Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00913/13.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/30/2014
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos
Descritores:EFEITO SUSPENSIVO; ATOS DE EXECUÇÃO INDEVIDOS; FALTA DE DESPACHO DE APENSAÇÃO;
REVERSÃO; ERRO NA FORMA DO PROCESSO
Sumário:1. A decisão oficiosa de apensação das execuções fiscais a que alude o artigo 179.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário não tem que ser motivada.
2. O meio processual adequado para conhecer dos vícios formais do procedimento de reversão é a oposição à execução fiscal – artigo 204.º, n.º 1, alínea i), do Código de Procedimento e de Processo Tributário.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:M...
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. Relatório

1.1. M…, n.i.f. 2…, com domicílio indicado na Rua…, Vilela – Gondar, 4600-642 Amarante, recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou totalmente improcedente a presente reclamação de atos do órgão de execução fiscal, interposta a coberto dos artigos 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Com a interposição do recurso, apresentou as respetivas alegações e formulou as conclusões que a seguir transcrevemos:

«CONCLUSÕES

A. O despacho de 20/12/2013 contém erro de julgamento de facto e de direito, pois consigna que não se encontra demonstrada (nos autos) a alegada violação do efeito suspensivo automático, inerente à apresentação de reclamação com invocação de prejuízo irreparável, mas tal demonstração existe, não só nos termos de vários requerimentos (e seus anexos) juntos pela reclamante, como ainda por documentos juntos pela AT.

B. Desde logo o alegado “requerimento de fls. 64 e ss. dos autos”, se é o requerimento de 24/07/2013, continha em si mesmo dados que impunham decisão diversa; pois refere três reclamações judiciais com invocação de prejuízo irreparável, subida imediata, nos próprios autos, e efeito suspensivo – duas delas, remetidas ao TAF pelo órgão de execução fiscal, e uma terceira, por ele retida injustificadamente e até à presente data – reportadas a actos distintos, devidamente identificados no texto das mesmas e fotocopiados em anexo a elas – ou não o estando, constam do PEF que às mesmas deveria estar junto, como foi requerido pela reclamante, e é necessário, para o bom julgamento das mesmas.

C. Da própria existência de mais do que uma reclamação judicial, contra actos sucessivos no mesmo PEF, para mais, espaçados entre si por cerca de um ano, conclui-se inexoravelmente que o orgão de execução fiscal prosseguiu com os autos e com a cobrança, quando tal lhe estava vedado pelo efeito suspensivo previsto no artigo 278º, n.º 3 do CPPT; a jurisprudência vertida nos doutos Acs. do STA de 28/07/2010, Proc. 0548/10 e Proc. 0596/10, em www.dgsi.pt; e a doutrina que o próprio despacho cita (Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado e Comentado, vol. IV, 6.ª ed., 2011, pp. 302-303) – pois se os autos estivessem suspensos, não podia haver outros actos a serem praticados dos quais fosse possível reclamar. Artigo, jurisprudência e doutrina, que o dito despacho violou.

D. É de considerar que os requerimentos da reclamante de 24/07/2013, 05/09/2013, 17/10/2013, 05/11/2013 e 19/12/2013, e seus respectivos teores, remissões e documentos, impunham decisão diversa da que foi consagrada no despacho em crise, pois identificam actos concretos de execução promovidos pelo órgão de execução fiscal, praticados num momento em que os autos deveriam estar suspensos; pelo que, ao referir o contrário (que a reclamante fez alegação genérica e não comprovada), o Tribunal incorreu em manifesto erro de julgamento.

E. Por outro lado, do teor dos despachos de 21/10/2013, 08/11/2013 e 05/12/2013, e dos ofícios do SF Felgueiras com os números 3636 e 3920 e seus anexos, também resulta muito clara e existência de actos concretos praticados pelo órgão de execução fiscal, aliás praticados sem qualquer paragem desde a dedução da primeira, da segunda ou da terceira reclamações judiciais (!), nomeadamente, actos de notificações de penhoras, respectivas respostas recebidas, associações de DUCs respeitantes a valores obtidos através de penhoras de créditos, etc., etc., etc. – como resulta das 13 páginas de listagem de actos de um tal sistema informático “SEFWEB”.

F. …Sendo certo que a sentença que se segue ao despacho recorrido, consagra no ponto 16. dos factos provados, a fiabilidade e a credibilidade dadas à tal listagem de tramitação processual, para outros efeitos (“…aplicação SEFWEB, que elegeu como processo principal o nº 1775201001030647 – cfr. informações de fls. 138 e 152 dos autos”); o que nesta parte representa violação do princípio da igualdade das partes e dos princípios sobre o valor probatório dos documentos, ao considerar determinados documentos válidos para provar factos prejudiciais à reclamante, não os considerando de todo, nem sequer a eles se referindo, para provar factos prejudiciais à reclamada.

Quanto à sentença,

G. Nada consta dos factos provados – como já nada constava dos autos de execução fiscal – que permita aferir se os PEF apensados estavam todos na mesma fase, e se estavam em condições de serem apensados; apenas, dos pontos 1 a 15 dos factos provados, consta que nas datas aí referidas, o SF de Felgueiras instaurou os PEF referidos, pelas dívidas também aí identificadas.

H. Pelo menos nos PEF referidos em 14 e 15 dos factos provados, era impossível proceder à reversão, porquanto, mesmo desconhecendo-se a data da suposta citação da originária devedora, é seguro afirmar que nunca teriam ainda decorrido os 30 dias dentro dos quais ela poderia pagar a dívida exequenda, pedir o pagamento em prestações, propor dação em pagamento, ou deduzir oposição à execução (cf. art. 189º, 196º, 201º, 203º CPPT – os quais assim resultaram violados pela sentença).

I. Comprovado está ainda nos autos – e nos PEF juntos ao Proc. 1273/12.1BEBRG, dos quais se extraiu certidão para junção aos presentes autos – que todos os 17 PEF apensos ao principal (1775 2010 010, …39458, …41193, …46926, …58061, …59122, …8655, …3577, …5286, …7718, …12720, …15567, …25503, …30914, …31368, …35096, …37110, …57065) são unicamente compostos de 2 folhas, sendo 1 folha de capa e 1 certidão de dívida, facto manifestamente incompatível, sequer, com a existência de citações e/ou quaisquer diligências, nomeadamente, de identificação (ou não) de bens da devedora originária, que pudessem responder pela dívida; numa averiguação que teria que ser prévia e fundamentadora da reversão – o que, de forma indirecta, representa seguramente tramitação processual inadmissível e que merece anulação/declaração de nulidade; não sendo tão inconsequente ou irrelevante como o Tribunal julgou.

J. Acresce que, tendo o processo de execução fiscal natureza judicial, e devendo os actos do processo, incluindo despachos, ser praticados por escrito e ser devidamente fundamentados, bem como, que o direito à fundamentação dos actos tem natureza de direito fundamental (arts. 131º, 153º e 154º do CPC, aplicáveis ex vi art. 2º, al. e) CPPT e 205º, n.º 1 e 268, n.º 3 da CRP – aqui violados), é óbvio que a falha detectada, mais do que irregularidade, com ou sem os efeitos invalidades da nulidade, ou que nulidade (art. 125º CPPT e 615º, n.º 1, al. b) e 613º, n.º 3 CPC – também violados), constituirá até uma inexistência jurídica, e não pode passar sem sanção, “como se nada fosse”, pois designadamente prejudica ou impossibilita totalmente o direito de defesa da reclamante.

K. Consequentemente, é manifestamente errado, já em termos de direito, concluir e decidir, como se fez na sentença, que “a referida omissão [de despacho fundamentado sobre a apensação de PEFs] constitui uma mera irregularidade, sem consequências invalidantes para o processo de execução fiscal” (fls. 13).

L. O “facto provado” 20. é conclusivo, no sentido que dá como certo que a reclamente foi citada, determinando a impossibilidade lógica de admitir a eventualidade de ocorrer falta de citação na modalidade de o cita(n)do demonstrar que não tomou conhecimento do conteúdo da citação, sem culpa sua, que é a questão fulcral do caso da primeira reclamação judicial já referida; pois que a carta de citação existe, foi expedida nos termos legais e entregue no domicílio fiscal de destino, não se discute, e é é pressuposto necessário da arguição da nulidade de falta de citação na modalidade concreta em questão.

M. Tal facto deveria conter apenas a referência a que “foi expedida a carta de citação” e não, que “A Reclamante foi citada” – redacção que aliás ficaria em consonância com a conferida aos factos 18 e 21, “foi enviada à Reclamante”.

N. Devia ter sido especificado no facto provado 21., que a carta de aviso à reclamante de citação em terceira pessoa, também foi assinada por terceira pessoa – a mesma que assinou a carta de citação, aliás.

O. O facto provado 22. tem que merecer a especificação de que o requerimento em questão não contém especificação dos PEF nem de quais dívidas e de que montante, ou seja, foi feito de forma genérica – e que na mesma data e no mesmo SF, a mesma reclamante deu entrada de outro requerimento, i.e., foi um para cada sociedade em que ela tinha figurado como gerente de direito (S... e I...) – solicitando autorização para efectuar o pagamento de 50% das dívidas existentes em nome da sociedade supra identificada, pelas quais eu possa ser em abstracto responsabilizada enquanto gerente que fui da mesma até 31/12/2010 – ainda que apenas de direito e nunca efectiva – o que é essencialmente diverso de afirmar, apenas, que “solicitou autorização para efectuar o pagamento de 50% das dívidas existentes em nome da sociedade… em 60 prestações” (logo ficando inculcada a ideia de que era a dívida específica deste PEF e seus apensos).

P. Merece ainda constar dos factos provados que, no caso da S..., o exercício de audição prévia da reclamante, previamente à citação para reversão mas posteriormente ao referido pedido de pagamento de 50% das dívidas em abstracto, redundou na exoneração de eventuais responsabilidades desta, e arquivamento do processo no que lhe diz respeito – facto do conhecimento do Tribunal, por conhecimento do outro Processo de reclamação judicial já referido; e que é relevante, da mesma forma que foi relevante consignar o facto provado 22., e que interessa, para esclarecer a postura da reclamante face ao PEF, e falta de citação.

Q. Crucialmente errada é a consideração da presente reclamação como “meio impróprio” para a reacção contra os vícios detectados – e que a sentença não nega! –, e a eleição da “oposição à execução” como o meio correcto, “como contestação que é”, na medida em que, sabendo-se e aceitando-se que o Tribunal tem conhecimento do Processo n.º 1273/12.1BEBRG – tal como consta do facto provado n.º 33, e de resto resulta ostensivamente dos autos, desde a conclusão e despacho de 4/10/2013 em diante – então, o Tribunal também sabe que o fundamento primordial desse processo é a alegação da nulidade de falta de citação, com a demonstração pela citanda de que, sem culpa, não tomou conhecimento do conteúdo da citação.

R. Assim sendo, no caso concreto era impossível à reclamante ter exercido oposição à execução fiscal; e quando espoletou a reclamação judicial que originou os presentes autos, fez pois uso do meio correcto, e do único que lhe estava ao alcance.

S. A sentença proferida violou as normas retro referidas, tendo-as interpretado no sentido de que as listagens de tramitação processual do “SEFWEB” apenas são válidas para provar a existência de parte dos actos nelas referidos, quando devem ser idóneas para provar todos os que delas constem, indistintamente de isso beneficiar a posição da reclamante ou da AT, nestes autos;

Bem assim, no sentido de que, os actos constantes do “SEFWEB” como actos de concretização da cobrança coerciva, tais como penhoras, não são actos que estejam vedados ao órgão de execução fiscal praticar, na pendência de uma (ou mais) reclamações judiciais com invocação de prejuízo irreparável, subida imediata e efeito suspensivo; isto quando, o correcto, é que a dedução de reclamação judicial nesses termos, impõe a suspensão da execução;

Bem como, no sentido de que, em processo de execução fiscal, não são aplicáveis as exigências de forma escrita e de fundamentação que vigoram quer para os actos administrativos, quer para os actos judiciais, quando manifestamente, o processo de execução fiscal é judicial, e carece de ser tramitado através de actos escritos e devidamente fundamentados em termos de facto e de direito; Ainda, no sentido de que, o mero envio das cartas de citação, eventualmente recebidas por terceiros, pode ser tratado como citação efectiva da pessoa citanda, enquanto noutros casos, o mero envio, apenas corresponde ao envio, nada significando em termos de recebimento; isto quando as normas sobre notificações e citações são coesas, e contêm provisões específicas sobre a sua validade/efectivação;

Mais interpreta as normas sobre nulidade da citação em processo de execução fiscal, sobre reclamações judiciais e sobre oposição à execução fiscal, no sentido de que, mesmo quando o contribuinte visado arguiu, fundamentadamente, a nulidade da citação por não ter chegado a tomar conhecimento do seu conteúdo, estava obrigado a usar do meio de oposição à execução para suscitar todos os vícios e nulidades no processo, sendo-lhe vedado – precisamente porque invoca falta de citação – recorrer à reclamação judicial sempre que as circunstâncias de facto à partida o permitissem; o que é manifestamente inadmissível e interpretação incorrecta, por limitadora dos direitos de defesa do contribuinte.

PELO EXPOSTO, O RECURSO DEVE MERECER PROVIMENTO, ANULANDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA NOS TERMOS REFERIDOS E NOS MELHORES DE DIREITO APLICÁVEIS, DOUTAMENTE SUPRIDOS.».

1.2. O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo.

O Recorrido não apresentou contra-alegações.

Remetidos os autos a este tribunal, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que «a decisão recorrida deve apenas ser alterada na parte em que indeferiu a notificação do OEF, para suspender o processo de execução fiscal, devido à dedução da reclamação com invocação de prejuízo irreparável».

Com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 707.º, n.º 4, do Código de Processo Civil), cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

2. Do Objeto do Recurso

O presente recurso é interposto de duas decisões do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga: de um lado, a decisão que incidiu sobre o requerimento de fls. 64 e seguintes dos autos, proferida a fls. 173/174 dos mesmos; de outro lado, da sentença de fls. 175 a fls. 188 dos autos.

À decisão que incidiu sobre o requerimento de fls. 64 dos autos opõe a Recorrente dois vícios:

1º. Erro no julgamento de facto, uma vez que dos autos decorre que a execução prosseguiu após a reclamação ter sido deduzida (artigos 1.º a 11.º e 17.º a 20.º das doutas alegações de recurso);

2º. Erro de julgamento na aplicação do direito aos factos, uma vez que a Recorrente, ao contrário do que ali se concluiu, identificou os atos de execução praticados após a interposição da reclamação (artigos 12.º a 16.º);

[conclusões “A” a “F”].

À sentença recorrida, opõe a Recorrente quatro vícios:

3º. Erro no julgamento de facto (quanto aos factos dados como provados), uma vez que o facto provado sob o n.º 20 é conclusivo (artigos 28.º a 30.º);

4º. Erro no julgamento de facto, uma vez que deveria ter sido aditada ou especificada outra factualidade relevante (artigos 21.º a 25.º e 31.º a 34.º);

5º. Erro na qualificação do vício decorrente da falta de despacho fundamentado sobre a apensação, uma vez que a falta detetada, mais do que irregularidade ou nulidade, constituirá até uma inexistência jurídica (artigos 26.º a 27.º);

6º. Erro na aplicação do direito aos factos – quanto à questão de saber se o meio processual adequado ao conhecimento dos vícios alegados era a oposição à execução fiscal – uma vez que, no caso concreto, era impossível à Recorrente ter interposto a oposição, sendo a reclamação o único meio que estava ao seu alcance (artigos 35.º a 37.º);

[conclusões “G” a “S”].

3. Questão prévia

Decorre dos autos e é do conhecimento deste tribunal em virtude das suas funções que no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga correu termos a reclamação da decisão do senhor Chefe do Serviço de Finanças de Felgueiras que incidiu sobre o requerimento apresentado na mesma execução fiscal e onde arguira a falta de citação e de notificação para o exercício de audição prévia na reversão (processo n.º 1273/12.1BEBRG).

É também do conhecimento deste tribunal em virtude das suas funções que no recurso da decisão ali proferida já foi proferido acórdão que revogou a sentença ali recorrida e anulou o ato ali reclamado.

A questão que agora se coloca é a de saber se, na eventualidade de tal acórdão já ter transitado em julgado, se terá tornado inútil o conhecimento do presente recurso.

A essa questão respondemos negativamente.

Porque este tribunal não concluiu nesse processo pela falta ou nulidade de citação nem ordenou a sua realização ou repetição.

O que este tribunal ali concluiu foi que o órgão de execução fiscal não realizou – e deveria ter realizado – as diligências necessárias a aferir se a Recorrente foi ou não regularmente citada. Que no caso se impunham porque a Recorrente tinha ali alegado que não chegou a ter conhecimento da citação por facto que não lhe era imputável, nos termos e para os efeitos do artigo 190.º, n.º 6, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

O que significa que, se dessas diligências vier a resultar que a Recorrente não demonstrou que não chegou a ter conhecimento do ato ou que esse facto não lhe é imputável, não se poderá concluir pela falta de citação para efeitos deste dispositivo legal.

E, por conseguinte, não haverá fundamento para anular todo o processado a coberto desse ato.

Por outro lado, do artigo 165.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário decorre que, ainda que se venha a concluir pela nulidade insanável decorrente da falta de citação, essa nulidade terá apenas por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que dela dependam absolutamente.

Ora, o ato reclamado é um ato do processo subsequente à citação, mas não se pode dizer que dela dependa absolutamente. De um lado, porque decorre diretamente duma intervenção da Recorrente no processo, que se pretende independente do conhecimento do ato de citação. De outro lado, porque decorre dessa intervenção e da subsequente reclamação desse ato que o eventual desconhecimento do ato de citação não interferiu com o direito de defesa respetivo.

No seguimento deste raciocínio, o que se poderá aventar é a inutilidade subsequente da apreciação da falta de citação, se se vier a concluir que a reclamação é o meio processual adequado para a Recorrente se opor à execução (como esta defende no presente recurso). É que uma das funções da citação é precisamente a de facultar o exercício desse direito, como decorre do artigo 189.º n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário. E se for de concluir que a Recorrente interveio voluntária e validamente nos autos para exercer esse direito, torna-se inútil a realização do ato para o mesmo efeito.

De todo o exposto se conclui pela utilidade do conhecimento do recurso.

4. Do Julgamento de Facto

4.1. Como se referiu já, estamos perante duas decisões recorridas: a decisão que incidiu sobre o requerimento de fls. 64 e seguintes dos autos, proferida a fls. 173/174 dos mesmos; e a sentença de fls. 175 a fls. 188 dos autos.

Entre os fundamentos do recurso da primeira dessas decisões encontra-se o erro de julgamento quanto aos factos em que essa decisão assentou. Considera a Recorrente, basicamente, que o tribunal recorrido errou ao considerar que não se encontra demonstrada a alegada violação do efeito suspensivo automático, inerente à apresentação da reclamação com invocação de prejuízo irreparável.

A decisão em causa tem o teor que a seguir se transcreve integralmente, para melhor enquadramento:

« Por requerimento de fls. 64 e ss. dos autos, veio a Reclamante pedir que fosse ordenada a notificação do órgão de execução fiscal para que suspenda o processo de execução fiscal, com efeitos retroactivos à data da entrada da reclamação judicial, e anule todos os actos posteriores.

Alega, para o efeito, que não obstante a dedução de reclamações judiciais, o órgão de execução fiscal prosseguiu com a execução fiscal, ao arrepio do efeito suspensivo das mesmas, o que traduz ofensa do princípio da confiança, da segurança jurídica e dos limites impostos a todas as execuções patrimoniais pela consideração da pessoa humana e da necessidade e garantia da sobrevivência condigna.

Notificada para se pronunciar sobre o requerido, a FP nada veio dizer aos autos.

Apreciando.

Como escreve Jorge Lopes de Sousa, a propósito do efeito suspensivo da reclamação com subida imediata, “[e]stá ínsito no regime de subida imediata da reclamação ao tribunal tributário que, quando o reclamante invocar prejuízo irreparável, a administração tributária deverá suspender os actos de cobrança da dívida, tendo de limitar-se a decidir se revoga ou não o acto reclamado, nos termos dos nºs 2 e 3 do art. 277.º do CPPT e a praticar os actos necessários ao envio da reclamação ao tribunal tributário1.”

Ora, no requerimento em apreço a Reclamante limita-se a afirmar genericamente que “o órgão de execução fiscal prosseguiu com a execução fiscal”, sem identificar qualquer acto concreto que tivesse sido praticado com vista à cobrança da dívida, pelo que não se encontrando demonstrada a alegada violação ao efeito suspensivo automático, inerente à apresentação da reclamação com invocação de prejuízo irreparável, é de rejeitar liminarmente o requerido.

Notifique.».

Do seu teor decorre claramente que a razão do indeferimento da pretensão formulada de fls. 64 a fls. 68 dos autos não foi a falta de prova do vício alegado, mas a falta de alegação dos factos que o evidenciassem. Foi por isso que a rejeitou liminarmente.

Assim sendo, também não releva para o mérito do recurso saber se a execução prosseguiu, mas saber se a Recorrente alegou devidamente os factos que evidenciassem esse prosseguimento.

Pelo que o recurso respetivo não pode merecer provimento nesta parte.

4.2. Na douta sentença foi o seguinte o julgamento de facto:

«II - 1) FACTOS PROVADOS

Dos autos e com interesse para a decisão a proferir, resultam demonstrados os seguintes factos:

1. Em 02.09.2010, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201001030647, para cobrança do montante de €302,00, respeitante a dívidas de IRS (retenção na fonte) do exercício de 2010 e respectivos juros de mora – cfr. fls. 1 e ss. do PEF;

2. Em 13.10.2010, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201001039458, para cobrança do montante de €170,00, respeitante a dívidas de IRS (retenção na fonte) do exercício de 2010 e respectivos juros de mora – cfr. PEF.

3. Em 21.10.2010, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201001041193, para cobrança do montante de €116,00, respeitante a dívidas de IRS (retenção na fonte) do exercício de 2010 e respectivos juros de mora – cfr. PEF.

4. Em 12.10.2010, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201001046926, para cobrança do montante de €90,00, respeitante a dívidas de IRS (retenção na fonte) do exercício de 2010 e respectivos juros de mora – cfr. PEF.

5. Em 16.12.2010, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201001058061, para cobrança do montante de €90,00, respeitante a dívidas de IRS (retenção na fonte) do exercício de 2010 e respectivos juros de mora – cfr. PEF. 6. Em 31.12.2010, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201001059122, para cobrança do montante de €111,40, respeitante a dívidas de coimas do ano de 2010 – cfr. PEF.

6. Em 17.01.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101001655, para cobrança do montante de €90,00, respeitante a dívidas de IRS (retenção na fonte) do exercício de 2010 e respectivos juros de mora – cfr. PEF.

7. Em 25.01.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101003577, para cobrança do montante de €85,00, respeitante a dívidas de coimas do ano de 2011 – cfr. PEF.

8. Em 17.02.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101005286, para cobrança do montante de €90,00, respeitante a dívidas de IRS (retenção na fonte) do exercício de 2010 e respectivos juros de mora – cfr. PEF.

9. Em 24.03.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101007718, para cobrança do montante de €90,00, respeitante a dívidas de IRS (retenção na fonte) do exercício de 2011 e respectivos juros de mora – cfr. PEF.

10. Em 19.04.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101012720, para cobrança do montante de €81,00, respeitante a dívidas de coimas do ano de 2011 – cfr. PEF.

11. Em 09.05.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101015567, para cobrança do montante de €81,00, respeitante a dívidas de coimas do ano de 2011 – cfr. PEF.

12. Em 15.06.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101025503, para cobrança do montante de €4.517,88, respeitante a dívidas de IVA do 1º trimestre de 2011 e respectivos juros de mora – cfr. PEF.

13. Em 06.07.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101030914, para cobrança do montante de €82,50, respeitante a dívidas de coimas do ano de 2011 – cfr. PEF.

14. Em 11.07.2011, o SF de Felgueiras instaurou contra I... – ..., Lda. a execução fiscal n.º 1775201101031368, para cobrança do montante de €82,50, respeitante a dívidas de coimas do ano de 2011 – cfr. PEF.

15. Em 22.07.2011, os processos de execução fiscal identificados nos pontos anteriores (1. a 15.) foram apensados automaticamente, através da aplicação SEFWEB, que elegeu como processo principal o nº 1775201001030647 – cfr. informações de fls. 138 e 152 dos autos.

16. Em 26.07.2011, foi lavrado projecto de reversão da execução contra a ora Reclamante, na qualidade de responsável subsidiária, com a identificação, em anexo, das dívidas em cobrança coerciva nos processos supra identificados, no montante global de €6.079,28 – cfr. fls. 19 do PEF.

17. Por carta registada, de 27.07.2011, foi enviada à Reclamante notificação do despacho referido na alínea anterior, para efeitos de audição prévia – cfr. fls. 21 e 23 do PEF.

18. Em 31.08.2011, foi proferido despacho de reversão contra a aqui Reclamante, com a identificação, em anexo, das dívidas em cobrança coerciva nos processos supra identificados, no montante global de €6.079,28 – cfr. fls. 25 do PEF.

19. A Reclamante foi citada para a execução, através de carta registada, com A/R, recebida em 12.09.2011, por M..., portadora do documento de identificação 7945595-4 B – cfr. fls. 28 a 29 do PEF.

20. Por carta registada, de 15.09.2011, foi enviada à Reclamante notificação nos termos do artigo 236º do CPC (aviso de citação em terceira pessoa) – cfr. fls. 31 e 33 do PEF.

21. Através de requerimento apresentado no referido Serviço de Finanças, em 16.02.2012, a aqui Reclamante solicitou autorização para efectuar o pagamento de 50% das dívidas existentes em nome da sociedade I... – ..., Lda. em 60 prestações – cfr. fls. 38 do PEF.

22. O requerimento referido na alínea anterior foi indeferido por despacho de 23.02.2012 – cfr. fls. 39 do PEF.

23. Em 02.05.2012, na sequência de notificação de penhora, a Reclamante apresentou requerimento no referido Serviço de Finanças, invocando a falta de citação para a execução e a falta de notificação para o exercício de audição prévia à reversão – cfr. fls. 43 e ss. do PEF.

24. O requerimento referido na alínea anterior foi indeferido por despacho do Chefe de Finanças de 14.05.2012, com o seguinte teor: “Indefiro o pedido por falta de fundamentação legal. A requerente mostra-se válida e eficazmente citada. Notifique para efeitos do artigo 276º e ss. do C.P.P.T.” – cfr. fls. 94 do PEF.

25. O despacho referido no nº anterior foi notificado à Reclamante através do ofício nº 2061, de 14.05.2011 – cfr. fls. 95 e 96 do PEF.

26. Através de requerimento remetido por via postal em 25.05.2012, a Reclamante apresentou requerimento de arguição de nulidades junto do órgão de execução fiscal e, “para o caso de não serem declaradas tais nulidades”, reclamação judicial dirigida ao TAF do Porto – cfr. fls. 99 e ss. do PEF, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

27. Em 14.06.2012, o Chefe de Finanças proferiu o seguinte despacho:

Quanto ao pedido /arguição de nulidades em processo de execução fiscal refere-se o seguinte:

O nº 1, alínea a) e b) do artigo 165º do CPPT, clarifica com toda a evidência as que são as nulidades insanáveis/insupríveis, especificando o nº 4 as que são de conhecimento oficioso.

Por outro lado, o artigo 166º, elenca os incidentes admitidos, em processo de execução fiscal, pelo que indefiro o pedido.

Quanto à reclamação judicial, este Serviço de Finanças está territorialmente adstrito ao TAFBraga, pelo que deverá, em cinco dias, rectificar o pedido.

(…)” – cfr. fls. 140 do PEF.

28. O despacho referido no ponto anterior foi notificado à Reclamante através do ofício nº 2497, de 14.06.2012 – cfr. fls. 141 do PEF.

29. Através de requerimento remetido por via postal em 27.06.2012, a Reclamante requereu, ao abrigo do artigo 37º, “a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha (… )” – cfr. fls. 144 e ss. do apenso.

30. Em 12.07.2012, o Chefe de Finanças proferiu o seguinte despacho:

Processo nº 1775 2010 01030647 e aps / Reversão nº 1775.2011.183


Despacho

Por requerimento(s) remetido, sob registo, pelos CTT em 2012-06-27, recebido(s) e registado(s) informaticamente nas “Entradas” /Gestão de Processos e Serviços, doravante GPS, em 28-06-2012, sob o(s) nº(s) 17752012E006718 [o(a)s] executada revertida M…, nif 2…, requer, por referência ao artigo 37º/1 do CPPT, a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento e, bem assim, com fundamento no artigo 348º/1 do CPPT, “correção ou convolação oficiosa de erros ou omissões manifestos em quaisquer declarações, reclamações, petições ou quaisquer atos dos contribuintes”, pelo que cumpre analisar e decidir:

Analisados os processos de execução fiscal (pef), constata-se que a citação pessoal da executada revertida /requerente ocorreu em 2011-09-12 (fls. 29 e 31).

Em 16-02-2012, conforme pedido registado no GPS sob o nº 17752012E001852 (fls 36/7) solicitou por escrito autorização para pagamento de 50% da dívida da I... ..., LDA, NIPC 5..., a devedora originária, que foi objeto de despacho de 2012-02-23 (fls 39), do qual foi notificada por carta registada simples em 2012-02-27, considerando-se validamente notificada em 01-03-2012 – 3º dia posterior ao do registo (cfr artigo 39º/1 do CPPT).

Em, 02-05-2012, conforme requerimento de fls. 42 a 44, deduz exposição escrita em que, em síntese, invoca não encontrar “notificação para o exercício da audição previa nesta reversão”, cabendo esclarecer que a mesma foi expedida sob registo em 2011-07-27 (fls 21 e 23), assim se considerando perfeita em 01-08-2011 – 1º dia útil seguinte ao 3º posterior ao do registo por este não ser dia útil (artigo 39º/1 do CPPT).

Esta exposição/requerimento foi objeto de despacho de indeferimento em 2012-05-14, (fls 94) por falta de fundamentação legal, porquanto a executada se encontrava valida e eficazmente citada, tendo-lhe sido expressamente referida a possibilidade de reclamar nos termos do artigo 276º e seguintes do CPPT, meio que não utilizou, do que foi notificada por carta registada em 2012-05-14, assim ficando perfeita a notificação em 2012-05-17 (fls 95, frente e verso).

Apesar de toda esta intervenção processual / documental pela executada revertida, anterior à constituição de mandatário, em momento algum foi arguida qualquer nulidade, o que somente veio a acontecer com a intervenção do mandatário, que foi objeto de despacho de 14-06-2012, do qual deduziu reclamação judicial, que aguarda a subida dos autos ao respetivo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, ou seja, ainda que invoque a falta de indicação do meio para reagir – reclamação nos termos do artigo 276º e ss do CPPT, já a tinha utilizado em 29-05-2012, pelo que não pode proceder a invocada nulidade.

Sem prescindir, nos termos do artigo 151º / 1 do CPPT AF de Braga decidir da reclamação dos atos praticados por este órgão de execução fiscal, pelo que, com todo o respeito por opinião diversa, não se mostra aplicável o artigo 48º / 1 do CPPT, ainda que a disposição legal a invocar, que o foi certamente por lapso, porquanto a matéria é tratada no artigo 52º do CPPT, e, em termos de nulidades insanáveis em processo judicial tributário, haverá que atentar-se na norma constante do artigo 98º / 4 do mesmo Código, sendo a respetiva competência do Tribunal e não da AT.

Nestes termos e com estes fundamentos indefiro os pedidos

Notifique o(a) mandatário(a) para efeitos do artigo 276 e seguintes do CPPT.

[Cfr. fls. 149/150 do PEF].

32. O despacho referido no nº anterior foi notificado à Reclamante por carta registada, com data de 12.07.2013 – cfr. fls. 151 do PEF.

33. Por despacho do Chefe de Finanças de 12.07.2012, foi ordenada a remessa da Reclamação Judicial referida ao TAF de Braga, a qual foi autuada e corre termos sob o nº 1273/12.1BEBRG - factos de que o Tribunal tem conhecimento no exercício das suas funções.


*

II - 2) FACTOS NÃO PROVADOS

Com interesse para o conhecimento do mérito, inexistem.».

4.3. Entre os fundamentos do recurso da sentença encontra-se o erro no respetivo julgamento de facto, na parte em que se consignou não existirem factos com interesse para o conhecimento do mérito e que devessem ser dados como não provados.

Considera a Recorrente, além do mais, que o tribunal recorrido errou ao desconsiderar para a decisão a fase em que se encontravam os processos executivos, porque relevava saber se todos se encontravam já em fase de reversão.

Sucede que o tribunal só pode pronunciar sobre factos que, sendo relevantes para a decisão, tenham sido oportunamente alegados ou sejam do conhecimento oficioso. É o que decorre dos artigos 99.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária e 13.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Sendo que a Recorrente nunca alegou perante o tribunal recorrido que a apensação fosse ilegal porque os processos executivos não se encontravam na mesma fase ou não estavam em condições de serem apensados. A Recorrente nada alegou sequer quanto à fase em que se encontravam uns ou outros.

O que a Recorrente alegou foi que a apensação era ilegal porque sobre ela não existia nenhuma nota, termo, informação ou despacho. Sendo que para o julgamento desta questão também não releva saber a fase em que se encontravam.

Pelo que o recurso também não pode merecer provimento nesta parte.

4.4. Entre os fundamentos do recurso encontra-se também o erro no julgamento de facto, agora quanto aos factos dados como provados.

Está em causa o facto dado como provado sob o n.º 20. A Recorrente considera que a redação adotada é conclusiva, e que ali se deveria dar como provado apenas que “foi expedida a carta de citação” e não que “A Reclamante foi citada”.

Está em causa, também, o facto dado como provado sob o n.º 21. Em sequência com o facto anterior, considera a Recorrente que deveria ter sido especificado que a carta de aviso de citação em terceira pessoa, também foi assinada por terceira pessoa.

Está em causa, ainda, o facto dado como provado sob o n.º 22. Considera a Recorrente que deveria ter sido especificado que o requerimento em questão não contém especificação dos PEF nem de quais dívidas e de que montante, ou seja, foi feito de forma genérica – e que na mesma data e no mesmo Serviço de Finanças, a mesma reclamante deu entrada de outro requerimento, i.e., foi um para cada sociedade em que ela tinha figurado como gerente de direito (S... e I...).

A Recorrente tem razão quanto ao facto dado como provado sob o n.º 20 porque a questão de saber se foi citada é controvertida e o documento para que ali se remete não assegura que tivesse conhecimento da carta ou que o desconhecimento não lhe é imputável.

Quanto ao demais, a Recorrente não explica convenientemente porque entende que as especificações a introduzir relevam para a decisão a proferir na presente reclamação, o que também não se entrevê, tendo em conta que o objeto da presente reclamação não é a falta de citação.

Assim sendo, altera-se apenas o facto dado como provado sob o n.º 20, o qual passará a ter a seguinte redação:

20. Através do registo RM 7847 3268 1 PT, foi enviada carta registada com aviso de receção para citação da Reclamante na Rua… Gondar, 4600-641 Gondar AMT, recebida em 12.09.2011 por M..., portadora do documento de identificação 7... – cfr. fls. 28 a 29 do PEF.

4.5. Por último, a Recorrente pretende que seja aditado aos factos provados, por considerar sobremaneira relevante ao contexto dos atos da reclamante e inerente à boa decisão da causa, que a reclamante apresentou igual pretensão de pagamento de 50% das dívidas “em abstrato” da I... e da S... à Segurança Social, e que, no caso da S..., o exercício de audição prévia da reclamante, previamente à citação para reversão mas posteriormente ao referido pedido de pagamento de 50% das dívidas em abstrato, redundou na exoneração de eventuais responsabilidades desta, e arquivamento do processo no que lhe diz respeito.

Mais uma vez, porém, não se entrevê o relevo de tais aditamentos para a demonstração dos vícios arguidos nos autos e que a sentença recorrida apreciou.

Razão bastante para se decidir não aditar a factualidade correspondente.

5. Do Julgamento de Direito

5.1. Vem o presente recurso interposto, além do mais, da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que rejeitou liminarmente o requerido a fls. 64 e seguintes dos autos, onde a ali Reclamante (ora Recorrente) pedia fosse ordenada a notificação do órgão de execução fiscal para que suspendesse o processo executivo e anulasse todos os atos posteriores à data da entrada da reclamação judicial.

Na decisão recorrida, entendeu a M.mª Juiz a quo que não se encontrava demonstrada a violação do «efeito suspensivo automático» inerente à apresentação da reclamação com invocação do prejuízo irreparável porque a ora Recorrente não identificou qualquer ato concreto que tivesse sido praticado com vista à cobrança da dívida, tendo-se limitado a afirmar genericamente que o órgão de execução fiscal prosseguiu com a execução.

Com o assim decidido não se conforma a Recorrente por entender, de um lado, que foram identificados atos concretos de execução posteriores à reclamação e, de outro lado, que deles resulta o prosseguimento da execução.

No artigo 85.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário consagra-se proibição da moratória e da suspensão da execução fora dos casos previstos na lei, que constitui um afloramento do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários enunciado no artigo 30.º da Lei Geral Tributária. Decorre destes dispositivos legais que a suspensão da execução só pode ocorrer quando exista, nas leis tributárias, norma especial que a determine.

A suspensão da execução fiscal em virtude da interposição de recurso com subida imediata não está expressamente prevista nas leis tributárias. O que se prevê na epígrafe do artigo 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário é a atribuição de um «efeito suspensivo» decorrente da subida da reclamação. Expressão ambígua que, atendendo à proibição genérica de suspensão execução referida no parágrafo anterior, deve ser reconduzida ao âmbito da própria reclamação.

Mas a suspensão da execução fiscal em virtude da reclamação da decisão nela proferida com subida imediata decorria da alínea n) do n.º 1 do artigo 97.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redação anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n.º66-B/2012, de 31 de dezembro, uma vez que a reclamação subia no próprio processo de execução fiscal.

Atualmente, porém, a reclamação com subida imediata é autuada por apenso, decorrendo dessa alteração legislativa que o legislador não pretendeu que, em tais casos, a execução subisse com a reclamação e que, por essa via, suspendesse a execução.

Assim sendo, é de concluir que não decorre do figurino legal vigente que a reclamação com subida imediata tenha efeito suspensivo da execução. Dele decorre apenas que a reclamação com subida imediata tem efeito suspensivo da decisão reclamada.

Anota-se, entre parêntesis, que esta alteração é de aplicação imediata às reclamações que tenham subido ao tribunal depois da sua entrada em vigor e no apenso criado para o efeito, uma vez que a norma que determina a apensação tem natureza processual e as normas de direito processual são de aplicação imediata aos atos futuramente praticados em ações pendentes. De salientar também que o efeito suspensivo na execução não decorria, na lei anterior, de uma norma substantiva, sendo uma consequência direta da própria tramitação processual.

Estando o efeito suspensivo delimitado pela decisão reclamada, o seu âmbito depende do objeto dessa decisão e do objeto da própria reclamação. Assim, a reclamação que tenha por objeto a penhora de um bem não obsta, em princípio, à penhora de outro bem. Mas se do prosseguimento da execução quanto a outros bens também resultar prejuízo irreparável para o reclamante, deve entender-se que do efeito de suspensão da decisão reclamada decorre a suspensão da execução também nessa parte.

A lei não esclarece o que sucede se a administração tributária der seguimento à execução e estiver pendente a reclamação com subida imediata, mas parece seguro que os atos que ofendam o efeito de suspensão da decisão reclamada são ilegais e o reclamante pode contra eles deduzir nova reclamação. Para além disso, alguma doutrina defende que é aplicável ao caso, por analogia, o disposto no artigo 128.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, podendo o reclamante, através de um incidente na reclamação com subida imediata, pedir que o juiz desse processo os declare ineficazes. Tudo sem prejuízo da adoção de outras medidas cautelares que entenda adequadas. (neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», IV volume, Áreas Editora 2011, pág. 751).

Em todo o caso, a ilegalidade ou ineficácia do ato não decorrerá do prosseguimento da execução em si mesmo mas do facto de os atos de execução concretamente praticados ofenderem o efeito de suspensão da decisão reclamada. O que significa que o reclamante não pode ser dispensado de indicar (na reclamação ou no incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, conforme o caso) os atos concretos praticados e a razão porque ofendem aquele efeito suspensivo. Até porque sem tal alegação não está devidamente concretizado o objeto da reclamação ou do incidente.

Apliquemos estes conceitos ao caso dos autos.

No requerimento de fls. 64 a fls. 68, a Recorrente pediu ao tribunal onde corria a reclamação que suspendesse o processo de execução fiscal e anulasse todos os atos posteriores, alegando que «uma reclamação judicial de acto de órgão de execução fiscal, que tenha subida imediata e nos próprios autos, acarreta, ope legis, efeito suspensivo da execução».

Ou seja, a Recorrente não pretende do tribunal que declare a invalidade ou ineficácia de atos determinados na execução, mas que decrete a suspensão da execução e que anule todos os atos posteriormente praticados, quaisquer que eles sejam. Por outro lado, a Recorrente não pretende que esses atos são ilegais por ofenderem o efeito de suspensão da decisão reclamada a que acima fizemos referência, mas por ofenderem o efeito suspensivo da execução.

É evidente que, em tal caso, a Recorrente não tinha que identificar nenhuns atos que tivessem sido praticados. Se o prosseguimento da execução é ilegal, sejam quais forem os atos nele praticados, à sua identificação basta a delimitação temporal: são todos os atos posteriores à reclamação.

Mas, a ser assim, a sua pretensão é manifestamente improcedente. Pelas razões que já acima adiantamos. A reclamação não tem efeito suspensivo da execução (no seu todo) suspendendo apenas os efeitos da decisão reclamada. E não acarreta a invalidade de todos os atos posteriores nela praticados mas apenas dos que sejam praticados a coberto da decisão reclamada e dos atos conexos que causem prejuízo irreparável ao reclamante ou ponham em causa o efeito útil da reclamação.

Do exposto decorre que a pretensão da Recorrente estava condenada ao decesso desde o início, apoiada que estava numa interpretação errada da lei aplicável.

Pelo que a douta decisão recorrida deve ser confirmada, ainda que com a precedente fundamentação.

5.2. Mas a Recorrente não se insurge, no presente recurso, apenas contra o indeferimento do pedido de suspensão da execução e de anulação dos atos posteriores à reclamação. Insurge-se também contra o indeferimento da própria reclamação.

Reclamação que teve por objeto ilegalidades praticadas na execução e que o órgão de execução fiscal não reconheceu e que na douta sentença recorrida foram identificadas do seguinte modo: (1) «falta de menção nos autos de execução fiscal da apensação das execuções»; (2) «falta de notificação para efeitos de audição prévia sobre o projecto de reversão»; e (3) «impropriedade do meio utilizado para remeter tal notificação».

Relativamente à primeira ilegalidade, a Mm.ª Juiz a quo concluiu que não tinha efeitos invalidantes porque a apensação ocorreu antes de ter sido iniciado o procedimento de reversão e porque não foi, assim, prejudicada a defesa da Reclamante. Relativamente às demais, a Mm.ª Juiz a quo concluiu que a reclamação não era o meio processual adequado para delas conhecer.

A Recorrente não se conforma com o assim decidido porque – quanto à primeira ilegalidade – a falta de despacho fundamentado sobre a apensação, mais do que uma irregularidade ou nulidade, constituirá até uma inexistência jurídica. E – quanto às demais – porque no caso concreto lhe era impossível ter deduzido oposição à execução fiscal e a reclamação era o único meio que estava ao seu alcance.

Cumpre decidir, começando pela primeira ilegalidade invocada.

Como bem refere a Recorrente no artigo 26.º das doutas alegações de recurso, processo de execução fiscal tem natureza judicial, mesmo quando estão em causa atos materialmente administrativos praticados pelo órgão de execução fiscal – artigo 103.º da Lei Geral Tributária. Consequentemente, os atos praticados pelo órgão de execução fiscal estão subordinados às mesmas regras formais dos atos a praticar nos processos judiciais. Mal se compreenderia, de resto, que atos a praticar no mesmo processo e com a mesma natureza formal pudessem subordinar-se a diferentes regras.

Pelo que, quando não estejam em causa atos formalmente administrativos enxertados na execução (como são os atos do procedimento de reversão ou os atos do procedimento de pagamento em prestações ou dispensa de garantia), o dever de motivação das decisões do órgão de execução fiscal não se rege pelas regras formais dos atos administrativos, mas dos atos judiciais. Pelo que as suas decisões só têm que ser motivadas quando decorram de algum pedido controvertido ou incidam sobre alguma dúvida suscitada no processo – cfr., ao tempo, o artigo 158.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

A decisão de apensação das execuções fiscais pode ser tomada oficiosamente ou a requerimento do executado, como decorre do artigo 179.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Sendo que, quando é tomada oficiosamente, não decorre de nenhum pedido controvertido nem incide sobre alguma dúvida suscitada no processo. Pelo que, em tal caso, não carece de ser motivada. Pelo que da falta de motivação dessa decisão não decorre nenhuma ilegalidade.

Ainda que assim não fosse, a decisão de apensação é determinada por razões de eficácia e celeridade, como decorre dos n.ºs 3 e 4 do mesmo dispositivo legal. Razões que interessam apenas à Fazenda e que não interferem com os direitos e interesses legítimos do executado, que não aumentam nem diminuem com a apensação. Não sendo um ato lesivo dos direitos e interesses do executado, a decisão de apensação nem sequer seria suscetível de reclamação – aponta neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA, in «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», II volume, Áreas Editora 2007, pág. 226.

E nem se contraponha que os interesses do revertido saem lesados com a apensação porque em dois dos processos apensados não era possível proceder à reversão. Em tal caso, o ato lesivo também não seria o de apensação, mas a própria decisão de reversão, quanto a essas dívidas.

Pelo que o recurso não merece provimento nesta parte.

E também não merece provimento na parte restante. Como muito bem refere a Mm.ª Juiz a quo na douta sentença, não é a reclamação regulada nos artigos 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, mas a oposição regulada nos seus artigos 203.º e seguintes, o meio processual adequado para conhecer dos vícios formais do procedimento de reversão. É que a reclamação não serve para reagir contra a pretensão executiva no seu todo mas apenas para reagir contra atos concretos nela praticados. Sendo que os vícios formais de que padeça a reversão afetam a própria pretensão executiva, na parte que ao revertido respeita. Sendo, por isso, fundamento de oposição a essa pretensão executiva a coberto da alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., pág. 370).

Contrapõe a Recorrente que não poderia ter deduzido oposição porque não foi citada para tal (sendo que a questão da falta de citação é discutida noutra reclamação) e, por conseguinte, a reclamação seria o único meio que estava ao seu alcance.

Mas esta argumentação não pode colher. Se a Recorrente não foi citada ou se, por alguma razão, se deve concluir pela falta de citação e esta a impediu de se inteirar dos factos necessários à interposição da oposição, a defesa ao seu alcance é precisamente a arguição da falta de citação. Se, inversamente, a falta de citação não obstou ao seu exercício do direito de defesa e esta pretendeu exercê-lo, o meio processual adequado para o fazer não deixava de ser a oposição.

Pelo que o recurso nunca podia merecer provimento por aqui.

6. Conclusões

6.1. A decisão oficiosa de apensação das execuções fiscais a que alude o artigo 179.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário não tem que ser motivada.

6.2. O meio processual adequado para conhecer dos vícios formais do procedimento de reversão é a oposição à execução fiscal – artigo 204.º, n.º 1, alínea i), do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

7. Decisão

Por todo o exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao presente recurso.

Custas pela Recorrente.

Porto, 30 de Abril de 2014

Ass. Nuno Bastos

Ass. Fernanda Esteves

Ass. Pedro Vergueiro