Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00571/13.1BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/08/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:RECURSO HIERÁRQUICO NECESSÁRIO; CONTAGEM DE PRAZOS
Sumário:1 – Resulta do artigo 58.º nº 2 do CPTA que os atos administrativos que enfermam de mera anulabilidade podem ser impugnados, em regra, no prazo de três meses, a contar da data da notificação do ato a impugnar.
2 - A contagem do prazo de três meses, estabelecido no art. 58, n.º 2, al. b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) para a impugnação de atos administrativos, quando esse prazo abranja período correspondente a férias judiciais é contínuo, mas suspende-se durante as férias judiciais.
3 - Quando o prazo abranja período em que decorram férias judiciais, deve o referido prazo de três meses ser convertido em 90 dias, para efeito da suspensão imposta pelo artigo 138.º, números 1 e 4 do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 58.º, número 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
4 - Tratando-se de atos de que caiba Recurso Hierárquico Necessário, o originário ato não é ainda passível de impugnação contenciosa, não estando nenhum prazo a correr para esse efeito, até que seja proferida decisão no Recurso Hierárquico.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:JFGO
Recorrido 1:Ministério da Educação
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no qual, a final, se pronuncia no seguinte sentido:
“1) Deverá ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional, no que concerne às arguidas nulidades da decisão judicial em crise;
2) Deverá ser concedido provimento ao recurso jurisdicional, revogando-se a decisão judicial recorrida e determinando-se a baixa dos autos à 1.ª instância para prosseguimento dos seus ulteriores termos, se nada mais entretanto vier a obstar” (Cfr. Fls. 224 a 227v Procº físico).
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Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I Relatório
JFGO, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada contra o Ministério da Educação, tendente, designadamente, “à anulação da decisão de Recurso de avaliação do desempenho, homologada em 19/11/2012 … que negou provimento ao recurso interposto … do indeferimento da sua reclamação que apresentou da Avaliação de Desempenho a que foi submetido no ano letivo 2011/2012”, inconformado com o Acórdão proferido em 22 de Maio de 2015, através do qual, em resultado de reclamação para a Conferência foi a reclamação julgada “improcedente”, confirmando-se a pretérita Sentença proferida em 24 de Novembro de 2014, na qual se havia decidido considerar “procedente a aventada exceção de caducidade do direito de agir” (Cfr. Fls. 116 a 143 Procº físico), veio interpor recurso jurisdicional face ao mesmo, proferido em primeira instância e em coletivo, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

Formulou o aqui Recorrente/José nas suas alegações de recurso, apresentadas em 14 de Julho de 2015, as seguintes conclusões (Cfr. Fls. 198 a 203 Procº físico):

“I. A decisão ora recorrida conclui pela caducidade do direito de ação, tendo assentado tal decisão, por aplicação do n.º 4 do art. 59.º do CPTA ao caso dos presentes autos.

II. O A. ora Recorrente não foi ouvido quanto ao entendimento prolatado pelo Tribunal a quo, não tendo exercido quanto a esta matéria o seu direito ao contraditório.

III. O Tribunal a quo introduziu e decidiu com referência a norma jurídica distinta, uma questão de direito nova para as partes sem as ouvir previamente, tendo o Recorrente sido prejudicado pela mesma.

IV. O Tribunal a quo ao não ter procedido à notificação prévia do A. ora Recorrente para se pronunciar sobre a exceção de caducidade nos moldes em que a mesma acabou por ser decidida, violou o disposto no art. 87.º n.º 1 alínea b) do CPTA e art. 3.º do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA.

V. A Douta Decisão recorrida não se pronunciou sobre a matéria aduzida pelo Recorrente em sede de Reclamação para a Conferência, tendo-se limitado a confirmar o Saneador-Sentença.

VI. Pelo que, a Douta Decisão ora recorrida enferma de vício de omissão de pronúncia, por violação do preceito legal do art. 608.º do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA, bem como do disposto no n.º 1 do art. 95.º do CPTA.

VII. De igual sorte, incorre a Douta Decisão ora recorrida em erro de julgamento, porquanto entendeu que ao caso dos autos era aplicável o disposto no n.º 4 do art. 59.º do CPTA, tendo considerado que as impugnações administrativas em causa eram facultativas, quando na realidade se tratam de impugnações administrativas necessárias.

VIII. É que, quando em lei especial posterior ao CPTA esteja prevista a utilização de reclamação ou recurso inseridos em trâmite a seguir no respetivo procedimento avaliativo, como é o caso do procedimento previsto no Decreto-Regulamentar n.º 26/2012, de 21.02, impõe-se qualificar tais impugnações administrativas como necessárias.

IX. De resto, tais impugnações administrativas necessárias constituem, inclusivamente, pressuposto processual do qual depende o recurso à via contenciosa.

X. Assim sendo, como não pode deixar de ser entendido, nas situações em que haja previsão legal de impugnação administrativa necessária, o prazo para a propositura da ação não se suspende, dado que nem sequer começa a correr sem prévia utilização, dentro dos prazos legais desse meio processual.

XI. A Douta decisão ora recorrida ao considerar aplicável aos presentes autos a disposição legal contida no n.º 4 do art. 59.º do CPTA, incorreu em manifesto lapso na determinação da norma jurídica aplicável.

XII. Desta feita, os dias que mediaram entre a data do indeferimento da reclamação e a interposição do recurso hierárquico, nunca poderiam ter sido contabilizados para efeitos do prazo de interposição da impugnação judicial, porquanto, tal prazo só começaria a correr com a decisão da impugnação administrativa necessária.

XIII. Ora, tendo a proposta dos árbitros quanto ao mérito de recurso hierárquico sido homologada em 19-11-2012 – constituindo tal homologação o ato final do procedimento avaliativo – e, sendo certo que a mesma foi notificada ao A. ora Recorrente em 23-11-2012;

XIV. O prazo a que alude a alínea b) do n.º 2 do art. 58.º do CPTA, convertido em 90 dias (devido às férias judiciais do natal), contado da data da notificação da homologação, terminou no dia 06-03-2013.

XV. Ora, tendo a presente ação dado entrada no dia 05-03-2013 só se pode concluir pela sua tempestividade, inexistindo, ao contrário do entendido pela Douta Decisão recorrida, caducidade do direito de ação.

XVI. Nem poderá, considerar-se, como foi feito sugerido no Saneador-Sentença confirmado pela Decisão ora Recorrida, que o ato que indeferiu o recurso hierárquico é meramente confirmativo dos que o antecederam.

XVII. Primeiro, porque o ato impugnado o padece de vícios próprios, tal como alegado na inicial.

XVIII. Segundo, porque para existir um ato confirmativo, o mesmo sempre teria de ser emanado pela mesma entidade, com conteúdo idêntico ao desta, e fosse uma mera repetição dessa decisão, perante pressupostos de facto e de direitos idênticos, o que não sucedeu in casu.

XIX. E, por último porque o ato que indeferiu o recurso hierárquico interposto pelo A. ora Recorrente, constitui o ato final do procedimento avaliativo, estando dotado de eficácia externa e, por essa razão contenciosamente impugnável.

XX. O que vale por dizer que, mesmo que a decisão final do procedimento mantenha a decisão inicial – o que, como se viu, não é caso dos autos – a avaliação homologada será objeto mediato de impugnação contenciosa da decisão que decidiu a impugnação administrativa necessária, sendo que lhe podem ser imputados vícios próprios, bem como ilegalidades cometidas ao longo do procedimento.

XXI. Dito por outras palavras, mesmo que a decisão final do procedimento de avaliação nada inove, o ato final do respetivo procedimento é dotado de eficácia externa impugnável no prazo previsto na alínea b) do n.º 2 do art. 58.º do CPTA.

XXII. Sem prescindir, sempre se dirá que mesmo que se entenda que a decisão do recurso hierárquico seja meramente confirmativa dos atos que a antecederam, o ato primário só adquiriria plenitude de efeitos para fim de tutela contenciosa com o decurso do prazo legal para decidir a impugnação administrativa necessária, o que não sucedeu no caso dos autos.

XXIII. De resto, dos prazos administrativos previstos no art. 25.º do Decreto-Regulamentar n.º 26/2012, de 21.02, apenas conhecia o ora Recorrente, a proposta de decisão do recurso hierárquico tinha sido elaborada em 12-11-2012 e homologada em 19-11-2012, e que ambas lhe foram notificadas em 23-11-2012, ou seja, dentro dos 8 dias previstos no art. 69.º do CPA.

TERMOS EM QUE DEVERÁ SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO JURISDICIONAL, JULGANDO-SE O MESMO PROCEDENTE E REVOGANDO-SE O ACÓRDÃO RECORRIDO, DEVENDO OS AUTOS PROSSEGUIR OS SEUS ULTERIORES TERMOS PROCESSUAIS ATÉ FINAL, COMO É DE INTEIRA JUSTIÇA.”

O Recurso Jurisdicional veio a ser admitido, por despacho de 22 de Setembro de 2014 (Cfr. Fls. 208 Procº físico).

O aqui Recorrido/Ministério não veio apresentar contra-alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 20 de Janeiro de 2016, veio a emitir Parecer em 4 de Fevereiro de 2016, no qual, a final, se pronuncia no seguinte sentido:
“1) Deverá ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional, no que concerne às arguidas nulidades da decisão judicial em crise;
2) Deverá ser concedido provimento ao recurso jurisdicional, revogando-se a decisão judicial recorrida e determinando-se a baixa dos autos à 1.ª instância para prosseguimento dos seus ulteriores termos, se nada mais entretanto vier a obstar” (Cfr. Fls. 224 a 227v Procº físico).
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, a violação do contraditório e a nulidade por omissão de pronúncia, decorrente da não ponderação da matéria aduzida pelo Reclamante, em sede de reclamação para a conferência do TAF a quo, mais se imputando erros de julgamento de direito, em violação do disposto no artigo 59.º, n.º 4, do CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade:
“1. Em 03.08.2012, o Autor foi notificado da sua avaliação final.
2. Desta apresentou reclamação em 13.08.2012;
3. Em 07.09.2012 foi o Autor notificado do indeferimento da sua reclamação;
4. O Autor interpôs recurso hierárquico em requerimento datado de 21.09.2012;
5. O Autor foi notificado em 23.11.2012 do indeferimento do recurso hierárquico;
6. A presente ação administrativa especial deu entrada neste tribunal em 05.03.2013

IV – Do Direito
JFGO veio interpor recurso jurisdicional do acórdão do TAF do Porto, proferido em 22/05/2015, que confirmou a precedente Sentença que havia declarado a intempestividade da presente ação administrativa especial.

O identificado Recorrente, arguiu:
(i) a nulidade da decisão reclamada, por violação do contraditório e;
(ii) a nulidade da decisão, decorrente de omissão de pronúncia, resultante da não ponderação da matéria aduzida pelo Reclamante, em sede de reclamação para a conferência do TAF.
Mais são invocados erros de julgamento de direito, que se consubstanciarão em violações do artigo 59.º, n.º 4, do CPTA.

Vejamos:
DAS NULIDADES DA DECISÃO RECORRIDA
É suscitada a nulidade da decisão recorrida, decorrente da violação do princípio do contraditório.

Suscita-se a violação do n.º 3 do artigo 3.º do CPC de 2013, no que concerne ao facto de não ter sido facultado o contraditório relativamente à, a final, declarada “caducidade do direito de agir”.

Com efeito, estabelece o referido artigo 3.º, n.º 3, do CPC que “O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.

Correspondentemente, refere-se, entre muitos outros no Acórdão do Colendo STA, de 03/03/2010, no Processo n.º 063/10, que “(...) nenhuma decisão deve ser tomada pelo juiz sem que previamente tenha sido dada ampla e efetiva possibilidade à parte contra quem é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar, com vista a evitar decisões surpresa. E a inobservância deste contraditório consubstanciará, fatalmente, uma nulidade processual se a omissão do convite à parte para tomar posição sobre qualquer questão que a possa afetar e que ainda não tenha tido possibilidade de contraditar, for suscetível de influir no exame ou decisão da causa.”

No mesmo sentido se pronunciou já este TCAN, designadamente, em 22.06.2011, no Processo n.º 00369/07.6BEPRT-B, onde se referiu que ”(...) O princípio do contraditório, enunciado no art. 3.º, n.º 2, do CPC, impõe que, antes de decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, seja proporcionada às partes a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. (...) Está em causa, de facto, o cumprimento do princípio estrutural do contraditório, que exige que, a não ser em casos excecionais previstos na lei, o tribunal não poderá resolver o conflito de interesses que uma ação pressupõe sem que a parte demandada seja devidamente chamada para deduzir oposição [artigo 3.º n.º 1 do CPC ex vi 1.º do CPTA]. Sendo que o juiz deverá observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido possibilidade de sobre elas se pronunciarem [artigo 3.º n.º 3 do CPC ex vi 1.º CPTA]. O princípio do contraditório é estrutural no processo judicial, já que emana do respeito pela própria dignidade da pessoa humana, sendo, assim, indispensável ao Estado de direito democrático que qualifica a nossa República [artigos 1.º e 2.º da CRP]. (….)”.

Em concreto, verifica-se que efetivamente o tribunal a quo não suscitou previamente a exceção da caducidade do direito de ação, que veio a decidir a final, por forma a que pudesse ter sido, em tempo, exercido o necessário contraditório.

Em qualquer caso, o Ministério da Educação havia suscitado na sua Contestação a “Caducidade do Direito de Ação”, a qual, no entanto, havia assentado em pressupostos e fundamentos que não coincidiram integralmente com aqueles que determinaram a caducidade declarada na decisão recorrida.

Em resultado da exceção da caducidade da Ação suscitada pelo Ministério da Educação, o tribunal a quo, por despacho em 10/02/2014, determinou que se procedesse à notificação do Autor para que, querendo, pudesse pronunciar face à matéria da exceção.

Consequentemente, veio o Autor a ser notificado do referido Despacho em 11/03/2014, o que determinou que tenha vindo a apresentar requerimento em 25 de Março de 2014, no qual, a final, se pronuncia no sentido de dever ser julgada improcedente “a exceção de extemporaneidade da ação”.

Sendo certo que os poderes do tribunal, em matéria de direito, não estão limitados pelo princípio do dispositivo, de harmonia com o preceituado no artigo 5.º, n.º 3, do CPC, e tendo sido facultado e efetivamente exercido o contraditório relativamente à suscitada caducidade, o facto do tribunal a quo ter decidido no sentido da verificação da suscitada caducidade, ainda que com base em divergente interpretação de direito, não significa que o contraditório realizado não se tenha por realizado.

Como sublinhou o Ministério Público no seu Parecer, “tratando-se aqui de uma exceção de conhecimento oficioso do tribunal e incidindo o pomo da discórdia em argumentação de natureza técnico-jurídica, o julgador não estava inibido de interpretar e aplicar o direito, sob o prisma do seu particular entendimento doutrinal”, em face do que se não mostra preterido o princípio do contraditório.

Assim, não se reconhece a verificação da suscitada nulidade secundária da decisão judicial de 1ª instância, por preterição do direito do contraditório.

* * * *
Suscita ainda o Recorrente a nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia relativamente à argumentação por si aduzida face à suscitada caducidade do direito de ação.

Com efeito, não se reconhece que constitua omissão de pronúncia a desconsideração da argumentação jurídica avançada pelo Recorrente, relativamente à intempestividade da presente ação defendida pelo Ministério da Educação e acolhida pelo tribunal a quo, mormente quanto à determinação do termo inicial do prazo de caducidade.

A desconsideração da argumentação jurídica aduzida, a qual a ser admitida e reconhecida, poderia levar porventura a uma decisão divergente da adotada, consubstanciar-se-ia, ainda assim e quanto muito, num erro de julgamento de direito, não podendo constituir uma omissão de pronúncia, geradora da nulidade da decisão recorrida.

Assim, improcederá igualmente a suscitada nulidade.

DO ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO
Invoca o Recorrente erros de julgamento na decisão recorrida suscetíveis de determinar a invalidade da decisão objeto de recurso.

Com efeito, relativamente à declarada caducidade do direito de ação, no domínio das ações de condenação à prática do ato devido, vigora o regime dos prazos para a impugnação contenciosa dos atos administrativos constante do artigo 69.º do CPTA, que estatui:
“1 - Em situações de inércia da Administração, o direito de ação caduca no prazo de um ano contado desde o termo do prazo legal estabelecido para a emissão do ato ilegalmente omitido.
2 - Tendo havido indeferimento, o prazo de propositura da ação é de três meses.
3 - No caso previsto no número anterior, o prazo corre desde a notificação do ato, sendo aplicável o disposto nos artigos 59.º e 60.º”.

Já nos termos do n.º 1 do citado artigo 59.º do mesmo CPTA, “O prazo para a impugnação pelos destinatários a quem o ato administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação, ainda que o ato tenha sido objeto de publicação obrigatória”.

Estabelece, por outro lado, o n.º 4 do referido artigo 59.º do CPTA, que “A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal”.

Relativamente à contagem de prazos refere, por outo lado, o artigo 72.º, do anterior CPA, que:
“1 - À contagem dos prazos são aplicáveis as seguintes regras:
a) Não se inclui na contagem o dia em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr;
b) O prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades e suspende-se nos sábados, domingos e feriados;
c) O termo do prazo que caia em dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.
2 - Na contagem dos prazos legalmente fixados em mais de seis meses incluem-se os sábados, domingos e feriados”.

Decorre do Acórdão deste TCAN nº 00298/10.6BEMDL de 18-12-2015 que “Resulta do artigo 58.º nº 2 do CPTA que os atos administrativos que enfermam de mera anulabilidade podem ser impugnados, em regra, no prazo de três meses, a contar da data da notificação do ato a impugnar.
A contagem do prazo de três meses, estabelecido no art. 58, n.º 2, al. b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) para a impugnação de atos administrativos, quando esse prazo abranja período correspondente a férias judiciais é contínuo, mas suspende-se durante as férias judiciais.
Assim, quando o prazo abranja período em que decorram férias judiciais, deve o referido prazo de três meses ser convertido em 90 dias, para efeito da suspensão imposta pelo artigo 138.º, números 1 e 4 do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 58.º, número 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”.*

Efetivamente, decorre do entendimento firmado na doutrina e na jurisprudência, que o prazo de três meses, previsto no artigo 58.° do CPTA, se deve considerar um prazo de noventa dias, por aplicação do disposto no artigo 279.°, al. a) do Código Civil, se e quando ocorrer a necessidade de contabilizar a suspensão decorrente do período de férias judiciais.

Neste sentido se pronunciaram também e designadamente Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, defendendo que “A nosso ver, tal não deverá impedir que, nos casos em que não haja lugar à suspensão do prazo, este se conte de data a data, segundo o disposto no artigo 279.°, alínea a), do Código Civil, terminando no dia que corresponde, dentro do terceiro mês, à data do termo inicial do prazo” (in «Comentários ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos», 3.ª edição revista, Almedina, 2010, página 389, nota 392).
No entanto, mais referem que “(...) Deve, entretanto, entender-se que a suspensão do prazo nas férias judiciais transforma o referido prazo de três meses no prazo de 90 dias para o efeito de nele serem descontados os dias de férias judiciais que eventualmente fiquem abrangidos (...)” (in obra cit., pág. 388).

No mesmo sentido se pronunciam Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, ao afirmarem que “(...) É evidente, por último, que a conversão de meses em dias só vale para contagem daqueles prazos que devam suspender-se por força do início de férias judiciais, não para qualquer outro que corra ininterruptamente (...).” (in «Código de Processo nos Tribunais Administrativos», Almedina, 2004, Volume I, pág. 382).

Igualmente, em idêntico sentido, alude-se ao Acórdão do Colendo STA, de 08/11/2007, no Recurso n.º 0703/07, onde se referiu que “(...) A questão jurídica essencial a decidir consiste em saber como deve efetuar-se a contagem do prazo de três meses, estabelecido no art. 58, n.º 2, al. b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) para a impugnação de atos administrativos, quando esse prazo abranja período correspondente a férias judiciais”.
(…) Assim, conforme o regime legal exposto, o referido prazo de três meses, para o exercício do direito de ação, é contínuo, mas suspende-se durante as férias judiciais.
Todavia, as férias judiciais correspondem a dias e não a meses. Pois que, nos termos do art. 12.º, da Lei 3/99, de 13.1 (red. Lei 42/2005, de 29.8), «decorrem de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro, de domingo de Ramos à segunda-feira de Páscoa e de 1 a 31 de Agosto».
“Daí a dificuldade, suscitada pela questão a decidir, decorrente da impossibilidade de se subtraírem dias a meses (a prazos de meses).
“(...) Cabe notar, por fim, que esta solução, de converter em dias o referenciado prazo de impugnação, de 3 meses, quando abranja período de férias judiciais, é a que permite viabilizar a imposição legal de suspensão daquele prazo não só nas férias judiciais de Verão como também nas de Natal e de Páscoa. O que assegura, como é desejável, o estabelecimento de um critério de interpretação idêntico, para qualquer das situações em que se suscita idêntica dificuldade de compatibilização daquele prazo, fixado em meses, com os prazos fixados em dias”.

Também no Acórdão deste TCAN, de 29/11/2007, no Processo n.º 00760/06BEPNF, se refere que “Quando abranja período em que decorram férias judiciais, deve o referido prazo de três meses ser convertido em 90 dias, para efeito da suspensão imposta pelo artigo 144.º, números 1 e 4 do Código de Processo Civil, aplicável por força do citado artigo 58.º, número 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”.

Estabeleceu ainda o STA a este respeito, no seu Acórdão do Pleno da Secção do CA, de 27-02-2008, no Processo n.º 0848/06, que "(...) Em matéria de “Início de prazos de impugnação” rege o art.º 59 do CPTA em cujo n.º 4 se vê que “A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal”. Este preceito reporta-se, apenas, à utilização de meios de impugnação administrativa facultativos, (…), porquanto, tratando-se de impugnações necessárias, o ato não é ainda passível de impugnação contenciosa não estando nenhum prazo a correr para esse efeito (Código de Processo nos Tribunais Administrativos, I, de Mário Esteves de Oliveira e outro, 391)."
A este respeito referem igualmente Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira que “(...) veio o legislador estabelecer no art. 59.º/4 do CPTA que, se o ato administrativo já passível de impugnação contenciosa for objeto de impugnação administrativa facultativa - se se tratar de uma impugnação administrativa necessária, é porque o ato em causa não é ainda passível de impugnação judicial, não havendo, por isso, qualquer prazo a correr para este efeito - ou seja, se se tratar de uma reclamação ou de um recurso administrativo facultativo de determinado ato, o prazo para o «levar» a tribunal suspende-se no dia da apresentação dessa impugnação perante a autoridade administrativa e só recomeça a correr com a notificação da decisão que por ela for proferida ou no dia seguinte àquele em que cessou o prazo para a sua emissão (...)"

Na situação em apreço, mostra-se que o recurso hierárquico aqui em questão, previsto no Decreto-Regulamentar n.º 26/2012, de 21/02, constitui um recurso hierárquico necessário.

Com efeito, a leitura conjugada dos Artº 24º e 25º do referido diploma resulta que assim seja.

Na realidade, refere-se no n.º 4 do seu artigo 24.º, que “Considera-se, para todos os efeitos, que a não apresentação de reclamação equivale à aceitação da avaliação”.

Por outro lado, estatui o artigo 25.º do mesmo diploma, no seu nº 1, que “Da decisão sobre a reclamação cabe recurso para o presidente do conselho geral a interpor no prazo de dez dias úteis a contar da data da sua notificação”.

Assim sendo, o prazo de caducidade do direito de ação apenas começou a correr no dia seguinte ao da notificação da decisão de indeferimento do recurso, que ocorreu em 23/11/2012 (Cfr. ponto 5. Dos factos provados).

Deste modo, tendo a presente Ação sido originariamente apresentada em 5 de Março de 2013, no TAF do Porto (cfr. ponto 6 dos Factos Provados), mostra-se que naquela data ainda não se mostrava esgotado o prazo de caducidade de 3 meses, o qual, atentas as férias judiciais de natal, determinaram a sua conversão em 90 dias, em face do que termo final do prazo só ocorreria em 6 de março de 2013.

Assim, e como se disse, tendo a Ação sido apresentada em 5 de março de 2013, era a mesma ainda tempestiva, em face do que procederá o recurso interposto relativamente a esta questão.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao Recurso, revogar o acórdão recorrido, mais se determinando a baixa dos autos à 1ª instância, para prosseguimento dos seus ulteriores termos, se a tal nada mais obstar.
Custas pela Entidade Recorrida.

Porto, 8 de Abril de 2016
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Fernanda Brandão