Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00804/19.0BEALM
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/15/2020
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO DE CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL, ARTIGO 68° DA LEI 96/2015, DE 17 DE AGOSTO, ASSINATURA ELETRÓNICA
Sumário:I-Tendo ficado demonstrado que a plataforma eletrónica utilizada pela Entidade Adjudicante permite o carregamento progressivo das propostas, o caso dos autos deve ser decidido por interpretação e aplicação do artigo 68°/5 da Lei 96/2015, de 17/8;

I.1-assim, a plataforma eletrônica utilizada no procedimento concursal em questão permite o carregamento progressivo porque se permitisse o mero carregamento fechado nunca seria possível a modificação dos documentos prevista nas condições de adesão à mesma, inclusivamente a pessoas autorizadas;

I.2-permitindo a plataforma o carregamento progressivo, não era obrigatória a assinatura dos documentos antes do carregamento, apenas sendo exigível aquando da submissão da proposta, que ocorreu dentro do prazo fixado para o efeito e mediante a utilização de certificado qualificado;

I.3-de todo o modo, é dominante na jurisprudência e doutrina administrativas que uma formalidade se degrada em não essencial se a sua preterição e omissão não tiver impedido a realização dos objetivos que mediante ela o legislador pretendeu produzir. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:E., S.A. e Outros
Recorrido 1:Infra-Estruturas de Portugal, S.A.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.
1
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO

E., S.A., com sede na Recta (…), (…), (…), instaurou acção de contencioso pré-contratual contra a Infra-Estruturas de Portugal, S.A., com sede na Praça (…), (…), destinada a impugnar o acto administrativo de adjudicação, e da subsequente decisão de contratar, constante da deliberação do Conselho de Administração da Ré datada de 05/09/2019, e referente ao concurso público para a empreitada designada de “Sistema de Mobilidade do (...) – Empreitada de Adaptação a uma Solução BRT – Metrobus, do Troço (...) – (...)”.
Indicou como contrainteressada: C., SA/F., S.A.”, com sede na Avenida (…), Edifício (…), (…).
Pediu a anulação do acto de adjudicação da empreitada identificada à Contrainteressada, bem como a condenação da Ré à prática de acto devido, consubstanciado na exclusão da proposta apresentada por esta e a consequente adjudicação da empreitada a si Autora.

Por decisão proferida pelo TAF de Viseu foi julgada improcedente a acção.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:

I. Discorda-se da sentença em matéria de direito, por padecer de um conjunto de violações da lei e de erros de interpretação e de aplicação de normas legais.
II. Desde logo, a fixação oficiosa do valor da causa consubstancia uma decisão surpresa.
III. Pois foi tomada sem que às partes tenha sido concedido o necessário contraditório, o que constitui uma violação do artº. 3° do CPC, aplicável ao caso por força do disposto no artº. 1º do CPTA.
IV. Ademais entende-se que na fixação do valor da acção se deverão atender aos critérios previstos no artº. 34° do CPTA.
V. Num processo de contencioso pré-contratual a utilidade da causa não pode corresponder ao valor da proposta sobre a qual incidiu a decisão de adjudicação ou ao valor da proposta não adjudicada (no caso a da Apelante).
VI. Essa utilidade corresponde, sim, à anulação de uma decisão ou acto de não adjudicação da proposta apresentada pela recorrente.
VII. Acto de não adjudicação esse cujo valor é indeterminável.
VIII. Pelo que, sendo a utilidade económica do pedido impossível de determinar, dever-se-á recorrer ao critério supletivo plasmado nos nºs 1 e 2 artº. 34º do CPTA.
IX. Devendo, portanto, o valor da acção ser o indicado da Petição Inicial (30.000,01€).
X. E, assim, a sentença recorrida ser revogada porque, ao atribuir à acção o valor de 23.765.000,00€, errou na aplicação do disposto no nº 2 do artº. 32º e no artº. 34º, ambos do CPTA.
Sem prescindir,
XI. Ainda que se atendesse ao critério valor económico do acto, o valor da acção nunca poderia ser totalidade do preço contratual proposto pela Contra-interessada.
XII. Desde logo, nos presentes autos não se discute a existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução de um contrato e, portanto, não pode o valor da acção ser o preço daquele negócio jurídico, tal como decorre da aplicação do nº 3 do artº. 32º do CPTA.
XIII. De acordo com o disposto no nº 2 do artº. 32º do mesmo CPTA, “Quando pela acção se pretenda obter um benefício diverso do pagamento de uma quantia, o valor da causa é a quantia equivalente a esse benefício”.
XIV. O benefício que a Apelante retirará de uma eventual adjudicação do contrato no âmbito do procedimento concursal sub-judice não é a totalidade do preço contratual, mas sim o lucro que deste resulta.
XV. Lucro esse que não se encontra determinado, pois a Meritíssima Juíza a quo não procedeu à instrução do processo nem concedeu o contraditório às partes, quando alterou oficiosamente o valor da acção.
XVI. Infringindo, deste modo, a sentença recorrida os artºs. 3º e 590°, ambos do CPC, aplicáveis por força do artº. 1° do CPTA.
XVII. A sentença recorrida dá como provado que “K) A todos os documentos que compunham a proposta apresentada pela CI foi aposta a assinatura electrónica qualificada do referido C., excepto no documento designado como “Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra”.
XVIII. Ao dar tal facto como provado está a considerar que a proposta da Contra-interessada deveria ter cumprido, mas não cumpriu, o disposto no n° 4 do artº. 68° da Lei n° 96/2015.
XIX. Em concreto, a sentença recorrida está a considerar que a proposta da Contra-interessada nos presentes autos contém um documento/ficheiro no qual não foi colocada a assinatura electrónica qualificada até ao momento do seu carregamento, como é exigência de tal preceito.
XX. Assim, errou a Meritíssima Juíza a quo ao entender sanável e sanada aquela manifesta falta de assinatura electrónica qualificada no documento a que se reporta a alínea k) dos factos provados por força da aplicação do disposto no nº 5 do artº. 68º, da Lei nº 96/2015.
XXI. E errou por entender ser suficiente a encriptação e assinatura de tal documento no momento da submissão da proposta na plataforma electrónica.
XXII. O que constitui uma violação directa do já referido n° 4 do artº. 68° da Lei n° 96/2015
XXIII. E uma constitui uma errada interpretação e aplicação da norma do nº 5 do artº. 68º, da Lei nº 96/2015 ao caso sub-judice.
XXIV. No cotejo das normas do nº 4 do artº. 68º da Lei nº 96/2015 e do nº 2 do artº. 54º da mesma citada lei, resultam à saciedade várias exigências.
XXV. Designadamente que a aposição de assinatura electrónica qualificada em cada um dos documentos deve ser prévia ao carregamento dos mesmos na plataforma electrónica.
XXVI. Tais exigências constituem formalidades essenciais de um procedimento adjudicatório e não podem “degradar-se em meras irregularidades (…)” (ver, neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 30.01.2013, Proc. 1123/12 e o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 28.06.2018, Proc. 278/17, in www.dgsi.pt).
XXVII. O nº 5 do artº. 68º da supracitada lei constitui um regime excepcional de assinatura e submissão dos documentos.
XXVIII. Sendo apenas aplicável aos casos em que uma plataforma electrónica permite a permanente alteração e edição dos documentos até ao momento da submissão da proposta.
XXIX. Da análise da letra e da ratio dos nºs 4 e 5 do artº. 68º da Lei nº 96/2015 é evidente que estamos perante diferentes situações de aposição de assinatura em documentos
XXX. A primeira situação – e que se refere ao nº 4 do citado artigo – é a que se refere aos casos em que não existe a possibilidade de edição de documentos na plataforma (sublinhado nosso), tendo o legislador determinado que estes deverão ser assinados antes de serem carregados em tal plataforma (sublinhado nosso) mediante a aposição de certificado electrónico qualificado.
XXXI. A segunda situação – e que se refere ao nº 5 do mesmo artigo – é a que se refere aos casos em que existe a possibilidade de edição de documentos na plataforma (sublinhado nosso), tendo o legislador determinado que a assinatura electrónica qualificada seja aposta no momento da submissão da proposta (sublinhados nossos), ou seja, já depois desses documentos terem sido carregados em tal plataforma.
XXXII. Se a lei estabeleceu esta destrinça de casos e momentos relativos à aposição de assinatura electrónica qualificada em documentos, não cabe ao intérprete e/ou ao julgador ignorar e desconsiderar tal distinção.
XXXIII. Pelo que nos casos em que não existe a possibilidade de edição de documentos, tendo o legislador determinado que estes devam ser previamente assinados e carregados como definitivos na plataforma (aplicando-se o nº 4 do artº. 68º), não pode a sentença recorrida considerar que o não cumprimento deste preceituado seja sanado pela mera aposição da assinatura electrónica qualificada no momento da submissão da proposta (aplicando, portanto, o nº 5 do mesmo artº. 68º).
XXXIV. A exigência constante do nº 4 do artº. 68º visa proteger os objectivos e valores de segurança, fidedignidade, credibilização e certeza do procedimento desmaterializado (ver, neste sentido, a subalínea xii), da alínea b) do nº 2 do artº. 11º da já citada Lei nº 96/2015).
XXXV. Cumpre realçar igualmente que no caso dos autos em recurso não ficou provado que a plataforma electrónica utilizada pelos concorrentes concedia a estes a possibilidade prevista no nº 5 do artº. 68º da Lei nº 96/2015.
XXXVI. Ficou provado tão somente que a plataforma usada pelos concorrentes e partes nos presentes autos emitiu “automaticamente um recibo electrónico da entrega, com o registo da identificação da entidade adjudicante, do procedimento, do concorrente, da proposta, bem como da data e hora da respectiva submissão” (ver, neste sentido, a alínea M) dos factos provados).
XXXVII. Da interpretação conjugada dos nºs 4 e 15, do artº. 68º com a do nº 5 do mesmo artigo, resulta que este último preceito legal (o nº 5) estabelece um regime excepcional e só aplicável aos casos em que a plataforma electrónica permite a permanente alteração e edição dos documentos até ao momento da submissão da proposta.
XXXVIII. O que não sucedeu no caso sub-judice por inexistir prova nesse sentido.
XXXIX. Pelo que a sentença recorrida e o aresto em que estriba o seu entendimento, aplicam indevidamente o citado nº 5 do artº. 68º da Lei nº 96/2015.
XL. Verifica-se, pois, o incumprimento das formalidades exigidas da conjugação do referido nº 4 do artº. 68º da supracitada lei, com o nº 1 do artº. 54º da mesma lei e com o nº 1 do artº. 62º do CCP.
XLI. Inexistindo, assim, fundamento legal para deixar de aplicar a causa de exclusão da proposta da Contra-interessada prevista na alínea l) do nº 2 do artº. 146° do CCP em conjugação com o nº 5 do artº. 54º da Lei nº 96/2015.
XLII. Pelo que a sentença recorrida deveria ter determinado que a Ré procedesse à exclusão da proposta da Contra-interessada e, em consequência, promovido à adjudicação da proposta à ora recorrente.

TERMOS EM QUE DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA.
ASSIM DECIDINDO FARÃO
J U S T I Ç A.

A Ré juntou contra-alegações, concluindo:

1. De acordo com o n.º 1 e o n.º 2 do artigo 306.º do CPC, compete ao juiz fixar o valor da causa, sendo o mesmo fixado na sentença, quando não haja lugar a despacho saneador.
2. Nos termos do n.º 2 do artigo 310.º do CPC, quanto às consequências da decisão do incidente do valor, se da fixação definitiva do valor resultar ser outra a forma de processo correspondente à ação, mantendo-se a competência do tribunal, é mandada seguir a forma apropriada, sem se anular o processado anterior e corrigindo-se, se for caso disso, a distribuição efetuada.
3. Deste modo, ao contrário do que pretende a Recorrente, o incidente suscitado pela parte interessada quanto à atribuição do valor da causa pelo Tribunal nunca teria como efeito a revogação da sentença.
4. O agrupamento C. S.A./F., S.A. apresentou proposta ao procedimento para a “Empreitada de adaptação a uma solução BRT – Metrobus, no troço (...) – (...)”, que integra, entre outros documentos, uma procuração, nos termos da qual as empresas integrantes do Agrupamento constituem como procurador C., concedendo-lhe poderes para praticar todos os atos, subscrever e assinar todos os documentos do Agrupamento e concedendo-lhe igualmente poderes para submeter na plataforma eletrónica todos e quaisquer documentos, assiná-los eletronicamente através de certificados de assinatura qualificada.
5. A proposta é assinada e submetida na plataforma pela C. por C. através da assinatura qualificada com certificado de representação MULTICERT, com poderes de representação para apresentação de propostas, como
se pode verificar no relatório de descarregamento.
6. A nota técnica sobre o Sistema de Gestão da Qualidade da Obra consta do referido relatório de descarregamento, com assinatura eletrónica individualizada para o referido documento devidamente validada.
7. “A plataforma eletrónica de contratação pública anoGov garante a assinatura digital qualificada de todos os ficheiros submetidos na plataforma, através do uso de CDQ – Certificados Digitais Qualificados válidos no mercado português (Multicert, DigitalSign, Cartão de Cidadão e outros admitidos na Trusted – Service Status List do GNS – Gabinete Nacional de Segurança)”, conforme esclarecimento prestado pela plataforma eletrónica de contratação pública anoGov em 18 de outubro de 2019, identificado como Doc. n.º 3 da Contestação da IP.
8. “No processo de submissão de ficheiros é associada a assinatura digital qualificada do utilizador que procede à respetiva submissão. Este procedimento cumpre os requisitos exigidos pela legislação em vigor”, conforme esclarecimento prestado pela plataforma eletrónica de contratação pública anoGov em 18 de outubro de 2019, identificado como Doc. n.º 3 da Contestação da IP.
9. “A plataforma anoGov cumpre todos os requisitos legais relativos à assinatura da submissão de ficheiros, ou seja, permite ao utilizador assinar e encriptar os ficheiros, com recurso ao certificado digital qualificado colocado no posto local, durante a fase de submissão. Esta assinatura fica associada aos ficheiros como se pode verificar posteriormente no relatório de descarregamento”, conforme esclarecimento prestado pela plataforma eletrónica de contratação pública anoGov em 18 de outubro de 2019, identificado como Doc. n.º 3 da Contestação da IP.
10. De acordo com o n.º 4 do artigo 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública, quando o interessado realizar o carregamento, na plataforma eletrónica, de um ficheiro de uma proposta, este deve estar já encriptado e assinado, com recurso a assinatura eletrónica qualificada.
11. Segundo determina o n.º 1 do artigo 54.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, os documentos submetidos na plataforma eletrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura eletrónica qualificada, nos termos dos n.os 2 a 6.
12. Conforme menciona o n.º 2 do mesmo artigo 54.º, os documentos elaborados ou preenchidos pelas entidades adjudicantes ou pelos operadores económicos devem ser assinados com recurso a certificados qualificados de assinatura eletrónica próprios ou dos seus representantes legais.
13. De acordo com o n.º 7 do artigo 54.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, nos casos em que o certificado digital não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma eletrónica um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e a assinatura do assinante.
14. De acordo com o n.º 1 do artigo 57.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, a identificação dos utilizadores perante as plataformas eletrónicas efetua-se mediante a utilização de nome de utilizador e da palavra-chave, podendo ainda ser utilizados certificados digitais próprios ou certificados disponibilizados pelas plataformas eletrónicas, bem como o cartão de cidadão ou a chave móvel digital referidos na alínea f) do n.º 1 do artigo 35.º 15. Conforme refere o n.º 3 do artigo 57.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, o mecanismo de validação de certificados dos utilizadores é efetuado tendo por base o certificado e a respetiva cadeia de certificação completa.
16. Segundo refere o n.º 4 do artigo 57.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, as plataformas eletrónicas devem garantir a integração com o Sistema de Certificação de Atributos Profissionais.
17. O Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06-12-2018, no Processo n.º 0278/17.0BECTB, disponível em www. dgsi.pt, refere o seguinte:
“I – Enquanto no carregamento de “ficheiro fechado” o concorrente elabora a proposta localmente, no seu próprio computador, inserindo os documentos em ficheiros que introduz na plataforma electrónica depois de encriptados e assinados, no carregamento progressivo ou de “ficheiro aberto”, a que alude o n.º 5 do art.º 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17/8, o ficheiro está em processo de carregamento até ao momento da submissão, não sendo a sua assinatura exigida até este momento.
II – Estando assente que se teria de considerar que a modalidade de carregamento era a de “ficheiro fechado”, em virtude de a plataforma electrónica utilizada no concurso não ter as potencialidades necessárias para permitir o carregamento progressivo nos termos do mencionado art.º 68.º, n.º 5, e resultando dos factos provados que, em violação do n.º 4 deste art.º 68.º, os ficheiros da proposta da adjudicatária só foram assinados electronicamente depois de carregados no portal, há que averiguar se a formalidade essencial omitida se degradou em não essencial por as funções da assinatura electrónica terem sido asseguradas.
III – Tendo-se provado que todos os ficheiros associados à proposta da adjudicatária foram assinados através de um certificado de assinatura electrónica a ela pertencente e garantindo a plataforma a possibilidade de aferir se uma cópia electrónica que dela tenha sido extraída corresponde ao documento original submetido pelo concorrente, é de concluir que o facto de os ficheiros não terem sido assinados na altura determinada pela lei, mas só em momento posterior, se degrada em formalidade não essencial.”
18. O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 12-07-2018, no Processo n.º 00374/17.4BECTB, disponível em www. dgsi.pt, refere o seguinte:
“1 – Constando n.º 3 da Cláusula 8ª do Programa do Concurso a obrigação de todos os documentos carregados na plataforma eletrónica deverem ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada, não podem os candidatos deixar de cumprir o estabelecido concursalmente.
2 – Correspondentemente, os documentos juntos ao procedimento concursal deverão ser carregados na plataforma eletrónica, individualmente assinados, sem prejuízo da assinatura do correspondente ficheiro devidamente encriptado.
3 – Com efeito, a submissão da proposta efetiva-se com a assinatura eletrónica da proposta por utilizador autorizado e identificado.
Os documentos carregados nas plataformas eletrónicas deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada, sendo que no caso em que o certificado digital não possa relacionar diretamente o assinante com a sua função e poder de assinatura a entidade interessada deverá submeter à plataforma um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do subscritor.”
19. O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 04-05-2018, no Processo n.º 02119/17.0BEBRG, disponível em www. dgsi.pt, refere o seguinte:
“A exigência de assinatura electrónica qualificada em cada ficheiro, nos termos do artigo 54º/5 da Lei 96/2015, é comprovável mediante o recibo de submissão emitido pela entidade gestora da plataforma electrónica, sendo desnecessário que a assinatura seja “embutida” (visível) em cada ficheiro”.
20. “Lê-se no esclarecimento feito pela Vortal em 12 da matéria de facto:
“Por forma a ajudar os concorrentes no cumprimento do nº1 do artigo 54º, a plataforma exige que todos os ficheiros que compõem as propostas sejam assinados eletronicamente, antes da sua submissão, podendo V/ Exas e a entidade adjudicante comprovar esse facto através do recibo comprovativo de submissão e consultando o detalhe da assinatura utilizada na plataforma (no qual terão toda a informação relativa ao certificado utilizado, bem como a validade da assinatura que comprova a integridade do ficheiro que foi anexado). Os operadores económicos/ concorrentes são assim obrigados a efetuar a assinatura eletrónica na plataforma em todos os ficheiros que constituem as propostas em procedimentos ao abrigo do CCP”
(Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 04-05-2018, no Processo n.º 02119/17.0BEBRG, disponível em www. dgsi.pt).
21. “Entende-se que a Vortal esclarece cabalmente a sua posição. Sem a exigência de assinatura dos ficheiros, acompanhada da possibilidade de comprovação desse facto através do recibo, seria difícil compreender a racionalidade do artigo 70º/1 do CPP (“a proposta considera-se apresentada, para efeitos do CCP, quando o concorrente finaliza o processo de submissão.”) e do artigo 66º/5 da Lei n.º 96/2015 de 17 de agosto (“A plataforma eletrónica deve disponibilizar um recibo eletrónico, que é anexado à proposta.”)” (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 04-05-2018, no Processo n.º 02119/17.0BEBRG, disponível em www. dgsi.pt).
22. “Por outro lado, afigura-se que seria estultícia regular de forma tão densa e minuciosa as plataformas electrónicas, como sucede com a Lei n.º 96/2015 de 17 de agosto, ao nível de licenciamento, monitorização, fiscalização, credenciação e outros requisitos, se não fosse para lhes atribuir e reconhecer funções de certificação e fé pública no exercício da sua actividade.”
(Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 04-05-2018, no Processo n.º 02119/17.0BEBRG, disponível em www. dgsi.pt).
23. “É surpreendente a quantidade de questões suscitadas nos tribunais relativamente à regularidade da submissão das propostas, quando tudo indica que o respetivo carregamento com êxito na plataforma eletrónica deveria ser uma garantia de fidedignidade que permitiria aos júris dedicarem-se serenamente à parte substantiva do procedimento, isto é, à análise do mérito das propostas” (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 04-05-2018, no Processo n.º 02119/17.0BEBRG, disponível em www.dgsi.pt).
24. “Certamente não é de encorajar a proliferação excessiva de litígios por questões formais na submissão das propostas quando, tanto quanto se sabe, não têm surgido nos tribunais casos objectivamente verificados, de corrupção ou falta de fidedignidade de ficheiros e propostas, que pudessem justificar tanto alarmismo”
(Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 04-05-2018, no Processo n.º 02119/17.0BEBRG, disponível em www.dgsi.pt).
25. E, contínua o douto Acórdão, “existiu e foi comprovada a aposição da competente assinatura electrónica qualificada em cada ficheiro, nos termos do artigo 54º/5 da Lei 96/2015, como o atestam o recibo e a declaração emitidos pela Vortal, e que vai para além da exigência legal que a assinatura seja “embutida” (visível) em cada ficheiro” (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 04-05-2018, no Processo n.º 02119/17.0BEBRG, disponível em www.dgsi.pt).
26. O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 05-04-2018, no Processo n.º 420/17.1BECTB, disponível em www. dgsi.pt, determina o seguinte:
“I.Os ficheiros que constituem a proposta em procedimento pré-contratual, devem ser carregados e submetidos na plataforma eletrónica de contratação pública, devendo ser encriptados e assinados, com recurso a assinatura eletrónica qualificada, segundo o n.º 4 artigo 68.º da Lei n.º 96/2015.
II. Quando o interessado realizar o carregamento de um ficheiro de uma proposta na plataforma eletrónica, este deve estar já encriptado e assinado, sem prejuízo da possibilidade prevista no n.º 5.
III. Nos termos do n.º 5 do artigo 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17/08 os ficheiros que constituem a proposta não têm de estar encriptados e assinados eletronicamente antes do seu carregamento na plataforma eletrónica, podendo ser carregados de forma progressiva, caso em que é suficiente a respectiva encriptação e assinatura eletrónica aquando a submissão da proposta.
IV. Nos casos referidos no n.º 5 do artigo 68.º, o momento da submissão desencadeia o processo de encriptação de todos os ficheiros que compõem a proposta, segundo o n.º 2 do artigo 70.º da Lei n.º 96/2015.
V. Em consequência da submissão da proposta, o concorrente é notificado eletronicamente da submissão de cada um dos ficheiros carregados, apresentando essa notificação a discriminação da data e hora da respetiva submissão e os dados do certificado qualificado da assinatura eletrónica utilizado, em respeito das normas legais aplicáveis.
VI. A exigência de encriptação visa assegurar que as entidades adjudicantes e os restantes concorrentes só tomam conhecimento do conteúdo das candidaturas, das soluções e das propostas, depois de serem abertas pelo júri do procedimento ou pelo responsável pelo procedimento.
VII. Trata-se de tutelar o respeito das regras pela concorrência e pela igualdade dos concorrentes, essenciais aos procedimentos da contratação pública.
VIII. Comprovando-se que os ficheiros que constituíam a proposta da concorrente, encontravam-se encriptados e assinados, encontram-se garantidos os princípios da segurança, da confidencialidade e da integridade que a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública deve assegurar.”
27. Deste modo, ao contrário do que pretende fazer crer a Recorrente, o documento identificado como artigo 8.4.vi) Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão da Qualidade da Obra encontra-se devidamente assinado eletronicamente, mediante a utilização de certificado de assinatura eletrónica, conforme se pode facilmente comprovar pelo relatório relatório de descarregamento e é confirmado pela declaração da plataforma eletrónica de contratação pública anoGov em 18 de outubro de 2019.
28. Conforme refere, e bem, a douta sentença “a quo”, na página 34, “Isto posto, dúvidas não existem que, aquando da submissão da proposta apresentada pela CI, após ter esta procedido ao respectivo carregamento sucessivo, os ficheiros que constituíam a mesma, independentemente da anterior aposição de assinatura (digital qualificada e manuscrita), encontravam-se devidamente assinados com recuso a assinatura electrónica qualificada, mais permitindo identificar o nome do titular da assinatura; a entidade em nome do qual assina (dado existirem poderes de representação, no caso presente, do Agrupamento concorrente); o tipo de utilização previsto (ou seja, assinar em plataformas electrónicas de contratação), e a indicação que é emitido como certificado qualificado.”
29. Segundo determina, e bem, a douta sentença “a quo”, na página 34, “Resultam assim, observadas todas as exigências que dimanam na lei no que toca à autenticidade, autoria e inalterabilidade da proposta apresentada pela CI, não se verificando o vício de violação de lei assacado pela Autora em sede de petitório.
Consequentemente, inexiste também qualquer motivo que justificasse a exclusão da proposta apresentada pela CI, pelo que bem andou o júri do procedimento ao propor a adjudicação do contrato a esta última.”
30. Conforme menciona, e bem, a douta sentença “a quo”, na página 34, “Assim sendo, improcedendo a argumentação com base na qual a Autora pretende ver impugnado o presente procedimento concursal e, consequentemente, o acto de adjudicação levado a cabo no termo do mesmo, deverá a presente acção considerada improcedente, o que desde já se declara.”
31. E, como refere, e bem, a douta sentença “a quo”, na página 35, “Atenta a improcedência de todos os vícios esgrimidos pela Autora, improcede a pretensão anulatória por aquela formulada. Em consequência, deve o acto impugnado manter-se válido na ordem jurídica.”
32. Face ao exposto, deverá confirmar-se totalmente a douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que decidiu julgar a presente ação totalmente improcedente e, consequemente, absolveu a Ré do pedido.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, devendo a sentença recorrida ser totalmente confirmada, assim se fazendo JUSTIÇA!

A Contrainteressada contra-alegou e concluiu:

1. Ficou cabalmente demonstrado que a plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante permite o carregamento progressivo das propostas e, portanto, o caso dos autos deve ser decidido por interpretação e aplicação do art. 68°15 da Lei n° 6/2015, de 17 de agosto.
2. Efetivamente, ficou provado na sentença que:
a. O carregamento do Documento Europeu único de Contratação Pública (DEUCP) da Cl foi efetuado, com assinatura qualificada, às 16h:04m:23s, no dia 17.06.2019 — Doc. 2 junto à contestação da CI.
b. A proposta das CI, acompanhada dos documentos que a integravam, foi submetida na plataforma, às 16h:40m:31s do dia 17.06.2019 — cfr. Doc. 4 da p.i., Doc. 2 da contestação da Ré e Doc. 3 da contestação da Cl.
c. Segundo as condições gerais de adesão à plataforma "anoGov", que são públicas e se encontram acessíveis no endereço eletrónico https://anopov.com/r5/condicoes-gerais-de-adesao/, a plataforma garante "a integridade da informação, através de processos que evitem a destruição, perda, desvio, violação de acesso e modificação, exposição ilegítima ou não autorizada" (negrito nosso) — cfr. n° 7.1.3 das condições de adesão.
d. Assim, e a contrario sensu, daqui resulta inequivocamente demonstrado que a plataforma "anoGov" permite o carregamento progressivo dos documentos e a sua modificação a pessoas devidamente autorizadas que são, naturalmente, os representantes dos concorrentes com certificado qualificado.
e. Ao invés, a plataforma eletrónica em questão não permite a pessoas que não estejam devidamente autorizadas, "a destruição, perda, desvio, violação de acesso e modificação, exposição ilegítima" dos documentos carregados por um concorrente.
f. E é óbvio também que esta possibilidade — de modificação das propostas por pessoas autorizadas — só faz sentido após o carregamento e antes da sua submissão, porque a partir desse momento vigora o princípio da intangibilidade das propostas, que impede a modificação das propostas a pessoas autorizadas ou não.
g. Assim, a plataforma eletrônica utilizada no procedimento concursal em questão permite o carregamento progressivo porque se permitisse o mero carregamento fechado nunca seria possível a modificação dos documentos prevista nas condições de adesão à mesma, inclusivamente a pessoas autorizadas.
3. Assim sendo, permitindo a plataforma o carregamento progressivo, não era obrigatória a assinatura dos documentos antes do carregamento, apenas sendo exigível aquando da submissão da proposta, que, como é incontestável, ocorreu dentro do prazo fixado para o efeito e mediante a utilização de certificado qualificado.
4. Em suma, estando errada a premissa em que assenta todo o seu recurso e tendo sido demonstrado inequivocamente que a plataforma utilizada no procedimento adjudicatório permite efetivamente o seu carregamento progressivo, deve o presente recurso interposto pela Embeiral, ser julgado improcedente.
5. Mas, mesmo que assim não sucedesse, e que a plataforma só permitisse o carregamento "fechado", o que se admite por mera hipótese académica, ainda assim, a ação de contencioso pré-contratual deveria ser decidida em termos desfavoráveis à sua pretensão.
6. Em primeiro lugar, porquanto, tendo a "Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra" apresentada pela CI, aposta na última página, a assinatura manuscrita do representante devidamente habilitado do agrupamento, e tendo esta valor jurídico equivalente à assinatura eletrônica, mostra-se obedecido o formalismo previsto no n° 4 do art. 68° da Lei n° 96/2015, de 17/08.
7. Em segundo lugar, uma vez que a partir da Lei n° 96/2015 de 17 de agosto, as plataformas eletrónicas passam ou devem passar a assegurar aplicações que garantam automaticamente a encriptação e aposição de assinaturas qualificadas.
8. Isto significa que os concorrentes deixaram de ser responsáveis por, aquando do carregamento dos documentos da proposta, proceder à encriptação prévia dos dados da proposta e à aposição prévia de assinaturas eletrónicas qualificadas, não podendo ser sancionados se, eventualmente, a plataforma não tiver garantido a encriptação e aposição de assinaturas, de forma automática.
9. Em terceiro lugar, porque é dominante na jurisprudência e doutrina administrativas que uma formalidade se degrada em não essencial se a sua preterição e omissão não tiver impedido a realização dos objetivos que mediante ela o legislador pretendeu produzir.
10. Os fins visados pela norma procedimental constante do art. 68°, n° 4 da LPE são os resultantes do art. 7°/1/a), b) e c) do Decreto Lei n° 290-D/99 de 2 de Agosto, na redação dada pelo Decreto-Lei n° 88/2009 de 9 de Abril, a saber:
n a função identificadora (traduzida na identificação "de forma unívoca (d)o titular como autor do documento"),
n a função finalizadora ou confirmadora (consubstanciada na circunstância de "a sua aposição ao documento dependa apenas da vontade do titular")
n e a função de inalterabilidade relativamente aos documentos instrutores de uma proposta contratual (consistindo na segurança de que "a sua conexão com o documento permita detectar toda e qualquer alteração superveniente do conteúdo deste").
11. No caso presente, está claro que todas as três funções legalmente atribuíveis à aposição de assinatura eletrónica se mostram igualmente alcançadas.
12. Quanto à função identificadora, não há dúvidas quanto ao signatário da "Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra", uma vez que:
n o acesso à plataforma, para carregamento do documento em causa, fez-se através de uma "autenticação forte", com "credenciais sempre protegidas", que não podem ser "adivinhadas nem alteradas";
n a CI submeteu o Documento Único de Contratação, com a assinatura eletrónica qualificada, onde juntou as procurações que conferem ao Exmo. Senhor Eng. C., os poderes para submeter todos os documentos da proposta, incluindo a "Nota Técnica sobre o Sistema de Qualidade da Obra"
n A "Nota Técnica sobre o Sistema de Qualidade da Obra" contém até a assinatura manuscrita do mesmo na última página;
n E, finalmente, o fato de o carregamento de todos os documentos ter sido feito entre as 16:04 e as 16:40 ­horário em que foi emitido o recibo da submissão da proposta, mediante a utilização de um certificado qualificado emitido pela plataforma após o registo e autenticação iniciais da CI, evidenciando que o carregamento da "Nota Técnica sobre o Sistema de Qualidade da Obra" foi feita na mesma sessão de autenticação, e, portanto, pelo titular do certificado qualificado válido.
13. Quanto à função finalizadora, também se encontra satisfeita uma vez que, após o carregamento de todos os documentos da proposta, incluindo a "Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra", o representante do agrupamento concorrente, em ato contínuo, preencheu o formulário principal previsto no art. 66°, n° 1, alínea c) da LPE e, num ato de vontade intencional, deliberado e inequívoco de se vincular naqueles termos, usando o certificado qualificado atribuído para a autenticação, finalizou o processo de submissão, tendo a plataforma emitido automaticamente um recibo eletrónico da entrega, com o registo da identificação da entidade adjudicante, do procedimento, do concorrente, da proposta, bem como da data e hora da respetiva submissão (cfr. previsto no art. 71°/1 da LPE) — Documento 2 junto à contestação das CI.
14. Quanto à função de inalterabilidade, a plataforma encriptou automaticamente todos os dados, que apenas ficaram disponíveis após o termo do prazo para apresentação das propostas.
15. Assim, e sem conceder quanto ao primeiro argumento, que é o de que a plataforma possibilitava o carregamento progressivo dos documentos, mesmo que assim não fosse, a presente ação de contencioso pré-contratual deveria ser julgada improcedente com os três fundamentos adicionais atrás aduzidos.
NESTES TERMOS e nos demais de direito aplicáveis, deverá ser negado total provimento ao presente recurso, confirmando-se, em consequência, a sentença recorrida só assim se fazendo o que é de Lei e de JUSTIÇA!

O Senhor Procurador Geral Adjunto, notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
A) A 20/12/2018, o Conselho de Administração Executivo da Ré deliberou aprovar o lançamento de procedimento concursal público para a empreitada designada “Sistema de Mobilidade do (...) – Empreitada de Adaptação a uma solução BRT – Metrobus, no troço de (...) – (...)”, com o preço base de € 25.000.000,00 e o prazo máximo de execução de 455 dias, condicionado à prévia obtenção de autorização para assunção de encargos plurianuais (cfr. pasta 3 a) do PA);
B) A 31/01/2019, o Conselho de Ministros aprovou a Resolução nº 25/2019, na qual autoriza a Ré a assumir os encargos plurianuais e a realizar a despesa necessária à implementação do Sistema de Mobilidade do (...), contando de tal resolução, designadamente, o seguinte: “(…) Ficou entretanto garantido o financiamento europeu para a concretização da nova solução, através da reprogramação do Portugal 2020, aprovada pela Comissão Europeia em 5 de Dezembro de 2018. (…) 2 – Determinar o seguinte faseamento da concretização do empreendimento: a) Primeira fase: troço suburbano – (...)/(...); b) Segunda fase: troços urbanos – (...)/(…) e Linha do Hospital. 3 – Autorizar a IP, S.A. a assumir os encargos plurianuais e a realizar a despesa necessária à implementação do Sistema de Mobilidade do (...) referido no nº 1 até ao montante global de € 85.000.000 (…), na condição de o projecto ter financiamento europeu assegurado pelo Portugal 2020. (…)” (cfr. documento junto com a contestação da Ré sob o nº 4);
C) A 04/02/2019, foi publicado na 2ª Série do Diário da República o Anúncio de procedimento nº 973/2019, publicitando a abertura do concurso público identificado em A) (cfr. documento junto com a petição inicial sob o nº 1);
D) Na mesma data, foram também aprovados e publicitados os Programa de Procedimento e Caderno de Encargos mediante os quais se iria reger o referido procedimento concursal (cfr. pasta 3 g) do PA);
E) De acordo com o previsto no artigo 8º do indicado Programa do Procedimento, a proposta deverá ser constituída pelos seguintes documentos: a.1) Documento Europeu Único de Contratação, conforme constante no Anexo I; a.2) Documentos que, em função do objecto do contrato a celebrar e dos aspectos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar, designadamente: a.2.1) Proposta de preço, elaborada de acordo com o modelo constante do Anexo II ao presente programa, e da qual constem os preços parciais dos trabalhos que o concorrente se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo Instituto Mercados Públicos e do Imobiliário e da Construção I.P., para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 60º do CCP; a.2.2) Lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstas no projecto de execução, com o ordenamento dos mapas resumo de quantidades de trabalho, apresentada de acordo com as instruções constantes do Anexo II-B ao presente programa de procedimento; a.2.3) Plano de trabalhos (Diagrama de Grant), de acordo com o previsto no Anexo VIII do presente Programa de Procedimento, que deve incluir todas as actividades necessárias à completa realização da presente empreitada; a.2.4) Memória descritiva e justificativa do modo de execução da obra de acordo com o previsto no Anexo IX do Programa de Procedimento; a.2.5) Plano de Pagamentos, conforme estabelecido no art.º 4º do DL 6/2004, de 6 de Janeiro e conforme estabelecido no Anexo XII do presente Programa de Procedimento; a.2.6) Plano de mão-de-obra de acordo com o previsto no Anexo X do presente Programa de Procedimento; a.2.7) Plano de equipamentos de acordo com o previsto no Anexo XI do presente Programa de Procedimento; a.2.8) Diagrama Espaço-Tempo do plano de trabalhos da obra de acordo com o previsto no Anexo XIII do presente Programa de Procedimento; a.2.9) Nota Técnica sobre a Gestão da Segurança e Saúde do Trabalho, de acordo com o Anexo XIV do presente Programa de Procedimento; a.2.10) Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão Ambiental, de acordo com o Anexo XV do presente Programa de Procedimento; a.2.11) Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão da Qualidade da Obra, de acordo com o Anexo XVI do presente Programa de Procedimento; a.2.12) Quadro com a apresentação das Datas-Chave em conformidade com o Anexo I do Caderno de Encargos – Condições Especiais e Particulares (cfr. idem);
F) O preço base do concurso era de € 25.000.000,00 (cfr. idem);
G) A adjudicação é feita segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa, tendo em conta os factores “Preço”, com uma ponderação de 40%, e “Valia Técnica”, com uma ponderação de 60%, sendo a proposta mais vantajosa aquela que obtiver a maior pontuação, a qual será calculada, através da média ponderada das classificações obtidas em cada um dos factores (cfr. idem);
H) As propostas tinham de ser entregues até às 17h00 do dia 04/05/2019, através da plataforma designado “anoGov” (cfr. idem);
I) No âmbito do presente concurso, foram apresentadas 5 propostas, inclusivamente àquelas da Autora e da CI (cfr. pasta 3 r) do PA);
J) A proposta apresentada pela CI foi instruída, designadamente, com o Documento Europeu Único de Contratação (DEUC) e com procurações emitidas pelas entidades C. S.A. e F., S.A., a atribuir poderes a C. para, em seu nome, e nomeadamente, concorrer a toda a espécie de concursos, formular propostas, formalizar adjudicações, a formalizar tais documentos e submetê-los em plataformas electrónicas, e assinar tais documentos através de assinatura electrónica qualificada (cfr. documento junto com a contestação da CI sob o nº 2);
K) A todos os documentos que compunham a proposta apresentada pela CI foi aposta a assinatura electrónica qualificada do referido C., excepto no documento designado como “Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra” (cfr. documentos que compõem a pasta 3 r) do PA);
L) O documento identificado em K) continha a assinatura manuscrita do Sr. C. (cfr. idem);
M) Após o carregamento de todos os documentos que compunham a proposta da CI, inclusive o identificado como “Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra”, o representante daquela preencheu o formulário principal constante da plataforma “anoGov” e finalizou o processo de submissão de todos os documentos, mediante a utilização de um certificado qualificado de assinatura de C., tendo aquela plataforma emitido automaticamente um recibo electrónico da entrega, com o registo da identificação da entidade adjudicante, do procedimento, do concorrente, da proposta, bem como da data e hora da respectiva submissão (cfr. documento junto com a contestação da CI sob o nº 3);
N) A 14/08/2019, o Júri do procedimento emitiu o Relatório preliminar, tendo admitido as propostas apresentas pela Autora e pela CI, mais tendo atribuído a pontuação final de 39,33 valores à proposta apresentada pela Autora e a pontuação de 54,47 valores à proposta apresentada pela CI (cfr. pasta 3 p) do PA);
O) A 23/08/2019, a Autora exerceu o seu direito de pronúncia, pugnando pela exclusão da proposta apresentada pela CI, uma vez que o documento que compunha esta última, e designado por “Artigo 8.4.vi) Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra”, não continha assinatura electrónica qualificada (cfr. idem, e documentos juntos com a petição inicial sob os nºs 6, 7 e 8);
P) A 02/09/2019, o Júri do procedimento emitiu o Relatório Final, no qual julgou improcedentes as alegações exaradas pela Autora em sede de pronúncia, e mantendo a proposta de adjudicação do contrato à CI, do mesmo constando, designadamente, o seguinte: “(…) O Agrupamento C. S.A./F., S.A. apresentou proposta ao procedimento para «Empreitada de Adaptação a uma solução BRT – Metrobus no Troço (...)/(...)», que integra, entre outros documentos, uma procuração, nos termos da qual as empresas integrantes do Agrupamento constituem como procurador, C., concedendo poderes a este para praticar todos os actos, subscrever e assinar todos os documentos do Agrupamento, concedendo-lhe igualmente poderes para submeter na plataforma electrónica, todos e quaisquer documentos, assiná-los electronicamente através de certificados de assinatura digital qualificada. Face ao exposto, uma vez que a proposta é assinada e submetida na plataforma pela c. por C. através de assinatura qualificada com certificado de representação MULTICERT, com poderes de representação para apresentação das propostas, o júri reitera a análise e avaliação que consta no relatório preliminar de análise e avaliação de propostas.” (cfr. pasta 3 q) do PA);
Q) A 05/09/2019, o Conselho de Administração Executivo da Ré deliberou adjudicar a empreitada ora em discussão à proposta apresentada pela CI, pelo preço contratual de € 23.765.000,00, e com o prazo máximo de execução de 455 dias (cfr. pasta 3 r) do PA);
R) A 10/09/2019 e a 11/09/2019, a Autora apresentou requerimentos dirigidos à Presidente do Júri do procedimento, reiterando a sua pronúncia e pugnando pela nulidade do Relatório Final, por omissão de resposta aos argumentos invocados em sede de audiência prévia (cfr. documento juntos com a petição inicial sob os nºs 12 a 14);
S) A petição inicial foi apresentada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada a 04/10/2019 (cfr. fls. 1 e seguintes dos presentes autos).

DE DIREITO
Está posta em causa a sentença que ostenta este discurso fundamentador:
Pretende a Autora, com a presente acção, que seja anulada a decisão de adjudicação do contrato aqui em análise à Contra-interessada e ainda que seja a Ré condenado a proferir nova decisão, determinando a adjudicação do contrato à Autora.
Em sede de contestação, defendem-se a Ré e a Contra-interessada por impugnação.
O cerne do presente dissídio prende-se com as exigências atinentes à assinatura digital qualificada dos documentos que compõem as propostas, nos termos definidos pela Lei nº 96/2015, de 17 de Agosto.
Efectivamente, alega a Autora que a proposta apresentada pela CI, concretamente, a totalidade dos respectivos documentos que a compõem, não se encontram electronicamente assinados em conformidade com o disposto nos artigos 54º e 68º, nº 4, da Lei nº 96/2015, de 17 de Agosto, uma vez que um deles, aquele referente à “Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão da Qualidade da Obra”, exigido pelo artigo 8º do Programa do Procedimento, não foi previamente encriptados e assinado, com recurso a assinatura digital qualificada, antes da sua submissão naquela plataforma. Mais invoca que esta assinatura electrónica qualificada não se confunde com a assinatura do carregamento na plataforma electrónica dos ficheiros individualizados a que se reporta o recibo de submissão da proposta, não sendo equivalente. Conclui que, ao não excluir a proposta da identificada CI, incorreu a Ré em violação da referida Lei nº 96/2015, bem como do disposto nos artigos 62º e 146º, nº 2, alínea l), do CCP.
Nas suas contestações, alegam a Ré e a CI que a submissão dos documentos que compõem a proposta da CI foi realizada um a um, de forma progressiva, encontrando-se devidamente encriptados e assinados, já que a aposição de assinatura qualificada, aquando do carregamento dos documentos na plataforma electrónica, cumpre os objectivos de segurança, de integridade, de fidedignidade e de credibilização da identidade do conteúdo da proposta que a Lei nº 96/2015 visa salvaguardar, assim pugnando pela improcedência deste argumento esgrimido pela Autora. Mais invoca a CI na sua contestação que o referido documento atinente à “Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão da Qualidade da Obra”, apesar de efectivamente não ter, em momento anterior ao carregamento na plataforma “anoGov”, assinatura digital qualificada, estava já assinado manualmente pelo representante do agrupamento, assinatura esta que não pode ser desconsiderada em virtude da aplicação da Lei nº 96/2015, e que em momento algum afecta a sua validade.
Vejamos.
Dispõe o artigo 62º do CCP, quanto ao modo de apresentação das propostas, que:
“1 - Os documentos que constituem a proposta são apresentados directamente em plataforma electrónica utilizada pela entidade adjudicante, através de meio de transmissão escrita e electrónica de dados, sem prejuízo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 115.º
(…)
4 - Os termos a que deve obedecer a apresentação e a recepção das propostas, conforme o disposto no nº 1, são definidos por diploma próprio. (…)”
A Lei nº 96/2015, de 17 de Agosto, veio regular esta norma, ao especificar que moldes deve ocorrer a disponibilização e a utilização das plataformas electrónicas de contratação pública.
No que às assinaturas electrónicas respeita, determina o seu artigo 54º o seguinte:
“1 - Os documentos submetidos na plataforma electrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura electrónica qualificada, nos termos dos n.os 2 a 6.
(…)
4 - Os documentos que sejam cópias electrónicas de documentos físicos originais emitidos por entidades terceiras, podem ser assinados com recurso a certificados qualificados de assinatura electrónica da entidade adjudicante ou do operador económico que o submete, atestando a sua conformidade com o documento original.
5 - Nos documentos electrónicos cujo conteúdo não seja susceptível de representação como declaração escrita, incluindo os que exijam processamento informático para serem convertidos em representação como declaração escrita, designadamente, processos de compressão, descompressão, agregação e desagregação, a aposição de uma assinatura electrónica qualificada deve ocorrer em cada um dos documentos electrónicos que os constituem, assegurando-lhes dessa forma a força probatória de documento particular assinado, nos termos do artigo 376.º do Código Civil e do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de Agosto, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 88/2009, de 9 de Abril, sob pena de causa de exclusão da proposta nos termos do artigo 146.º do Código dos Contratos Públicos.
6 - No caso de entidades que devam utilizar assinaturas electrónicas emitidas por entidades certificadoras integradas no Sistema de Certificação Electrónica do Estado, o nível de segurança exigido é o que consta do Decreto-Lei n.º 116-A/2006, de 16 de Junho, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 161/2012, de 31 de Julho.
7 - Nos casos em que o certificado digital não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma electrónica um documento electrónico oficial indicando o poder de representação e a assinatura do assinante. (…)”
Já o artigo 68º, que especifica as normas quanto ao carregamento das propostas, determina, e para o que aqui se afigura de pertinente, que:
“1 - As plataformas electrónicas devem permitir o carregamento progressivo, pelo interessado, da proposta ou propostas, até à data e hora prevista para a submissão das mesmas.
2 - O carregamento mencionado no número anterior é feito na área reservada em exclusivo ao interessado em causa e relativa ao procedimento em curso.
3 - A plataforma electrónica deve disponibilizar ao interessado as aplicações informáticas que permitam automaticamente, no acto de carregamento, encriptar e apor uma assinatura electrónica nos ficheiros de uma proposta, localmente, no seu próprio computador.
4 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, quando o interessado realizar o carregamento, na plataforma electrónica, de um ficheiro de uma proposta, este deve estar já encriptado e assinado, com recurso a assinatura electrónica qualificada.
5 - As plataformas electrónicas podem conceder aos interessados a possibilidade de os ficheiros das propostas serem carregados de forma progressiva na plataforma electrónica, desde que encriptados, permitindo a permanente alteração dos documentos até ao momento da submissão. (…)”
Ora, da leitura desta norma, em particular da concatenação do disposto nos nºs 4 e 5 do artigo 68º da indicada Lei nº 96/2015, advém a imposição de duas distintas etapas: em primeiro lugar, a prévia encriptação e assinatura dos ficheiros que compõem a proposta, com recurso a assinatura electrónica qualificada; em segundo lugar, a aposição de uma assinatura global, aquando da submissão da proposta e da emissão do respectivo recibo.
Conforme advém do probatório coligido, resulta que todos os documentos que compunham a proposta apresentada pela CI se encontravam, previamente ao seu carregamento sucessivo na plataforma electrónica, devidamente encriptados. Mais resulta que, de entre todos os referidos documentos, apenas a um deles não tinha sido previamente aposta a assinatura digital qualificada, se bem que estivesse o mesmo assinado por forma manual.
Será tal matéria suficiente para considerar que não se encontram observados os ditames legais?
Tem sido a presente matéria alvo de intensa discussão doutrinária e jurisprudencial, concretamente no que respeita à interpretação das previsões constantes dos nºs 4 e 5 do artigo 68º da LPE, sendo que, já desde meados de 2018, tem a jurisprudência dos tribunais superiores pugnado por uma posição homogénea e reiterada.
Assim, por razões que se prendem com celeridade e uniformidade da justiça, e revendo este Tribunal posição anteriormente assumida, louva-se no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, datado de 05/04/2018, proferido no P. 420/17.1BECTB (disponível em www.dgsi.pt), no qual se pode ler, designadamente, o seguinte:
“(…) A norma jurídica alvo de discórdia respeita ao disposto no n.º 5 do artigo 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17/08, que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública, o que exige a sua interpretação, assim como a compreensão do regime legal sobre os termos do carregamento de ficheiros e a submissão da proposta e ainda as exigências legais em matéria de encriptação e de assinatura electrónica. Com relevo e para melhor compreensão, transcreve-se a seguinte parte do artigo 68.º, com a epígrafe “Carregamento das propostas”: “1 - As plataformas eletrónicas devem permitir o carregamento progressivo, pelo interessado, da proposta ou propostas, até à data e hora prevista para a submissão das mesmas. 2 - O carregamento mencionado no número anterior é feito na área reservada em exclusivo ao interessado em causa e relativa ao procedimento em curso. 3 - A plataforma eletrónica deve disponibilizar ao interessado as aplicações informáticas que permitam automaticamente, no ato de carregamento, encriptar e apor uma assinatura eletrónica nos ficheiros de uma proposta, localmente, no seu próprio computador. 4 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, quando o interessado realizar o carregamento, na plataforma eletrónica, de um ficheiro de uma proposta, este deve estar já encriptado e assinado, com recurso a assinatura eletrónica qualificada. 5 - As plataformas eletrónicas podem conceder aos interessados a possibilidade de os ficheiros das propostas serem carregados de forma progressiva na plataforma eletrónica, desde que encriptados, permitindo a permanente alteração dos documentos até ao momento da submissão. (…) 15 - Durante o processo de carregamento, as plataformas electrónicas devem assegurar aos interessados a possibilidade de substituírem ficheiros já carregados por outros novos, no âmbito do processo de construção de cada proposta. (…)” (sublinhados nossos). O preceito seguinte, sob artigo 69.º, com a epígrafe “Encriptação e classificação de documentos”, determina: “1 - Os documentos que constituem a proposta, a candidatura ou a solução são encriptados, sendo-lhes aposta assinaturas electrónicas qualificadas.” (sublinhados nossos). Por sua vez, o artigo 70.º disciplina a “Submissão das propostas”, nos seguintes termos: “1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo 65.º, a proposta considera-se apresentada, para efeitos do CCP, quando o concorrente finaliza o processo de submissão. 2 - Nos casos referidos no n.º 5 do artigo 68.º, o momento da submissão desencadeia o processo de encriptação de todos os ficheiros que compõem a proposta. (…)” (sublinhados nossos). E segundo o n.º 1 do artigo 71.º da citada Lei n.º Lei n.º 96/2015, de 17/08, “Após a submissão, o concorrente deve receber, para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo anterior, um recibo eletrónico, com registo da identificação da entidade adjudicante, do procedimento, do lote, se for o caso, do concorrente, da proposta, bem como da data e hora da respectiva submissão.”. De acordo com o n.º 2 do artigo 53.º da Lei n.º 96/2015 “Os documentos que constituem as candidaturas, as soluções e as propostas carregados nas plataformas eletrónicas devem ser encriptados (…)”, de modo a salvaguardar a confidencialidade da informação disponibilizada nas plataformas electrónicas e garantindo que “(…) o acesso aos documentos que constituem as candidaturas, as soluções e as propostas só deve ser possível na data fixada nos termos das regras do procedimento”, como previsto no disposto do seu n.º 1. Por outro lado, nos termos do n.º 1 do artigo 54.º da Lei n.º 96/2015, “Os documentos submetidos na plataforma eletrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura eletrónica qualificada (…)”. Explanado o quadro normativo, enfrentemos a questão decidenda. Resulta claro que segundo o n.º 4 artigo 68.º da Lei n.º 96/2015, quando o interessado realizar o carregamento de um ficheiro de uma proposta na plataforma eletrónica, este deve estar já encriptado e assinado, com recurso a assinatura eletrónica qualificada, sem prejuízo da possibilidade prevista no n.º 5 de os ficheiros das propostas, desde que encriptados, poderem ser carregados de forma progressiva na plataforma eletrónica. No procedimento pré-contratual em causa, a Contrainteressada optou pela modalidade de carregamento dos documentos da proposta prevista no citado n.º 5, pois não assinou, com recurso a assinatura electrónica qualificada, todos os ficheiros da sua proposta antes do carregamento e submissão, como previsto nos termos do n.º 4. Analisando com detalhe o disposto no n.º 5 do artigo 68.º da Lei n.º 96/2015, deparamo-nos com o inciso “desde que encriptados”, a que o precedente n.º 5 do artigo 18.º da Portaria n.º 701-G/2008 não fazia referência. A disposição equivalente anterior assumia mesmo o sentido contrário, ao estipular que “As plataformas podem conceder aos interessados a possibilidade de os ficheiros das propostas serem carregados de forma progressiva na plataforma electrónica, sem necessidade de encriptação e assinatura electrónica, permitindo a permanente alteração dos documentos na própria plataforma até ao momento da submissão”, nos termos da correspondência e sucessão resultante do quadro comparativo elaborado pela Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, no âmbito da Proposta de Lei n.º 320/XII/4.ª, que culminou na aprovação da Lei n.º 96/2015 (disponível em http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=39389) (sublinhado nosso). Significa que nos termos anteriores à actual Lei n.º 96/2015 já se encontrava prevista a modalidade de carregamento prevista no seu n.º 5 do artigo 68.º, mas sem que então fosse exigida a encriptação no momento do carregamento, como agora exigido e em relação ao qual o elemento literal da norma não deixa margem para dúvidas. Como destacado na decisão sob recurso, que ora se acolhe, comparando a versão inicial e a versão final da Proposta de Lei n.º 320/XII/4.ª, constata-se que o inciso referente à encriptação foi aditado mediante proposta de alteração do PSD/CDS-PP e do PS (as mencionadas versões e propostas encontram-se disponíveis para consulta no site e endereço referido). A justificação apresentada para a alteração em causa pelo PS foi a seguinte: “Acolhe-se recomendação da Associação para a Contratação Pública Electrónica; Segurança: A presente norma, prevê o carregamento progressivo de propostas na plataforma electrónica, mas deverá ser garantida a sua encriptação por motivos de segurança, pois caso não ocorra a encriptação de documentos, a proposta dos Operadores económicos fica vulnerável no sistema” (veja-se o documento intitulado “Propostas de alteração apresentadas pelo grupo parlamentar do PS”, pp. 12, disponível para consulta no site e endereço referido). A finalidade e preocupação subjacentes à exigência da encriptação prendem-se em acautelar que as propostas e os seus respetivos documentos sejam carregados nas plataformas eletrónicas em segurança, sem possibilidade de conhecimento em momento anterior ao estabelecido para o efeito, seja por terceiros, incluindo os outros concorrentes, seja pelo próprio júri ou entidade adjudicante, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 74º da Lei n.º 96/2015, ao prever que “As propostas não podem ser disponibilizadas ao júri, ou ao responsável pelo procedimento caso não exista júri, antes do termo do prazo para a respectiva apresentação”). No mesmo sentido estabelece o n.º 1 do artigo 73.º da Lei n.º 96/2015, nos termos do qual, “Os meios eletrónicos utilizados pelas plataformas eletrónicas devem assegurar que as entidades adjudicantes e os restantes concorrentes só tomam conhecimento do conteúdo das candidaturas, das soluções e das propostas, depois de serem abertas pelo júri do
procedimento, ou pelo responsável pelo procedimento caso não exista júri”. Trata-se de concretizar e dar efetividade à regra legal, prevista no n.º 1 do artigo 53.º da Lei n.º 96/2015, de que “o acesso aos documentos que constituem as candidaturas, as soluções e as propostas só deve ser possível na data fixada nos termos das regras do procedimento”. Considerando a relevância dessa matéria, para efeitos de respeito das regras pela concorrência e pela igualdade dos concorrentes, essenciais aos procedimentos da contratação pública, a violação dos dois artigos citados foi tipificada pelo legislador como contraordenação muito grave, nas alíneas c) e d) do artigo 82.º da Lei n.º 96/2015. Tal como bem decidido pela decisão recorrida, a solução à questão decidenda passa pela interpretação e aplicação conjugada dos preceitos legais explanados, em especial, o n.º 5 do artigo 68.º, com os artigos 70.º, n.º 2 e 69.º, n.º 1 da Lei n.º 96/2015. Resultando do disposto no n.º 2 do artigo 70.º que nos casos referidos no n.º 5 do artigo 68.º, o momento da submissão desencadeia o processo de encriptação de todos os ficheiros que compõem a proposta e que, segundo o n.º 1 do artigo 69.º, os documentos que constituem a proposta, a candidatura ou a solução são encriptados, sendo-lhes aposta assinaturas eletrónicas qualificadas, nada obsta à apresentação da proposta nos termos em que a Contrainteressada, ora Recorrida, o fez no âmbito do procedimento pré-contratual. Se concatenarmos os três artigos citados, constatamos que no procedimento de carregamento dos ficheiros previsto no n.º 5 do artigo 68.º da Lei n.º 96/2015, o concorrente insere individualmente cada um dos ficheiros que constituem a sua proposta, sem os mesmos estarem encriptados ou assinados eletronicamente e, aquando da respectiva submissão, a plataforma eletrónica, automaticamente, procede à sua respectiva encriptação e assinatura eletrónica qualificada. Significa que se encontra assegurada a exigência de encriptação dos documentos carregados, prevista no n.º 5 do artigo 68.º da Lei n.º 96/2015. Acresce que, tal como destacado na decisão recorrida, os factos apurados nos autos permitem corroborar esta interpretação, pois a concorrente Contrainteressada, ora Recorrida, foi notificada eletronicamente da submissão de cada um dos ficheiros que integram a sua proposta, onde se discrimina a data e hora da respetiva submissão e os dados do certificado qualificado de assinatura eletrónica utilizado. O que traduz que a plataforma electrónica usada no procedimento pré-contratual em causa deu cumprimento ao estatuído no artigo 31.º da Lei n.º 96/2015, ao exigir a implementação de um sistema que, entre outras informações, permita identificar “A data e hora exatas da submissão dos documentos”. Tal basta para demonstrar que a plataforma electrónica usada no procedimento de contratação pública em causa nos autos deu resposta, em termos que permitem comprovar o respeito pelas formalidades e procedimentos previstos na lei, assegurando as finalidades de autenticidade e de integralidade da proposta. Como já antes afirmado no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 13/09/2012, Processo n.º 09080/12, as normas do artigo 62.º e da alínea l), do n.º 2 do artigo 146.º, ambas do CCP, que estipulam que o júri deve propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas que não observem as formalidades do modo de apresentação das propostas, assumem a opção feita pelo legislador “pela desmaterialização dos procedimentos pré-contratuais ou por outra, a opção pela contratação pública eletrónica, baseada na utilização de tecnologias, designadamente, pela utilização de plataformas eletrónicas por parte de todos intervenientes dos procedimentos”, sendo “definido o respetivo regime jurídico, isto é, o conjunto de regras, requisitos e condições quanto à utilização e funcionamento das plataformas eletrónicas, com relevo, quanto ao modo de apresentação e receção das propostas”. Em concretização, de acordo com o artigo 65.º da Lei n.º 96/2015, “A plataforma eletrónica deve operacionalizar um sistema de aviso de receção eletrónico que comprove o sucesso do envio dos documentos que constituem as candidaturas, as soluções e as propostas, bem como a data e hora da submissão” (n.º 3), “deve assegurar a determinação precisa da data e hora da transmissão dos dados referidos no número anterior, devendo aqueles dados ser inscritos na proposta no momento da sua receção” (n.º 4), sendo o aviso de receção referido no n.º 3 “enviado, de imediato, para o interessado” (n.º 5) e “Caso o envio completo não seja bem-sucedido, considera-se não ter existido qualquer apresentação de candidaturas, soluções e propostas, devendo o interessado ser, de imediato, notificado desse facto” (n.º 6). Todos os imperativos previstos nas normas legais aplicáveis foram respeitados, não tendo a proposta submetida pela Contrainteressada na plataforma eletrónica violado as vinculações relativas à encriptação e assinatura electrónica dos ficheiros e da proposta. A Contrainteressada foi carregando ficheiro a ficheiro na plataforma eletrónica e à medida que os respetivos ficheiros iam sendo carregados, ia sendo emitido uma notificação electrónica, comprovativa da data e hora de cada carregamento efetuado. Os recibos electrónicos de submissão das propostas são emitidos automaticamente pela plataforma eletrónica e servem para comprovar não apenas a data e a hora em que se procedeu a essa submissão, mas também o seu envio bem-sucedido, ou seja, que a proposta vinha codificada, encriptada e com o certificado digital de assinatura electrónica, sendo eles apostos na própria proposta no momento da sua recepção e enviando-se de imediato o respectivo aviso de recepção para os concorrentes. Deste modo, com o envio dos recibos eletrónicos, a plataforma electrónica pode asseverar que no momento da submissão, o qual ocorreu em momento posterior ao do carregamento de todos os ficheiros que constituíam a proposta da concorrente, ora Contrainteressada, todos os documentos que a integram se encontravam devidamente encriptados e assinados com assinatura eletrónica qualificada. Ora, de acordo com a definição dada pela alínea g) do artigo 2.º da Lei n.º 96/2015, a submissão da proposta ocorre no momento em que o concorrente ou candidato efetiva a entrega da proposta, da candidatura ou da solução, após o respetivo carregamento em plataforma electrónica e a proposta considera-se apresentada, para efeitos do CCP, quando o concorrente finaliza o processo de submissão, nos termos do n.º1 do artigo 70.º da Lei n.º 96/2015. Como se extrai da sentença recorrida, na parte que ora se transcreve: “se compararmos os elementos fornecidos pela assinatura digital electrónica da Demandante (aposta em cada um dos ficheiros que constituíam a sua proposta) e os dados transmitidos pelo certificado qualificado de assinatura eletrónica utilizado pela concorrente I...., Lda. (constantes de cada um dos recibos eletrónicos que foram emitidos após o carregamento de cada ficheiro que constituía a respetiva proposta), constatamos que em ambos constam os seguintes quatro elementos: o nome do titular da assinatura; a entidade em nome do qual assina (dado existirem poderes de representação: no caso concreto, a Demandante e a I...., Lda.); o tipo de utilização previsto (ou seja, assinar em plataformas eletrónicas de contratação), e a indicação que é emitido como certificado qualificado. Ou seja, em ambos os casos contemplados, temos que, no momento da submissão das respetivas propostas, os ficheiros que constituíam as mesmas, encontravam-se devidamente assinados com recurso a uma assinatura eletrónica qualificada (independentemente dessa assinatura ter ocorrido logo no momento do carregamento do ficheiro em causa ou apenas no momento da submissão). E não podemos olvidar que “A aposição de uma assinatura electrónica qualificada a um documento electrónico equivale à assinatura autógrafa dos documentos com forma escrita sobre suporte de papel e cria a presunção de que: a) A pessoa que apôs a assinatura electrónica qualificada é o titular desta ou é representante, com poderes bastantes, da pessoa colectiva titular da assinatura electrónica qualificada; b) A assinatura electrónica qualificada foi aposta com a intenção de assinar o documento electrónico; c) O documento electrónico não sofreu alteração desde que lhe foi aposta a assinatura electrónica qualificada” (conforme estabelece o artigo 7º, n.º 1 do Decreto-Lei nº 290-D/99, de 02-08, que regula o Regime Jurídico dos Documentos Electrónicos e da Assinatura Digital).”. Deste modo, mantém-se actual a doutrina que dimana do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido no processo n.º 02610/14.0BEBRG, de 06/11/2015, proferido ao abrigo do regime legal anterior, em que o artigo 27.º mencionado no acórdão corresponde ao artigo 54.º da Lei n.º 96/2015, na parte em entendeu que “conforme decorre da Portaria, também pode ocorrer um carregamento progressivo dos ficheiros e neste aspecto, quando esta ocorre, será com a submissão da proposta que se irão ser assinados os diversos documentos. Não é assim imperioso que tenha de ocorrer a assinatura de todos os documentos quando do carregamento dos diversos documentos da proposta”, dado que “não há dúvidas que os documentos em causa nos autos foram assinados, estando assim cumprido o desiderato prosseguido pela Portaria que é a necessidade de que todos os documentos da proposta se encontrem assinados, como decorre do seu artigo 27º”, concluindo que “de acordo com o artigo 27º da Portaria n.º 701-G/2008, de 29 de Julho, todos os documentos carregados nas plataformas electrónicas deverão ser assinados electronicamente, mesmo que essa assinatura decorra da assinatura quando da submissão da proposta. Se todos os documentos da proposta se encontram assinados através da assinatura electrónica qualificada não há motivo para exclusão da proposta do contra-interessado”. Tal como se extrai do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 15/01/2015, Processo n.º 11671/14: “A apresentação da proposta no âmbito de procedimento concursal desenvolvido sob a égide de plataforma eletrónica carece de ser produzida por meio de transmissão escrita e eletrónica de dados através do carregamento dos ficheiros e dos formulários respetivos, devidamente encriptados, sendo que o momento da submissão da proposta se efetiva com a assinatura eletrónica da proposta por utilizador autorizado e identificado (vide, a este respeito, entre outros, os Acórdãos do TCA Norte de 25-11-2011, Proc. 02389/10.4BELSB; de 22-06-2011, de 00770/10.8BECBR; de 16-09-2011, Proc. 00102/11.8BEPRT (…)”. Pelo que, tal como decidido pelo Tribunal a quo, comprovando-se que os ficheiros que constituíam a proposta da concorrente, ora Contrainteressada encontravam-se devidamente encriptados e assinados nos termos legais, encontram-se garantidos os princípios da segurança, da confidencialidade e da integridade que a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública deve assegurar, nenhuma irregularidade havendo a apontar ao modo de carregamento efetuado. Neste campo da contratação pública eletrónica, deverá igualmente ter em conta a reserva colocada pela Comissão Permanente do Tribunal de Contas, no Parecer que emitiu no âmbito da Proposta de Lei n.º 320/XII/4.ª, na parte em que refere que “A proposta de lei consagra, em vários passos, exigências formais no âmbito dos procedimentos de contratação pública que se afiguram excessivas e contrárias aos princípios e objetivos gerais de proporcionalidade, simplificação, desburocratização, desmaterialização e livre acesso aos mercados públicos. Este tipo de exigências, num sistema que não admite admissões condicionais nem aperfeiçoamentos formais, favorece a exclusão de candidaturas e propostas, reduzindo o número de opções a apreciar. O Tribunal de Contas tem vindo a observar o crescimento exponencial das exclusões por razões de natureza formal e, por essa via, a frequente drástica redução do universo de propostas a considerar nos concursos. Por outro lado, as exigências de natureza formal aumentam também a litigância que, sendo já bastante elevada neste mercado, alonga procedimentos e é fonte de ineficiências. O incremento das causas de exclusão formal de candidaturas e propostas é, pois, muito negativo, tendo consequências prejudiciais para a concorrência, para a amplitude das possibilidades de escolha oferecidas às entidades adjudicantes e para o inerente interesse público”. (…)”
Isto posto, dúvidas não existem que, aquando da submissão da proposta apresentada pela CI, após ter esta procedido ao respectivo carregamento sucessivo, os ficheiros que constituíam a mesma, independentemente da anterior aposição de assinatura (digital qualificada e manuscrita), encontravam-se devidamente assinados com recuso a assinatura electrónica qualificada, mais permitindo identificar o nome do titular da assinatura; a entidade em nome do qual assina (dado existirem poderes de representação, no caso presente, do Agrupamento concorrente); o tipo de utilização previsto (ou seja, assinar em plataformas electrónicas de contratação), e a indicação que é emitido como certificado qualificado.
Resultam assim, observadas todas as exigências que dimanam na lei no que toca à autenticidade, autoria e inalterabilidade da proposta apresentada pela CI, não se verificando o vício de violação de lei assacado pela Autora em sede de petitório. Consequentemente, inexiste também qualquer motivo que justificasse a exclusão da proposta apresentada pela CI, pelo que bem andou o júri do procedimento ao propor a adjudicação do contrato a esta última.
Assim sendo, improcedendo a argumentação com base na qual a Autora pretende ver impugnado o presente procedimento concursal e, consequentemente, o acto de adjudicação levado a cabo no termo do mesmo, deverá a presente acção considerada improcedente, o que desde já se declara.
*
Atenta a improcedência de todos os vícios esgrimidos pela Autora, improcede a pretensão anulatória por aquela formulada. Em consequência, deve o acto impugnado manter-se válido na ordem jurídica.
Considerando o decidido em sede impugnatória, fica também prejudicado o conhecimento do pedido condenatório formulado, o que desde já se declara.
X
Constitui entendimento unívoco da doutrina e obteve consagração legal o de que o objecto do recurso jurisdicional se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria que nelas não tiver sido versada, com ressalva óbvia, dos casos que imponham o seu conhecimento oficioso.
Assim, vejamos:
Do valor da acção -
Como se sabe, a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido (artº 31º/1, do CPTA).
É a parte que deve indicar o valor da acção.
E, se discórdia surgir no que tange à fixação desse valor, “é aplicável o disposto na lei processual civil quanto aos poderes das partes e à intervenção do juiz” (citado artigo 31º/4).
No caso, a parte teve a acção como de valor indeterminável e indicou como valor o montante de 30 000.01 €.
Porém, erradamente. Porque o critério supletivo, exactamente por ser supletivo, só é aplicável se não houver normativo que ao caso expressamente se aplique. E nesta caso há.
A Autora ao peticionar, além da anulação do acto de adjudicação e da subsequente celebração do contrato, que lhe seja adjudicada a obra está a pretender um benefício diverso do pagamento de uma quantia, ou seja, está a pretender receber o preço de 23 765 000.00 € em troca da execução do contrato. Pelo que, nos termos do artigo 32º/2, do CPTA, não pode deixar de ser esse o montante fixado como valor da causa. E ao mesmo valor se chegaria se se aplicasse o disposto no artigo 33º/a), do mesmo Diploma.
Não houve in casu a prolação de qualquer decisão surpresa.
Nos termos do artigo 306º/1, do CPC, “Compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes.” Donde a parte indica um valor e espera que o juiz o aceite ou fixe outro. Sendo que, quando o juiz não aceita o valor indicado por uma das partes ou o consensualizado pelas partes, fixa o valor de acordo com os elementos do processo - artº 308º
Artigo 308.º (art.º 317.º CPC 1961)
Determinação do valor quando não sejam suficientes a vontade das partes e o poder do juiz
Quando as partes não tenham chegado a acordo ou o juiz o não aceite, a determinação do valor da causa faz-se em face dos elementos do processo ou, sendo estes insuficientes, mediante as diligências indispensáveis, que as partes requererem ou o juiz ordenar.
do CPC.
No caso, tais elementos processuais eram suficientes para a fixação do valor da causa, sendo dispensáveis adicionais diligências.
E, sendo tais elementos processuais conhecidos das partes, para o aqui pertinente, conhecidos da Autora, mister é concluir que em nada foi surpreendida. Pelo que decisão surpresa aqui não existiu, como bem aduz o Senhor PGA.
Ademais, nos termos do n.º 2 do artigo 310.º do CPC, quanto às consequências da decisão do incidente do valor, se da fixação definitiva do valor resultar ser outra a forma de processo correspondente à ação, mantendo-se a competência do tribunal, é mandada seguir a forma apropriada, sem se anular o processado anterior e corrigindo-se, se for caso disso, a distribuição efetuada.
Deste modo, ao contrário do que pretende a Recorrente, o incidente suscitado pela parte interessada quanto à atribuição do valor da causa pelo Tribunal nunca teria como efeito a revogação da sentença.
Desatende-se, pois, este segmento do recurso.
Do mérito/fundo do recurso -
Na sentença recorrida deu-se como provado, além do mais, o seguinte:
“K) A todos os documentos que compunham a proposta apresentada pela CI foi aposta a assinatura electrónica qualificada do referido C., excepto no documento designado como “Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra” (cfr. documentos que compõem a pasta 3 r) do PA);
L) O documento identificado em K) continha a assinatura manuscrita do Sr. C. (cfr. idem);
M) Após o carregamento de todos os documentos que compunham a proposta da CI, inclusive o identificado como “Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra”, o representante daquela preencheu o formulário principal constante da plataforma “anoGov” e finalizou o processo de submissão de todos os documentos, mediante a utilização de um certificado qualificado de assinatura de C., tendo aquela plataforma emitido automaticamente um recibo electrónico da entrega, com o registo da identificação da entidade adjudicante, do procedimento, do concorrente, da proposta, bem como da data e hora da respectiva submissão (cfr. documento junto com a contestação da CI sob o nº 3);”
O presente recurso visa responder à seguinte questão: o carregamento e submissão, mediante certificado qualificado de assinatura, na plataforma concursal de todos os documentos, inclusive da “Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra”, o qual só continha assinatura electrónica, satisfaz os requisitos legais de apresentação da proposta pela CI?
Para a decisão do presente dissídio mostra-se suficiente a jurisprudência do TCAS citado na sentença recorrida, de 05/04/2018, proc. 420/17 e a demais que aí se menciona.
De todo o modo, também o STA in Acórdão de 06/12/2018, proc. 278/17 Sumário
I – Enquanto no carregamento de “ficheiro fechado” o concorrente elabora a proposta localmente, no seu próprio computador, inserindo os documentos em ficheiros que introduz na plataforma electrónica depois de encriptados e assinados, no carregamento progressivo ou de “ficheiro aberto”, a que alude o n.º 5 do art.º 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17/8, o ficheiro está em processo de carregamento até ao momento da submissão, não sendo a sua assinatura exigida até este momento.
II – Estando assente que se teria de considerar que a modalidade de carregamento era a de “ficheiro fechado”, em virtude de a plataforma electrónica utilizada no concurso não ter as potencialidades necessárias para permitir o carregamento progressivo nos termos do mencionado art.º 68.º, n.º 5, e resultando dos factos provados que, em violação do n.º 4 deste art.º 68.º, os ficheiros da proposta da adjudicatária só foram assinados electronicamente depois de carregados no portal, há que averiguar se a formalidade essencial omitida se degradou em não essencial por as funções da assinatura electrónica terem sido asseguradas.
III – Tendo-se provado que todos os ficheiros associados à proposta da adjudicatária foram assinados através de um certificado de assinatura electrónica a ela pertencente e garantindo a plataforma a possibilidade de aferir se uma cópia electrónica que dela tenha sido extraída corresponde ao documento original submetido pelo concorrente, é de concluir que o facto de os ficheiros não terem sido assinados na altura determinada pela lei, mas só em momento posterior, se degrada em formalidade não essencial.
, proclamou para caso idêntico jurisprudência que sustenta a decisão recorrida.
Porque também aqui a única questão a decidir é a de saber se, por recurso à teoria das formalidades não essenciais, hoje consagrada no art.º 163.º, n.º 5, al. b), do CPA, aprovado pelo DL 4/2015, de 7/1, se deve afastar a exclusão da proposta da Contrainteressada por os objectivos subjacentes à exigência decorrente do n.º 4 (e n.º 6) do art.º 68.º da Lei 96/2015 terem sido alcançados com a assinatura electrónica dos ficheiros aquando da submissão dessa proposta.
Deste aresto retiramos o seguinte trecho:
“Resulta deste preceito (artigo 68º da L. 96/2015) que há duas modalidades de carregamento das propostas: a normal, a que se referem os transcritos nºs. 1, 2, 3, 4, 6 e 15, geralmente denominada de carregamento de “ficheiro fechado” e a prevista no n.º 5 do mesmo normativo, denominada de carregamento progressivo ou de “ficheiro aberto”. Na primeira modalidade o concorrente elabora a sua proposta “localmente, no seu próprio computador”, inserindo os documentos em ficheiros e preenchendo os formulários disponibilizados que introduz na plataforma electrónica (na área que em exclusivo lhe está reservada) depois de estarem encriptados e assinados electronicamente, podendo esses ficheiros - embora já completos - serem substituídos por outros novos, ou pura e simplesmente retirados ou aditados, enquanto não houver lugar à submissão, permitindo-se, assim, que o concorrente adapte a proposta aos atributos que um estudo mais aprofundado lhe mostre ser necessário, sem pôr em causa as exigências de celeridade da fase da apresentação das propostas quando o seu termo se aproxima. Por sua vez, no carregamento progressivo, permite-se o envio para a plataforma de ficheiros abertos - encriptados mas não assinados - onde vão sendo incluídos documentos que, não estando finalizados, também podem ser alterados na própria plataforma electrónica até ao momento da submissão da proposta que é quando a assinatura electrónica é aposta (cf. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira in “Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública”, 2011, págs. 681 e 897-899). Assim, enquanto na primeira modalidade o ficheiro fica carregado, devendo, por isso, estar previamente assinado electronicamente, na segunda, porque está em processo de carregamento até ao momento da submissão, não é de exigir a sua assinatura antes deste momento. Mesmo no carregamento com base em ficheiros fechados, a submissão da proposta só se efectiva com a sua assinatura electrónica, sendo este o momento em que ela se considera completa e apresentada a concurso. Assim, como referem Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira (ob. cit., pág. 903), apesar de todos os ficheiros e formulários já irem assinados, a lei exige a assinatura da própria proposta para que eles saiam do estado de pendência procedimental em que se encontravam e sejam agora apresentados à entidade adjudicante, ficando o concorrente finalmente vinculado ao compromisso aí assumido, pelo que é essa assinatura que assegura que a apresentação da proposta como um todo é fruto de um acto voluntário do concorrente. Portanto, no caso em apreço, não é por os ficheiros informáticos e formulários apresentados pela “B…….” não se encontrarem assinados antes do seu carregamento na plataforma que ela deixa de se considerar vinculada ao que deles consta, o que demonstra a irrelevância do incumprimento dessa formalidade em relação à firmeza do compromisso que assumiu. Tendo as instâncias considerado, sem contestação na presente revista, que, por a plataforma electrónica utilizada não ter as potencialidades necessárias para permitir o carregamento dos ficheiros nos termos do mencionado art.º 68.º, n.º 5, se deveria entender que a modalidade de carregamento das propostas dos concorrentes era a denominada de “normal” e resultando dos factos provados que os ficheiros da proposta da adjudicatária e os formulários só foram assinados electrónicamente depois de carregados no portal e não localmente no seu próprio computador, como exigiam os nºs. 3, 4 e 6 daquele art.º 68.º, o que há que averiguar é apenas, como já referimos, se a formalidade omitida - essencial, por legalmente prescrita - se degrada em não essencial, em virtude de o resultado que o legislador tinha em vista quando impôs a assinatura electrónica dos ficheiros antes do seu carregamento ter acabado por ser atingido. O art.º 7.º, n.º 1, do DL n.º 290-D/99, de 2/8, na redacção resultante do DL n.º 88/2009, de 9/4, prevê que a aposição de uma assinatura electrónica equivale à assinatura autógrafa dos documentos com forma escrita sobre suporte de papel e cria a presunção de que: a) a pessoa que apôs a assinatura é o titular desta ou é representante, com poderes bastantes, da pessoa colectiva titular da assinatura electrónica; b) a assinatura foi feita com intenção de assinar o documento electrónico; c) o documento electrónico não foi alterado desde a aposição da assinatura. Correspondendo estas presunções legais aos fins prosseguidos pela exigência da assinatura electrónica qualificada, é de entender que esta tem uma função identificadora, finalizadora ou confirmadora e de inalterabilidade. Assim, o que há que apurar é se estas funções foram asseguradas pela assinatura electrónica dos ficheiros na plataforma aquando da submissão da proposta. Ora, estando provado que todos os ficheiros associados à proposta da adjudicatária “B…….” foram assinados através de um certificado qualificado de assinatura electrónica àquela pertencente, é de concluir que estão preenchidas as referidas funções identificadora e finalizadora, por não haver dúvidas quanto à autoria daqueles ficheiros e à vinculação de quem assinou o seu conteúdo. Quanto à função de inalterabilidade, o que importa averiguar é se o facto de os ficheiros não conterem uma assinatura electrónica qualificada quando são carregados na plataforma permite garantir que após a sua assinatura o respectivo conteúdo não foi alterado. Pretendendo salvaguardar-se com esta função da assinatura que haja uma forma segura de saber se algum documento foi alterado após o momento da abertura das propostas, a circunstância de as plataformas electrónicas estarem obrigadas a “manter os documentos no seu formato original, devidamente conservados” (art.º 31.º, n.º 2, da Lei n.º 96/2015), de forma a que seja possível identificar “o documento enviado, bem como a entidade e o utilizador que o enviou” [al. c) do n.º 3 do citado art.º 31.º] e de elas terem de registar “tentativas com sucesso ou fracassadas de modificação de dados” [art.º 50.º, n.º 5, al. h), da Lei n.º 96/2015] e de garantirem a existência de cópias de segurança “protegidas contra modificação com recurso a mecanismos de assinatura digital” (n.º 4 do art.º 52.º da Lei n.º 96/2015), demonstra que há sempre a possibilidade de aferir se uma cópia electrónica que tenha sido extraída da plataforma corresponde ao documento original que foi submetido pelo concorrente. Assim, ainda que fosse possível extrair dos ficheiros carregados na plataforma cópias electrónicas, sempre a plataforma permitiria averiguar a inexactidão dessa cópia relativamente ao original. Portanto, a omissão da formalidade resultante de os ficheiros não terem sido assinados no momento determinado pela lei, mas só em momento posterior, degrada-se em formalidade não essencial.”
A decisão do recurso, com a qual nos identificamos, acaba a revogar o acórdão do TCAS de 28/06/2018 sobre que incidiu, dando razão ao voto de vencido aí aposto.
Assim, sem necessidade de outras considerações, tem o recurso de ser desatendido.
Sem embargo, atente-se, (mais uma vez), na síntese efectuada pela Contrainteressada na sua peça processual:
3. Ficou cabalmente demonstrado que a plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante permite o carregamento progressivo das propostas e, portanto, o caso dos autos deve ser decidido por interpretação e aplicação do art. 68°/5 da Lei n° 6/2015, de 17 de agosto.
4. Efetivamente, ficou provado na sentença que:
a. O carregamento do Documento Europeu único de Contratação Pública (DEUCP) da Cl foi efetuado, com assinatura qualificada, às 16h:04m:23s, no dia 17.06.2019 — Doc. 2 junto à contestação da CI.
g. A proposta das CI, acompanhada dos documentos que a integravam, foi submetida na plataforma, às 16h:40m:31s do dia 17.06.2019 — cfr. Doc. 4 da p.i., Doc. 2 da contestação da Ré e Doc. 3 da contestação da Cl.
h. Segundo as condições gerais de adesão à plataforma "anoGov", que são públicas e se encontram acessíveis no endereço eletrónico https://anopov.com/r5/condicoes-gerais-de-adesao/, a plataforma garante "a integridade da informação, através de processos que evitem a destruição, perda, desvio, violação de acesso e modificação, exposição ilegítima ou não autorizada" (negrito nosso) — cfr. n° 7.1.3 das condições de adesão.
i. Assim, e a contrario sensu, daqui resulta inequivocamente demonstrado que a plataforma "anoGov" permite o carregamento progressivo dos documentos e a sua modificação a pessoas devidamente autorizadas que são, naturalmente, os representantes dos concorrentes com certificado qualificado.
j. Ao invés, a plataforma eletrónica em questão não permite a pessoas que não estejam devidamente autorizadas, "a destruição, perda, desvio, violação de acesso e modificação, exposição ilegítima" dos documentos carregados por um concorrente.
k. E é óbvio também que esta possibilidade — de modificação das propostas por pessoas autorizadas — só faz sentido após o carregamento e antes da sua submissão, porque a partir desse momento vigora o princípio da intangibilidade das propostas, que impede a modificação das propostas a pessoas autorizadas ou não.
g. Assim, a plataforma eletrônica utilizada no procedimento concursal em questão permite o carregamento progressivo porque se permitisse o mero carregamento fechado nunca seria possível a modificação dos documentos prevista nas condições de adesão à mesma, inclusivamente a pessoas autorizadas.
5. Assim sendo, permitindo a plataforma o carregamento progressivo, não era obrigatória a assinatura dos documentos antes do carregamento, apenas sendo exigível aquando da submissão da proposta, que, como é incontestável, ocorreu dentro do prazo fixado para o efeito e mediante a utilização de certificado qualificado.
6. Em suma, estando errada a premissa em que assenta todo o seu recurso e tendo sido demonstrado inequivocamente que a plataforma utilizada no procedimento adjudicatório permite efetivamente o seu carregamento progressivo, deve o presente recurso interposto pela Embeiral, ser julgado improcedente.
5. Mas, mesmo que assim não sucedesse, e que a plataforma só permitisse o carregamento "fechado", o que se admite por mera hipótese académica, ainda assim, a ação de contencioso pré-contratual deveria ser decidida em termos desfavoráveis à sua pretensão.
11. Em primeiro lugar, porquanto, tendo a "Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra" apresentada pela CI, aposta na última página, a assinatura manuscrita do representante devidamente habilitado do agrupamento, e tendo esta valor jurídico equivalente à assinatura eletrônica, mostra-se obedecido o formalismo previsto no n° 4 do art. 68° da Lei n° 96/2015, de 17/08.
12. Em segundo lugar, uma vez que a partir da Lei n° 96/2015 de 17 de agosto, as plataformas eletrónicas passam ou devem passar a assegurar aplicações que garantam automaticamente a encriptação e aposição de assinaturas qualificadas.
13. Isto significa que os concorrentes deixaram de ser responsáveis por, aquando do carregamento dos documentos da proposta, proceder à encriptação prévia dos dados da proposta e à aposição prévia de assinaturas eletrónicas qualificadas, não podendo ser sancionados se, eventualmente, a plataforma não tiver garantido a encriptação e aposição de assinaturas, de forma automática.
14. Em terceiro lugar, porque é dominante na jurisprudência e doutrina administrativas que uma formalidade se degrada em não essencial se a sua preterição e omissão não tiver impedido a realização dos objetivos que mediante ela o legislador pretendeu produzir.
15. Os fins visados pela norma procedimental constante do art. 68°, n° 4 da LPE são os resultantes do art. 7°/1/a), b) e c) do Decreto Lei n° 290-D/99 de 2 de Agosto, na redação dada pelo Decreto-Lei n° 88/2009 de 9 de Abril, a saber:
n a função identificadora (traduzida na identificação "de forma unívoca do titular como autor do documento"),
n a função finalizadora ou confirmadora (consubstanciada na circunstância de "a sua aposição ao documento dependa apenas da vontade do titular")
n e a função de inalterabilidade relativamente aos documentos instrutores de uma proposta contratual (consistindo na segurança de que "a sua conexão com o documento permita detectar toda e qualquer alteração superveniente do conteúdo deste").
13. No caso presente, está claro que todas as três funções legalmente atribuíveis à aposição de assinatura eletrónica se mostram igualmente alcançadas.
14. Quanto à função identificadora, não há dúvidas quanto ao signatário da "Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra", uma vez que:
n o acesso à plataforma, para carregamento do documento em causa, fez-se através de uma "autenticação forte", com "credenciais sempre protegidas", que não podem ser "adivinhadas nem alteradas";
n a CI submeteu o Documento Único de Contratação, com a assinatura eletrónica qualificada, onde juntou as procurações que conferem ao Exmo. Senhor Eng. C., os poderes para submeter todos os documentos da proposta, incluindo a "Nota Técnica sobre o Sistema de Qualidade da Obra"
n A "Nota Técnica sobre o Sistema de Qualidade da Obra" contém até a assinatura manuscrita do mesmo na última página;
n E, finalmente, o fato de o carregamento de todos os documentos ter sido feito entre as 16:04 e as 16:40 ­horário em que foi emitido o recibo da submissão da proposta, mediante a utilização de um certificado qualificado emitido pela plataforma após o registo e autenticação iniciais da CI, evidenciando que o carregamento da "Nota Técnica sobre o Sistema de Qualidade da Obra" foi feita na mesma sessão de autenticação, e, portanto, pelo titular do certificado qualificado válido.
15. Quanto à função finalizadora, também se encontra satisfeita uma vez que, após o carregamento de todos os documentos da proposta, incluindo a "Nota Técnica sobre o Sistema de Gestão de Qualidade da Obra", o representante do agrupamento concorrente, em ato contínuo, preencheu o formulário principal previsto no art. 66°, n° 1, alínea c) da LPE e, num ato de vontade intencional, deliberado e inequívoco de se vincular naqueles termos, usando o certificado qualificado atribuído para a autenticação, finalizou o processo de submissão, tendo a plataforma emitido automaticamente um recibo eletrónico da entrega, com o registo da identificação da entidade adjudicante, do procedimento, do concorrente, da proposta, bem como da data e hora da respetiva submissão (cfr. previsto no art. 71°/1 da LPE) — Documento 2 junto à contestação das CI.
16. Quanto à função de inalterabilidade, a plataforma encriptou automaticamente todos os dados, que apenas ficaram disponíveis após o termo do prazo para apresentação das propostas.
15. Assim, e sem conceder quanto ao primeiro argumento, que é o de que a plataforma possibilitava o carregamento progressivo dos documentos, mesmo que assim não fosse, a presente ação de contencioso pré-contratual deveria ser julgada improcedente com os três fundamentos adicionais atrás aduzidos.
Improcedem, pois, as conclusões da alegação, com a consequente manutenção do julgado na ordem jurídica.

DECISÃO

Termos em que se nega provimento ao recurso
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Em fase recursiva é devida taxa de justiça fixada nos termos da tabela l-B do Regulamento das Custas Processuais, de acordo com o disposto no nº 2 do artº 6º do aludido Regulamento, sendo que, nos termos previstos no nº 2 do referido preceito legal, “A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais”, pelo que, as taxas de justiça devem adequar-se aos custos que o processo acarretou para o sistema judicial.
Esse é o princípio que está na base do Regulamento das Custas Judiciais; efectivamente, neste Regulamento verifica-se um sistema misto uma vez que a taxa de justiça se baseia no valor da acção e na complexidade da causa; por essa razão é que diversas normas do Código de Processo Civil e do Regulamento de Custas preveem a possibilidade de o juiz determinar a final o agravamento das taxas de justiça em função da complexidade da causa ou então a sua dispensa.
Voltando ao caso concreto, o valor da acção foi fixado em € 23.765.000,00, sendo que, nos termos do artº 6º/7 do RCP, nas causas de valor superior a € 275.000,00 (duzentos e setenta e cinco mil euros), o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, pelo que ao valor da taxa de justiça inicial acresce, a final, por cada € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) ou fracção, 3 UC, no caso da col. A, 1,5 UC, no caso da col. B, e 4,5 UC, no caso da col. C, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz, de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.
É justamente essa dispensa que se impõe.
Sem ela, a conta de custas, a elaborar nos termos do RCP, dado o valor da acção, seria manifestamente exorbitante, excessiva e desproporcional, atendendo, nomeadamente à tramitação processual e à conduta processual de todas as Partes.
Os presentes autos não contêm articulados e alegações prolixas - pois limitam-se às alegações e contra-alegações de recurso; não dizem respeito a questões de elevada especialização jurídica - uma vez que se trata de matéria jurídica eminentemente processual, de natureza objectiva, já tratada pela doutrina e pela jurisprudência, sem necessidade de análise de questões de âmbito diverso; não foram realizadas quaisquer diligências de produção de prova, quer testemunhal, quer pericial, nem foi realizada qualquer audiência - porquanto as mesmas não eram necessárias, sendo que a decisão proferida se cingiu à subsunção e interpretação jurídico-normativa do que fora articulado pelas partes.
De acordo com as novas tabelas, o valor da taxa de justiça não é fixado com base numa mera correspondência face ao valor da acção; o valor da acção não é um elemento decisivo na ponderação da complexidade do processo e na geração de custos para o sistema judicial.
No caso posto, repete-se, a tramitação dos autos foi simples, não implicou qualquer especialidade, nem houve lugar a incidentes relevantes ou particularmente laboriosos; não se pode considerar que o presente recurso diga respeito a uma questão de especialização jurídica ou de fino recorte técnico.
E no que tange ao comportamento das Partes constata-se que a respectiva actuação processual se limitou a seguir os trâmites; cada uma fez o seu papel.
Assim, visto que no caso se evidencia por banda das Partes um comportamento processual curial e que a lide se não reveste de especial complexidade, mas antes de uma complexidade que não se eleva do padrão que este tipo de questões implica, determinamos, nos termos do disposto no artigo 6º/7 do RCP, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Este entendimento vai na linha do que tem sido decidido em casos similares - vide o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 421/2013 que julgou inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, previsto no artº 20º da CRP, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos artºs 2º e 18º/2, 2ª parte, do mesmo diploma, as normas contidas nos artigos 6º e 11º, em conjugação com a tabela 1-A anexa, do Regulamento das Custas Processuais, na redacção introduzida pelo DL 52/2011, de 13 de abril, quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título.
De facto, para o apuramento do montante da taxa de justiça devida a final (nas acções de valor superior a €275.000,00) não pode ser tido em consideração exclusivamente o valor atribuído à acção; os valores da taxa de justiça não podem ser de tal forma elevados que possam pôr em causa o acesso ao direito constitucionalmente consagrado no artigo 20º; caso contrário, poderia claudicar o próprio acesso dos cidadãos aos tribunais.
Devem, pois, operar juízos de razoabilidade, adequação e proporcionalidade na fixação das custas.
Custas pela Recorrente, sem prejuízo do aqui exposto.
Notifique e DN.


Porto, 15/05/2020


Fernanda Brandão
Frederico Branco (em substituição)
Helena Canelas