Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00022/03-Coimbra |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 09/29/2016 |
Tribunal: | TAF de Coimbra |
Relator: | Mário Rebelo |
Descritores: | NULIDADE SUPRIDA DE SENTENÇA |
Sumário: | 1. Arguida a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, se o juiz suprir a nulidade ou reformar a sentença, considera-se o despacho proferido como complemento e parte integrante desta, ficando o recurso interposto a ter como objecto a nova decisão (art.º 617º/2 do NCPC). 2. O Recorrente pode, no prazo de dez dias, desistir do recurso interposto, alargar ou restringir o seu âmbito, em conformidade com a alteração sofrida pela sentença, podendo o recorrido responder a tal alteração no mesmo prazo (art. 617º/3 do NCPC)* * Sumário elaborado pelo Relator. |
Recorrente: | O..., Lda. |
Recorrido 1: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Decisão: | Negado provimento ao recurso |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: O…, Lda. melhor identificada nos autos, impugnou as liquidações adicionais de IRC dos exercícios de 1997 e 1998 nos montantes de 10.622.052$ (€ 52982,57) e de 12.639.204$ (€ 63044,53) e juros compensatórios, liquidadas pela AT com recurso a correcções técnicas. A MMª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra julgou a impugnação improcedente por sentença de 29 de Maio de 2014. Inconformada, a Recorrente recorreu para este TCA concluindo as alegações com as seguintes conclusões: a) A douta sentença é nula por omissão de pronúncia (art. 125.° do CPPT), quanto à matéria suscitada nos artigos 27.º a 29.° da p.i., quanto ao vício de preterição de formalidades legais por violação do direito de audição. b) Procedendo esse vício, deve a sentença ser julgada nula por omissão de pronúncia e, consequentemente, ser ordenada a remessa dos autos à primeira instância para reforma da decisão de acordo com tal juízo. Nessa medida, invocou-se ainda, subsidiariamente: c) A sentença erra ao não dar como provado que “nos anos de 1997 e 1998, o sócio gerente da impugnante utilizava, habitualmente, a viatura Mercedes-Benz” (alínea a) dos factos não provados), contradizendo, inclusivamente, o facto dado como provado na alínea e). d) A prova requerida e efectuada refere-se ao período abrangido pelas correcções contestadas e não a qualquer outro momento anterior ou posterior (cf., se necessário, depoimento de M…, rotações 15 a 20), razão pela qual ao dar como provado, com interesse para a decisão e sem alteração do friso cronológico circunstancialmente em causa, o facto de o sócio gerente da impugnante usar, “frequentemente”, a viatura Mercedes CLK, o juízo do Tribunal refere-se forçosamente ao facto controvertido pela impugnante e balizado entre os anos de 1997 e 1998. e) A primeira testemunha, referindo-se a esse facto, não diz apenas que a viatura em causa era a “habitualmente” utilizada, concretizando mesmo que esse veículo era “praticamente sempre” utilizado pelo sócio gerente da impugnante (cf. depoimento de M…, rotações 77 a 100). A segunda testemunha, refere-se também a essa viatura como sendo a “mais frequentemente” utilizada pelo sócio gerente da ora recorrente (cf. depoimento de E…, rotações 490 a 497). f) Logicamente que impugnando a recorrente as correcções pressupostas pela utilização do veículo, que forçosamente se referem à utilização daquele, a única conclusão validamente possível é a de que, nesses exercícios, a viatura encontrava-se em utilização porque gerava as despesas corrigidas e impugnadas. g) Não se compreende, por não ser compreensível, como pode a Douta Sentença referir-se à impossibilidade de “aferir o período de utilização da viatura”, quando estão em causa despesas que forçosamente a pressupõem. Se em 1997 e 1998 foi pago o seguro dessa viatura, se em 1997 e 1998 existiram gastos de combustível com essa viatura, então, forçosamente, em 1997 e 1998, foi utilizada essa viatura! Assim: h) conjugados os depoimentos testemunhais nas partes referidas e o relatório da inspecção e atenta a motivação da matéria de facto referida pelo Tribunal, conclui-se (a) pela existência de uma contradição insanável entre as alíneas e) e a) (dos factos provados e não provados, respectivamente); (b) que é patente o erro de julgamento quanto a esse ponto da matéria de facto na parte em que o Tribunal a refere “não provada”, contra os meios de prova atrás referidos; (c) que o juízo constante da alínea e) dos factos provados ficou aquém da prova produzida, o que constitui, não menos, um erro de julgamento da matéria de facto, porquanto o Tribunal deveria ter dado como provado que a viatura Mercedes Benz, com a matrícula 96-39-10, era aquela que o sócio gerente da impugnante mais frequentemente utilizava. i) Em consequência, conjugado o facto referido na alínea d) dos factos provados, com o facto de a viatura Mercedes-Benz ser aquela que o sócio gerente da recorrente mais frequentemente utilizava, fica atestada a sua utilização nessas deslocações e a necessidade desses encargos. Razão pela qual o juízo do Tribunal de acordo com o qual não se provou que “nos anos de 1997 e 1998, era necessária a utilização da viatura Mercedes-Benz para o desenvolvimento da actividade da impugnante”, não pode manter-se. j) O mesmo se diga quanto à alínea c) dos factos não provados. Também aqui o Tribunal exorbita do facto (provado de que a “a esposa do sócio gerente da impugnante ajudava o marido em algumas tarefas da sociedade, como a elaboração de relatórios e a realização de pequenas deslocações, nomeadamente a bancos” - alínea h) dos factos provados), para um juízo de valor de matriz exclusivamente subjectiva e, como tal, desprovido de natureza fáctica, sendo que, para além disso, se suporta numa evidente violação das regras de experiência comum porquanto se afigura notório que o il quod plerumque accidit em cidades com alguma dimensão, como Coimbra, é que mesmo as deslocações puramente citadinas são efectuadas através de viaturas automóveis. l) Dando-se por provado que a esposa do sócio gerente e também ela sócia da impugnante efectuava deslocações ao serviço da sociedade, da circunstância de as testemunhas não terem referido “se, para esse efeito, ela precisava de utilizar um veículo automóvel”, não resulta o “facto” levado à alínea c) dos factos não provados. m) Trata-se aí de um juízo presuntivo que não tem qualquer apoio no padrão de realidade pressuposto como critério de normalidade na ponderação da prova: se do facto “não efectua deslocações” pode colher-se “não precisa de automóvel”, já do oposto daquele não pode validamente extrair-se idêntica conclusão. n) Com base no depoimento da testemunha, E…, rotações 380 a 420., o Tribunal devia ter dado como provado, atento o interesse para a decisão que o sócio gerente se deslocava mensalmente a uma localidade onde tinha de instalar todo o equipamento oftalmológico necessário para as consultas que aí prestava. o) A viatura, com a matrícula IO era a mais frequentemente utilizada pelo sócio gerente da impugnante, e como tal, os encargos suportados com ela são dedutíveis fiscalmente. p) Os pressupostos de actuação da AT foram infirmados pela recorrente, não apenas por se ter demonstrado que a actividade não era exercida exclusivamente por um sócio e porque foram efectivamente suportadas despesas e encargos com viaturas, deslocações e estadas, que o fisco não acolheu. q) A indispensabilidade a que se refere o artigo 23.° do CIRC como condição para que um custo seja dedutível não se refere à necessidade (a despesa como condição sine qua non dos proveitos), nem sequer à conveniência (a despesa como conveniente para a organização empresarial), sob pena de intolerável intromissão da AT na autonomia e na liberdade de gestão do contribuinte, mas exige, tão só, uma relação de causalidade económica, no sentido de que basta que o custo seja realizado no interesse da empresa, em ordem directa ou indirectamente, à obtenção de lucros”. r) Os custos originados com deslocações e estadas para prospecção de novos locais de actividade e para contactos com fornecedores, são dedutíveis nos termos do artigo 23.° do CIRC, por dizerem respeito ao normal exercício da actividade societária. s) As correcções fiscais relativamente à não dedutibilidade de certas despesas, não podem ser efectuadas com base em meras presunções de que os custos não se realizaram por não serem necessários. t) Infirmados os pressupostos que determinaram a existência das correcções dos custos, devem as mesmas ser anuladas de acordo e na medida resultante das anteriores alegações. u) O Tribunal violou o disposto nos artigos 125° do CPPT e 23.° do CIRC. Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deve esse Colendo Tribunal julgar nula, por omissão de pronúncia, remetendo-se os autos à 1.ª Instância para reforma da decisão recorrida, e, subsidiariamente devem ser anuladas as liquidações adicionais de IRC de 1997 e 1998, na parte relativa às correcções aqui impugnadas e recorridas. CONTRA ALEGAÇÕES. Não houve. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso, e considerando a sanação da nulidade, confirmação da sentença recorrida. II QUESTÕES A APRECIAR. O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença é nula por omissão de pronúncia e se errou no julgamento da matéria de facto. Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
* Com interesse para a decisão, não se provou que:a) Nos anos de 1997 e 1998 o sócio gerente da impugnante utilizava, habitualmente, a viatura Mercedes-Benz. b) Nos anos de 1997 e 1998, era necessária a utilização a viatura Mercedes-Benz para o desenvolvimento da atividade da atividade da impugnante. c) A esposa do sócio médico da impugnante precisava de utilizar uma viatura nas pequenas deslocações que fazia no interesse da sociedade. d) A impugnante prestava serviços na zona do Algarve e Alentejo. e) Nos exercícios de 1997 e 1998, a impugnante suportou despesas de representação bem como de deslocações e estadas, no desenvolvimento da sua atividade. f) Nos anos de 1997 e 1998, a impugnante utilizou a viatura Peugeot 106 XRD no desenvolvimento da sua atividade. g) A impugnante necessitava de utilizar a viatura identificada na alínea antecedente, no exercício da sua atividade. * Relativamente aos factos não provados:a) Ambas as testemunhas inquiridas referiram que o sócio médico da impugnante teve um acidente em que o veículo Mercedes-Benz ficou “desfeito” mas sem esclarecer quando ocorreu tal acidente, por forma a permitir ao tribunal aferir o período de utilização efetiva de tal viatura. b) As testemunhas nada referiram a este propósito e da prova documental junta aos autos também não é possível inferir tal necessidade, mormente por inadequação da viatura Volkswagen Passat. c) As testemunhas referem, unanimemente, que a esposa do sócio médico da impugnante fazia “pequenas deslocações” ao serviço desta, contudo, não esclarecem se, para esse efeito, ela precisava de utilizar um veículo automóvel. d) Não foi produzida qualquer prova. e) Idem. f) Idem. g) Idem. IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO. Quanto à nulidade da sentença por omissão de pronúncia. O RECORRENTE começa por denunciar o vício de nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto à matéria suscitada nos artigos 27º a 29º da pi quanto ao vício de preterição de formalidades legais por violação do direito de audição. A MMª juiz no despacho a que alude o art. 617º do NCPC (correspondente ao anterior Art. 670º/1 do CPC) procedeu ao aditamento de matéria de facto (alínea l) com o seguinte teor: A impugnante foi notificada para exercer o direito de audiência prévia sobre o projecto de conclusões de inspeção, a coberto do ofício n.º 2224, datado de 17/04/2002 – fls. 7 do p.a. E de seguida pronunciou-se sobre a preterição do direito de audiência prévia após a notificação do relatório final e antes de emitidas as liquidações em crise, concluindo que tendo a impugnante sido «…notificada para exercer o seu direito de adução sobre o projecto de conclusões do relatório da inspecção, não havia que ser notificada, para o mesmo efeito, antes da liquidação, tendo em conta a inexistência de invocação de factos novos sobre os quais ela ainda não tivesse tido a oportunidade de se pronunciar». Conforme resulta do disposto no art.º 617º/2 do NCPC, se o juiz suprir a nulidade ou reformar a sentença, considera-se o despacho proferido como complemento e parte integrante desta, ficando o recurso interposto a ter como objecto a nova decisão. O Recorrente pode, no prazo de dez dias, desistir do recurso interposto, alargar ou restringir o seu âmbito, em conformidade com a alteração sofrida pela sentença, podendo o recorrido responder a tal alteração no mesmo prazo (art. 617º/3 do NCPC) A MMª juiz supriu a nulidade. Notificada, a RECORRENTE nada disse. Por conseguinte, o recurso interposto passa a ter como objecto a nova decisão. Mas esta decisão não nos merece qualquer censura, desde logo porque se inscreve em jurisprudência pacífica e uniforme (ac. do Pleno da secção do CT 0903/06 de 26-09-2007 Sumário: I - O contribuinte que foi ouvido em fase anterior do procedimento de liquidação não tem, em regra, de voltar a sê-lo antes do acto de liquidação. II - Esta a interpretação a dar ao artigo 60º da Lei Geral Tributária, mesmo antes de o nº 2 do artigo 3º da Lei nº 16-A/2002, de 31 de Maio, ter dado nova redacção ao seu nº 3, com carácter interpretativo, doutrina reiterada no acórdão do Pleno da mesma secção com o n.º 0131/07 de 24-10-2007 e em outros arestos daquele alto Tribunal como é exemplo o ac. 0675/11 de 16-05-2012). Termos em que improcede a invocada nulidade da sentença. Quanto ao erro de julgamento da matéria de facto. A AT corrigiu os custos contabilizados pela IMPUGNANTE/RECORRENTE com as viaturas Peugeot 106 XRD, matrícula DM, WW Passat TDI matrícula HP e Mercedes Benz CLK matrícula IO. Os custos com a primeira viatura não foram aceites por nos exercícios em análise estar registada em nome de pessoa estranha à empresa. Foram aceites apenas os custos com o veículo Passat TDI matrícula HP por ser a primeira viatura a ser adquirida. E por isso (por serem aceites os custos com a viatura Passat), não foram aceites custos com a viatura Mercedes Benz CLK matrícula IO, «…tendo em conta o tipo de actividade desenvolvida, a mesma ser exercida por um único médico que é o próprio sócio, atendendo ainda ao faco de que a Drª C… (esposa) apesar de sócia é professora do ensino secundário, não contribuindo assim para a realização dos proveitos, entendemos ser apenas necessária uma viatura para o desenvolvimento da actividade». O RECORRENTE discorda da matéria de facto levada ao probatório na sentença recorrida no que se refere à utilização do veículo matrícula IO (Mercedes Benz CLK). Apreciemos. Reapreciada a prova, as testemunhas confirmam que o sócio gerente da RECORRENTE se deslocava para várias cidades/localidades onde tinha consultório, além de contactos com fornecedores de equipamentos (que no dizer da testemunha Dr. E… «a cada seis meses o equipamento está desactualizado») «andava praticamente» com este carro (Mercedes CLK). A MMª juiz considerou provado na alínea E) que nas deslocações para os consultórios o sócio gerente usava frequentemente a viatura Mercedes CLK. Mas não se provou que essa utilização ocorresse nos anos de 1997 e 1998 porque as testemunhas nada referiram a esse propósito e da prova documental também não é possível inferir tal necessidade. A RECORRENTE defende que as testemunhas confirmaram a utilização daquele veículo e não compreende a impossibilidade referida na sentença «…de aferir o período de utilização da viatura quando estão em causa despesas que forçosamente a pressupõem. Se em 1997 e 1998 foi pago o seguro dessa viatura então, forçosamente em 1997 e 1998 foi utilizada essa viatura» (Conclusão g). Efectivamente as testemunhas confirmaram a utilização do veículo Mercedes CLK, mas não referiram o período em que essa utilização foi feita. E o facto de terem sido contabilizadas despesas com este veículo nos exercícios em análise também não permite concluir que nesse período o veículo foi utilizado pelo sócio gerente da RECORRENTE, ao serviço desta. E a razão é simples. É que nos exercício em causa o RECORRENTE também contabilizou a quantia de Esc. 6.777.105$ (exercício de 1997) referentes a deslocações efectuadas em viatura própria e no exercício de 1998 contabilizou Esc. 7.016.725$ a título de deslocações efectuadas em viatura própria (como resulta do Relatório a fls. 12 e 13 e dos factos provados a fls. 5 da sentença). Ora, se nesse período a RECORRENTE também tivesse utilizado o Mercedes CLK no seu giro profissional– deslocações para várias localidades onde se situa o consultório – ficaríamos sem compreender a contabilização dos custos com viatura própria. Uma destas utilizações dificilmente pode ser verdadeira nos mesmos exercícios pois a actividade é exercida por uma única pessoa que só pode utilizar um veículo de cada vez. Ou utilizou o CLK ou a viatura própria; as duas é que nos parece algo difícil de aceitar, pelo menos sem uma explicação fundamentada. E não é pelo facto de os custos com as deslocações em viatura própria não terem sido aceites que «automaticamente» se deve aceitar os custos com a viatura IO, numa espécie de raciocínio filiado na ideia de que «se não se aceitam custos com uma viatura devem aceitar-se os custos com a outra». Para além desta conclusão não ser válida - o imobilizado da sociedade ainda contempla outra viatura, precisamente aquela cujos custos foram aceites-, nesta fase do exame da questão limitamo-nos a indagar o eventual erro de julgamento da matéria de facto e para isso temos de ponderar todos os factos disponíveis nos autos que nos é lícito conhecer. A possibilidade de utilização no mesmo exercício de viatura particular e viatura de serviço pode acontecer. Mas se acontecer, deve ser explicada para que se possa compreender e aceitar. Não tendo sido dada qualquer explicação para a utilização das duas viaturas pela mesma pessoa, não nos podemos basear no depoimento das duas testemunhas que asseguram que o sócio gerente da IMPUGNANTE (Dr. J…) «andava praticamente» com o Mercedes CLK para a seguir concluir (extrapolar, melhor dizendo, porque as testemunhas não referiram os anos) que essa utilização ocorreu em 1997 e 1998. Mas como tal explicação não foi fornecida, não nos merece censura o facto não provado na alínea a) dos factos não provados nos termos do qual não se provou que nos anos de 1997 e 1998 o sócio gerente da impugnação utilizava, habitualmente, a viatura Mercedes Benz. Também não vemos qualquer contradição entre o facto provado na alínea E) e o facto não provado na alínea a). Ninguém nega que a viatura tenha sido utilizada «porque gerava as despesas corrigidas e impugnadas» (Conclusão F). O ponto não é que ela tenha sido utilizada, mas sim que tenha sido utilizada pelo sócio gerente da RECORRENTE no período em análise, precisamente o mesmo período em que também foram contabilizadas despesas com deslocações em viatura própria. E como essas dúvidas não foram removidas, o julgamento da matéria de facto não nos merece qualquer censura. Para além deste erro, a RECORRENTE denuncia um segundo erro. Referindo-se ao facto não provado na alínea c) entende exorbitar do facto provado na alínea h) para um juízo de valor de matriz exclusivamente subjectiva e, como tal, desprovido de natureza fáctica, sendo que, para além disso, se suporta numa evidente violação das regras de experiência comum porquanto se afigura notório que o il quod plerumque accidit em cidades com alguma dimensão, como Coimbra, é que mesmo as deslocações puramente citadinas são efectuadas através de viaturas automóveis (Conclusão J). A alínea h) dos factos provados consta que: «A esposa do sócio gerente da impugnante ajudava o marido em algumas tarefas da sociedade, como a elaboração de relatórios e a realização de pequenas deslocações, nomeadamente a Bancos». Na alínea c) dos factos não provados não se provou que a «…esposa do sócio médico da impugnante precisava de utilizar uma viatura nas pequenas deslocações que fazia no interesse da sociedade». Mas nenhuma das testemunhas inquiridas referiu que a esposa utilizava qualquer veículo nas suas deslocações em ajuda ao marido. Disseram que ajudava o marido, mas não disseram que utilizava qualquer veículo. Nem se fez qualquer outra prova nesse sentido. E ao contrário do que afirma a RECORRENTE também não há qualquer prova de que «em cidades com alguma dimensão, como Coimbra, é que mesmo as deslocações puramente citadinas são efectuadas através de viaturas automóveis», nem vemos que isso constitua um «facto notório» ou mesmo presunção judicial (art. 351º do Código Civil). Aliás, o que é sabido é que nas deslocações dentro da cidade muitas pessoas não usam veículos devido às dificuldades de estacionamento e ao tempo que demora na procura de um lugar, pelo que de modo algum não se pode extrair a conclusão proposta pela RECORRENTE. E assim, também nesta parte a douta sentença não nos merece qualquer censura. A nulidade da sentença e os erros de julgamento da matéria de facto eram os vícios apontados à douta sentença. Improcedendo estes na totalidade, o recurso não merece provimento e a sentença deve ser confirmada. V DECISÃO. Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida. Custas pela RECORRENTE. Porto, 29 de Setembro de 2016. Ass. Mário Rebelo Ass. Cristina Travassos Bento Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira |