Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00784/10.8BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/31/2020
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO; PREENCHIMENTO DO SISTEMA DE QUOTAS; FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO.
Sumário:I- No âmbito da avaliação de desempenho dos trabalhadores da Administração pública com recurso ao preenchimento de quotas existe um dever reforçado de fundamentação por parte da Administração, o que só é atingível com a apresentação [por parte desta] de forma clara congruente suficiente e contextual das razões atinentes à não obtenção por parte do trabalhador da classificação mais elevada, e que lhe foi proposta pelo seu avaliador, por mera imposição de um sistema de quotas.

II- Na situação recursiva, este dever de fundamentação não foi devidamente assegurado, pois ficou-se sem perceber as razões pelas quais foi o Autor, aqui Recorrente, e não outro, que incidiu o efeito restritivo decorrente daquele aplicação de sistema de quotas e de mérito e excelência.

Assente que no âmbito da reclamação apresentada pelo Autor não foi ponderado o “real mérito do avaliado”, mas antes razões conexas com o sistema de preenchimento de quotas, ficou grandemente esvaziado o direito deste em obter uma verdadeira reavaliação do seu desempenho nos termos e com o alcance que derivam dos artigos 8º e seguintes da Lei nº. 10/2004, de 22.03, e 3º e seguintes da Decreto Regulamentar 19-A/2004, de 14 de maio.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL
Recorrido 1:MUNÍCIPIO DE (...)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
* *
I – RELATÓRIO
SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL, STAL, devidamente identificado nos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 10.05.2016, proferida no âmbito da Ação Administrativa Especial por si intentada contra o MUNÍCIPIO DE (...), também devidamente identificado nos autos, que julgou a presente ação totalmente improcedente e, em consequência, absolvo o Réu do pedido.
Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)
a) O facto de no serviço em causa terem sido atribuídas outras avaliações de “Muito Bom” na fase de validação/harmonização, não podia constituir óbice ao acolhimento da reclamação do sócio do ora Recorrente e consequente ponderação da atribuição de outra avaliação, porquanto seria esvaziado o direito de impugnação graciosa e violado o princípio do contraditório;
b) O SIADAP em vigor previa, de facto, uma fase inicial de validação/harmonização das avaliações, para observância das percentagens máximas admitidas das avaliações superiores, “Muito Bom” e “Excelente” mas, ao incorporar uma posterior fase de reclamação da homologação da avaliação, necessária segundo a jurisprudência dominante, o sistema criou uma válvula de segurança para salvaguardar os avaliados lesados com a dita harmonização/validação, que deve obedecer a critérios genéricos e abstratos;
c) O aresto recorrido, ao não considerar que o ato contenciosamente impugnado errou nos pressupostos, na medida em que não atendeu à reclamação do ato de homologação da avaliação de desempenho por as avaliações superiores já terem sido atribuídas na fase de validação harmonização, violou os artigos 3°, alínea d), 4°, alínea c) e 15° da Lei n° 10/2004, de 22/3 e 13°, n° 1, alínea c) e 28°, n° 2, do Decreto Regulamentar n° 19-A/2004, de 14/5;
d) De todo o modo, tendo em conta a reclamação do sócio do Recorrente e, o mais relevante, o parecer favorável do avaliador, peças que traziam ao procedimento elementos concretos que sustentavam uma avaliação de patamar diferente, era exigida uma fundamentação mais aprofundada e ajustada à avaliação concreta;
e) Seria insuficiente fundamentar o indeferimento da reclamação com a simples referência à atribuição de outras avaliações superiores a outros trabalhadores, na dita fase de validação/harmonização;
f) Aliás, sempre o caso do sócio do Recorrente, mormente face ao posicionamento do avaliador, exigiria uma fundamentação do ato que versou sobre a reclamação condizente ou ao nível do exigido;
g) Na verdade, não se descortina que comparação de avaliações terá existido e se tal cotejo terá sido a motivação do não provimento e, finalmente, se foi ponderada a situação do sócio do Recorrente como uma das que poderia ser tomada em conta pelo CCA;
h) Pelo que o douto aresto recorrido, ao não assacar ao ato contenciosamente impugnado fundamentação insuficiente, violou as normas dos artigos 268°, n° 3, da Constituição da República Portuguesa e 125° do Código do Procedimento Administrativo então vigente;
i) São factos incontornáveis: (I) que na petição inicial foi logo de início invocada a isenção decorrente da conjugação das normas do artigos 310°, n° 3 e 4°, n° 1, alínea f), do RCP, de acordo com jurisprudência comprovada pela junção de documento, (II) que a p i. com esse teor, foi rececionada no dia 10/12/2010, (III) que o respetivo processo foi distribuído, sem que ao dito articulado tivesse sido junto comprovativo da liquidação da taxa de justiça, (IV) que foi proferido despacho de saneador transitado o qual não levantou qualquer questão quanto à receção e distribuição do processo faltando à p.i. o comprovativo da liquidação da taxa de justiça;
j) Assim sendo, o segmento decisório do aresto recorrido, que se confina à condenação em custas ao arrepio dos factos acabados de discriminar, que inculcavam igualmente o acolhimento pelo Tribunal da doutrina então dominante, constitui uma revogação dos atos processuais consolidados que encontrou o Autor, ora Recorrente, desprevenido face à estabilidade e confiança decorrentes dos ditos factos;
l) Pelo que o douto aresto recorrido viola os artigos 310°, n° 3, do RCTFP e 4°, n° 1, alínea f), do RCP, 87°, n° 2, do CPTA e o princípio do caso julgado violando, sempre, o artigo 3°, n° 3, do CPC (…)”.
*
Notificado que foi para o efeito, o Recorrido produziu contra-alegações, embora desprovidas de conclusões, do seguinte teor: “(…)
Vem o presente recurso interposto pelo ora recorrente STAL - SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL, da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de (...) que julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo o Réu Município de (...) do pedido.
Recurso esse que está, a nosso ver e salvo o devido respeito, totalmente destinado ao insucesso, não assistindo qualquer razão ao recorrente, dando-se aqui por integralmente reproduzida, para todos os devidos e legais efeitos, a douta sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância.
Pretende o Autor que a douta sentença proferida pelo Tribunal "a quo" seja revogada por entender que a mesma, ao não atender à reclamação do ato de homologação da avaliação de desempenho por as avaliações superiores já terem sido atribuídas na fase de validação harmonização, violou os artigos 3.9, alínea d), 4.9, alínea c) e 15.9 da Lei n.9 10/2004, de 22/3 e 13.9, n.9 1, alínea c) e 28.e, n.°s do Decreto - Regulamentar n.°s 19-A/2004, de 14/5 e as normas dos artigos 268.9, n.9 3 da Constituição da República Portuguesa e 125.5 do Código do Procedimento Administrativo então vigente.
Não assiste qualquer razão ao Autor.
Como bem resulta da douta sentença recorrida, que se reproduz, nos termos do artigo 4.? alíneas b) e c) da Lei n.9 10/2004, de 22 de março, o SIADAP tem como objetivo avaliar o mérito dos funcionários em função da produtividade, a qual será determinada através do nível da realização de objetivos, da aplicação de competências e da atitude pessoal demonstrada.
Acresce que nos termos do disposto no n.9 1 do artigo 15.9 do mesmo diploma legal, a aplicação do SIADAP "(...) implica a diferenciação de desempenhos numa perspetiva de maximização da qualidade dos serviços prestados, devendo em conformidade ser estabelecidas percentagens máximas para atribuição das classificações mais elevadas de cada organismo".
No caso sub judice, analisando a avaliação do sócio do Autor, o CCA deliberou, atendendo à avaliação dos demais trabalhadores com a categoria profissional de Assistente Operacional, promover a referida diferenciação de níveis de desempenho, em cumprimento da lei.
Com efeito, o CCA deliberou, por unanimidade, manter a nota atribuída ao sócio do Autor, comparativamente com a nota atribuída a trabalhadores do mesmo serviço e com a mesma categoria profissional a quem foi atribuída a nota de Muito Bom.
Conforme resulta provado (ponto 11.) "(...) O Conselho apreciou o teor da reclamação apresentada pelo avaliado C.A.A.T., bem como os argumentos expostos pelo respetivo avaliador, o Senhor Chefe da Divisão de Viaturas e Máquinas, o Eng. J.L.D.F. e deliberou, por unanimidade, não acolher as argumentações apresentadas pelo avaliador, uma vez que foi atribuída, naquele serviço, a nota de Muito Bom a trabalhadores com a categoria de Assistente Operacional e por considerar que deve existir uma avaliação comparativa entre os avaliadores de cada categoria profissional. No entanto, o CCA considera que podem existir situações provadas inequivocamente, e poderá tomar em conta as fundamentações, apresentadas entre avaliador e avaliado, acolhendo-as, ou solicitando apreciação adicional ao avaliador (...)."
Acresce ainda que a atribuição da nota de Muito Bom (desempenho de mérito) está dependente do cumprimento do disposto no artigo 9.Q do Decreto Regulamentar n.°s 19- A/2004, de 14 de maio.
Face ao exposto, a notação atribuída ao sócio do Autor - Bom - cumpriu integralmente a Lei, designadamente a Lei n.°s 10/2004, de 22 de março, assim como o CCA deu integral cumprimento ao disposto no artigo 125. do CPA e artigo 268 n.3 da CRP.
A deliberação do CCA, conforme resulta da douta sentença recorrida, é confirmativa da anterior, pelo que, por confirmativo, este ato integra a fundamentação do ato anterior. Ou seja, a avaliação do associado do Autor não se baseia unicamente no preenchimento máximo da quota mas antes na fundamentação que resultou do anterior ato fundamentado.
A deliberação do CCA ao manter o anterior ato, assimilou o teor do primário de homologação da avaliação feita ao associado do Autor, sendo certo que esta foi efetuada de forma suficiente e congruente.
Foi também o cumprimento restrito das quotas que determinou a manutenção daquela decisão.
Acresce ainda que, por exceder a quota estabelecida para as avaliações de Muito Bom, a decisão sempre teria que ser mantida.
De qualquer forma, a decisão está fundamentada e o Autor compreendeu e conseguiu reconstituir o itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela entidade decisora, designadamente na violação do princípio da diferenciação de desempenho.
Face ao exposto, andou bem o Tribunal "a quo" ao julgar improcedente a ação e em absolver o Réu, ora recorrido, do pedido (…)”
*
O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão destes recursos [contrariamente ao recurso interposto pelo Ministério do Ambiente, que foi ordenado desentranhar dos autos], fixando os seus efeitos e o modo de subida.
*
*
O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso jurisdicional.
*
Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
* *
II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, as questões suscitadas pelo Recorrente consistem em saber se a decisão recorrida, ao julgar nos termos e com os efeitos explanados no ponto I) do presente acórdão:
(i) incorreu em erro de julgamento de direito, por (i.1) violação de direito do dispostos nos artigos 3°, alínea d), 4°, alínea c) e 15° da Lei n° 10/2004, de 22/3 e 13°, n° 1, alínea c) e 28°, n° 2, do Decreto Regulamentar n° 19-A/2004, de 14/5, e, bem assim, por (i.2) ofensa das normas dos artigos 268°, n° 3, da Constituição da República Portuguesa e 125° do Código do Procedimento Administrativo então vigente;
(ii) errou em matéria de determinação de custas, por ofensa do disposto nos artigos 310°, n° 3, do RCTFP e 4°, n° 1, alínea f), do RCP, 87°, n° 2, do CPTA e o princípio do caso julgado.
Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.
* *
III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte: “(…)
1. O associado do Autor, C.A.A.T., era no ano de 2009, funcionário do Quadro da Entidade Demandada, com a categoria de Assistente Operacional, da carreira de Assistente Operacional (facto provado por acordo);
2. O associado do Autor estava no ano de 2009 afeto à Divisão de Viaturas e Máquinas do Departamento de Ambiente e Qualidade de Vida, do Município da (...) (facto provado por acordo);
3. Em 28 de janeiro de 2010, o associado do Autor preencheu uma ficha para avaliação do seu desempenho no período de 01/01/2009 a 31/12/2009 (cf. ficha de avaliação de desempenho a fls. 1 a 3 do PA, que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
4. O associado do Autor obteve a classificação qualitativa de «bom» e quantitativa de 3,9 (cf. ficha de avaliação de desempenho a fls. 11 a 4 do PA, que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
5. O associado do Autor obteve nos pontos 3 e 5 das Competências Comportamentais, a valoração de 4 pontos, que se destinavam a avaliar, respetivamente: “Capacidade de adaptação e de melhoria contínua” e “Responsabilidade e compromisso com o serviço”, (cf. ficha de avaliação de desempenho a fls. 4 a 11 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
6. Em 2 de março de 2010, o associado do Autor declarou tomar conhecimento da sua avaliação em entrevista (cf. ficha de avaliação de desempenho a fls. 4 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
7. Em 9 de março de 2010, o Vereador L.P. homologou a avaliação do associado do Autor (cf. despacho de homologação aposto em ficha de avaliação de desempenho a fls. 4 do PA, que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
8. Em 19 de março de 2010, o associado do Autor apresentou reclamação, com abreviadamente o seguinte teor: “(...) Não concordo com a avaliação que me foi dada nos pontos 3 e 5 das Competências Comportamentais nomeadamente na capacidade de adaptação e de melhoria contínua e na responsabilidade e compromisso com o serviço nas quais o meu avaliador me atribuiu nota 4 quando deveria ser nota 5, pois sou o único na secção que se preocupa com o equipamento reparando o mesmo quando este se danifica ou substituindo por equipamento novo quando este já esta deteriorado, preservando assim o bom funcionamento do mesmo, adaptando-me às mais diversas situações resolvendo as mesmas com eficácia e prontidão, muitas das quais não fazendo sequer parte do meu conteúdo funcional. Sempre disponível quando o solicitado para prolongar o horário de trabalho quanto este assim o exige. Trabalhando diariamente em sintonia com o responsável pela secção e substituindo o mesmo na sua ausência para que tudo funcione em pleno para o bom serviço e da instituição. Por tudo isto penso que mereço a classificação de Muito Bom”, (cf. reclamação a fls. 12 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
9. Em 24 de março de 2010, o Sr. Avaliador, J.L.F., emitiu informação com o seguinte teor: “Dada a reclamação apresentada pelo funcionário supra mencionado, com a categoria de Assistente Operacional (Lubrificador), relativamente à avaliação atribuída nas Competências comportamentais, considero ser de atender as razões invocadas e atribuir a pontuação de 5 (cinco), no campo da «capacidade de adaptação e melhoria continua» e no campo da «responsabilidade e compromisso com o serviço». Com efeito, o funcionário demonstra muita flexibilidade e capacidade de adaptação em situações distintas, assumindo de forma eficaz as diversidades de tarefas demonstrando disponibilidade para responder às necessidades do serviço, substituindo o responsável pelo sector Estação de Serviço, nas ausências deste, quantificando e calendarizando as tarefas a realizar de forma eficaz e em tempo útil. Considero assim, que deve ser atribuída a classificação qualitativa de muito bom e quantitativa de 4,1 valores”, (cf. parecer a fls. 14 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
10. Em 17 de maio de 2010, os membros do Conselho de Coordenação de Avaliação da Direção Municipal de Desenvolvimento Humano e Social (DMDHS) reuniram com o Chefe de Divisão de Viaturas e Máquinas, o Engenheiro J.L.D.F. e com o Vereador L.N.R. Providência para apreciar a reclamação apresentada pelo associado do Autor (cf. ata a fls. 16 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
11. Na reunião de 17 de maio de 2010, foi deliberado pelo órgão referido na alínea anterior, por unanimidade, o que parcialmente se reproduz e para onde se remete: “(...) O Conselho apreciou o teor da reclamação apresentada pelo avaliado C.A.A.T., bem como os argumentos expostos pelo respetivo avaliador, o Senhor Chefe da Divisão de Viaturas e Máquinas, o Eng.º J.L.D.F. e deliberou, por unanimidade, não acolher as argumentações apresentadas pelo avaliador, uma vez que foi atribuída, naquele serviço, a nota de Muito Bom a trabalhadores com a categoria de Assistente Operacional e por considerar que deve existir uma avaliação comparativa entre os avaliadores de cada categoria profissional. No entanto, o CCA considera que podem existir situações provadas inequivocamente, e poderá tomar em conta as fundamentações, apresentadas entre avaliador e avaliado, acolhendo-as, ou solicitando apreciação adicional ao avaliador (...)”, (cf. ata a fls. 16 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido);
12. Em 16 de agosto de 2010, foi aposto despacho de concordância pelo Sr. Presidente da Câmara de (...), com o parecer referido no ponto anterior (cfr. despacho a fls. 17 dos autos do proc. fls. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido) (…)”.
*
III.2 - DO DIREITO
A Recorrente pugna pela revogação da decisão recorrida sustentado, brevitatis causae que, a (i) atribuição da notação de Muito Bom a outros funcionários não pode obstaculizar a ponderação de outra avaliação no seu caso particular, e que (ii), tendo em conta a reclamação apresentada e o parecer favorável do avaliador, se exigia uma fundamentação mais aprofundada e ajustada à avaliação concreta, pois não se descortina que comparação de avaliações terá existido e se tal cotejo terá sido a motivação do não provimento e, finalmente, se foi ponderada a situação do sócio do Recorrente como uma das que poderia ser tomada em conta pelo CCA.
Julgamos que os termos em que a Recorrente desenvolve a sua argumentação pretendem convencer este Tribunal de que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito, por, contrariamente ao ali decidido, se mostrar o ato impugnado inquinado com os vícios de violação de lei e de falta de fundamentação.
Na decisão recorrida considerou-se nesta parte que (i) a avaliação do associado do Autor não se baseia unicamente no preenchimento máximo da quota, mas antes na fundamentação que resultou do anterior ato reclamado e (ii) que a deliberação do CCA ao manter o anterior ato, assimilou o teor do primário de homologação da avaliação feita ao associado do Autor, cuja fundamentação se mostra suficiente e congruente.
Em função do que concluiu que, com reporte para o fundamentação supra sintetizada, não se verificavam os vícios de (i) violação do artigo 4.°, alínea c), da Lei n.º 10/2004, e de (iv) falta de fundamentação, o que, associado à inverificação das demais causas de invalidade, desembocou na improcedência da presente ação.
Adiante-se, desde já, que o assim decidido não é de manter.
Na verdade, como se decidiu no aresto deste T.C.A.N., de 25.02.2012, tirado no processo nº. 73/09BEBCR, e com inteira mais valia para o caso recursivo:
“(…)
Os artigos 15° da Lei n°. 10/2004 de 22.03 [diploma que criou o SIADAP] e 9° do Decreto Regulamentar n°19-A/2004 de 14.05 [que regulamentou o SIADAP] estabelecem um sistema de classificação dos trabalhadores da Administração Pública que prevê quotas máximas para atribuição das classificações mais elevadas [Muito Bom e Excelente].
Desde cedo este regime suscitou as maiores reservas em termos de constitucionalidade e de legalidade, porque parece que a avaliação de tais trabalhadores deixa de ser igual para todos: uns obterão, pelo seu mérito, as classificações mais elevadas, e outros, que por igual mérito seriam merecedores das mesmas classificações, não as alcançam por mero impedimento administrativo, consubstanciado na fixação de quotas.
Embora a respeito de norma similar, relativa à classificação dos docentes [46° nº. 3 do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores do Ensino Básico e Secundário, aprovado pelo DL nº. 139-A/90 de 28.04, na redação do DL n° 15/2007 de 19.01], o Tribunal Constitucional considerou que a norma questionada, ao limitar a atribuição de notas mais elevadas de classificação, não implica diferenciação constitucionalmente ilegítima. E concluiu que tal norma não viola o princípio da igualdade pelos simples facto de prever a fixação percentagens máximas para a atribuição das classificações de Muito Som e Excelente, mas, advertiu, no caso de a norma ser questionada ser interpretada de forma contrária à Constituição, por conduzir a uma discriminação arbitrária na avaliação do docente, sempre poderá o lesado recorrer à fiscalização concreta da constitucionalidade. Mas tal situação não justifica, contudo, a declaração da inconstitucionalidade da norma [ver AC TC nº. 184/2008, de 12.03.2008, para cuja fundamentação remetemos].
Resulta bastante claro, assim, que lidamos com matéria jurídica explosiva, porque no limiar da constitucionalidade e da legalidade, e se a limitação das classificações mais altas, através de percentagens, foi salva no âmbito da constitucionalidade abstrata, isso só significa que deve ser reforçadamente sindicada na sua aplicação concreta.
O sistema de quotas não pode ser cego, não pode resultar numa aplicação arbitrária, o que significa que o trabalhador não alcança a classificação mais elevada, que lhe foi proposta, e que corresponde ao seu mérito intrínseco, por mera imposição de um sistema de quotas, deverá ficar apto a perceber porque foi ele a vítima, e não outro.
E este dever da Administração apresentar os motivos da sua decisão, de dar resposta ao direito subjetivo do trabalhador avaliado, de forma clara, suficiente, congruente e contextual, impõe-se neste caso, diríamos como que forma reforçada, porque, para além de servir os ditos fins de ponderação e pacificação, é essa fundamentação que fará a diferença, no plano concreto, entre o constitucional e o não constitucional, entre o legal e o ilegal.
(…)”.
Acompanhando e acolhendo a interpretação assim declarada por este Tribunal Superior, tem-se, portanto, por assente que, no âmbito da avaliação de desempenho dos trabalhadores da Administração Pública com recurso ao sistema de preenchimento de quotas, existe um dever reforçado de fundamentação por parte da Administração.
O que só é atingível com a apresentação [por parte desta] de forma clara congruente suficiente e contextual das razões atinentes à não obtenção por parte do trabalhador da classificação mais elevada, e que lhe foi proposta pelo seu avaliador, por mera imposição de um sistema de quotas.
Pois bem, examinando o teor do despacho impugnado, do qual fazem parte integrante, per remissionem, de entre outros, a (i) informação prestada pela Diretora Municipal de Administração e Finanças da Câmara Municipal de (...) e o (ii) parecer prévio prestado pelo Conselho de Coordenação de Avaliação da Direção Municipal de Desenvolvimento Humano e Social, tomado em reunião de 17.05.2010, resulta cristalino que foram as circunstâncias de (i) ter já sido atribuída, no serviço do Autor, a notação de Muito Bom a trabalhadores com a categoria de Assistente Operacional e (ii) por se considerar que deve existir uma diferenciação na avaliação comparativa entre os avaliadores de cada categoria profissional, que motivaram o não acolhimento da reclamação apresentada pelo Autor, aqui Recorrente.
Sucede, porém, que a fundamentação que o Recorrido mobiliza neste domínio, e que se mostra supra sintetizada, é manifestamente insuficiente no sentido da sua conformação com o dever de fundamentação reforçado que se impunha neste caso.
Com efeito, dela apenas consta a invocação de que o indeferimento da pretensão do Autor ficou-se a dever a razões conexas com o sistema de preenchimento de quotas.
Contudo, fica-se sem saber as razões pelas quais foi o Autor, aqui Recorrente, e não outro, que incidiu o efeito restritivo decorrente daquele aplicação de sistema de quotas e de mérito e excelência.
Ora, não basta fazer um apelo genérico ao sistema de preenchimento de quotas, sendo necessário, na senda do que se decidiu no mencionado aresto deste T.C.A.N. de 25.02.2012, explicitar que razões concretas é que levaram a desconsiderar a pretensão do Autor por decorrência da aplicação do efeito restringente do apontado sistema de quotas ao Autor em detrimento dos demais.
Na ausência de tal explicitação/fundamentação, os interessados ficam sem possibilidade de saber exatamente quais as razões por detrás das escolhas da Administração.
Eventualmente, poderá formular-se um palpite sobre qual terá sido a motivação subjacente à tomada de tal decisão em matéria de preenchimento de quotas.
Mas, os interessados têm direito a conhecer com exatidão o critério seguido, para poderem impugnar o ato que afeta as suas esferas jurídicas com todas as possibilidades impugnatórias, designadamente a nível de pressupostos de facto e de direito.
É este o alcance essencial do direito à fundamentação dos atos administrativos.
Deste modo, não tendo sido este o caminho trilhado na sentença recorrida, é mandatório concluir pela procedência do erro de julgamento de direito ora em análise.
E este julgamento tem direta repercussão nos demais vetores sustentadores do presente recurso jurisdicional.
De facto, mostrando-se adquirido que, no âmbito da reclamação apresentada pelo Autor, não foi ponderado o “real mérito do avaliado”, mas antes razões conexas com o sistema de preenchimento de quotas, resulta cristalino que ficou grandemente esvaziado o direito do Recorrente em obter uma verdadeira reavaliação do seu desempenho nos termos e com o alcance que derivam dos artigos 8º e seguintes da Lei nº. 10/2004, de 22.03, e 3º e seguintes da Decreto Regulamentar 19-A/2004, de 14 de maio.
Pelo que não se pode deixar de concluir que não andou bem o MMº Juiz a quo julgar de forma diversa.
Face ao que se vem de julgar, resta-nos, pois, a questão de saber se a condenação em custas do Recorrente imposta na sentença recorrida é [ou não] violadora do disposto nos artigos 310°, n° 3, do RCTFP e 4°, n° 1, alínea f), do RCP, 87°, n° 2, do CPTA e o princípio do caso julgado.
E a resposta é, adiante-se já, negativa.
Na verdade, o Recorrente labora em manifesto equívoco quanto ao erro de julgamento argumentado em matéria de condenação em custas.
Na verdade, e se bem se interpreta o pensamento vazado nas conclusões de recurso, a Recorrente entende que houve lugar à sua condenação efetiva nas custas devidas pelo processo.
Todavia, contrariamente ao entendimento perfilhado pelo Recorrente, o Tribunal a quo não determinou a sua condenação em termos de efetividade nas custas do processo.
Diferentemente, fez verter no dispositivo a seguinte determinação em custas:” Por totalmente vencido, condeno o Autor em custas, nos termos do artigo 527.° do CPC, sem prejuízo da isenção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea f) do RCP e no artigo 310.°, n.° 3 do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas”.
Ou seja, o Tribunal a quo, embora tenha atribuído ao Autor a responsabilidade pelo pagamento das custas do processo, isentou-o do pagamento das mesmas.
E quanto a este quadro condenatório constitui suporte legal o disposto no artigo 4.°, n.° 1, alínea f) do RCP e no artigo 310.°, n.° 3 do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas.
De tudo o quanto vem de se expor deriva, que quanto ao assim decidido, que não se antolha a existência de qualquer elemento substancial que permita concluir pela existência do invocado erro de julgamento.
Improcedem, por isso, as conclusões i) a l) do recurso.
Mercê de tudo o quanto ficou exposto, deverá ser concedido parcial provimento ao presente recurso jurisdicional, revogada a sentença recorrida e julgada totalmente procedente a presente ação.
Assim se decidirá.
* *
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO ao recurso jurisdicional “sub judice”, revogar a sentença recorrida, e julgar a presente ação procedente.
Custas pelo Recorrente e Recorrido, na proporção de 1/3 e 2/3, respetivamente, sem prejuízo da isenção de que goza o Recorrente.
Registe e Notifique-se.
* *
Porto, 31 de janeiro de 2020,


Ricardo de Oliveira e Sousa
Fernanda Brandão
Helder Vieira