Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00304/21.9BEBRG |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 03/14/2023 |
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Tribunal: | TAF de Braga |
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Relator: | Irene Isabel Gomes das Neves |
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Descritores: | RECURSO; INUTILIDADE; FALTA DE ATAQUE DE UM DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO; |
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Sumário: | I. O recurso jurisdicional tem como objecto a sentença recorrida e destina-se a anulá-la ou alterá-la com fundamento em vício de forma (nulidade) ou de fundo (erro de julgamento) que o recorrente entenda assacar à mesma. II. Se a sentença julgou procedente a pretensão do oponente com mais do que um fundamento, o recurso só terá utilidade se se insurgir contra todos esses fundamentos, não o fazendo, a decisão terá que se considerar intacta na parte que não ataca e considerar que nessa exacta medida se verificou o trânsito em julgado. III. Não sendo o efeito jurídico pretendido com o recurso juridicamente possível, o tribunal ad quem não deve tomar conhecimento do recurso, porque aos tribunais está vedada a prática de actos inúteis (cf. artigo 130.º do CPC).* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Não tomar conhecimento do objecto do recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. – Secção de Processo Executivo de ... (Recorrente) notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida no âmbito dos autos de oposição à execução fiscal deduzida por «AA» (Recorrido), na qualidade de responsável subsidiário (sendo devedora originaria «X, LDA.»), por dívidas por contribuições e cotizações relativas a períodos situados entre 2014/01 e 2014/03, no valor exequendo de € 18.209,51, inconformado vem dela interpor o presente recurso jurisdicional. Alegou, formulando as seguintes conclusões: «I. O revertido «AA» NIF: ... foi gerente de direito e de facto existente no período em que as dívidas foram geradas à Segurança Social (cotizações e contribuições). II. Recebia salário na qualidade de gerente conforme demonstrativo ora entregue. III. Não indica quem era o gerente de facto que não o próprio. IV. Não existindo por proibição legal sociedades por quotas em autogestão, estando o revertido «AA» NIF: ... nomeado como gerente, deve apenas e só dele ser assacada a responsabilidade e ser considerado responsável subsidiariamente responsável pelo pagamento das dívidas demandadas no processo de execução fiscal ......62 e apensos V. Sem conceder, consideramos que decidindo como decidiu, a Mo. Juiz a quo não interpretou corretamente as normas legais referidas nestas conclusões merecendo-nos a censura para as suas conclusões, considerando a oposição procedente, quando a mesma claramente não deveria. Como se demonstrou aliás. PEDIDO NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, QUE V. Ex.ª DOUTAMENTE SUPRIRÁ, DEVERÁ O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, SENDO A OPOSIÇÃO CONSIDERADA IMPROCEDENTE E AS DÍVIDAS CONSIDERADAS DEVIDAS E PASSÍVEIS DE COBRANÇA.» 1.2. O Recorrido «AA», notificado da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações. 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 180 SITAF, no sentido da improcedência do recurso e do qual se extraí as seguintes conclusões: «III – Conclusões Em conclusão, pelos fundamentos de facto e de direito supra expostos e de acordo com a lei, somos do parecer que se deve considerar: 1º - O recurso interposto pelo recorrente IGFSS, I.P./Secção de Processos Executivos de ... totalmente improcedente, pois que a sentença a quo está conforme à lei e ao direito devendo manter-se na Ordem Jurídica; e 2º - Com custas processuais a cargo do recorrente (cf. artigo 527º, nº 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” artigo 281º, do CPPT, e artigos 6º, nº 2 e 7º, nº 2, do Regulamento de Custas Processuais e Tabela I – B anexa).» 1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. Questões a decidir: a única questão que cumpre apreciar e decidir é a da utilidade do recurso, o que passa por indagar se a sentença transitou em julgado por não vir atacado um dos fundamentos que determinaram a procedência da oposição, como veremos. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto 2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1.ª instância e respectiva fundamentação: «Com relevo para a decisão a proferir, consideram-se provados os seguintes factos: A) Corre termos no OEF o PEF nº ...62 e apensos (...70, ...78, ...86, ...39 e ...47), instaurados pelo IGFSS, IP, contra a sociedade devedora originária «X, LDA.», resultante de contribuições e cotizações relativas a períodos situados entre 2014/01 e 2014/03, perfazendo a dívida exequenda o montante de € 18.166,12 (cfr. fls. 99 do SITAF); B) Em 18-07-2019 foi proferido pelo OEF documento designado “DESPACHO PARA AUDIÇÃO” dirigido ao Oponente (cfr. fls.90 do SITAF e cujo teor se dá por reproduzido); C) Em 18-07-2019 o OEF emitiu ofício dirigido ao Oponente designado “NOTIFICAÇÃO AUDIÇÃO PRÉVIA” (cfr. fls.103 do SITAF e cujo teor se dá por reproduzido); D) Em 02-08-2019 o OEF emitiu documento designado “DESPACHO DE REVERSÃO” com o seguinte teor (cfr. fls.93 do SITAF): “(...) Não existe motivo para suspender a execução, conforme o disposto no artº 169º do Código de Procedimento e Processo Tributário (C.P.P.T.), pelo que deve a mesma prosseguira sua normal tramitação, nos termos e para os efeitos do disposto no artº 153º do C.P.P.T e artº 23º e artº 24º, nº 1, alínea b) da Lei Geral Tributária (L.G.T.). Na sequência das diligências levadas a cabo por esta SECÇÃO DE PROCESSO EXECUTIVO DE ... do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, no âmbito do processo de execução referido em epígrafe, foi proposta a reversão da execução fiscal em relação ao(s) gerente(s)/administrador(es) «BB». Procedeu-se a audiência de interessados, através de carta registada, nos termos constantes do artigo 23º, nº 4, e artigo 60º da Lei Geral Tributária, fixando-se o prazo de 15 dias úteis para o exercício do direito de participação. Terminado o prazo concedido para o efeito não veio (vieram) o(s) gerente(s)/administrador(es), ora interessado(s), responder ou trazer ao processo qualquer elemento. Assim sendo, parece de manter a decisão proposta no projeto de decisão, procedendo-se à reversão da execução fiscal em relação ao(s) mencionado(s) gerente(s) /administrador(es), dado que: - Em resultado das diligências efetuadas no proc. nº ................62 E APENSOS concluiu-se pela inexistência / insuficiência de bens na titularidade da executada. - De acordo com informação constante da base de dados da Segurança Social, verifica-se que é responsável subsidiário pelo pagamento da dívida, «BB», porquanto eram gerentes/administradores da executada nos períodos a que a dívida se refere. DOS FUNDAMENTOS Em conclusão, e atendendo aos elementos constantes no processo encontram-se preenchidos os requisitos exigidos no nº 2 do art. 23º da L.G.T., em conjugação com o art. 153º do C.P.P.T., para efetivação da reversão contra o (os) responsável (eis) subsidiário (os) de acordo com o definido artº24º da L.G.T., devendo a presente execução fiscal ser revertida para «BB». Proceda-se à citação em reversão do(s) referido(s) gerente(s) /administrador(es), através de carta registada com aviso de receção, nos termos do artigo 191º, nº 3, do Código do Procedimento e do Processo Tributário. (...)”; E) Em 15-10-2019 foi emitido pelo OEF documento designado “CITAÇÃO (REVERSÃO)” dirigido ao Oponente (cfr. fls.26 do SITAF e cujo teor se dá por reproduzido); F) Em data não concretamente apurada, o Oponente tomou conhecimento do documento referido na alínea supra (facto não controvertido). * Inexistem outros factos, provados ou não provados, com interesse para a decisão a proferir. * Motivação A decisão da matéria de facto dada como provada efectuou-se com base no exame dos documentos que constam dos autos e ao PEF e na posição das partes relativamente aos factos alegados e não impugnados, consoante se anota em cada alínea do probatório. Foi análise de toda a prova assim enunciada que, em conjugação com as regras da experiência comum, sedimentou a convicção do Tribunal quanto aos factos dados como provados – cfr. arts. 74.º e 76.º, n.º 1, ambos da LGT e art. 342.º e ss do CC.» 2.2. De direito Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou procedente a presente oposição, com fundamento na ilegitimidade do oponente no processo de execução fiscal identificado no item A) do probatório supra, nos termos do artº.204, nº.1, al. b), do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), mais declarando a extinção do processo executivo contra o mesmo movido. As conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr. artigo 639º, do Código de Processo Civil (CPC), na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, ex vi do artigo 281º, do C.PPT). A recorrente (IGFSS, IP) dissente do julgado alegando, em síntese, que o revertido foi gerente de direito e de facto no período em que as dívidas foram geradas à Segurança Social (cotizações e contribuições), pois que recebia salário na qualidade de gerente durante o período, não indicou quem era de o gerente de facto, pelo que “(...) só dele ser assacada a responsabilidade e ser considerado responsável subsidiariamente responsável pelo pagamento das dívidas demandadas no processo de execução fiscal ...62 e apensos.”, pelo que o Tribunal a quo “(...) não interpretou corretamente as normas legais referidas nestas conclusões merecendo-nos a censura para as suas conclusões, considerando a oposição procedente, quando a mesma claramente não deveria. Como se demonstrou aliás” (pasme-se que nenhuma norma legal é mencionada nas singelas cinco conclusões apresentadas). Em suma, com muita bondade consideramos que por via do presente recurso a Recorrente atesta que o Recorrido é parte legítima na presente execução, por verificação dos pressupostos da reversão, nomeadamente a gerência de direito e de facto da devedora originária no período em que as dívidas se reportam, sendo com base exclusiva em tal alegação que pretende concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida. Ora, analisada a sentença objecto do presente recurso, constatamos que na mesma, no âmbito da verificação dos pressupostos de reversão, dela consta para além do mais, após discorrer sobre o enquadramento legal e doutrinal do instituto da reversão, que: «Ora, no caso sub juditio, está em causa a reversão, contra o Oponente, das dívidas da devedora originária a que se reportam os PEFs m.i. na alínea A) do probatório, por dívidas de contribuições e cotizações de períodos situados entre 2014/01 a 2014/03. A entidade exequente fundamentou a decisão de reversão contra a ora Oponente na inexistência/insuficiência dos bens penhorados da devedora originária e no exercício da gerência de facto pela Oponente, para garantir o pagamento da totalidade das dívidas tributárias que foram objecto de reversão. Para o efeito, deixou-se plasmado o seguinte (alínea D) do probatório) no despacho de reversão: “(...) - Em resultado das diligências efetuadas no proc. nº ................62 E APENSOS concluiu-se pela inexistência/insuficiência de bens na titularidade da executada. - De acordo com informação constante da base de dados da Segurança Social, verifica-se que é responsável subsidiário pelo pagamento da dívida, «BB», porquanto eram gerentes/administradores da executada nos períodos a que a dívida se refere. (...)”. Do supra exposto resulta desde logo que não é identificado no Despacho de Reversão o Oponente mas sim uma terceira pessoa, sendo certo que o Oponente veio a ser citado, de forma surpreendente e sem fundamento legal, para o PEF em crise nos autos na qualidade de responsável subsidiário. O IGFSS, IP foi notificado expressamente pelo Tribunal para juntar aos autos os PEFs em crise nos autos tendo juntado, segundo se lê dos mesmos, o original dos mesmos e dos quais não se extrai qualquer despacho de reversão contra o Oponente, sendo certo que era ao OEF que incumbia a prova dos fundamentos de reversão, o que não logrou fazer desde logo por falta do respectivo despacho de reversão. Porém, e ainda que assim não fosse ...» (fim de transcrição; negritos nossa autoria) Prosseguindo na sua apreciação, o Tribunal a quo, considerou que mesmo que assim não fosse, o despacho de reversão não identifica e concretiza quais as diligências que encetou no PEF para concluir pela insuficiência, como não identifica ou junta prova documental que comprove essa mesma inexistência/insuficiência e que do mesmo não consta alegação ou prova suficiente do exercício efectivo pelo Oponente da gerência na sociedade devedora originária, o que por si determinava também a ilegitimidade do Oponente. Ora, a Recorrente em momento algum exprime discordância com a sentença na parte em que esta considerou da “inexistência de despacho de reversão” contra o Oponente, o que por si determinava a procedência da oposição, nos termos em que o foi. Daí termos, adiantado em 1.4, que a única questão que cumpre apreciar e decidir é a da utilidade do recurso, o que passa por indagar se a sentença transitou em julgado por não vir atacado um dos fundamentos que determinaram a procedência da oposição à execução fiscal. É certo que, como decorre dos n.ºs 2 e 4 do art. 635.º do CPC («[…] 2. Se a parte dispositiva da sentença contiver decisões distintas, é igualmente lícito ao recorrente restringir o recurso a qualquer delas, uma vez que especifique no requerimento a decisão de que recorre. […] 4. Nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso. […]»), pode o recorrente restringir o recurso a uma parte da sentença quando esta contiver decisões distintas, desde que o especifique no requerimento de interposição do recurso ou essa restrição do objecto do recurso resulte, expressa ou tacitamente, das conclusões do recurso. Mas, fazendo-o, a parte da sentença que não seja recorrida transita em julgado, como resulta do disposto no art. 628.º do CPC («A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação».) – com os efeitos previstos no n.º 1 do art. 619.º do CPC («1. Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º».) – e o afirma expressamente o n.º 5 do citado art. 835.º do CPC («5. Os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo».). Ou seja, no caso sub judice, a sentença transitou em julgado na parte em que nela se considerou verificada o oponente parte ilegítima na execução, por ilegalidade da reversão contra quem não figura no despacho e, em consequência, se julgou acção procedente com a consequente extinção dos Processos de Execução fiscais identificados em A) do probatório contra o Oponente. Assim, a apreciação do recurso revela-se inútil, uma vez que, ainda que fosse provido, nunca a Recorrente obteria o efeito jurídico pretendido – a revogação da sentença –, uma vez que sempre se manteria o julgamento nela efectuado naquela parte (o despacho de reversão respeitar a pessoa distinta do citado). A apreciação e decisão do recurso, sobre a se a Recorrente fez prova da gerência de direito e de facto do Oponente não teria qualquer interesse processual (Revestindo mero interesse teórico ou académico, que aos tribunais não compete tutelar.), interesse que constitui uma condição da admissibilidade do próprio recurso. Neste sentido se tem vindo a pronunciar a jurisprudência (vide, entre outros os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 17.10.2012, proferido no processo n.º 583/12, de 24,10.2012, proferido no processo n.º 696/12, de 13.11.2013, proferido no processo com o n.º 1020/13) e a doutrina (vide Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, IV volume, anotação 12 ao art. 279.º, pág. 337.). Por todo o exposto, não tomaremos conhecimento do recurso. 2.3. Conclusões I. O recurso jurisdicional tem como objecto a sentença recorrida e destina-se a anulá-la ou alterá-la com fundamento em vício de forma (nulidade) ou de fundo (erro de julgamento) que o recorrente entenda assacar à mesma. II. Se a sentença julgou procedente a pretensão do oponente com mais do que um fundamento, o recurso só terá utilidade se se insurgir contra todos esses fundamentos, não o fazendo, a decisão terá que se considerar intacta na parte que não ataca e considerar que nessa exacta medida se verificou o trânsito em julgado. III. Não sendo o efeito jurídico pretendido com o recurso juridicamente possível, o tribunal ad quem não deve tomar conhecimento do recurso, porque aos tribunais está vedada a prática de actos inúteis (cf. artigo 130.º do CPC). 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em não tomar conhecimento do recurso. Custas pela Recorrente. Porto, 14 de março de 2023 Irene Isabel das Neves Ana Paula Santos Margarida Reis |