Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00018/23.5BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/20/2023
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:ATO DE EXCLUSÃO DE PROPOSTA;
DECLARAÇÃO DO ANEXO I) AO CCP - ESCLARECIMENTO E SUPRIMENTO DE PROPOSTA;
LEI INTERPRETATIVA; LEI INOVADORA;
Sumário:
I – Nos termos do artigo 57º, nº.1, alínea a), do CCP, a proposta é constituída, de entre outros, pela declaração do anexo I) do CCP, da qual faz parte integrante.

II – Apresentando distintivo que um dos candidatos não logrou apresentar tal declaração, deve concluir-se no sentido da existência de um fundamento de exclusão da sua proposta, nos termos do artigo 146º, nº.2, alínea d), do CCP, na redação anterior ao Decreto-Lei nº. 78/2022, de 07.11.

III- Não pode ser objeto de “prestação de esclarecimentos” aquilo que não existe no procedimento concursal, sendo de qualificar como formalidade essencial” a exigência legal à qual o legislador comina com a sua inobservância com a exclusão da proposta.

IV- O que nos transporta para evidência da inaplicabilidade ao caso versado do disposto no artigo 72º, n.ºs 2 e 3 do C.C.P, na redação anterior ao Decreto-Lei nº. 78/2022, de 07.11.

V- A redação dada ao CCP pelo Decreto-Lei nº. 78/2022, de 07.11., não conforma qualquer lei interpretativa do C.C.P. em matéria de prestação de esclarecimentos e suprimento de irregularidades prevista no seu artigo 72º, mas antes configura uma lei disruptora da previsão legal até então estabelecida.
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte - Secção de Contencioso Administrativo, subsecção de Contratos Públicos:
* *
I – RELATÓRIO
1. [SCom01...] E.I.M., S.A. e [SCom02...], S.A., aquela Ré e esta Contra-interessada nos autos à margem referenciados de AÇÃO DE CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL em que é Autora [SCom03...], S.A., vêm interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que julgou “(…) a presente ação procedente e, em consequência: i) Anul[ou] os actos de exclusão da proposta apresentada pela Autora aos lotes 1 e 2 concursados, contidos na deliberação, de 19.12.2022, do Conselho de Administração da Ré; ii) Conden[ou] a Ré à prática de acto administrativo que admita a proposta apresentada pela Autora aos lotes 1 e 2 concursados e, ainda, que ordene essa mesma proposta em primeiro lugar; iii Anul[ou] os actos de adjudicação da proposta apresentada pela Contra-interessada [SCom02...], S.A. aos lotes 1 e 2 concursados, contidos na deliberação, de 19-12-2022, do Conselho de Administração da Ré; iv) Conden[ou] a Ré à prática de acto de adjudicação da proposta apresentada pela Autora aos lotes 1 e 2 concursados; v) Anul[ou] o contrato de empreitada celebrado entre Ré e a Contra-interessada [SCom02...], S.A., em 06-01-2023, designado por “Execução de VRP's nos sistemas de abastecimento de água nos municípios do núcleo do Douro e Corgo – 2ª fase”, na parte referente aos lotes 1 e 2; e, por fim, vi) Conden[ou] a Ré a celebrar esse mesmo contrato com a Autora, na parte referente aos lotes 1 e 2 (…)”.
2. Alegando, a Recorrente [SCom01...] formulou as seguintes conclusões: “(…)
1. Em causa está a correta aplicação conjugada do disposto nos Artigos 57.° número 1, alínea a) e 146.° número 2 alínea d) do CCP.
2. A Sentença recorrida do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela acolhe uma interpretação, que pensamos ser pioneira e, como tal, única na nossa Jurisprudência, apontando para uma solução sem qualquer adesão ao CCP e, como tal, suscetível de redundar num elevado clima de incerteza e insegurança jurídica (uma vez que muitos dos intervenientes na Contratação Pública não são Juristas e apenas têm o texto da Lei como a sua bússola comportamental no desempenho de funções de, por exemplo, Júri do Procedimento).
3. A não apresentação da Declaração que consta do Anexo I ao CCP, a que alude o Artigo 57.°, número 1 alínea a) do CCP, assume-se nos termos do CCP como uma formalidade essencial e, como tal não passível de ser suprida.
4. O seu carácter essencial é absolutamente sublimado, com o facto de a apresentação desta Declaração ser taxativamente obrigatória nos termos do CCP, mais concretamente nos termos do mencionado Artigo 57.° do CCP quando refere que “A proposta é constituída pelos seguidos documentos" pelo que, a sua não apresentação por parte da Recorrida, nos termos do disposto no supra mencionado Artigo 57.° número 1, alínea a) ex vi do Artigo 146.° número 2, alínea d), ambos do CCP, assume-se como um inquestionável motivo para exclusão da Proposta em causa.
5. Assim, nesta linha de raciocínio encontrando-se a Declaração em causa nesses documentos essenciais, mais concretamente no primeiro número deste preceito, na sua primeira alínea, entendemos que, de acordo com o CCP à época vigente, não pode a ausência da mesma ser objeto de suprimento por iniciativa do Júri do Procedimento ou, fora do prazo definido para a apresentação de Propostas, por parte de um qualquer Concorrente que a tenha olvidado.
6. A Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela objeto do presente Recurso, no sentido de permitir esse suprimento fora de tempo, para além de se assumir ao completo arrepio do regime estatuído pelo CCP, viola de forma gritante o Princípio da Legalidade bem como, os Princípios da Imparcialidade, da Concorrência e da Igualdade de tratamento entre Concorrentes.
7. Viola o Princípio da Legalidade uma vez que pretende que a Recorrente atue contra a Lei, in casu, contra o regime estatuído pelo CCP.
8. Atinge também de forma clara o Princípio da Imparcialidade uma vez que se subsume num comportamento a favor da Recorrida sem qualquer fundamento legal para o efeito e, como tal, sem a objetividade que se impõe à Administração na sua atuação.
9. A Sentença aqui em crise proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela atinge ainda o Princípio da Concorrência uma vez que, ao pretender ver ser Adjudicado um Contrato a um Concorrente que ostensivamente violou o CCP, trata este Concorrente de forma desigual relativamente a outros interesses no procedimento, introduzindo assim uma inaceitável, ilegal e desproporcional na concorrência que a Contratação Pública pretende (e bem) suscitar.
10. Violando desta forma o Princípio da Concorrência, a Sentença de que se recorre tem também o condão de violar assim também de forma ostensiva o Princípio da Igualdade de Tratamento entre Concorrentes porque, desconsidera profundamente os demais Concorrentes, como a Contra-Interessada [SCom02...], S.A., que cumpriram escrupulosamente com o estatuído pelo CCP.
11. Entendemos que não se poderá assumir a apresentação em conjunto com a Proposta da mencionada da Declaração de Aceitação do Conteúdo do Caderno de Encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do Anexo I do CCP como uma formalidade não essencial, não sendo aqui aplicável a Doutrina do Aproveitamento do Ato Administrativo uma vez que, em matéria de Contratação Pública (matéria muito sensível tendo sempre presente o Princípio da Concorrência), o recurso à teoria do aproveitamento do acto administrativo e da degradação das formalidades essenciais em não essenciais, para efeitos de salvar uma proposta irregular ou de evitar o efeito excludente dessa irregularidade (quando taxativamente previsto no CCP), terá forçosamente de ser encarado como uma situação de exceção.
12. Perante todo este pano de fundo, resulta para nós como cristalinamente claro que o Júri do Procedimento, porque subordinado em primeira instância ao Princípio da Legalidade, não dispunha de qualquer fundamento legal que lhe possibilitasse, sem ferir os mais elementares direitos dos demais Concorrentes, não excluir uma Proposta que não cumpre com um requisito básico e elementar do CCP: a apresentação em conjunto com a Proposta da Declaração que consta do Anexo I ao CCP, a que alude o seu Artigo 57.° número 1, alínea a).
13. Pelo que, ao contrário do que refere a Sentença recorrida do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, não poderia de forma alguma e, particularmente de forma legalmente admissível, o Júri do Procedimento, em sede de análise a avaliação das Proposta apresentadas, substituir-se nas suas funções à ora Recorrida, enquanto Concorrente, no procedimento concursal em causa neste Recurso.
14. Nesta sequência, resulta claro e uniforme o entendimento Doutrinal no sentido de que, na vigência do CCP aqui em causa, a admissão póstuma da Declaração do Anexo I ao CCP defendida pela Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, porque ilegal, não é juridicamente admissível.
15. Acresce que, a posição vertida na Sentença recorrida, defendendo que vários elementos da referida Declaração já integram outros documentos numa tentativa de desqualificar a necessidade de apresentação da mesma, trata-se de um raciocínio jurídico esforçadíssimo, sem qualquer enquadramento no texto e no espírito do CCP, por todos os motivos já explanados supra. Trata-se por isso de uma Interpretação Contra Legem.
16. Sucede ainda que a Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela reconhece que “ o problema é já mais complexo no tocante aos pontos 1 a 3 do modelo de declaração do Anexo I ao CCP, porque aí já contende mais especificadamente com os termos da formação da vontade negocial das partes”. Ou seja, mesmo que se considere na análise concreta desta matéria a dicotomia entre formalidades essenciais e não essenciais, olhando para a globalidade do conteúdo da mencionada Declaração que consta do Anexo I ao CCP, tratando-se, como a própria Sentença reconhece, de uma verdadeira declaração negocial da Parte, nunca se poderia considerar como uma formalidade não essencial.
17. Não poderá, desta forma, nunca assumir-se como uma formalidade não essencial a declaração negocial de uma Parte, na qual ela se vincula e fica vinculada aos exatos termos da Proposta a apresentar, sendo a própria Sentença, na parte supra mencionada, que lhe confere esta capital relevância.
18. Em complemento a este facto e analisando com atenção para a própria estrutura da Declaração, que entendemos ter justificado a sua individualização pelo CCP, a mesma assume uma verdadeira natureza negocial e não, como se de um qualquer formalismo estéril se tratasse.
19. Ademais, para além da mencionada importância negocial e das cominações que o CCP lhe confere, a apresentação da mesma demonstra uma boa fé negocial e um cuidado que não poderão nunca ser olvidados pela análise do Júri de um determinado procedimento concorrencial.
Por outro lado,
20. O disposto no Artigo 9.° número 1 do Código Civil estatui que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada, não se devendo nunca olvidar que o pensamento legislativo, não pode ser atingido e considerado pelo bom intérprete quando não tenha na lei um mínimo de correspondência verbal.
21. Estando em causa neste Recurso a correta interpretação e aplicação conjugada do disposto nos Artigos 57.° número 1, alínea a) e 146.° número 2 alínea d) do CCP, não pode deixar de ser referir que quando nos reportamos à Interpretação efetuado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, estamos perante uma interpretação, que pensamos ser pioneira e, como tal, única na nossa Jurisprudência, que aponta para uma solução tão alargada do sentido destas normas que esvazia praticamente todo o seu sentido útil, sendo certo que tal interpretação não cabe na literalidade do preceito.
22. Interpretação essa que deverá ser devidamente retificada em função do presente Recurso, sob pena a sua materialização redundar num elevado clima de incerteza e insegurança jurídica (uma vez que muitos dos intervenientes na Contratação Pública não são Juristas e apenas têm o texto da Lei como a sua bússola comportamental no desempenho de funções de, por exemplo, Júri do Procedimento) uma vez que o disposto nos Artigos 57.° número 1, alínea a) e 146.° número 2 alínea d) do CCP contém um comando normativo que não permite ao julgador a ponderação discricionária dos interesses em jogo por forma a suspender a sua aplicabilidade com a fundamentação constante na Sentença objeto deste Recurso.
23. Determina assim a Lei, neste caso o CCP, que o Júri do Procedimento teria sempre de excluir a Proposta apresentada pela Recorrida em resultado de a mesma não ter instruído a sua Proposta com a Declaração que consta do Anexo I ao CCP, nos termos do disposto no Artigo 57.° número 1, alínea a) do CCP.
24. Só esta interpretação tem correspondência com a letra e com o espírito do preceito e se ajusta com o pensamento do legislador e da coerência do sistema jurídico no seu todo na data em que a mesma foi proferida.
Importa ainda atender ao facto de,
25. Constitui entendimento da Recorrente que a não junção da declaração de preços parciais a que se refere o disposto no Artigo 60.° número 4 do CCP, implica per si a exclusão da proposta uma vez que a não apresentação desta lista trata-se da preterição de uma formalidade essencial do conteúdo da Proposta, que se aplica diretamente aos concorrentes, sem necessidade sequer de estar prevista no programa de procedimento (cfr. Artigo 51.° do CCP) e que diz respeito a atributos da proposta.
26. Mais se entende que a não apresentação da lista de preços parciais consubstancia uma ilegalidade, pelo que aceitar-se a possibilidade de avaliação e graduação de uma Proposta em concreto sem a referida declaração como pretende fazer valer a Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela de que se recorre, significaria a consagração de uma situação de favor, violadora dos princípios fundamentais da Contratação Pública e da própria Constituição da República Portuguesa.
27. Nos termos do CCP, no âmbito do procedimento de formação de um Contrato de Empreitada de obra pública, todos os Concorrentes devem indicar nas respectivas propostas os preços parciais dos trabalhos que se propõem efetuar, correspondentes às habilitações contidas nos alvarás, para efeitos de verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.
Indicação essa que deverá ser formalizada independentemente dessa exigência constar ou não do Programa do Procedimento.
28. Assim, dúvidas não nos subsistem dúvidas de que a obrigação de os Concorrentes apresentarem a declaração a que se reporta o Artigo 60.° número 4 do CCP com a respectiva Proposta, decorre de uma imposição legal e, como tal, a exigência da sua apresentação não está dependente da sua previsão ou não em particular no Programa do Procedimento.
29. Andou assim mal o Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela também na análise a esta questão concreta uma vez que e o próprio CCP, enquadrado pelos elementos histórico, sistemático, teleológico e a unidade do Sistema Jurídico, que nos conduz conclusão de que a não apresentação da Declaração prevista no Artigo 60.° número 4 do CCP só pode levar à exclusão de uma Proposta uma vez que a mesma contende diretamente com a correta avaliação da mesma.
30. Este preceito tem no nosso entendimento precisamente o objetivo de permitir à Entidade Adjudicante verificar a adequação dos alvarás aos trabalhos a executar, de forma a que fique assegurado que quem vai executar os trabalhos possui os necessários alvarás habilitantes (Cfr. leitura conjugada do disposto no Artigo 60.° número 4 e Artigo 81.°, número 2 do CCP), facto essencial para o Interesse Público subjacente à boa execução do Contrato Público aqui em causa.
31. Ao não o ter concretizado, a ora Recorrida não só violou ostensivamente o disposto no CCP, como tornou impossível a correta avaliação da sua Proposta por parte do Júri do Procedimento uma vez que, para que seja possível aferir a adequação da classe dos alvarás é necessário conhecer o valor dos trabalhos especializados de construção, o que implica a indicação dos respetivos preços parciais.
32. Uma vez que este tipo de contratos incluem prestações de vária natureza e na maioria das vezes vários prestadores, o cálculo destes preços por parte da Recorrente é completamente inviabilizado pela não apresentação dos mencionados preços parciais.
33. Sobre esta questão, importa ainda sublinhar que a Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela não analisa nada do que está no probatório, limitando-se apenas a referir que “À guisa de conclusão, o Júri não deveria ter considerado relevante a falta de apresentação da lista de preços parciais ou, pelo menos, convidar a Autora a apresentar tal lista em conformidade com o artigo 60°, n° 4, do CCP. Não o tendo feito, é ilegal a exclusão da proposta da Autora com esse fundamento.” Não tomando assim, efetivamente, qualquer posição sobre esta matéria.
Por último,
34. Ao condenar a Recorrente a adjudicar à Recorrida e com ela celebrar Contrato, a Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela viola abruptamente as competências do Júri do Procedimento, definidas no Artigo 69.° do CCP, nomeadamente no que toca à análise das Propostas (Cfr. Artigo 70.° do CCP). Violação essa que, por constituir uma enorme intromissão nos poderes atribuídos ao Júri do Procedimento pelo CCP, consideramos inaceitável e que entendemos deverá merecer por parte de V. Exas. um forte juízo de censura.
35. A Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela de que se recorre consegue desta forma fazer a síntese perfeita entre o pior de dois Mundos: por um lado viola ostensiva e diversas formas a Lei aplicável (o CCP); e, por outro lado a discricionariedade administrativa atribuída pelo CCP ao Júri do Procedimento (…)”.
*
3. Já quanto ao seu recurso, a Recorrente [SCom02...] rematou nos seguintes termos: “(…)
1 - Embora não comungando da douta decisão proferida em crise e da respetiva fundamentação, a Recorrente não pode deixar de começar por manifestar a sua concordância com dois dos pressupostos de que a mesma partiu, e que, salvo o devido respeito por opinião contrária, conduzem a um desfecho decisório diametralmente oposto ao adotado pela douta decisão recorrida, o que não pode deixar de configurar uma certa contradição entre a decisão proferida e a fundamentação subjacente;
2 - O primeiro dos pressupostos de que a douta decisão recorrida partiu, prende-se com a constatação de que a jurisprudência nunca, até à data, se debruçou sobre a questão controvertida concreta suscitada nos presentes autos, o que só pode significar uma de duas coisas: que todos os concorrentes, nos milhares de procedimentos concursais processados desde a publicação do Dec. Lei n° 111-B/2017, cientes da sua importância e das consequências da sua não apresentação, sempre apresentaram a declaração a que se refere a alínea a) do n° 1 do artigo 57 do CCP;
3 - Ou então, os que, por qualquer motivo, não apresentaram a referida declaração, não lograram encontrar argumentos para impugnar a decisão administrativa que concluiu pela exclusão da respetiva proposta, tal é a clareza da redação, então em vigor, dos artigos 57, n° 1, alínea a) e 146, n° 2, alínea d), ambos do CCP (na redação dada pelo Decreto Lei 111- B/2017), que determinam de forma expressa e categórica, a exclusão da proposta prevaricadora. Recorde-se que, este foi a postura do concorrente “[SCom04...], LDA“ que, confrontada com a exclusão da sua proposta (vencedora) para o lote 3, precisamente com o mesmo fundamento de ausência da referida declaração, não esboçou qualquer reação (judicial) à respetiva decisão;
4 - O segundo pressuposto subjacente à douta decisão em crise e que merece, igualmente, a concordância da aqui Recorrente, refere-se ao entendimento do douto Tribunal recorrido, segundo o qual “... o Decreto Lei n° 78/2022 não consubstancia uma lei interpretativa, mas antes uma lei inovadora, e, por conseguinte, é aplicável à situação em crise o artigo 72° na redação dada pelo Decreto-Lei n° 111-B/2017, de 31 de agosto”.
5- Da leitura das duas redações (prévia e pós Dec. Lei n° 78/2022, de 07 de novembro) resulta, claramente, uma alteração radical do entendimento do legislador no que toca à não apresentação da declaração do anexo I ao CCP e respetivas consequências;
6 - Na redação anterior às alterações do Dec. Lei n° 78/2022 (aplicável à situação dos autos), prevê a exclusão da proposta que não inclua a referida declaração, nada se prevendo quanto à possibilidade de sanação desse vicio, designadamente, por recurso ao mecanismo previsto no artigo 72° do CCP. Diversamente, na redação introduzida com a publicação do referido Dec. Lei n° 78/2022, embora mantendo a sanção de exclusão da proposta prevaricadora, admite-se, agora, a possibilidade de sanação desse vicio, com recurso ao mecanismo do n° 3 do artigo 72° do CCP;
7 - Não sendo o Decreto Lei n° 78/2022, assumidamente, uma norma interpretativa, como muito bem refere a douta decisão em crise e, portanto, vigorando o seu conteúdo apenas para o futuro, tal só pode ser interpretado como uma mudança no entendimento do legislador, no que diz respeito à possibilidade de sanação do vicio da proposta que não apresenta a declaração prevista na alínea a), do n° 1 do artigo 57° do CCP. Ou seja,
8- A nova redação, introduzida pelo Dec. Lei n° 78/2022 ao n° 3 do artigo 72° do CCP, só pode significar que, até à entrada em vigor deste diploma, a falta da declaração do anexo I ao CCP consubstanciava a omissão de uma formalidade essencial, não sendo, por isso, suscetível de ser suprida. E, pelo contrário, com a nova redação emergente da citada alteração legislativa, instituiu-se um novo entendimento, segundo o qual a omissão da referida declaração consubstancia a omissão de uma formalidade não essencial, suscetível de ser suprida pelo mecanismo previsto no artigo 72°, n° 3 do CCP;
9- Não obstante a diferença de redação do referido n° 3 do artigo 72° do CCP, e da alteração radical do entendimento do legislador quanto à possibilidade de sanação da falta da declaração da declaração do Anexo I ao CCP, o Mm° Juiz “a quo”, considerou, mesmo assim, ser de aplicar à situação dos autos o mecanismo previsto no seu n° 3, convidando-se à apresentação da declaração ou aceitando-se a sua apresentação póstuma espontânea;
10- Interpretação que sustenta no entendimento de que a referida admissão não belisca, por qualquer forma, os princípios da concorrência e igualdade de tratamento, estando desta forma legitimado o recurso ao convite a que se refere o número 3 do artigo 72° do CCP;
11- A ser válido este entendimento, que não se aceita, e não estando nós perante uma lei interpretativa (como muito bem defende a douta decisão em crise), impõe-se indagar, porque razão sentiu o legislador necessidade de, com a publicação do Decreto Lei n° 78/2022, alterar a redação do referido n° 3, passando a prever expressamente o recurso ao convite para sanar a falta de apresentação da declaração do Anexo I ao CCP ? Aliás,
12 - A ser válido o entendimento sufragado pelo Mm° Juiz “a quo”, não se impunha qualquer alteração na redação desta disposição legal, sendo suficiente comungar do entendimento da douta decisão em crise e, assim, considerar que a admissão póstuma daquela declaração, não põe em causa o princípio da concorrência e da igualdade de tratamento, pelo que a omissão daquele documento configuraria a preterição de uma formalidade não essencial e, por isso, suprível nos termos da citada disposição legal;
13 - Afigura-se-nos, pois, como evidente que, a alteração legislativa operada pela publicação do Dec. Lei n° 78/2022, visou consagrar uma alteração significativa do entendimento do legislador, quanto à possibilidade de sanação da falta de declaração do anexo I ao CCP com recurso ao disposto no n° 3 do artigo 72°;
14 - Na análise e fundamentação desenvolvida em sustentação do entendimento sufragado, ou seja, de que a omissão da referida declaração configuraria sempre a omissão de uma formalidade não essencial, o Mm° Juiz “a quo” defende “que os pontos 4 a 7 são mais facilmente supríveis, na medida em que se reportam à declaração de factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta”;
15 - Reconhecendo, contudo, que “O problema é já mais complexo no tocante aos pontos 1 a 3 do modelo de declaração do Anexo I ao CCP, porque aí já contende mais especificamente com os termos da formação da vontade negocial das partes”, objeção evidente que a douta decisão recorrida procura contornar, com o entendimento de que a “apresentação da maior parte dos documentos que constituem a proposta pode até ser entendida, como uma declaração tácita do conteúdo contemplado no anexo I do CCP”;
16 - Salvo o devido respeito, trata-se de entendimento que jamais poderá ser sufragado, pois tal equivaleria: (i) a afirmar a total inutilidade da declaração prevista na alínea a) do n° 1 do artigo 57; (ii) à consagração legislativa da prática de actos inúteis; (iii) a retirar o propósito e a relevância da sanção estabelecida na alínea d) do n° 2 do artigo 146° do CCP;
17 - Contrariamente ao pugnado na douta decisão em crise, entende-se que a não apresentação - no momento da entrega da proposta - dos documentos exigidos no artigo 57°, n° 1 e 2 do CCP, nomeadamente da declaração prevista na alínea a) do seu n° 1, não configura uma mera irregularidade formal não essencial, suscetível de ser suprida ao abrigo e nos termos do disposto no artigo 72°, n° 3 do CCP, constituindo, pelo contrário, uma causa de exclusão da proposta, nos termos do disposto no artigo 146°, n° 2, alínea d) do CCP e cuja omissão, por não configurar uma formalidade não essencial, não é passível de suprimento por via do pedido de esclarecimento ou de apresentação póstuma espontânea;
18 - Ao determinar a exclusão prevista na alínea d), do n° 2, do artigo 146° do CCP, o legislador considerou essencial a formalidade omitida, pois as declarações de vinculação nela insertas não são despiciendas, antes constituindo declarações de garantias fundamentais para a Entidade Adjudicante. A declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, e restantes declarações nela insertas, visam conferir segurança jurídica na manifestação da vontade de contratar por parte do concorrente, assim como, garantir que no procedimento pré-contratual não participam entidades abrangidas pelas situações de impedimento previstas no artigo 55° do CCP;
19 - O disposto no artigo 72°, n° 3 do CCP (na versão aplicável à situação dos autos) não tem, portanto, a virtualidade de afastar a aplicação de normas de exclusão relativas ao não cumprimento de formalidades essenciais (como são as relativas à declaração de compromisso a que se reporta a declaração do Anexo I ao CP), nem de afastar a aplicação da norma legal de exclusão constante da alínea d) do n° 2, do artigo 146° do CCP;
20 - A não ser assim, ou seja, a admitir a possibilidade de suprimento da falta de tal declaração estar-se-ia, perante uma autentica antinomia jurídica, derivada do facto de o ordenamento jurídico, em tal cenário hipotético, reputar como essencial a apresentação da declaração do Anexo I com a proposta, pela importância fundamental que as declarações nela insertas assumem (seja em termos de vinculação ao caderno de encargos, seja para efeitos de acesso ao mercado publico por parte dos interessados), e, ao mesmo tempo, permitir o suprimento desta omissão através da sua junção em momento posterior ao da proposta;
21 - Subscreve-se a este propósito a posição de Luís Verde de Sousa (in Comentários à revisão do Código dos Contratos Públicos, 218, pág. 519), segundo o qual:
“quanto aos seus aspetos formais, o CCP veio tipificar (essencialmente o n° 2 do artigo 146o), um conjunto de irregularidades que devem determinar a exclusão da proposta. Ora, tais causas de exclusão não são mais do que o resultado da ponderação realizada pelo legislador a propósito das diferentes exigências de caráter formal colocadas às propostas. Com efeito, se o legislador optou por sancionar a inobservância de tais formalidades com a exclusão da proposta foi certamente porque o mesmo reputa de essenciais para a salvaguarda dos princípios basilares da contratação publica. De outra forma, não faria sentido que à sua violação fosse associada a consequência mais grave que uma proposta pode conhecer: a sua exclusão. Não nos parece, assim, que, a propósito de cada caso concreto, o interprete possa aferir, para efeitos de (des)qualificação de uma determinada formalidade, se a violação põe, ou não, em causa os mencionados princípios da contratação pública, no que seria uma verdadeira reponderação da solução legalmente prevista”.
22 - Afigura-se-nos, pois, como único com acolhimento à luz das disposições legais aplicáveis, o entendimento segundo o qual a Declaração do Anexo I ao CCP, é de apresentação obrigatória das propostas e com as propostas, não sendo a sua falta suscetível de ser suprida em momento posterior nos termos e ao abrigo do disposto no n° 3 do artigo 72° do CCP, na versão em vigor à data da publicação do respetivo programa de procedimento (redação dada pela Lei n° 30/2021, de 21 de maio, com a Retificação n° 25/2021, de 21 de julho);
23 - Sendo a sua falta de apresentação, inelutavelmente, sancionada com a exclusão das respetivas propostas (artigo 146°, n° 2, alínea d. do CCP), pelo que, mal andou a douta decisão em crise a determinar a anulação do acto de exclusão da proposta apresenta pela Recorrida e subsequente admissão e graduação da mesma em primeiro lugar; Depois,
24 - Como resulta dos autos, as propostas apresentadas pela Recorrida, também não incluem a declaração de preços parciais a que esta estava obrigada, quer por força do disposto no n° 4 do artigo 60°, quer por força do previsto na alínea a.1) do ponto n° 7.1, ponto 23 e Anexo III do programa de procedimento;
25 - Como é unanimemente aceite, “O programa do concurso público assume a natureza jurídica regulamentar, funcionando como parâmetro normativo-regulamentar em relação aos atos administrativos e demais atos procedimentais praticados no decorrer do concurso público, projetando-se assim as suas disposições no domínio da legalidade validade administrativas dos atos praticados no seu seio por qualquer das pessoas que nele intervêm, incluindo a entidade adjudicante que fica auto vinculada ao bloco de legalidade por ela instituído no Programa de Concurso” (Mário Esteves de Oliveira, in Concursos e outros Procedimentos de Adjudicação, Almedina, 2005, p. 131). No mesmo sentido Margarida Olazabal Cabral in O Concurso Público nos Contratos Administrativos, pág. 170 a 176);
26 - O Programa de Procedimento dos autos é expresso a exigir declaração de preços parciais a que se refere o n° 4 do artigo 60° do CCP e segundo o qual “o concorrente deve indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás pelo que, a falta de junção da declaração de preços parciais a que se refere o artigo 60°, n° 4, do CCP, configura a preterição de uma formalidade essencial do conteúdo da proposta, que determina a exclusão da respetiva proposta;
27 - Estando em causa a violação de uma norma injuntiva/imperativa que regula a indicação do preço nas propostas, a sanção aplicável é a exclusão da proposta prevaricadora. Tal é a sanção que resulta, quer da aplicabilidade direta do artigo 146°, n° 2, alínea d), quer das disposições conjugadas dos artigos 146°, n° 2, alínea o), artigo 70°, n° 2, alínea a), artigo 57°, n° 1, alínea b) e artigo 56°, n° 2, todos os CCP;
28 - A não apresentação da lista de preços parciais, consubstancia uma ilegalidade, para além de que, a manutenção da douta decisão configuraria, sempre, a violação dos princípios da legalidade, transparência, igualdade, concorrência e imparcialidade, pois, a admissão da respetiva proposta sempre significaria a consagração de uma situação de favor, injusta e injustificada, em relação aos demais concorrentes que perante as mesmas circunstâncias, deram cumprimento ao estipulado no Programa de Procedimento e no disposto no n° 4 do artigo 60°;
29 - A interpretação do artigo 60°, n° 4 do CCP, no sentido de que a falta de entrega, aquando da apresentação da proposta, da declaração de preços parciais, determina a exclusão do concorrente cuja proposta não tenha observado tal formalidade, constitui a única compatível com as citadas disposições legais. Neste sentido veja-se o decidido no douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, datado de 27-10-2011, proferido no processo n° 315/11.2BEAVR, disponível no site www.dgsi.pt. e cujo sumário, pela sua relevância, se transcreveu, parcialmente, no item 53° supra;
30 - Ciente desta consequência legal para a preterição da formalidade em causa, a Recorrida ensaia o apelo à dogmática da degradação das formalidades essenciais em não essenciais, como forma de conseguir a sua pretensão de ver anulado o ato de exclusão da sua proposta e dos demais que se lhe seguiram que, salvo o devido respeito por opinião diversa, não se nos afigura viável na situação sub iudice, até porque o recurso à teoria da degradação das formalidades essenciais em não essenciais, como forma de evitar o efeito excludente de uma preterição de formalidades, legalmente determinado, terá de ser encarado como uma situação de exceção, o que manifestamente não é o caso;
31 - Bem andou o Júri do procedimento ao se pronunciar pela exclusão das propostas da Recorrida, decisão que se impõe confirmar, seja por força do disposto no artigo 146°, n° 2, alínea d) do CCP, seja em consequência das disposições conjugadas dos artigos 146°, n° 2, alínea o), artigo 70°, n° 2, artigo 57°, n° 1 e alínea b) e artigo 56°, n° 2, todos os CCP, e que, de forma alguma, viola quaisquer disposições legais aplicáveis nem, tão pouco, põe em causa nenhum dos princípios invocados pela Recorrente, designadamente, os princípios da igualdade de tratamento e da concorrência;
32 - Face a todo o exposto, impõe-se a revogação da douta decisão em crise (essa sim violadora das citadas normas e princípios legais) e, consequentemente, a manutenção de todos os atos praticados pela Ré Adjudicante, neles se incluindo o ato de adjudicação e o contrato de empreitada celebrado com a aqui Recorrente (…)”.
*
4. Notificada que foi para o efeito, a Recorrida [SCom03...], S.A., produziu contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos: ”(…)
A. O presente Recurso vem interposto pela Ré [SCom01...] e pela Contrainteressada [SCom02...], ora Recorrentes, da sentença proferida, em 13.06.2023, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, que julgou totalmente procedente a ação proposta pela Autora, aqui Recorrida, tendo o Tribunal a quo determinado a anulação (i) do ato de exclusão da proposta apresentada pela [SCom03...] aos lotes 1 e 2 concursados, (ii) do ato de adjudicação do concurso público e do (iii) contrato de empreitada celebrada entre a [SCom01...] e a [SCom02...] para a execução de VRP's nos Sistemas de Abastecimento de Água nos Município ... e Corgo;
B. Nos termos da sentença recorrida, o Tribunal a quo condenou a [SCom01...] (i) à prática do ato administrativo que admita a proposta da [SCom03...] para os lotes 1 e 2, graduando-a em primeiro lugar, (ii) à prática do ato de adjudicação da proposta apresentada pela Recorrida para estes mesmos lotes, e (iii) a celebrar com esta o contrato objeto do procedimento pré-contratual;
C. As Recorrentes entendem que a Sentença padece de nulidade - sem especificar, contudo, quais os concretos fundamentos em que a mesma assentaria - e limitam-se a reiterar o entendimento já sufragado nas respetivas contestações, aproveitando agora para aditar o fundamento de que o Tribunal a quo teria encetado uma interpretação contra legem do bloco de legalidade aplicável, bem como violado a discricionariedade administrativa do Júri do Procedimento.
D. Conforme bem reconheceu o Tribunal a quo a não apresentação da Declaração do Anexo I do CCP não determina a imediata exclusão de uma proposta, sendo que importará sempre analisar o conteúdo de todos os documentos juntos pelos proponentes e, caso ainda assim subsista alguma dúvida ao júri, deverá ser lançada mão do mecanismo de suprimento de irregularidades consagrado no artigo 72.°, n.° 3 do CCP;
E. Contrariamente ao aventado pelas Recorrentes, a materialidade deve prevalecer sobre a forma e, nesta medida, tendo sido possível concluir, dos documentos juntos com a proposta da Recorrida, que esta se "[...] obriga a executar o referido contrato em conformidade com o conteúdo do mencionado caderno de encargos, relativamente ao qual declara aceitar, sem reservas, todas as suas cláusulas” (ponto 1 do Anexo I do CCP), de que "[d]eclara também que executa o referido contrato nos termos previstos nos seguintes documentos, que [já acompanharam a proposta inicialmente]” (ponto 2 do Anexo I do CCP), e de que "[d]eclara ainda que renuncia a foro especial e se submete, em tudo o que respeitar à execução do referido contrato, ao disposto na legislação portuguesa aplicável” (cfr. Anexo III apresentado);
F. A não junção do referido Anexo I não constitui a violação de uma formalidade essencial, antes corresponde a uma irregularidade decorrente da omissão de uma formalidade não essencial, que é passível de suprimento, conforme e bem reconheceu o Tribunal a quo;
G. Em face da natureza da própria declaração do Anexo I do CCP, a sua não apresentação encontra-se abrangida pela previsão do artigo 72.°, n.° 3 do CCP, por se tratar de “documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura”, motivo pelo qual a sua não apresentação poderia - e deveria - ter sido suprida ao abrigo do regime da regularização de propostas, consagrado no artigo 72.°, n.° 3 do CCP;
H. Foi esta a conclusão a que o Tribunal a quo chegou, afirmando-se - e muito bem - na sentença recorrida que havia fundamento para que o Júri tivesse a iniciativa de convidar a prestar esclarecimentos, concluindo a final que o ato de exclusão da proposta da Autora aos lotes 1 e 2 - sem que tenha sido precedido da admissão da apresentação póstuma da declaração do Anexo I ao CCP -, é ilegal;
I. Dito isto, não merece qualquer censura a conclusão de que o carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz (cfr. artigo 217.°, n.° 2, do CC) - cf. página 43 da sentença recorrida;
J. A apresentação de todos os elementos da proposta revela que a Autora quis vincular-se aos aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência e não submetidos à concorrência mediante a apresentação oportuna dos documentos que continham os atributos e os termos e condições fixados pela entidade adjudicante, revelando, ainda, que a Autora quis vincular-se a executar o contrato em conformidade com o conteúdo do caderno de encargos;
K. Se o Júri do Procedimento tinha dúvidas quanto à verificação dos elementos do Anexo I do CCP nos vários documentos da proposta, deveria ter solicitado os esclarecimentos necessários à Recorrida, nos termos do artigo 72.°, n.° 3, do CCP, pelo que não o tendo feito, é por demais evidente que o júri violou os deveres a que estava adstrito, sendo manifestamente ilegal a exclusão da proposta da Recorrida, conforme bem reconheceu o Tribunal a quo;
L. Não resulta da sentença recorrida a violação de quaisquer princípios basilares da contratação pública, como sejam os princípios da legalidade, da imparcialidade, da concorrência e da igualdade de tratamento entre concorrentes;
M. O suprimento da irregularidade identificada sempre passaria pelo crivo dos princípios jurídicos a que a entidade adjudicante está adstrita no exercício das suas funções.
N. O recurso ao regime de suprimento das irregularidades da proposta da [SCom03...] mantém o respeito pelo princípio da concorrência, bem como dos seus corolários dos princípios da imparcialidade e da igualdade de tratamento, na medida em que (i) não só a junção posterior da declaração do Anexo I do CCP é insuscetível de afetar o igual tratamento entre concorrentes, por dela não constarem quaisquer atributos submetidos à concorrência relativamente aos quais incida o critério de adjudicação, como (ii) aproveitaria, também, a outros concorrentes, cujas propostas tenham sido excluídas com o mesmo fundamento, como é o caso da [SCom04...];
O. Não se extrai da sentença recorrida qualquer interpretação contra legem, antes se aplica integralmente o disposto no artigo 72.° n.° 3 do CCP e, bem assim, os princípios norteadores da contratação pública;
P. No documento Proposta de Preço e Lista de Preços Unitários, junto pela ora Recorrida como documento da proposta, a [SCom03...] declara que o preço indicado é composto pelos preços parciais nele indicados, aos quais correspondem as habilitação contidas nos alvarás ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, I.P., sendo que, precisamente para permitir a contraposição dos preços parciais com as suas habilitações, a [SCom03...] indicou o número do alvará de que é titular: Alvará de Construção n.° ..., o que permite ao júri e à entidade adjudicante, através da mera consulta deste Alvará no site do IMPIC, comprovar que a Recorrida detém todas as habilitações exigidas pelo ponto 23.1 do Programa do Procedimento;
Q. Assim, a não junção deste documento não impossibilitou a correta avaliação da proposta da [SCom03...] por parte do júri do procedimento, por ser possível ao júri do procedimento fazê-lo mediante a confrontação da classe de habilitação da Recorrida com os valores da proposta de preço por esta apresentada para cada um dos lotes;
R. Trata-se, por isso, de uma irregularidade que, chamando à colação a teoria da degradação das formalidades essenciais em não essencial, se degradou em não essencial por ser possível atingir o fim que tutelam por outra via, sendo desnecessário proceder ao respetivo suprimento, sendo que, ainda que se considerasse que a formalidade prevista no artigo 60.°, n.° 4, do CCP era essencial, por permitir à entidade adjudicante avaliar se o adjudicatário tem (ou não) habilitações para executar o contrato a celebrar, a verdade é que se degradou numa formalidade não essencial a partir do momento em que passou a ser possível proceder a essa aferição por outra via, nos termos acima expostos, designadamente, através da consulta do Alvará no site do IMPIC;
S. Não existe qualquer violação da discricionariedade administrativa por parte do Tribunal a quo, porquanto o sentido decisório assentou no seguinte: (i) sendo a exclusão da proposta da Recorrida e o ato de adjudicação a favor da Recorrente [SCom02...] ilegais, (ii) devendo o procedimento retomar o seu curso normal e (iii) sendo a proposta da Recorrida a melhor proposta, nada mais restava ao Tribunal que não fosse a condenação da Recorrente [SCom01...] nos termos em que o fez, ao abrigo do disposto no artigo 66.° e seguintes e 100.° n.° 1 do CPTA;
T. Em face do exposto, não assiste qualquer razão às Recorrentes, devendo ser julgado totalmente improcedentes os recursos interpostos e mantida a sentença recorrida nos termos em que foi proferida, por não padecer de qualquer vício (…)”.
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5. O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão dos recursos, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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6. O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.
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7. Com dispensa de vistos prévios, cumpre apreciar e decidir.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
8. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
9. Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir em ambos os recursos são as de saber se a sentença recorrida incorreu em erro[s] de julgamento de direito, por incorreta interpretação e aplicação da normação vertida (i) nos artigos 57º, nº.1, alínea a), 72º, nº. 2 [na redação originária] e 146º, nº.2 alínea d) do CCP e, bem assim, (ii) nos artigos 69º e 70º do mesmo diploma legal.
10. É na resolução de tais questões que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
11. A matéria de facto pertinente é a dada como provada na sentença «sub censura», a qual aqui damos por integralmente reproduzida, como decorre do art. 663º, n.º 6, do CPC.
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III.2 - DO DIREITO
12. A Autora, aqui Recorrida, intentou a presente ação de contencioso pré-contratual peticionando o provimento do presente meio processual por forma a “(…) i) Serem anulados os atos de exclusão da proposta da Autora e o ato de adjudicação praticado a favor da proposta da concorrente [SCom02...] e, caso já tenha sido celebrado, ser anulado o contrato celebrado entre a Ré e a [SCom02...], por serem todos os atos e o contrato ilegais e inválidos; ii) Ser a Ré condenada a readmitir a proposta da Autora para os três lotes em concurso, ordenando-a em primeiro lugar nos lotes 1 e 2; iii) Ser a Ré condenada à prática do ato de adjudicação a favor da proposta da Autora quanto aos lotes 1 e 2 por ser o legalmente devido e, em consequência, a celebrar com esta o contrato objeto do procedimento em apreço, para os referidos lotes (…)”.
13. Arrimou tais pretensões jurisdicionais no entendimento [aqui sintetizado] de que constituía dever do júri do procedimento solicitar à Autora que procurasse suprir a irregularidade identificada na proposta da Autora, ao abrigo do disposto no artigo 72.º, n.º 3, do CCP, e do Ponto 15.3 do Programa, antes de propor a exclusão da proposta da Autora, o que não foi feito, impondo-se, por isso, “(…) reconhecer que o ato de exclusão da proposta da Autora é manifestamente ilegal, devendo ser anulado, sendo, por conseguinte, igualmente ilegal, o ato de adjudicação dos lotes 1 e 2 a favor da proposta da [SCom02...] e, caso já tenha sido celebrado, o contrato celebrado entre a Ré e a [SCom02...], por serem ilegais e inválidos os dois atos administrativos que o precedem (…)”.
14. Estribou ainda as pretensões jurisdicionais formuladas nos autos na convicção de que “(…) a pretensa exclusão da proposta da Autora com fundamento na alegada violação do disposto no artigo 60.º, n.º 4, do CCP é manifestamente ilegal, uma vez que sempre seria possível ao júri do procedimento aferir se a Autora dispõe (ou não) das habilitações necessárias à execução da obra, através da consulta do alvará no site do IMPIC, cujo número havia sido indicado na proposta da Autora, degradando esta formalidade em não essencial (…)”.
15. O T.A.F. de Mirandela, como sabemos, julgou “(…) a presente ação procedente e, em consequência: i) Anul[ou] os actos de exclusão da proposta apresentada pela Autora aos lotes 1 e 2 concursados, contidos na deliberação, de 19.12.2022, do Conselho de Administração da Ré; ii) Conden[ou] a Ré à prática de acto administrativo que admita a proposta apresentada pela Autora aos lotes 1 e 2 concursados e, ainda, que ordene essa mesma proposta em primeiro lugar; iii Anul[ou] os actos de adjudicação da proposta apresentada pela Contra-interessada [SCom02...], S.A. aos lotes 1 e 2 concursados, contidos na deliberação, de 19-12-2022, do Conselho de Administração da Ré; iv) Conden[ou] a Ré à prática de acto de adjudicação da proposta apresentada pela Autora aos lotes 1 e 2 concursados; v) Anul[ou] o contrato de empreitada celebrado entre Ré e a Contra-interessada [SCom02...], S.A., em 06-01-2023, designado por “Execução de VRP's nos sistemas de abastecimento de água nos municípios do núcleo do Douro e Corgo – 2ª fase”, na parte referente aos lotes 1 e 2; e, por fim, vi) Conden[ou] a Ré a celebrar esse mesmo contrato com a Autora, na parte referente aos lotes 1 e 2 (…)”.
16. Perlustrando a fundamentação de direito vertida na decisão judicial recorrida, verificamos que o juízo de procedência da presente ação estribou-se, no mais essencial, no pressuposto de que, não obstante ser aplicável à situação em crise artigo 72º do CCP, não na redação dada pelo Decreto-Lei nº 78/2022, de 07.11, mas antes na redação dada pelo Decreto-Lei nº 111-B/2017, de 31 de agosto, em virtude daquele não consubstanciar uma lei interpretativa deste, sempre era possível sanar a detetada falta de apresentação do Anexo I ao CCP mediante um convite do júri à sua apresentação ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo 72º do CCP, por tal atuação não violar os princípios da concorrência ou igualdade de tratamento.
17. Ancorou-se ainda no entendimento de que a falta de apresentação da lista de preços parciais do artigo 60º, nº 4, do CCP, por não vir acompanhada de sanção legal ou regulamentarmente prevista, não permitia que o Júri do concurso excluísse a proposta da Autora, não sem antes solicitar esclarecimentos ao abrigo do artigo 72º, nº 1, do CCP, se entendesse.
18. Razões que determinaram a declaração judicial de ilegalidade dos atos de exclusão da Autora e de adjudicação da proposta da Contra-interessada [SCom02...], e, dessa sorte, a condenação da Ré à prática de acto que gradue a Autora em 1º lugar e à prática de acto de adjudicação da proposta apresentada pela Autora nos lotes 1 e 2 concursados.
19. Vêm agora as Recorrentes, por intermédio dos recursos jurisdicionais em análise, colocar em crise a decisão judicial assim promanada.
20. De facto, patenteiam as conclusões alegatórias que as Recorrentes se insurgem contra o assim considerado e decidido, impetrando-lhe erros de julgamento de direito, por incorreta interpretação e aplicação da normação vertida (i) nos artigos 57º, nº.1, alínea a), 72º, nº. 2 [na redação originária] e 146º, nº.2 alínea d) do CCP, e, bem assim, do disposto (ii) nos artigos 69º e 70º do mesmo diploma legal.
21. O que estribam na crença, aqui concatenada, de que:
(i) a falta de apresentação da declaração que consta do Anexo I ao CCP, a que alude o Artigo 57.º, nº. 1, alínea a) do CCP, assume-se como um motivo para exclusão da proposta da Autora, nos termos do artigo 146.º nº. 2, alínea d), não sendo a mesma passível de suprimento com recurso ao disposto no nº. 2 do artigo 72º, nº. 3 do CCP, na redação anterior ao D.L. n.º 78/2022, de 07/11.
(ii) A obrigação de apresentação da declaração a que se reporta o artigo 60.º número 4 do CCP com a respectiva proposta decorre de uma imposição legal e regulamentar, conduzindo sua inverificação à exclusão da proposta, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 146º, nº 2, alínea d) e/ou o), artigo 70º, nº 2, alínea a), artigo 57º, nº 1, alínea b) e artigo 56º, nº 2, todos os CCP;
(iii) A condenação judicial determinada na sentença em crise viola as competências do Júri do Procedimento, definidas no Artigo 69.º do CCP, nomeadamente no que toca à análise das Propostas [cfr. Artigo 70.º do CCP], sendo, por isso, violadora da “(…) Lei (o CCP) e [d]a discricionariedade administrativa atribuída pelo CCP ao Júri do Procedimento (…)”.
22. Espraiadas as considerações pertinentes da constelação argumentativa das Recorrentes, cumpre agora decidir da bondade da sentença recorrida, não sem antes salientar os presentes autos respeitam a ação administrativa de contencioso pré-contratual envolvendo um procedimento concursal lançado pela [SCom01...], E.I.M, S.A., em 17.10.2022.
23. Quer isto tanto significar que o regime processual aplicável é o constante do Código dos Contratos Públicos, na redação dada pela Lei nº 30/2021, de 21 de maio, com a Retificação nº 25/2021, de 21 de julho 18ª versão], portanto, antes das alterações introduzidas pelo DL n.º 78/2022, de 07/11 [19º versão], e o que lhe sucedeu [D.L. nº. 54/2023, de 14.07].
24. É o seguinte o teor dos artigos 56º, 57º e 146º do CPC, na redação aplicável aos autos: “(…)
Artigo 56.º
Noção de proposta
1 - A proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo.
2 - Para efeitos do presente Código, entende-se por atributo da proposta qualquer elemento ou característica da mesma que diga respeito a um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos.
Artigo 57.º
Documentos da proposta
1 - A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
a) Declaração do anexo i ao presente Código, do qual faz parte integrante;
b) Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar;
c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento ou convite que contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule;
d) (Revogada.)
2 - No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, a proposta deve ainda ser constituída por:
a) Uma lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstas no projeto de execução;
b) Um plano de trabalhos, tal como definido no artigo 361.º, quando o caderno de encargos seja integrado por um projeto de execução;
c) Um cronograma financeiro, quando o caderno de encargos seja integrado por um projeto de execução, contendo um resumo dos valores globais correspondentes à periodicidade definida para os pagamentos, subdividido pelas componentes da execução de trabalhos a que correspondam diferentes fórmulas de revisão de preços;
d) Um estudo prévio, nos casos previstos no n.º 3 do artigo 43.º, competindo a elaboração do projeto de execução ao adjudicatário.
3 - Integram também a proposta quaisquer outros documentos que o concorrente apresente por os considerar indispensáveis para os efeitos do disposto na parte final da alínea b) do n.º 1.
4 - Os documentos referidos nos nº. s 1 e 2 devem ser assinados pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
5 - Quando a proposta seja apresentada por um agrupamento concorrente, os documentos referidos no n.º 1 devem ser assinados pelo representante comum dos membros que o integram, caso em que devem ser juntos à proposta os instrumentos de mandato emitidos por cada um dos seus membros ou, não existindo representante comum, devem ser assinados por todos os seus membros ou respetivos representantes.
6 - Nos procedimentos com publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia, é apresentado, em substituição da declaração do anexo i do presente Código, o Documento Europeu Único de Contratação Pública.
(…)
(…)
Artigo 146.º
Relatório preliminar
1 - Após a análise das propostas, a utilização de um leilão eletrónico e a aplicação do critério de adjudicação constante do programa do concurso, o júri elabora fundamentadamente um relatório preliminar, no qual deve propor a ordenação das mesmas.
2 - No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas:
a) Que tenham sido apresentadas depois do termo fixado para a sua apresentação;
b) Que sejam apresentadas por concorrentes em violação do disposto no n.º 2 do artigo 54.º;
c) Que sejam apresentadas por concorrentes relativamente aos quais ou, no caso de agrupamentos concorrentes, relativamente a qualquer dos seus membros, a entidade adjudicante tenha conhecimento que se verifica alguma das situações previstas no artigo 55.º;
d) Que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 57.º;
e) Que não cumpram o disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 57.º ou nos n.ºs 1 e 2 do artigo 58.º;
f) Que sejam apresentadas como variantes quando estas não sejam admitidas pelo programa do concurso, ou em número superior ao número máximo por ele admitido;
g) Que sejam apresentadas como variantes quando não seja apresentada a proposta base;
h) Que sejam apresentadas como variantes quando seja proposta a exclusão da respetiva proposta base;
i) Que violem o disposto no n.º 7 do artigo 59.º;
j) (Revogada.)
l) Que não observem as formalidades do modo de apresentação das propostas fixadas nos termos do disposto no artigo 62.º;
m) Que sejam constituídas por documentos falsos ou nas quais os concorrentes prestem culposamente falsas declarações;
n) Que sejam apresentadas por concorrentes em violação do disposto nas regras referidas no n.º 4 do artigo 132.º, desde que o programa do concurso assim o preveja expressamente;
o) Cuja análise revele alguma das situações previstas no n.º 2 do artigo 70.º (…)”.
25. Conforme emerge grandemente do que sem de transcrever, após a análise das propostas apresentadas, o júri concursal, no relatório preliminar, deve propor a exclusão das propostas, designadamente e para o que ora nos interessa, que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 57.º [cfr. artigo 146, nº. 2, alínea d)].
26. Pois bem, um desses documentos exigidos pelo nº. 1 do artigo 57º do C.C.P. é precisamente, a declaração do Anexo I) ao CCP, conforme se alcança manifestamente da sua alínea a).
27. Apresentando-se distinto que a Autora, aqui Recorrente, não logrou apresentar tal declaração conjuntamente com a sua proposta, deve concluir-se no sentido da existência de um fundamento de exclusão da sua proposta, nos termos do disposto no artigo 146º, nº.2, alínea d) do CCP.
28. A questão que se equaciona no imediato é a de saber se tal patologia procedimental é [ou não] suscetível de regularização procedimental, dessa forma evitando-se a exclusão da proposta da Autora.
29. Adiante-se, desde já, que a resposta é negativa.
30. Na verdade, a declaração do Anexo I) ao CCP não integra qualquer documento habilitante dos concorrentes, antes assumindo-se como uma verdadeira parte integrante da proposta.
31. É o que nos dá conta o artigo 57º, nº. 1, alínea a), e os n.ºs 1 e 2 do artigo 81º, ambos do CCP, e ainda o ponto 23 do Programa de Concurso.
32. Como tal, isto é, não sendo um documento habilitante dos concorrente, não resulta abrangido pela previsão procedimental prevista no nº.3 do artigo 86º do CCP, que impõe ao júri concursal o dever de notificação do “(…) adjudicatário relativamente ao qual o facto ocorreu, fixando-lhe um prazo, não superior a 5 dias, para que se pronuncie, por escrito, ao abrigo do direito de audiência prévia (…)”.
33. O que serve para atingir a inviabilidade de sanação da irregularidade patenteada nos autos ao abrigo do regime previsto para os casos de não apresentação dos documentos de habilitação na fase, prazo e forma legalmente previstas.
34. Idêntica asserção é atingível, desta feita, com base no regime previsto no artigo 72º do CCP, na redação aplicável, para a “prestação de esclarecimentos e suprimento de propostas e candidaturas”.
35. De facto, estabelecia o artigo 72º, n.ºs 1 a 3, do CCP o seguinte: “(…)
1 - O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas.
2 - Os esclarecimentos prestados pelos respetivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º
3 - O júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento (…)” [destaque e sublinhado nosso].
36. No caso em análise, já vimos que se impunha a apresentação da declaração anexo I) ao CCP conjuntamente com a proposta da Autora, o não logrou ocorrer.
37. Como se colhe inequivocamente do disposto no artigo 72º, nº.1 do CCP, a faculdade de “prestação de esclarecimentos” mostra-se reservada para os elementos constantes das propostas apresentadas.
38. O que significa que não pode ser objeto de “prestação de esclarecimentos” aquilo que não existe no procedimento concursal.
39. Logo, a irregularidade patenteada nos autos não podia ser objeto da prestação de esclarecimentos, porque nada havia a esclarecer.
40. E também não podia ser objeto de suprimento.
41. De facto, o nº. 3 do artigo 72º do CCP, na redação aplicável, apenas permitia o suprimento das “(…) das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento (…)”.
42. Contudo, esse não é o caso dos autos.
43. De facto, por “formalidades não essenciais”, e na senda da jurisprudência tirada pelo Tribunal de Contas no processo nº. 04/2022 - que aqui se acolhe inteiramente -, deve entender-se aquelas que não colidam com os princípios gerais que regem os procedimentos concursais, mormente da transparência e da concorrência.
44. Já as “formalidades essenciais” serão aquelas que colidam com tais princípios, apontando-se neste patamar, desde logo, as exigidas pelo bloco legal aplicável relativamente às quais o legislador comina a sua inobservância com a exclusão da candidatura ou da proposta do concorrente.
45. Desta feita, sopesando (i) a natureza da declaração da declaração do Anexo I) ao CCP já afirmada no sobredito no parágrafo 30º e (ii) a cominação estatuída no artigo 146º, nº. 2, alínea d) do CCP, impera concluir pela qualificação da exigência de apresentação da referida declaração como [sendo] uma “formalidade essencial”.
46. O que nos transporta para a evidência da inaplicabilidade do artigo 72º, nº. 3 do C.C.P ao caso versado.
47. E nada disto bule com a posição acolhida no aresto do S.T.A. de 11.09.2019, tirado no processo nº. 0829/18.3BEAVR, e melhor evidenciada na sentença recorrida, já que, na redação aplicável aos autos, a falta de apresentação do “DEUCP” - contrariamente ao que sucede com a declaração do Anexo I ao CCP - não é objeto de expressa cominação de exclusão da proposta, podendo, portanto, degradar-se em “formalidade não essencial”, e, qua tal, suscetível de suprimento no decurso do pleito procedimental.
48. Neste domínio, saliente-se ainda que não se ignora que a redação posterior introduzida pelo Decreto-Lei nº. 78/2022, de 07/11 [19º versão do CCP], veio expressamente prever a possibilidade de suprimento da “(…) não apresentação ou a incorreta apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da candidatura ou da proposta, incluindo as declarações dos anexos i e v ao presente Código ou o Documento Europeu Único de Contratação Pública (…)”.
49. Esta redação, porém, não conforma qualquer lei interpretativa do C.C.P. em matéria de prestação de esclarecimentos e suprimento de irregularidades prevista no seu artigo 72º, mas antes configura uma lei disruptora da previsão legal até então estabelecida.
50. Realmente, a lei nova não veio acolher uma interpretação já consentida pela lei anterior, antes visando acolher uma alteração do entendimento legal até então vigente quanto à possibilidade de sanação da falta de declaração do Anexo I) do CCP.
51. Neste enquadramento, sustentar-se - como se fez na sentença recorrida -, a possibilidade de sanação de tal patologia procedimental com recurso ao artigo 72º do CCP na redação anterior Decreto-Lei nº. 78/2022, de 07/11, integra uma interpretação não consentida pelo Legislador, não sendo, por isso, de aceitar.
52. Tanto mais que a sentença recorrida começa por afirmar a “natureza inovadora” do Decreto-Lei nº. 78/2022, de 07/11, o que se revela manifestamente paradoxal no tocante ao juízo decisório de possibilidade de suprimento ao abrigo da lei anterior.
53. De facto, qual a coerência e racionalidade em afirmar – como se fez na decisão recorrida - que a lei nova veio alterar o panorama legal com a introdução de um mecanismo de suprimento da falta de apresentação da declaração do Anexo I) do CCP para depois concluir-se que afinal já era possível proceder-se ao suprimento de tal patologia ao abrigo da lei antiga?
54. Nenhuma, como está bom de ver.
55. Aqui chegados, é tempo de concluir que não se antolham quaisquer fundamentos válidos para desintegrar juridicamente a decisão da Administração de adjudicação do procedimento concursal visado nos autos nos termos e com o alcance que se mostram explicitados no ato impugnado.
56. A sentença recorrida, ao assim não o entender, interpretou mal e violou o regime jurídico aplicável, não podendo, por isso, manter-se, o que determina a prejudicialidade do conhecimento das demais questões objeto de recurso [artigo 95º, nº. 1 in fine do C.P.T.A. e 608º nº.2 do CPC].
57. Assim deriva, naturalmente, que se conceder provimento ao presente recurso, devendo-se revogar a decisão judicial recorrida, e julgar totalmente improcedente a presente ação, ao que se provirá no dispositivo.
* *
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em CONCEDER PROVIMENTO a ambos os recursos interpostos, revogar a sentença recorrida e julgar a presente ação totalmente improcedente.
Custas pela Recorrida.
Registe e Notifique-se.
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Porto, 20 de outubro de 2023

Ricardo de Oliveira e Sousa
Antero Pires Salvador
Helena Maria Mesquita Ribeiro