” da empreitada, “cai por terra” o fundamento da aplicação da correção financeira censurada nos autos.
IV- O que atinge fatalmente, para além do ato impugnado, a decisão judicial recorrida, já que esta, ao validar a posição da Administração no particular conspecto em análise, fez incorreta subsunção do tecido fáctico apurado nos autos ao bloco legal aplicável, sendo, por isso, merecedora da censura que a Recorrente lhe dirige.
V- Tal não significa, porém, que a atuação da Autora, efectivamente, apurada nos autos [inexecução parcial da empreitada] não seja passível de nova apreciação por parte da Administração – como, aliás, é sua obrigação -, e eventual aplicação das sanções positivadas nos artigos 14º e 15º do contrato de incentivos financeiros celebrado pelas partes.*
* Sumário elaborado pelo relator
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I – RELATÓRIO
ÁGUAS DA REGIÃO (...), S.A. [doravante AD__], com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que, em 20.05.2021, julgou totalmente improcedente a presente ação, e, em consequência, absolveu a Ré, aqui Recorrida, AUTORIDADE DE GESTÃO DO PROGRAMA OPERACIONAL TEMÁTICO VALORIZAÇÃO DO TERRITÓRIO [doravante AGPOT] do pedido.
Em alegações, a Recorrente formulou as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…)
1.ª - O OBJETO DO AJUIZADO CONTRATO CONSISTIA NA EXECUÇÃO, EM SIMULTÂNEO, DE DUAS OBRAS:
a)- REDE DE DRENAGEM DAS ÁGUAS RESIDUAIS; E
b)- REDE DE DRENAGEM DAS ÁGUAS PLUVIAIS.
2.ª - SÓ AS DESPESAS COM A EXECUÇÃO DA REDE DE DRENAGEM DAS ÁGUAS RESIDUAIS FORAM CANDIDATADAS A COFINANCIAMENTO PELA RECORRENTE UMA VEZ QUE AS DESPESAS COM A REDE DE DRENAGEM DAS ÁGUAS PLUVIAIS NÃO ERAM ELEGÍVEIS;
3ª- OS TRABALHOS RELATIVOS À REDE DE DRENAGEM DAS ÁGUAS RESIDUAIS FORAM EXECUTADOS PELA RECORRENTE NA SUA TOTALIDADE;
4.ª- A REDE DE DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS - QUE CONTRATUALMENTE FICARAM NA DISPONIBILIDADE DO MUNICÍPIO (...) - SÓ FORAM EXECUTADAS EM PARTE, UMA VEZ QUE, DURANTE A EXECUÇÃO (ADIANTADA) DO CONTRATO, AQUELE MUNICÍPIO SE VIU IMPEDIDO DE EXECUTAR OS TRABALHOS EM FALTA, SUPRIMINDO-OS;
5.ª - DE TODO O MODO, A REDE DE DRENAGEM DAS ÁGUAS RESIDUAIS, EXECUTADA NA TOTALIDADE PELA RECORRENTE, E A PARTE DA REDE DE DRENAGEM DAS ÁGUAS PLUVIAIS ENTRARAM EM FUNCIONAMENTO, CUMPRINDO OS FINS A QUE DE DESTINAVAM;
6.ª - É QUE A REDUÇÃO A REDE DE DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS FOI MERAMENTE QUANTITATIVA. DESTINAVA-SE, INICIALMENTE, A ABRANGER VÁRIAS FREGUESIAS DO CONCELHO DE (...) E TEVE DE SER ENCURTADA, SERVINDO MENOS FREGUESIAS, MAS SERVINDO-AS;
7.ª - CONSEQUENTEMENTE, A RECORRENTE SÓ APRESENTOU PARA COFINANCIAMENTO AS DESPESAS RESULTANTES DA EXECUÇÃO DOS ÚNICOS TRABALHOS CANDIDATÁVEIS, OS DA REDE DE DRENAGEM DE ÁGUAS RESIDUAIS;
8.ª - ENTENDEU A DOUTA DECISÃO SOB CENSURA, EM SINTONIA COM A TESE DA RE-CORRIDA, QUE A RECORRENTE DEVE SER FINANCEIRAMENTE PENALIZADA EM VIRTUDE DE SE TER VERIFICADO UMA ALTERAÇÃO DO OBJETO DO CONTRATO, CONSUBSTANCIADA NA “DIMINUIÇÃO” VERIFICADA COM A DITA SUPRESSÃO DE TRABALHOS (REPETE-SE, TRABALHOS ESSES NÃO CANDIDATADOS A COFINANCIAMENTO),
9.ª - ACRESCENTANDO QUE TAL “DIMINUIÇÃO” DO OBJETO CONTRATUAL, SE FOSSE DO CONHECIMENTO DOS CONCORRENTES, ESTES PODERIAM TER APRESENTADO OUTRO TIPO DE PROPOSTAS QUE PODERIAM TER JUSTIFICADO A ALTERAÇÃO DA ORDENAÇÃO DAS MESMAS,
10.ª- PELO QUE PODERIA TER-SE VERIFICADO UMA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONCORRÊNCIA;
11.ª- SALVO O DEVIDO RESPEITO, A RECORRENTE DISCORDA FRONTALMENTE DE SE-MELHANTE TESE, PRETENSAMENTE suportada NAS NORMAS “COCOF”;
DE FACTO:
12.ª - O CONTRATO DE QUE TRATA OS AUTOS É DISCIPLINADO PELO RJEOP APROVADO PELO DECRETO-LEI N.° 59/99, DE 2 DE MARÇO.
13.ª - TRATA-SE DE UM CONTRATO DE OBRA PÚBLICA DE EMPREITADA, NA MODALIDADE DE “SÉRIE DE PREÇOS”;
14.ª - ISTO É, O VALOR DOS TRABALHOS CORRESPONDE À APLICAÇÃO ÀS QUANTIDADES EFETIVAMENTE EXECUTADAS DOS PREÇOS UNITÁRIOS OFERECIDOS PELO ADJUDICATÁRIO;
15.ª - POR OUTRO LADO, O ARTIGO 28.°, DAQUELE RJEOP, PREVIA, SEM RESTRIÇÕES, DURANTE A EXECUÇÃO DO CONTRATO, A SUPRESSÃO DE TRABALHOS,
16.ª - SENDO QUE AS ÚNICAS CONSEQUÊNCIAS DE TAL SUPRESSÃO OPERAVAM NAS RELAÇÕES ENTRE ENTIDADE ADJUDICANTE E EMPREITEIRO. CONSTAM DOS SEUS ARTIGOS 31.°, 1 E 35.°, 1: DIREITO DO EMPREITEIRO A RESCINDIR O CONTRATO E DIREITO DO EMPREITEIRO A INDEMNIZAÇÃO, RESPETIVAMENTE;
POSTO ISTO:
17.ª - A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, SALVO SEMPRE O DEVIDO RESPEITO, ASSENTA EM DIVERSOS EQUÍVOCOS QUE URGE DENUNCIAR, DESIGNADAMENTE:
A)FAZ EQUIVALER QUALQUER SUPRESSÃO DE TRABALHOS A MODIFICAÇÃO DO OBJETO DO CONTRATO TAXANDO-A COMO PASSÍVEL DE VIOLAR O PRINCÍPIO DA CONCORRÊNCIA;
B) APLICA AS NORMAS “COCOF” MESMO NO CASO EM QUE AS DESPESAS COM OS TRABALHOS SUPRIMIDOS NÃO FORAM, SEQUER, CANDIDATADOS, E, MUITO MENOS, INDEVIDAMENTE APRESENTADAS PARA EFEITOS DE COFINANCIAMENTO;
18.ª - COMO DECORRE DO TEXTO DAS REFERIDAS NORMAS “COCOF”, LOGO DO SEU TÍTULO, SE DEPREENDE QUE SE TRATA DE MERAS “ORIENTAÇÕES” PARA A DETERMINAÇÃO 19 DAS CORREÇÕES FINANCEIRAS A APLICAR ÀS DESPESAS COFINANCIADAS PELOS FUNDOS ES-TRUTURAIS E PELO FUNDO DE COESÃO;
19.ª - PODE LER-SE, AINDA, NO SEU TEXTO:
«O objectivo das correções financeiras consiste em estabelecer uma situação em que a totalidade das despesas declaradas para cofinanciamento dos Fundos estruturais esteja em conformidade com a regulamentação nacional e comunitária aplicável.»
«O montante da correção será estabelecido, sempre que possível, com base em processos individuais e será igual ao montante das despesas indevidamente imputadas ao Fundos nos casos em questão.»” (sublinhados nossos)
20.ª - VALE ISTO POR DIZER QUE TAIS “ORIENTAÇÕES” - AS CORREÇÕES FINANCEIRAS AÍ PREVISTAS NÃO SÃO DE APLICAR A OUTRAS DESPESAS QUE NÃO TENHAM SIDO COFINANCIADAS NEM PODEM AFETAR O VALOR DAS DESPESAS QUE TENDO SIDO CANDIDATADAS E FINANCIADAS NÃO PADEÇAM DE QUALQUER IRREGULARIDADE, COMO OCORREU NO CASO DOS AUTOS;
21.ª - ALIÁS, EM CONSONÂNCIA COM O TEXTO DA COMISSÃO DIRETIVA DO ON2, QUE CAPEIA TAIS “ORIENTAÇÕES”, ONDE PODE LER-SE:
“Considerando que alínea b) do artigo 60.° (Funções da autoridade de gestão) do referido Regulamento [Regulamento (CE) n.° 1083/ 2006] estabelece que «A autoridade de gestão e execução do programa operacional de acordo com o princípio da boa gestão financeira, em especial verifica que foram fornecidos os produtos e os serviços cofinanciados e assegura que as despesas declaradas pelos 20 beneficiários para as operações foram realmente efectuadas, no cumprimento das regras comunitárias e nacionais: ....»"
22.ª - ACRESCE QUE A PRÓPRIA RECORRIDA ACABA POR RECONHECER QUE A DIMINUIÇÃO DO OBJETO CONTRATUAL VERIFICADA NO CASO CONCRETO NÃO É PASSÍVEL DE CONSTITUIR IRREGULARIDADE PARA EFEITOS DE APLICAÇÃO DE QUALQUER CORREÇÃO FINANCEIRA;
23.ª - COM EFEITO, NO DOC. N° 12 JUNTO PELA RECORRIDA COM A CONTESTAÇÃO NOTIFICAÇÃO DA RECORRENTE PARA EFEITOS DE AUDIÊNCIA PRÉVIA - ESCREVEU A PÁGINAS 16/20 DO RESPETIVO ANEXO:
“(…) a alteração (ou redução) do objeto do contrato, sendo conhecida dos concorrentes à data da abertura do procedimento, poderia ter determinado a apresentação por estes de uma proposta diferente - para melhor - face àquelas que efetivamente apresentaram.";
“Na verdade, caso o objeto do contrato posto a concurso fosse aquele que veio a ser, posteriormente, consagrado na sequência da redução/alteração, os preços propostos pelos concorrentes poderiam ter sido diferentes e, consequentemente, a ordenação das propostas poderia também ela ter sido diferente."
24.ª - POR AQUI SE VÊ QUE A RECORRIDA BEM SABIA QUE A REDUÇÃO DO OBJETO DO CONTRATO SÓ TERIA EFEITOS, PARA EVENTUAL PENALIZAÇÃO FINANCEIRA, SE FOSSE DO CONHECIMENTO DOS CONCORRENTES À DATA DA ABERTURA DO PROCEDIMENTO;
25.ª - COMO, POR OUTRO LADO, SE SABE, À DATA DA ABERTURA DO PROCEDIMENTO O DONO DA OBRA IGNORAVA, DE TODO, QUE, MUITO MAIS TARDE, EM PLENA EXECUÇÃO DO CONTRATO ONDE JÁ IA A ABERTURA DO PROCEDIMENTO! - IRIA TER DE SUPRIMIR TRABALHOS! DAÍ QUE A VERIFICADA SUPRESSÃO DE TRABALHOS NÃO PREENCHE AQUELE REQUISITO DE PODER SER CONHECIDA DOS CONCORRENTES ANTES DA ABERTURA DO PROCEDIMENTO OU MESMO ANTES DA OUTORGA DO CONTRATO;
26.ª - POR OUTRO LADO, A SUPRESSÃO DE TRABALHOS NUM CONTRATO DE EMPREITADA, SÓ POR SI, NÃO PODE EQUIVALER A ALTERAÇÃO DO OBJETO DO CONTRATO. A MODIFICAÇÃO DO OBJETO DO CONTRATO IMPLICA MODIFICAR AS PRESTAÇÕES CONTRATUAIS DE MODO A QUE SE NÃO EXECUTE O QUE SE PREVIU, MAS, ANTES, COISA DIFERENTE;
27.ª - A SUPRESSÃO DE TRABALHOS - COMO OCORREU NO CASO EM ANÁLISE, DURANTE A EXECUÇÃO DO CONTRATO SÓ NA PARTE RELATIVA À DESPESA NÃO CANDIDATADA A COFINANCIAMENTO NÃO SE ASSEMELHOU ÀQUELA MODIFICAÇÃO DO OBJETO CONTRATUAL. APESAR DA SUPRESSÃO O OBJETO MANTEVE-SE O MESMO. SÓ NÃO FOI CONCLUÍDO. EM VEZ DE 5,5KM DE TUBO PARA DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS SÓ SE CONSTRUIU PARTE DA REDE PREVISTA. POR FALTA, SUPERVENIENTE, DE CONDIÇÕES PARA CONCLUIR A REDE NA SUA GLOBALIDADE;
28.ª - ALIÁS, BASTA ATENTAR NA PRÓPRIA TABELA COCOF PARA PERCEBER QUE NÃO PODE SER APLICADA AO CASO DOS AUTOS;
29.ª - NA TABELA ANEXA ÀS NORMAS COCOF, OS SEUS PONTOS 10 E 11, REFEREM- SE A CASOS EM QUE SE VERIFIQUE A “DIMINUIÇÃO DO OBJETO FÍSICO CONTRATUAL”. MAS, COM CONDIÇÕES QUE DIZEM RESPEITO AO TEMPO EM QUE SE VERIFIQUE TAL DIMINUIÇÃO;
30.ª - NO PRIMEIRO CASO, SE O CONTRATO FOI FEITO RESPEITANDO AS DIRETIVAS SOBRE OS CONTRATOS PÚBLICOS, MAS SEGUIDO DE UMA DIMINUIÇÃO DO OBJETO FÍSICO CONTRATUAL SEM REDUÇÃO PROPORCIONAL CONTRATUAL DO MONTANTE DO CONTRATO;
31.ª - NO SEGUNDO CASO, SE O CONTRATO FOI FEITO RESPEITANDO AS DIRETIVAS SOBRE OS CONTRATOS PÚBLICOS, SEGUIDO DE UMA DIMINUIÇÃO DO OBJETO FÍSICO CONTRA COM REDUÇÃO PROPORCIONAL, JÁ EFETUADA, DO MONTANTE DO CONTRATO.
32.ª - EM AMBOS OS CASOS, CLARO, SUPÕE-SE QUE OS CONTRATOS FORAM OBJETO DE COFINANCIAMENTO. QUANTO AO PRIMEIRO CASO A IRREGULARIDADE CONSISTE EM TER-SE REDUZIDO O OBJETO FÍSICO DO CONTRATO SEM SE TER REDUZIDO, PROPORCIONALMENTE, O MONTANTE DO CONTRATO. NO SEGUNDO CASO PENALIZA-SE QUEM, APESAR DE EFETUAR (NO CONTRATO) A REDUÇÃO PROPORCIONAL DO MONTANTE DO CONTRATUAL, DIMINUI O OBJETO FÍSICO NO PRÓPRIO CONTRATO.
33.ª - NO SEGUNDO CASO, QUE FOI A ÂNCORA DA DECISÃO ANULANDA, A HIPÓTESE CONSISTIRIA EM A ENTIDADE ADJUDICANTE, AO ELABORAR O CONTRATO, FAZÊ-LO APESAR DE TER DIMINUÍDO O OBJETO INICIAL E TER EFETUADO A REDUÇÃO PROPORCIONAL DO MONTANTE GLOBAL;
34.ª- AÍ, DE FACTO, PARA SALVAGUARDAR O PRINCÍPIO DA CONCORRÊNCIA, A ENTIDADE ADJUDICANTE, SABENDO QUE IA ALTERAR O OBJETO DO CONTRATO, NÃO DEVERIA FORMALIZAR O CONTRATO, ANTES DEVERIA ANULAR PROCEDIMENTO PRÉ-CONTRATUAL E LANÇAR OUTRO NOS NOVOS TERMOS, COM O OBJETO CONTRATUAL DIMINUÍDO;
35.ª - SÓ QUE, NO CASO DOS AUTOS, NEM À DATA DA ABERTURA DO PROCEDIMENTO NEM À DATA DA OUTORGA DO CONTRATO, NINGUÉM, INCLUINDO O DONO DA OBRA, SABIA QUE, MUITO MAIS TARDE, EM FASE JÁ ADIANTADA DA EXECUÇÃO, TERIA DE SUPRIMIR TRABALHOS, POR RAZÕES MUITO SUPERVENIENTES!
36.ª - LOGO, NÃO PODIA DAR ISSO A CONHECER, PREVIAMENTE, ANTES DA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO, PELO MENOS, AOS CONCORRENTES OU AO MERCADO!
37.ª- DE TUDO RESULTA, SALVO MELHOR OPINIÃO, QUE O COMPORTAMENTO DA RECORRENTE NÃO É PASSÍVEL DA CORREÇÃO FINANCEIRA OPERADA PELA RECORRIDA, QUE,
38.ª- DECIDINDO COMO DECIDIU, VIOLOU, PARA ALÉM DAS “ORIENTAÇÕES PARA A DETERMINAÇÃO DAS CORREÇÕES FINANCEIRAS A APLICAR ÀS DESPESAS COFINANCIADAS PELOS FUNDOS ESTRUTURAIS E PELO FUNDO DE COESÃO”, PELO MENOS, AS NORMAS DOS ARTIGOS 28.°, DO RJEOP APLICÁVEL, 45.°, 1, F), 60.° E 98.°, DO REGULAMENTO (CE) N.°1083/2006, 180.° Do CPA, NA REDAÇÃO DADA PELO DECRETO-LEI N.° 442/91, DE 15 DE NOVEMBRO, E 313.°, DO INAPLICÁVEL, CCP (…)”.
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Notificada da interposição do recurso jurisdicional por parte da AD__, a Recorrida AGPOT, produziu contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido quanto à improcedência da presente ação.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.
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Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir resume-se a saber se a sentença recorrida, ao julgar nos termos e com o alcance explicitados no ponto I) do presente Acórdão, “(…) violou para além das “Orientações para a determinação das Correções Financeiras a aplicar às despesas cofinanciadas pelos Fundos Estruturais e pelo Fundo de Coesão”, pelo menos, as normas dos artigos 28.º, do RJEOP aplicável, 45.º, 1, f), 60.º e 98.º, do Regulamento (CE) N.º 1083/2006, 180.º do CPA, na redação dada pelo decreto-lei n.º 442/91, de 15 de novembro, e 313.º, do inaplicável, CCP (…)”.
Assim sendo, estas serão as questões a apreciar e decidir.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
O quadro fáctico [sem reparos] apurado na decisão judicial recorrida foi o seguinte: “(…)
1. Por deliberação da Câmara Municipal de (...) de 11.01.2008, aprovou-se o projeto de execução da obra de “Drenagem de águas residuais no (...) - 2ª Fase", o respectivo caderno de encargos e Programa do Concurso, determinando-se a abertura de concurso público para execução da empreitada - cf. doc. 1 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
2. O anúncio do procedimento destinado à celebração do contrato de empreitada referido no ponto anterior foi publicado em Diário da República, II Série, n.° 17, de 24.01.2008 - cf. doc. 4 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
3. Do anúncio referido no ponto precedente consta, além do mais, como -Quantidade ou extensão total" da obra, a de - cerca de 5500 m” e, como preço base, o valor de € 1 217 207,90 (um milhão, duzentos e dezassete mil, duzentos e sete euros e noventa cêntimos) - cf. doc. 4 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
4. Na sequência do procedimento concursal referido, em 21.01.2009 foi celebrado, entre o MUNICÍPIO (...) e a sociedade VA--, S.A., o contrato n.° 01/2008, -Contrato Escrito de Empreitada de Drenagem de Águas Residuais no (...) – 2ª Fase”, pelo valor de € 844 702,63 (oitocentos e quarenta e quatro mil, setecentos e dois euros e sessenta e três cêntimos) - cf. doc. 2 junto com a PI, cujo teor se dá por reproduzido.
5. Em 29.07.2009 foi celebrado entre o Estado Português e os Municípios de (...) e (...) “Contrato de Parceria”, pelo qual os citados municípios decidiram agregar os respectivos sistemas de abastecimento de águas e de saneamento num sistema integrado, denominado Sistema de ÁGUAS DA REGIÃO (...) - cf. doc. 4 junto com a PI, cujo teor se dá por reproduzido.
6. Pela cláusula segunda do contrato de parceria referido no ponto anterior, a gestão do sistema ali mencionado foi atribuída à autora - cf. doc. 4 junto com a PI, cujo teor se dá por reproduzido.
7. Em 17.09.2010 foi celebrado, entre o MUNICÍPIO (...), ÁGUAS DA REGIÃO (...), S.A. e VA---, S.A.”, acordo de cessão da posição contratual, relativamente ao contrato de empreitada identificado em 4.” - cf. doc. 3 junto com a PI, cujo teor se dá por reproduzido.
8. Na cláusula primeira do contrato de cessão da posição contratual referido no ponto anterior estabelece-se que o MUNICÍPIO (...) cede à ÁGUAS DA REGIÃO (...), S.A. a posição contratual que o primeiro detém no contrato de empreitada n.° 01/2008, daí fazendo decorrer “(…) a completa, total e incondicional assunção por parte da segunda (...) de todos os direitos e deveres que estavam afetos contratualmente ao MUNICÍPIO (...) (…)”, sem prejuízo do estabelecido quanto à partilha de responsabilidades - cf. doc. 3 junto com a PI e doc. 9 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
9. Quanto à partilha de responsabilidades, em anexo ao contrato referido no ponto anterior, foi aprovada a repartição da “imputação de custos do projeto”, nos seguintes termos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

10. Na sequência de candidatura da autora para o efeito, em 02.06.2011 foi celebrado “Contrato de Financiamento” entre o Programa Operacional Temático Valorização do Território e a autora, no âmbito da operação “AD__ – 1ª fase do sistema de Recolha de AR nos Concelhos de (...), (...) e (...)”, a que foi atribuído o código POVT-02-0146- FCOES-000142 - cf. doc. constante de fls. 421 e ss do processo administrativo junto aos autos (“PA”), cujo teor se dá por reproduzido.
11. No âmbito da referida candidatura, foi submetido a cofinanciamento, além do mais, o concurso público para a execução da empreitada “Drenagem de Águas Residuais no (...) – 2ª Fase” - cf. doc. 3 junto com a PI e docs. 9 e 12 juntos com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
12. Por ofício datado de 05.02.2013, subscrito pela Presidente da Comissão Diretiva do Programa Operacional Temático Valorização do Território, e com referência ao contrato de empreitada mencionado no ponto anterior, a entidade demandada solicitou à autora "informação detalhada sobre os montantes dos trabalhos que foram executados pela AD__, SA e pela Câmara Municipal de (...), bem como aqueles que foram suprimidos” - cf. doc. 10 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
13. Em resposta ao ofício referido no número anterior, a autora informou a demandada de que, no âmbito do contrato de empreitada “Drenagem de Águas Residuais e Pluviais em (...)”, a mesma tinha executado trabalhos no valor de € 264.063,91 e que o MUNICÍPIO (...) executara trabalhos no valor de e 146.343,14 - cf. doc. 11 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
14. Por ofício de 07.06.2013, a Ré informou a autora de proposta de decisão que consistia, no essencial, na «aplicação de uma correção financeira de 25% sobre o montante do objecto físico final, no valor de € 410.407,04, em relação ao contrato de Empreitada da Rede de Drenagem de Águas Residuais e Pluviais em (...)” (...)» - cf. doc. 12 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
15. Por missiva de 25.06.2013, dirigida à Presidente da Comissão Diretiva do Programa Operacional Temático Valorização do Território, a autora pronunciou-se sobre a proposta de decisão referida no ponto antecedente, no sentido da sua revisão e exclusão da aplicação de qualquer correção financeira - cf. doc. 13 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
16. Em 23.10.2013 foi elaborada informação pelos serviços da ré, da qual consta o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cf. doc. 14 junto com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
17. Em 25.10.2013 foi exarado, pela Presidente da Comissão Diretiva do Programa Operacional Temático Valorização do Território, despacho de concordância sobre a informação referida no ponto anterior - cf. doc. 14 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
18. Por ofício de 28.10.2013, subscrito pela Presidente da Comissão Diretiva do Programa Operacional Temático Valorização do Território, a demandada informou a autora do seguinte: «Na sequência da análise dos argumentos aduzidos por V. Exa. em sede de Audiência Prévia, através do V/ Oficio (...), com data de 25.06.2013, vimos pelo presente comunicar que a Autoridade de Gestão do POVT entendeu manter a decisão de aplicação de uma correção financeira 25% sobre o montante da despesa submetida a cofinanciamento do contrato 15/42 relacionado com a Empreitada de "Drenagem de Águas Residuais no (...) – 2ª Fase", com os fundamentos de facto e de direito que constam do documento que se anexa a este Oficio e que dele faz parte integrante (...)» - cf. doc. 14 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
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Nos termos do artigo 662º do CPC, aplicável ex vi artigos 1º e 140º do CPTA, adita-se a seguinte factualidade:
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19 - É o seguinte o teor da decisão favorável do financiamento referido nos sobreditos pontos 10) e 11) do probatório: - fls. 421 e seguintes do P.A. -“(…)
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

20 - É o seguinte o teor contrato de financiamento referido no sobredito ponto 10) do probatório: - fls. 421 e seguintes do P.A. -“(…)
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
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III.2 - DO DIREITO
A Autora, aqui Recorrente, pediu ao Tribunal a quo a declaração judicial de ilegalidade, por nulidade ou anulabilidade, do ato administrativo da Ré, aqui Recorrida, de 25.10.2013, que “entendeu manter a decisão de aplicação de uma correção financeira de 25% sobre o montante da despesa submetida a cofinanciamento do contrato relacionado com a Empreitada “Drenagem de Águas Residuais no (...) – 2ª fase”.
A par do pedido anulatório, a Autora peticionou também a condenação da Ré a “(...) praticar o ato devido, isto é, considerar como totalmente elegíveis as despesas do contrato no que se refere aos trabalhos por si executados no montante de € 264,063.90 (…)”.
Arrimou tais pretensões jurisdicionais no entendimento, como se apreciou na decisão judicial recorrida, de que (i) a decisão administrativa carecia de fundamento, uma vez que não teria existido qualquer irregularidade determinante da correção financeira aplicada; (ii) que norma invocada pela Autoridade de Gestão quanto aos limites à modificação de contratos públicos [artigo 313.º do Código dos Contratos Públicos] não estava em vigor à data do procedimento concursal que antecedeu o contrato de empreitada de obras públicas em questão, inexistindo, de todo em todo, restrições à possibilidade de supressão de trabalhos pelo contraente público; que (iii) a modificação do contrato deveria ser perspetivada apenas do ponto de vista da parcela do contrato público que foi submetida a financiamento através do Programa de Operacional Temático Valorização do Território, a qual consiste, unicamente, na componente da empreitada relativa às aguas residuais, parcela em que não existiu significativa supressão de trabalhos; que (iv) o ato impugnado incorreu em preterição de audiência prévia de interessados, e ainda que a (v) tabela COCOF que determinou a correção financeira visada nos autos carece de vinculatividade ou força jurídica.

O T.A.F. de Aveiro, porém, assim não o entendeu.
Fê-lo, sobretudo, desde logo, quanto à matéria assinalada nos sobreditos pontos (i) e (ii), por entender que, da interpretação do RJEOP e do CPA, resultava já a imposição, como princípio geral em matéria de contratos públicos, da intangibilidade do objecto do contrato - o que, aliás, veio a ser consagrado no artigo 313º do CCP -, cuja infração ocorre sempre que a modificação introduzida, se tivesse constado das condições do procedimento pré-contratual, teria permitido admitir concorrentes diferentes dos que se apresentaram a concurso ou, semelhantemente, teria viabilizado propostas diferentes das apresentadas no procedimento.
No caso versado, a verificada redução dos trabalhos em mais de 50%, assim como a correspondente redução dos custos, meios humanos e técnicos que se lhe associam, habilitaria um conjunto potencial de interessados, que não se terá apresentado a concurso à vista da sua incapacidade para fazer face às dimensões previstas nas normas do procedimento, constatando-se, por isso, uma a existência de uma alteração substancial do contrato, que limitou ou restringiu a livre concorrência, o que legitima a irregularidade detetada pela autoridade de gestão e que justificou a aplicação da correção financeira em análise.
Por sua vez, e quanto à causa de invalidade identificada sob o sobredito ponto (iii), o Tribunal recorrido considerou que a aferição das regras de contratação pública não pode ser feita, até pelo respeito pelo princípio da intangibilidade do contrato, senão por referência à globalidade do contrato de empreitada, cuja execução integral a Autora assumiu por força do acordo de cessão de posição contratual celebrado com o contratante inicial.
Já quanto à invocada preterição da audiência prévia de interessados, entendeu o Tribunal a quo a mesma não se verificou “(…) considerando justamente que, não só teve ela a possibilidade de se pronunciar concretamente quanto à matéria revista, isto é, relativamente ao objecto da aplicação da correção financeira, como ainda foi a decisão final alterada em conformidade com essa sua pronúncia (…)”.
Derradeiramente, e no tocante à alegação vertida no sobredito ponto (v), entendeu o Tribunal Recorrido que, não obstante a Nota COCOF consubstanciar uma mera recomendação de atuação dirigida aos organismos dos Estados-membros responsáveis pelo controle, sempre a auto-vinculação da Administração ao teor da mesma in casu não excluiu o espaço próprio de livre apreciação administrativa, que impõe a ponderação das circunstâncias concretas da hipótese em análise, já que resulta demonstrado que “(…) a entidade administrativa ponderou acerca do ajuste dos parâmetros cristalizados na dita tabela às especificidades do caso, considerando-a adequada à situação concreto (…) ”.
A Recorrente opõe-se ao assim sopesado e decidido, impetrando-lhe violação “(…) para além das “Orientações para a determinação das Correções Financeiras a aplicar às despesas cofinanciadas pelos Fundos Estruturais e pelo Fundo de Coesão”, pelo menos, as normas dos artigos 28.º, do RJEOP aplicável, 45.º, 1, f), 60.º e 98.º, do Regulamento (CE) N.º 1083/2006, 180.º do CPA, na redação dada pelo decreto-lei n.º 442/91, de 15 de novembro, e 313.º, do inaplicável, CCP (…)”.
O que funda, brevitatis causae, (i) na convicção de que o Tribunal a quo, erroneamente, (i.1) faz equivaler a supressão de trabalhos a uma modificação do objeto do contrato, taxando-a como passível de violar o princípio da concorrência e (i.2) aplica as normas COCOF a casos em que as despesas com trabalhos suprimidos não foram sequer candidatados e, muito menos, apresentadas para efeito de cofinanciamento, bem como (ii) no entendimento de que (ii.1) a diminuição do objeto contratual verificada no caso concreto não é passível de constituir irregularidade para efeitos de aplicação de qualquer correção financeira; que (ii.2) a supressão de trabalhos – como ocorreu no caso em análise, durante a execução do contrato só na parte relativa à despesa não candidatada a cofinanciamento – não se assemelhou à modificação do objeto contratual.
Vejamos, convocando, desde já, o tecido fáctico mais relevante apurado na decisão judicial recorrida.
Assim, e no que para o que aqui releva, cabe notar que dimana do probatório coligido nos autos, de entre outra realidade, que, por deliberação da Câmara Municipal de (...) de 11.08.2008, foi aprovado o projeto de execução da obra de “Drenagem de águas residuais no (...) – 2ª Fase”.
Mais brota que, na sequência do procedimento concursal referido, em 21.01.2009 foi celebrado, entre o MUNICÍPIO (...) e a sociedade VA--, S.A., o contrato n.° 01/2008, - Contrato Escrito de Empreitada de Drenagem de Águas Residuais no (...) - 2ª Fase”, pelo valor de € 844 702,63.
Resulta ainda que, em 17.09.2010 foi celebrado, entre o MUNICÍPIO (...), ÁGUAS DA REGIÃO (...), S.A. e VA---, S.A.”, acordo de cessão da posição contratual, relativamente ao contrato de empreitada identificado em 4.”, em cuja cláusula primeira estabelece-se que o MUNICÍPIO (...) cede à ÁGUAS DA REGIÃO (...), S.A. a posição contratual que o primeiro detém no contrato de empreitada n.° 01/2008, daí fazendo decorrer “(…) a completa, total e incondicional assunção por parte da segunda (...) de todos os direitos e deveres que estavam afetos contratualmente ao MUNICÍPIO (...) (…)”, sem prejuízo do estabelecido quanto à partilha de responsabilidades, [documento] onde ficou consignada a vinculação da Autora, aqui Recorrente, a realizar trabalhos de empreitada no montante de € 278,150,68 e do MUNICÍPIO (...) a executar obras no montante de € 566,551,25, num total de € 844,702,63.
Brota ainda que a Autora, aqui Recorrente, apresentou uma candidatura junto da Ré com vista à obtenção de comparticipação financeira para a realização da operação designada "AD__ – Iª fase do Sistema de Recolha de AR nos Concelhos de (...), (...) e (...)", do Eixo II - Rede Estruturante de Abastecimento de Água e Saneamento, que abrange, de entre outras intervenções, a construção de 5,5 km de rede de drenagem no sistema autónomo de “Ouca o qual abrange os lugares de Ouca Boco e Carregosa. com uma população residente total de 1 456 habitantes (em 2007)”, que integra a empreitada posta a concurso.
Finalmente, mais emerge que, tendo-se apurado que, com reporte ao contrato de empreitada celebrado pelo montante de € 880,702,63, que apenas foram executados trabalhos no valor de € 410,407,05 [€ 264.063,903 pela AD__ e € 146,343,14 pelo MUNICÍPIO (...)], num total de € 844,702,63, a Ré considerou existir uma supressão de trabalhos correspondente a € 439,295,59, e, qua tale, uma redução de 51,41% do objecto físico do contrato, na esteira do que decidiu aplicar à Autora uma correção financeira de 25% sobre o montante sobre o montante da despesa submetida a cofinanciamento do contrato relacionado com a Empreitada de "Drenagem de Águas Residuais no (...) – 2ª Fase”.
Ora, do circunstancialismo fáctico ora evidenciado destaca-se a existência de “dois patamares” de intervenção jurídica da Recorrente no âmbito do caso em análise.
O primeiro é relativo ao acordo de cessão da posição contratual celebrado com o MUNICÍPIO (...) [e VA---, S.A.], no âmbito do qual a Recorrente assumiu todos os direitos e deveres que estavam afetos contratualmente ao MUNICÍPIO (...) no âmbito da Empreitada de "Drenagem de Águas Residuais no (...) – 2ª Fase”, sem prejuízo do estabelecido quanto à partilha de responsabilidades, onde ficou consignada a vinculação da Autora, aqui Recorrente, a realizar trabalhos de empreitada no montante de € 278,150,68 e do MUNICÍPIO (...) a executar obras no montante de € 566,551,25, num total de € 844,702,63.
O segundo relaciona-se com o contrato de incentivos financeiros celebrado com a Recorrida para a realização da operação designada "AD__ – Iª fase do Sistema de Recolha de AR nos Concelhos de (...), (...) e (...)", do Eixo II - Rede Estruturante de Abastecimento de Água e Saneamento, que abrange, de entre outras intervenções, a construção de 5,5 km de rede de drenagem nos lugares de Ouca e Boco, que integra a empreitada posta a concurso.

Definidos assim os “dois patamares de intervenção” de jurídica da Recorrente, refira-se que o acordo de cessão de posição contratual, ademais e especialmente, a imputação de responsabilidades na execução da empreitada aí definida, produz apenas eficácia inter-partes.
Assim, à míngua de idêntica previsão de repartição de responsabilidade no âmbito do contrato de concessão de incentivos de financeiros, a Autora, aqui Recorrente, não pode julgar-se dispensada das intervenções abrangidas no financiamento pelo facto de, por acordo de cessação de posição contratual, ter atribuído ao MUNICÍPIO (...) a responsabilidade pela execução de cerca de 2/3 das obras relativas à empreitada visada nos autos.
Daí que a falta de cumprimento do contrato de financiamento, em particular, no tocante à da execução da construção de 5,5 km de rede de drenagem nos lugares de (…), a verificar-se, será apenas de imputar à Autora e não ao MUNICÍPIO (...), que nem sequer figura como outorgante do mesmo.
Por força de tal convicção decorre, obviamente, a certeza quanto à bondade do julgamento operado pelo Tribunal a quo neste domínio no sentido de que “(…) a aferição do cumprimento das regras da contratação pública, subjacente à decisão impugnada, não pode senão ser feita por referência à globalidade do contrato de empreitada, uma vez que foi este, integralmente considerado, o objecto do procedimento concursal cuja (ir)regularidade se afere no âmbito do controlo do programa de financiamento em causa nos autos (…)”.
A mesma asserção, porém, já não é atingível no que tange à decidida existência de uma alteração substancial do contrato, que limitou ou restringiu a livre concorrência, o que legitimou a irregularidade detetada pela autoridade de gestão e que justificou a aplicação da correção financeira em análise.
De facto, rememore-se que o fundamento da aplicação da correção financeira censurada nos autos foi a circunstância da Ré ter considerado, com reporte ao contrato de empreitada celebrado pelo montante de € 880,702,63, existir uma supressão de trabalhos correspondente a € 439,295,59, e, qua tale, uma redução de 51,41% do objecto físico do contrato, no seu entendimento, atentatória dos princípios da livre concorrência, igualdade e transparência.
Ou seja, foi o facto da Ré ter entendido existir uma modificação contratual - no sentido da redução do objeto físico do contrato de empreitada - violadora dos princípios supra apontados, visão esta plenamente suportada pelo Tribunal a quo.
Salvo o devido respeito, não acompanhamos minimamente esta posição.
Realmente, “suprimir” é sinónimo de “abolir” ou “dissolver” ou “eliminar “ ou “ excluir” [Dicionário Porto Editora].
Sucede que a matéria de facto dada como provada não legitima a referência a qualquer elemento no sentido da “supressão de trabalhos” no âmbito do contrato de empreitada visada nos autos nos termos e com o alcance supra explicitados.
De facto, o que resulta apurado é que foram executados trabalhos no valor de € 410,407,05 [€ 264.063,903 pela AD__ e € 146,343,14 pelo MUNICÍPIO (...)], num total de € 844,702,63.
Mas daí não decorre qualquer “supressão de trabalhos”, mas antes e apenas a “inexecução parcial” da empreitada.
Qualquer outra conclusão em face do aludido preceito legal constitui uma extrapolação não sustentável, mesmo temerária, por falta do respectivo nexo lógico.
Nem sequer se pode admitir que o termo “supressão” foi empregue impropriamente, ou seja, com vista a traduzir a realidade “inexecução” e não “extinção ou abolição”, pois que a “inexecução parcial do contrato” não faz operar qualquer alteração substancial do contrato, como, aliás, sustentou a Ré para a aplicação da correção financeira visada nos autos.
Realmente, a “alteração substancial do contrato” corresponde àqueles casos em que “(…) as alterações introduzidas apresentem características substancialmente diferentes das do contrato inicial e sejam, consequentemente, suscetíveis de demonstrar a vontade das partes de renegociar os termos essenciais do contrato (…)” [cfr. Acórdão Comissão/CAS Succhi di Frutta SPA, de 29.04.2004, proc. C-469/99].
Ora, nada disso é verificável no caso em análise.
De facto, não se descortina a aquisição processual de qualquer tecido fáctico expressivo da introdução por parte da Recorrente de quaisquer características diferentes do contrato de empreitada visado nos autos, ou seja, da “alteração substancial do contrato”.
Diferentemente, o que resulta verificável é apenas a “inexecução parcial” da empreitada.
Ora, como é sabido, existe erro nos pressupostos de facto quando o acervo factual considerado provado e que esteia a subsunção jurídica não assume correspondência com a realidade ôntica; e subsiste erro nos pressupostos de direito quando a estatuição é ditada por normativos desadequados ou desajustados à realidade que impõe a atuação jurídica.
Assim, no quadro em apreço, é de manifesta evidência de que a estatuição vertida no ato impugnado é ditada por normativos desadequados ou desajustados ao acervo factual considerado provado.
O que legitima a conclusão de que o acto impugnado incorreu em erro nos pressupostos de direito.
O que atinge fatalmente a decisão judicial recorrida, já que esta, ao validar a posição da Administração no particular conspecto em análise, fez incorreta subsunção do tecido fáctico apurado nos autos ao bloco legal aplicável, sendo, por isso, merecedora da censura que a Recorrente lhe dirige.
Note-se que o que se vem de expor, com referência ao mérito dos autos, significa que o ato impugnado, nos termos e com fundamentos invocados, não pode manter-se, por incorrer em vício de violação de lei.
Mas já não que a atuação da Autora, efectivamente, apurada nos autos [inexecução parcial da empreitada] não é passível de nova apreciação por parte da Administração – como, aliás, é sua obrigação -, e eventual aplicação das sanções positivadas nos artigos 14º e 15º do contrato de incentivos financeiros celebrado pelas partes.
Seja como for, a decisão judicial recorrida não pode manter-se pelas razões supra aduzidas, o que determina a prejudicialidade do conhecimento da remanescente argumentação aduzida no domínio do invocado erro de julgamento de direito.
Assim deriva, naturalmente, que se impõe conceder provimento ao presente recurso, devendo ser revogada a decisão judicial recorrida e julgada improcedente a presente ação.
Ao que se provirá no dispositivo.
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IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em CONCEDER PROVIMENTO ao recurso jurisdicional “sub judice”, revogar a decisão judicial recorrida e julgar a improcedente a presente ação.
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Custas pela Recorrida.
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Porto, 08 de abril de 2022,

Ricardo de Oliveira e Sousa
Rogério Martins
Luís Migueis Garcia