Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01423/11.5BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/06/2019
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:FUNDAMENTAÇÃO DO DESPACHO DE REVERSÃO; GERÊNCIA DE FACTO, CULPA
Sumário:
I. O despacho de reversão, sendo um ato administrativo tributário, está sujeito a fundamentação dado o princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos atos administrativos (n.º 3 do art.º 268º da CRP) densificado, no caso, no nº 4 do art. 23º e nº 1 do art. 77º da LGT.
II. A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efetivada (nº 4 do art.º 23º da LGT) não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a Administração Tributária fundamenta a alegação relativa ao exercício efetivo das funções do gerente revertido. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:JDAFN
Votação:Unanimidade
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a sentença recorrida e, em substituição, julgar improcedente a oposição
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do
Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Representação da Fazenda Pública veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou procedente a pretensão do Recorrido JDAFN, na presente instância de OPOSIÇÃO execução fiscal, nº 3425200601045180 e apensos que o Serviço de Finanças de Braga-2, que lhe moveu por reversão para cobrança de dívidas provenientes de dívidas de IVA e IRS do ano de 2006, que contra si foi revertida e inicialmente instaurada contra a sociedade NPA, S.A”, no valor total de € 18.673.31.
O presente recurso foi interposto para o STA, o qual por despacho de 20.10.2014, se declarou incompetente em razão da hierarquia, tendo o recurso sido remetido a este TCAN.
A Recorrente formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…)
A- Ressalvado o devido respeito, com o que desta forma foi decidido não se conforma a Fazenda Pública, pelas razões que passa a expender;
B- Na douta sentença recorrida julgou-se totalmente procedente a oposição deduzida pelo Oponente, com a consequente extinção da execução contra o Oponente;
C- Tendo o Tribunal a quo assim decidido com fundamento na falta de fundamentação formal do despacho de reversão quanto aos requisitos da gerência de facto por parte do ora Oponente e da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas;
D- Contudo, do nosso ponto de vista e salvo melhor entendimento, não se verificam os fundamentos invocados pela Meritíssima Juiz para decidir nos termos em que o fez;
E- Cumpre, pois, indagar da fundamentação formal do despacho de reversão, quanto aos elementos que dele devem constar, para daí se extrair se houve, ou não, falta de fundamentação formal;
F- Os requisitos a que deve obedecer a decisão de reversão vêm indicados nos art.º 153.º, n.º 2 do CPPT e nos art.º 23.º e 24.º, ambos da LGT (para além do conteúdo da citação previsto nos art.º 163.º e 189.º do CPPT) e, de forma sucinta, subsumem-se à insuficiência/inexistência de património da devedora principal, exercício da gerência de facto dos oponentes e culpa na insuficiência patrimonial que originou o não pagamento das dívidas fiscais;
G- Analisado o despacho de reversão, verifica-se que nele se encontra explicitado que a devedora originária apenas possui dois veículos automóveis, sendo que o valor atribuído no auto de penhora é manifestamente insuficiente para pagamento da presente dívida e respetivos acréscimos legais;
H- O mesmo despacho de reversão, identifica as pessoas, entre as quais o ora Oponente que, no período a que respeitam as dívidas, exerceram funções de gerência, de direito e de facto, na executada principal, designadamente através da assinatura da declaração de início de atividade, e pelo facto de o próprio Oponente confessar ter sido administrador da devedora originária; Acrescenta que, ao abrigo o art. 153.º, n.º 2 do CPPT e 23.º e 24.º da LGT, deve o Oponente ser responsabilizado pela dívida no montante de € 18.673,31.
I- Assim, consta do despacho de reversão a imputação de factos concretos que demonstram o exercício efetivo de funções de gestão por parte do Oponente, sendo certo que tal imputação nem seria necessária, desde que a administração tributária imputasse esse exercício, vide o acórdão recente do STA de 31.10.2012 (processo n.º 0580/12);
J- Ainda sobre esta matéria, importa citar a Jurisprudência vigente, nomeadamente o Acórdão do STA de 18.01.2012 (processo n.º 0724/11), o Acórdão do STA de 15.02.2012 (processo n.º 0872/11) e o Acórdão do TCA Sul de 05.06.2012 (processo n.º 05431/12);
K- Assim, no despacho de reversão vem fundamentado que o património da originária devedora é manifestamente insuficiente para pagar a dívida exequenda, bem como a indicação de factos concretos de que o Oponente exerceu de facto a gerência, o que determinou a decisão de reversão que foi tomada;
L- Questão diversa é a de apurar que, afinal, não se verifica a insuficiência patrimonial e que o Oponente não exerceu de facto a gerência, o que redunda na falta de verificação de dois dos pressupostos da reversão previstos no art.º 24º da LGT; Contudo, esse é já um problema da validade substancial do ato e não de forma;
M- Pelo que, não podemos deixar de concluir que o ato de reversão está devidamente fundamentado, no que tange ao juízo de insuficiência/inexistência dos bens da originária devedora para pagar a quantia exequenda e no que tange ao exercício da gerência de facto, não existindo qualquer falta de fundamentação formal;
N- Em suma, a Meritíssima Juiz incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação da lei, mormente o disposto nos artigos 153.º n.º 2 do CPPT, 23.º e 24.º da LGT, 124.º e 125º do CPA e art.º 77º da LGT;
SEM PRESCINDIR, (...)”
O- Ainda que se entenda de forma diversa do pugnado – o que não se concebe nem concede, sempre se dirá que, uma vez verificado o vício de forma - falta de fundamentação do despacho de reversão, a consequência jurídica a extrair em sede de oposição à execução fiscal deverá ser a absolvição da instância executiva por falta de legitimidade processual e não a extinção da execução quanto ao Oponente, como se decidiu na douta sentença ora recorrida;
P- A sentença sob recurso julgou o Oponente não responsável pelo pagamento da dívida exequenda, considerando que o despacho que efetivou a reversão da execução fiscal contra o Oponente e responsável subsidiário não cumpria o dever legal de fundamentação;
Q- Como decorre do probatório e da fundamentação da decisão, não existiu uma avaliação de mérito da matéria controvertida que possa motivar a extinção da execução contra o Oponente, tal como a M.ª Juiz a determina;
R- Pelo que a douta sentença sob recurso deveria limitar-se a anular o despacho de reversão por vício de forma, consubstanciado em falta de fundamentação;
S- Uma vez que, nos casos em que a anulação do ato administrativo é motivada por um mero vício de forma, a Administração Fiscal pode executar uma decisão anulatória praticando um ato de sentido idêntico, mas sem o vício que o afetava, faculdade que a decisão sob recurso inviabiliza;
T- Assim, a douta decisão, julgando a oposição procedente deveria determinar a anulação da decisão que operou a reversão contra o Oponente.
U- Ao não se decidir assim, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do Direito.
V- Decidindo doutro modo, a douta decisão violou os artigos 101° e 124° do CPPT, 125° do CPA e 608º, n.º 1 do CPC, pelo que não pode manter-se.
Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de Vossas Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que se julguem improcedentes, por não provados, os vícios imputados ao despacho de reversão, com as legais consequências;
Ou caso assim não se entenda,
Deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por douto Acórdão que absolva o Oponente da instância executiva. JUSTIÇA
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O Recorrido não contra-alegou.
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O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida.
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Colhidos os vistos das Ex.mas Juízas Desembargadoras Adjuntas, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
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2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 660.º, n.º 2, 684.º, nº s 3 e 4, atuais art.ºs 608.º, nº 2, 635.º, nº 4 todos do CPC “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT, sendo as questões a decidir a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito e de facto, ao julgar que o despacho de reversão se encontrava insuficientemente fundamentado e em consequência declarou extinta a execução fiscal.
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3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1. Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…)
Factos provados
Com interesse para a decisão da causa consideram-se provados os factos seguintes:
A) A AT – Serviço de Finanças de Braga-2, instaurou o processo de execução fiscal n.º 3425200601045180 e apensos, contra a sociedade “NPA, S.A”, NIPC 50xxx88, por dívidas provenientes de IVA e IRS (Retenção na Fonte), no valor total de € 18.673.31;
B) A execução mencionada em A. reverteu contra o aqui oponente JDAFN, NIF 17xxx51;
C) Do despacho de reversão, com interesse para a decisão, consta no que releva para estes autos, quanto aos FUNDAMENTOS DA REVERSÃO:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
D) No despacho de projecto/reversão mencionado na al. anterior, consta no que releva para estes autos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
Facto não provado
Que o Oponente tenha realizado qualquer acto de gerência da originária devedora aquando da ocorrência dos factos que originaram a dívida exequenda.
A base probatória radica nos documentos neles referidos. (…)”
3.2. Aditamento e Alteração Oficiosa à Matéria de Facto
Ao abrigo do artigo 662º, nº 1, alínea a) do Código do Processo Civil importa reformular a alínea D) da matéria de facto, sendo que este facto constante no probatório não reproduz fielmente o conteúdo do despacho de reversão e aditar a alínea E) por dos autos existirem documentos que o compravam e consequentemente eliminar o facto não provado.

Assim, a alínea D) passa a ter a seguinte redação:
DESPACHO
Analisados os elementos constantes da instrução do presente processo, constata-se a manifesta insuficiência do valor dos bens para o pagamento da divida exequenda e acrescidos da devedora originária “NPA, S.A”, ..
(...)
Apurou-se nos autos, conforme matricula à Conservatória do Registo Comercial que à data da obrigatoriedade de pagamento dos impostos, a administração foi exercida por:
· Desde 14.03.2006 a 17-2-2007 – JDAFN, NIF…com domicilio em …., na qualidade de administrador único, sendo responsável subsidiários pelo valor de 18.673,31 €, nos termos do art. 24. N.º1 alínea b) da lGT.
· (…) Após consulta ao processo individual do cadastro de IVA verifica-se a existência de uma declaração de inicio de actividade datada de 14-3-2006 assinada pelo eventual JD.
Solicitou-se à Segurança Social informação acerca da qualificação como membro de órgão estatutário da sociedade dos supostos administradores acima indicados. Recebida resposta em 18-6-12, confirma-se essa situação relativamente a todos eles.
Nestes termos, mesmos como os elementos descritos concluímos que administração da sociedade, quer de facto quer de direito, era exercida pelos eventuais revertidos.
(…)
Obtida a concordância no sentido da decisão, deu-se cumprimento ao disposto no art. 23.º n.º 4 da Lei Geral Tributária (LGT), tendo unicamente o potencial revertido JDAFN exercido o direito de audição prévia em requerimento rececionado neste serviço 3-6-2011, referindo o seguinte:
o O ora requerente foi de facto administrador da sociedade “NPA” até ao final do ano de 2006. Altura em que, a empresa que se dedicava área da serralharia passou a dedicar-se à área de comercialização de produtos alimentares”.
o Tendo assinado acordo que junta cópia…passou a ser administrador o Sr. LASR.
o De tal acordo…..ressalta não ser o respondente responsável pelo pagamento de qualquer dívida fiscal,…..
(…)
A primeira alegação invocada em audição prévia tem a ver com o exercício efectivo do cargo de administrador. A cessação do cargo efetuada através de renúncia em 17-2-2007, pelo que nosso entender será esta a data da cessação efectiva das funções do órgão social da sociedade.
(…)
Relativamente à administração de facto, e provada que está a gerência de facto nominal ou de direito, presume-se o exercício efectivo daquela pelos responsáveis subsidiários da sociedade executada, porque uma vez feita a prova da administração de direito, e porque dela se infere naturalmente o exercício de uma gerência real ou de facto, a Administração Tributária passa a beneficiar da presunção judicial da gerência de facto, ficando assim dispensada da sua prova para obter a reversão da execução fiscal contra os gerentes nominais. A titularidade do cargo de administrador é um verdadeiro poder-dever e não um simples direito a favor de que quem é conferida; cria também para efeitos tributários simultaneamente direitos e obrigações.
Ainda que assim não fosse, existem elementos nos autos que sustentam que os visados exerceram a administração de facto da originária devedora. No que diz respeito ao administrador L…, após consulta ao processo individual, verifica-se a existência de ….
Face à presunção legal de culpa dos gerentes e administradores deste tipo de sociedades na respectiva insuficiência patrimonial, prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, a Administração tributária fica dispensada de provar essa culpa, pois……. ].
(…)
O potencial responsável JD que exerceu o direito de audição, não logrou demonstrar sem margem para dúvidas que não teve culpa pelo facto do património da devedora originária se ter tornado insuficiente para a satisfação dos créditos fiscais ……
(…)
Então, atendendo aos elementos atrás referidos, nos termos …… reverto a presente execução contra JDAFN pelo valor de 18.673,31 €, …..
Proceda-se à citação dos revertidos, nos termos…..(…)” Cfr. fls.93/97 do PEF apenso aos autos.
E) O Oponente exerceu o direito de audição e refere no ponto n.º 1 da sua exposição que “(…) foi de facto administrador da “NPA” até ao final de ano de 2006. “ (cf. Fls. 84/85 do pA apenso aos autos).
A sentença recorrida consignou nos factos não provados que “o Oponente tenha realizado qualquer ato de gerência da originária devedora aquando da ocorrência dos factos que originaram a dívida exequenda. “, o que importa eliminar. Tal asserção para além de ser conclusiva, não está suportado em prova documental e encontra-se em manifesta contradição com os restantes factos provados.
*
4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A questão principal que importa apreciar e decidir, equacionada nas conclusões é de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na aplicação do direito ao ter julgado que o despacho que determinou a reversão da execução contra o ora Recorrido/Oponente, não se encontra suficientemente fundamentado.
A sentença recorrida julgou a oposição procedente por considerar que o despacho de reversão padece de falta de fundamentação e em consequência julgou extinta a execução fiscal, no que ao Recorrido diz respeito.
Vejamos:
É inquestionável que a Administração Fiscal tem o dever de fundamentar os atos que afetem os direitos ou os legítimos interesses dos administrados, em conformidade com o princípio plasmado no artigo 268.º da CRP e densificado nos artigos 124.º do CPA e 77.º da LGT.
No que concerne ao ato de reversão da execução fiscal, a lei é expressa a determinar, no n.º 4 do art.º 23. ° da LGT, que: “A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação. (destacado nosso).
E também indiscutível que as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de ato e as circunstâncias concretas em que este foi proferido. A determinação do âmbito da declaração fundamentadora pressupõe, a busca de um conteúdo adequado, que há-de ser, num sentido amplo, o suficiente para suportar formalmente a decisão administrativa. (Acórdão do STA n.º 0624/12 de 14.02.2013).
Sobre a questão da fundamentação do despacho de reversão, a jurisprudência do STA é pacífica, sendo dela revelador o acórdão de 29.10.2014, proferido no processo 0925/13 que, por isso, aqui parcialmente se transcreve:
“… não sofre dúvida que a responsabilidade subsidiária se efectiva por reversão do processo de execução fiscal (n.º 1 do art. 23.º da LGT) e que este despacho de reversão, sendo um acto administrativo tributário, está sujeito a fundamentação (art. 268.º n.º 3 da CRP; arts. 23.º n.º 4 e 77.º nº 1, da LGT).
E sendo pressupostos da responsabilidade subsidiária (arts. 23.º n.º 4 e 24.º n.º 1, da LGT) a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (art. 23.º n.º 2 da LGT; art. 153.º n.º 2 do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou da respectiva entrega (art. 24.º n.º 1 da LGT), então o despacho de reversão, enquanto acto administrativo tributário, deve, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (nº 1 do art. 77.º da LGT), e deve incluir, igualmente, a declaração daqueles pressupostos e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária (art. 23º nº 4 LGT). Daí que, em consonância com este normativo, se tenha afirmado, no acórdão do Pleno desta Secção do STA, proferido em 16/10/13, 0458/13, que a fundamentação formal do despacho de reversão se basta com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada, «não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.» (cfr., igualmente, os acórdãos desta Secção do STA, de 31/10/2012, proc. nº 580/12 e de 23/1/2013, proc. nº 953/12).” (destacado nosso)
Regressando ao caso em análise, e tendo presente a doutrina acolhida pela jurisprudência citada, o despacho de reversão - como se extrai da transcrição parcial do facto constante na alínea D) da matéria de facto e neste acórdão reformulado – refere o período da dívida, insuficiência de bens e ainda indica documentos diversos, constantes do processo executivo, referindo que desses documentos fica patente o exercício das funções de gerente e fazendo também alusão às normas legais.
Acresce ainda referir que o Recorrido, em sede de audição, - facto E)- admite a gerência de facto da executada originária até finais de 2006 (as dívidas exigidas reportam todas ao ano de 2006) e em sede de oposição à execução embora negue a audição prévia, não nega a gerência de facto da executada originária.
E como lapidarmente concluiu o acórdão do STA n.º 0925/13 a fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efetivada (nº 4 do art.º 23º da LGT) não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a Administração Tributária fundamenta a alegação relativa ao exercício efetivo das funções do gerente revertido e aos demais pressupostos.
Acresce ainda que o despacho de reversão em causa, para além de indicar as normas legais em se sustentava, fez levantamento das dívidas da sociedade executada, dos potenciais responsáveis solidários e períodos da administração, verificando se tinha de facto exercido gerência, tenho apurado que o Recorrido exerceu no ano de 2006 a gerência facto, que assinou declaração de inicio de atividade e constatava da Segurança Social como membro estatutário e ainda que o património da sociedade executada (dois veículos) não se mostrava suficiente para o pagamento da dividida exequenda.
A sentença recorrida ao decidir que o despacho se encontrava insuficientemente fundamentado, incorreu em erro de julgamento e também incorreu em erro de julgamento ao declarar extinta a execução fiscal contra o Recorrido, quando a consequência jurídica a extrair de vício de forma – falta de fundamentação do despacho de reversão – é a da absolvição da instância executiva.
Destarte, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, na medida em que o despacho de reversão se encontra fundamentado de facto e de direito pelo que procedem as conclusões de recurso.
4.2. Compulsada a petição inicial verifica-se que o Recorrido– nos pontos 33º a 36º – alega ainda que a Administração Fiscal não cuidou de argumentar quaisquer factos de onde decorra a culpa do Oponente na insuficiência do património da executada originária para satisfação da dívida exequenda, como impõe a alínea a) do art.º 24.º da LGT, daqui advindo também a insuficiência da fundamentação.
E que na data da sua destituição a sociedade executada tinha um capital de 50 0000 € e que o seu sucessor estatutário responsabilizou-se pessoalmente pelo cumprimento de qualquer obrigação tributária.
Não tendo a sentença recorrida conhecido desta questão, face ao decidido, por força do disposto no n.º 2 art.º 665º do CPC cabe a este tribunal conhecer do mérito dessa parte, em substituição, se os autos fornecerem os necessários elementos.
Nesta conformidade, este tribunal dispõe dos elementos necessários para decidir em substituição, pelo que se procede ao seu conhecimento.
Antes de mais salienta-se que o Recorrido labora em erro quando refere que a reversão foi efetuada nos termos do disposto no art.° 24.°, n.º1 al. a), da LGT, e isso não desconhece pois o despacho de reversão, reporta-se sem margem para dúvidas ao art.° 24.°, n.º1 al. b), da LGT.
Compulsada a matéria de facto dada como provada - nas alíneas C) e D) - dela decorre que a reversão foi efetuada nos termos do disposto no art.° 24.°, al. b), da LGT.
O regime de responsabilidade subsidiária aplicável é o vigente no momento em que se verifica o facto gerador dessa responsabilidade (artigo 12º do Código Civil), pelo que sendo as dívidas exequendas referentes ao ano de 2006 é de aplicar o regime previsto no artigo 24.º da LGT, que foi, aliás, o normativo invocado pelo órgão de execução fiscal no despacho de reversão e também pela sentença recorrida.
Prevê o artigo 24.º, n.º 1 da LGT que: “1. Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. (…)”.
Como se relatou no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), de 10.10.2013, no âmbito do processo n.º 242/06.5BECBR: “Quanto às dívidas tributárias cujo facto constitutivo tenha ocorrido no período do exercício do seu cargo ou quando o prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois desse exercício (mas em que o gerente ou administrador já não exercia funções à data em que a dívida foi posta à cobrança) o administrador ou gerente é responsável se tiver sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para o seu pagamento. Neste caso, o ónus da prova da culpa recai, no entanto, sobre a Fazenda Pública.
Quanto às dívidas cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, o administrador ou gerente é responsável pelo seu pagamento, salvo se provar que a falta de pagamento lhe não foi imputável. Neste caso, existe uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária. Ora, “esta presunção, apesar de contrária à regra geral da responsabilidade extracontratual prevista no artigo 487.º do Código Civil (CC), compreende-se neste caso, pois se o gestor não tiver culpa pela falta de pagamento ou de entrega do imposto ocorrida no período em que exerceu funções, ser-lhe-á fácil prová-lo (Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., II volume, anotação 32 ao art. 204º, pág. 356.). Note-se que, embora esta alínea b) se refira meramente a imputação, e não a culpa, a jurisprudência tem vindo a interpretá-la no sentido de que é sempre exigível a culpa do gestor, entendida esta como a inobservância ou violação de uma regra de conduta previamente estabelecida” – (…)”.
No caso dos autos, não é controvertido que o prazo legal de pagamento ou entrega das dívidas tributárias exequendas terminou dentro do período do exercício da gerência da executada originária, por parte do Recorrido.
O ora Recorrido não negou a gerência, admitiu mesmo em sede de direito de audição e existiam nos autos elementos que consolidam essa versão, o que, aliás, não vem questionado na petição inicial.
Como supra se disse, alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT comporta uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária.
Demonstrada que seja a falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da sociedade originária devedora recai sobre o gestor o ónus da prova da falta de culpa por tal facto, sendo certo que a lei impõe a quem exerça funções de administração em pessoas coletivas ou ente fiscalmente equiparados “o cumprimento dos deveres tributários das entidades por si representadas” (art.º 32º da LGT).
Têm também a jurisprudência entendido que a culpa consiste na omissão da diligência exigível, e exprime sempre um juízo de censura em relação à atuação do agente (por este, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, poder e dever ter agido de outro modo), tornava-se necessário que prove que administrou a empresa de molde a evitar que o seu património se tornasse insuficiente para a satisfação suas dívidas.
Sendo que, os deveres dos gerentes ou administradores que decorrem do art.º 64.º do Código das Sociedades Comerciais "é a de dirigir, administrar, conduzir a gestão social, o que se deve concretizar, particularmente, no exercício da atividade para que a sociedade se constituiu.”
Assim, quem assume as funções de administrador ou gerente, deverá ter uma postura responsável e refletida, sem prejuízo da inerente discricionariedade técnica, no desempenho das suas funções, que se mostre, adequado ao alcance dos objetivos para que a sociedade se constituiu.
Neste mesmo sentido, entre muitos outros, acórdão TCA Norte n.º 0086/01 de 07.12.2005, 0032/02 de 23.02.2006, 0002/03, de 16.03.2006 e 0021/12 de 06.04.2006, 00242/06.5 BECBR de 10.10.2013, 00333/11.0BEAVR de 16.10.2014 e 0589/06.0 BEPNL de 16.10.2014, disponíveis em www.dgsi.pt.
No caso dos autos, sendo a situação enquadrável na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, para que o Recorrido, afastasse a sua responsabilidade subsidiária teria que demonstrar que a falta de entrega da prestação tributária não lhe era imputável.
O Recorrido somente alega que na data da sua destituição a sociedade executada tinha um capital de 50 0000 € tendo-se responsabilizado pessoalmente pelo cumprimento de qualquer obrigação o seu sucessor estatutário.
Porém o Recorrido apenas alega o referido circunstancialismo, no entanto, nada prova, sendo certo que a primeira circunstância teria de ser provada por documento, não sendo necessário como bem entendeu a MM juíza titular do processo, ao dispensar a inquirição de testemunhas arroladas.
Acresce ainda referir que qualquer negociação entre o Recorrido e o seu sucessor estatutário, não o desobriga do pagamento dos impostos, uma vez que face ao n.º 3 do art.º 29.º da LGT as obrigações tributárias não são suscetíveis de transmissão inter vivos,logo qualquer acordo ou negócio que envolva a cedência de dívidas para terceiros, não vincula a Administração Fiscal e não desonera o obrigado tributário.
Destarte, improcede a impugnação judicial.
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4.3. E assim formulamos as seguintes conclusões/Sumário:
I. O despacho de reversão, sendo um ato administrativo tributário, está sujeito a fundamentação dado o princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos atos administrativos (n.º 3 do art.º 268º da CRP) densificado, no caso, no nº 4 do art. 23º e nº 1 do art. 77º da LGT.
II. A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efetivada (nº 4 do art.º 23º da LGT) não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a Administração Tributária fundamenta a alegação relativa ao exercício efetivo das funções do gerente revertido.
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5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e em substituição julgar improcedente a oposição.
Custas pelo Recorrido, em primeira a instância, sem prejuízo do apoio judiciário, sendo que nesta instância não contra-alegou.
Porto, 6 de junho de 2019
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Ass. Maria da Conceição Soares
Ass. Maria do Rosário Pais