Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00935/20.4BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/01/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:ACÇÃO PARA RECONHECIMENTO DE DIREITO; ACTO CONFIRMATIVO;
ACTO CONSOLIDADO NA ORDEM JURÍDICA;
ARTIGOS 38º, N.º 2, E 58º, N. º1, ALÍNEA B), AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS;
Sumário:
1. Independentemente de se considerar – ou não – um acto como meramente confirmativo de acto anterior, se o primeiro acto fixou à Autora a sua pensão de reforma com aplicação do factor de sustentabilidade, a acção de impugnação do segundo acto e reconhecimento do seu alegado direito a receber a pensão sem aplicação do factor de sustentabilidade é intempestiva,
depois de decorrido o prazo para impugnar o primeiro.

2. A tese contrária, pugnada pela Autora, a prevalecer, esvaziaria de conteúdo útil a norma que fixa de forma peremptória, o prazo de 3 meses para a impugnação de actos meramente anuláveis – artigo 58º, n.º1, alínea b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Bastaria apresentar novo requerimento sobre a mesma pretensão substantiva em sede administrativa.

3. Daí que o n. º2 do artigo 38º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos determine que não pode ser obtido por outros meios processuais o efeito que resultaria da anulação do acto inimpugnável.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

«AA» veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 23.10.2023, pela qual foi julgada procedente a excepção dilatória de intempestividade para a prática de acto processual e, em consequência, absolvida a Entidade Demandada da instância, na acção administrativa que intentou contra a Caixa Geral de Aposentações, I.P., para anulação da decisão proferida em 25.03.2020, que indeferiu o pedido de alteração da pensão da Autora e para a condenação da Entidade Demandada à prática do acto administrativo devido, nomeadamente à rectificação da pensão de aposentação, com um aumento de 12,34%, com efeitos desde 19.11.2014, e ao pagamento dos diferenciais remuneratórios desde essa data.

Invocou para tanto, em síntese, que os fundamentos da pretensão da Autora, ou seja, da causa de pedir na presente acção são diferentes dos do procedimento anterior, não se tendo formado caso decidido ou caso resolvido pela não impugnação do despacho de 19.11.2014, que era de reconhecimento do direito à aposentação, pelo que não se verifica a excepção julgada procedente na decisão recorrida; acrescenta que não há lugar à aplicação de qualquer factor de sustentabilidade à situação da Autora.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*
Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
*

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:
1. No âmbito do presente recurso, importa saber se a prática do acto processual é intempestivo.

2. Por despacho de 2014/11/19 da Direção da Caixa Geral de Aposentações (CGA), foi reconhecido o direito à aposentação da Recorrente, tendo sido considerada a situação existente em 2014/11/19.

3. À data, a Recorrente possuía 57 anos de idade e 34 anos de serviço docente em regime de monodocência, após a aquisição de habilitações para tanto em 1975 e 1976, tendo beneficiado do regime especial de aposentação previsto no DL 77/2009, de 13 de Agosto.

4. Não obstante, o montante de pensão ter fixado para o ano de 2014 no valor de € 1.968,82, considerando como carreira completa 34 anos de serviço, foi efectuada uma redução de 12,34% no respectivo cálculo por aplicação do factor de sustentabilidade para o ano de 2014, porquanto a CGA considera que a Recorrente não reunia a idade normal de acesso à pensão de velhice.

5. Porém, nos termos do Artigo 2º, nº 1 da Lei 77/2009, constata-se para o cálculo da pensão, como carreira completa, 34 anos de serviço, sendo que este regime especial de aposentação estabelece que a idade de aposentação é de 57 anos de idade e não de 66 anos, não havendo por isso lugar à aplicação de qualquer factor de sustentabilidade à situação da aqui Recorrente já que totalizava a idade normal, em função do regime específico de aposentação de que beneficia.

6. Pelo que, a Recorrente, em 2020/02/28, requereu a rectificação da pensão de aposentação, recalculando-se o respectivo valor sem aplicação de qualquer factor de sustentabilidade com os fundamentos supra aduzidos, com efeitos desde 2014/11/19, pagando-se a diferença entre o valor da pensão paga e o valor da pensão devida desde então.

7. Sem êxito, porquanto, a sua pretensão foi indeferida pela CGA.

8. Resulta, assim, do exposto que a Recorrente pretende com a presente acção, a anulação da decisão de indeferimento de 2020/03/25 e não do despacho de 2014/11/19 que lhe reconheceu o direito à pensão.

9. Considerou, assim, Mmº Juiz do Tribunal “a quo” que o prazo aplicável para a impugnação da decisão seria de 3 meses a contar da notificação ao interessado, suspendendo-se com a utilização de meios de impugnação administrativa, nomeadamente, da reclamação de que teria de ter ocorrido no prazo de 15 dias a contar da notificação do acto, e,

10. Considerando que o requerimento da Autora de 2020/02/20 era uma reclamação da decisão de 2014/11/19, como tal seria intempestiva e legalmente inadmissível, não suspendendo o prazo de propositura da acção de condenação à prática do acto devido.

11. Não acompanhamos tal entendimento porquanto o requerimento da Autora de 2020/02/20 não consubstancia uma reclamação do despacho da CGA de 2014/11/19, mas sim um requerimento autónomo.

12. Acontece que, nos termos do artigo 13º do Código do Procedimento Administrativo os Órgãos da Administração Pública, têm o dever de decisão sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados, não existindo o dever de decidir, quando há menos de dois anos, contados da data da apresentação do requerimento, o órgão competente tenha praticado um acto administrativo sobre o mesmo pedido, formulado pelo mesmo particular com os mesmos fundamentos.

13. No caso em apreço, em 2014, a Autora iniciou um procedimento administrativo quando requereu a sua aposentação tendo-lhe sido reconhecido o direito à aposentação e fixada uma pensão de reforma.

14. Entretanto, em 2020, por requerimento dirigido à Direção da CGA, a Autora requereu a desaplicação do factor de sustentabilidade definido para o ano de 2014, ao valor da sua pensão, tendo tal pretensão sido indeferida por decisão de 2020/03/25.

15. A Recorrente deduziu o seu pedido mais de cinco anos após a data do despacho de reconhecimento do seu direito à aposentação e fixação da pensão de reforma, ultrapassando os 2 anos decorridos após esta data.

16. Sendo que, a Entidade recorrida decidiu indeferir a pretensão da Recorrente, em 2023/03/25 no cumprimento do seu dever de decisão nos termos do Artigo 13º, nº 2 do CPA.

17. E tal como decidido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Proc. 046256, de 2004/03/31, de acordo com este preceito legal (com redação idêntica ao do Artigo 9º, nº 2 do CPA, entretanto revogado) haverá sempre o dever de decidir se o órgão for competente, tendo praticado o acto administrativo, independentemente do prazo, sobre o mesmo pedido e com fundamentos diferentes formulado pelo mesmo requerente.

18. No presente caso, tal como no caso referido no Acórdão, não há identidade de fundamentos entre os primeiro e segundo pedidos formulados pela aqui Recorrente.

19. Enquanto no primeiro procedimento a Recorrente solicitou a sua aposentação, no segundo procedimento solicitou a desaplicação do factor de sustentabilidade no cálculo do valor da sua pensão.

20. À semelhança do decidido no Acórdão do STA para haver uma relação de confirmatividade é necessária a identidade de partes, pedido e causa de pedir, mantendo-se o mesmo quadro normativo.

21. No presente caso, a causa de pedir, ou seja, os fundamentos dos dois requerimentos não são os mesmos, pelo que fica desde logo afastada a natureza de confirmatividade, não se podendo interpretar que o requerimento de 2020/02/20 se tratou de uma reclamação ao despacho de 2014/11/19 que reconheceu à Recorrente o direito à aposentação e lhe fixou a pensão.

22. Os fundamentos da pretensão da Recorrente, ou seja, da causa de pedir são diferentes dos do procedimento anterior, não se tendo tornado caso decidido ou caso resolvido ao não ter impugnado o referido despacho que era de reconhecimento do direito à aposentação – Neste sentido cfr. Acórdão supra identificado.

23. Na verdade, tal como consta na PI, os fundamentos da causa de pedir são diferentes dos do primeiro acto que consistiram no seguinte:

24. Nos termos do Artigo 2º, nº 1 da Lei 77/2009, constata-se para o cálculo da pensão, como carreira completa, 34 anos de serviço, sendo que este regime especial de aposentação estabelece que a idade de aposentação é de 57 anos de idade e não de 66 anos, não havendo por isso lugar à aplicação de qualquer factor de sustentabilidade à situação da aqui Autora já que totalizava a idade normal, em função do regime específico de aposentação de que beneficia.

25. Neste sentido, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, nº 00169/15.0BEMDL, de 2018/03/02, confirmado pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 2019/01/23, considera que (num caso igual ao da aqui Recorrente), o factor de sustentabilidade apenas se aplica nos casos em que ocorra antecipação da aposentação, sendo que no caso em apreço não ocorreu qualquer antecipação da aposentação, condenando a CGA a efectuar novo cálculo considerando a carreira contributiva de 34 anos completos, não aplicando na forma de cálculo o factor de sustentabilidade.

26. Refere este último Acórdão que:

“Como já se referiu, a situação da autora está abrangida por um regime especial de aposentação, pelo que a sua idade de aposentação é de 57 anos de idade e não 66 anos.

Ora, a Portaria n.º 378-G/2013, de 31 de dezembro o que veio estabelecer como idade normal da aposentação os 66 anos (artigo 1.º), determinando-se a aplicação de um factor de sustentabilidade aos beneficiários que não atingissem essa idade (artigo 2.º), tendo em vista o regime geral.”

27. “Assim, para efeitos do disposto no artigo 3.°-A da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, a idade de aposentação a considerar na situação da autora são os 57 anos e não os 66 anos de idade. Logo, não há lugar a aplicação de qualquer factor de sustentabilidade à situação da autora, já que esta totaliza a idade normal, em função do regime específico de aposentação de que beneficia.”

28. “No caso em apreço não ocorreu qualquer antecipação da aposentação, pelo que não será de aplicar o facto de sustentabilidade.”

*

II –Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:

1. Em 19.11.2014, a Caixa Geral de Aposentações elaborou ofício, endereçado à Autora, com o seguinte teor:

“(…)

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)”.

- Cf. documento n.º ..., junto com a petição inicial a fls. 12 e seguintes do SITAF.

2. Em 27.11.2014, a Autora tomou conhecimento do ofício mencionado no ponto anterior – cf. documento n.º ..., junto com a petição inicial a fls. 12 e seguintes do SITAF.

3. Em 28.02.2020, a Autora dirigiu um requerimento ao Director da Caixa Geral de Aposentações, no qual requer seguinte:

“(…)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)”

– Cf. documento n.º ..., junto com a petição inicial a fls. 12 e seguintes do SITAF.

4. Pelo Ofício, datado de 25.03.2020, a Entidade Demandada comunicou à Autora o seguinte:

“(…)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)”.

- Cf. documento n.º ..., junto com a petição inicial a fls. 12 e seguintes do SITAF.

5. Em 28.04.2020, deu entrada a presente acção administrativa – cf. fls. 9 a 11 do SITAF.

*
III - Enquadramento jurídico.

Este é o teor da decisão recorrida na parte aqui relevante:

“(…)

Pela presente acção administrativa, a Autora pretende a desaplicação do factor de sustentabilidade, definido para o ano de 2014, ao valor da sua pensão de reforma, cujo direito lhe foi reconhecido por despacho da CGA de 19.11.2014.

Deste modo, a Autora insurge-se contra o acto que lhe atribuiu a pensão de reforma, praticado pela Entidade Demandada, em 19.11.2014 (cfr. ponto 1) dos factos provados) e, em concomitância, peticiona a prática do acto devido, consubstanciado na rectificação do valor da pensão de aposentação, com um aumento de 12,34%, com efeitos desde 19.11.2014. Em sede de contestação, a Entidade Demandada veio suscitar a excepção da intempestividade da presente acção.

Replicando, a Autora refuta a aludida excepção, visto que a sua pretensão consiste na anulação da decisão de indeferimento de 25.03.2020 e não do despacho de 19.11.2014, que lhe reconheceu o direito à pensão.

Cumpre decidir.

A acção de condenação à prática do acto devido tem como objecto a pretensão do interessado (cfr. artigo 66.º, n.º 2, do CPTA), isto é, o direito subjectivo de que o interessado se arroga, pelo que competiria ao Tribunal aferir se a Autora é titular de um direito subjectivo à sobredita rectificação do cálculo do valor da pensão.

Neste contexto, o destino do acto de indeferimento sempre dependerá da procedência ou improcedência do pedido de condenação à prática do acto devido, uma vez que, nos termos do n.º 2 do artigo 66.º do CPTA, “o objecto do processo é a pretensão do interessado e não o acto de indeferimento, cuja eliminação da ordem jurídica resulta directamente da pronúncia condenatória” e, nos termos do n.º 1 do artigo 71.º, do CPTA, “o tribunal não se limita a devolver a questão ao órgão administrativo competente, anulando ou declarando nulo o eventual ato de indeferimento, mas pronuncia-se sobre a pretensão material do interessado, impondo a prática do ato devido”.

Por conseguinte, os actos visados – acto, de 19.11.2014, que atribuiu à Autora a pensão de reforma e o acto, de 25.03.2020, que indeferiu a desaplicação do factor de sustentabilidade -, constituem, respectivamente, um acto administrativo de conteúdo positivo que não satisfaz integralmente a pretensão da Autora e um acto administrativo de indeferimento, nos termos e para os efeitos do disposto nas alíneas c) e b) do n.º 1 do artigo 67.º e dos n.os 4 e 5 do artigo 51.º do CPTA. Por conseguinte, importa considerar as normas que disciplinam a tempestividade das acções administrativas de condenação à prática do acto devido.

Assim, resulta do n.º 2 do artigo 69.º do CPTA, que “nos casos de indeferimento, de recusa de apreciação do requerimento ou de pretensão dirigida à substituição de um ato de conteúdo positivo, é aplicável o disposto nos artigos 58.º, 59.º e 60.º”.

Neste seguimento, de acordo com o n.º 1 do artigo 58.º do CPTA, “a impugnação de actos nulos não está sujeita a prazo”. Por outro lado, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA, a impugnação de actos anuláveis tem lugar no prazo de três meses, cuja contagem obedece ao disposto no artigo 279.º do Código Civil, transferindo-se o seu termo, quando o prazo terminar em férias judiciais ou em dia em que os tribunais estiverem encerrados, para o 1.º dia útil seguinte (cfr. artigo 58.º, n.º 2, do CPTA). Acresce que, de acordo com o n.º 2 do artigo 59.º do CPTA, “o prazo para a impugnação pelos destinatários a quem o acto administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação ao interessado (…)”.

Por outro lado, nos termos do n.º 4 do artigo 59.º do CPTA (ex vi artigo 69.º, n.º 2, do CPTA), “a utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar”. Todavia, a aludida suspensão depende de o meio de reacção administrativa utilizado ser tempestivo e legalmente admissível (cfr. inter alia acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, de 30.05.2018, Processo n.º 00270/16.2BEVIS; MÁRIO AROSO DE ALMEIDA/CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª Edição, Almedina, 2018, p. 413). Neste contexto, sublinha-se que, nos termos da alínea b) do artigo 162.º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro, aplicável aos autos, a reclamação deve ser apresentada no prazo de 15 dias a contar da notificação do acto.

Isto posto:

Em 28.02.2020, a Autora, ao requerer ao Director da Caixa Geral de Aposentações a rectificação do cálculo da pensão de reforma, com efeitos a 19.11.2014, insurge-se contra o despacho, da mesma entidade, de 19.11.2014, que lhe reconheceu o direito à aposentação e a um determinado montante de pensão (cfr. ponto 3) dos factos provados). Destarte, pelo aludido requerimento, a Autora apresentou uma reclamação administrativa face ao despacho de 19.11.2014, com fundamento na aplicação ilegal do factor de sustentabilidade definido para o ano de 2014 (cfr. artigo 159.º do CPA/91).

Ora, considerando que o prazo de reclamação era de 15 dias após a notificação do despacho de 19.11.2014 (cfr. artigo 162.º, alínea b), do CPA/91), que ocorreu em 27.11.2014 (cfr. ponto 2) dos factos provados), é manifesto que, em 28.02.2020, o aludido prazo há muito se havia esgotado.

Consequentemente, a reclamação, apresentada em 20.02.2020, é intempestiva e legalmente inadmissível e, como tal, não tem a virtualidade de suspender o prazo de propositura da acção de condenação à prática do acto devido, nos termos previstos no n.º 4 do artigo 59.º do CPTA ex vi artigo 69.º, n.º 2, do CPTA.

Assim sendo:

De acordo com a factualidade provada, em 27.11.2014, a Autora foi notificada do despacho, da CGA, de 19.11.2014, pelo qual lhe foi reconhecido o direito à aposentação (cfr. pontos 1) e 2) dos factos provados).

A Autora imputa ao aludido despacho vício de violação de lei, gerador de anulabilidade, porquanto alega que não lhe é aplicável o factor de sustentabilidade, definido para o ano de 2014, visto ser-lhe aplicável, ao invés, o regime especial resultante da Lei n.º 77/2009, de 13 de Agosto.

Ora, considerando a causa de anulabilidade invocada, a Autora dispunha do prazo de 3 meses, contados desde a notificação do despacho de 19.11.2014, para dar entrada da acção de condenação à prática do acto devido eventualmente cumulada com o pedido de anulação daquele despacho (cfr. artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do CPTA ex vi artigo 69.º, n.º 2, do CPTA e artigo 66.º, n.º 3, do CPTA).

Porém, a presente acção foi proposta em 28.04.2020 (cfr. ponto 5) dos factos provados), isto é, cerca de seis anos após a notificação do despacho que reconheceu o direito à aposentação da Autora. Por conseguinte, conclui-se pela intempestividade da presente acção administrativa.

À luz do exposto, julgo verificada a excepção dilatória da intempestividade da prática do acto processual e, em consequência, será a Entidade Demandada absolvida da instância, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 89.º, n.º 2, e n.º 4, alínea k), do CPTA.

(…)”.

Mostra-se acertada esta decisão não logrando a Recorrente apresentar argumentos que convençam do contrário.

Independentemente de se considerar – ou não - o acto de indeferimento de 25.03.2023 como meramente confirmativo do acto de 19.11.2014 que fixou à Autora a sua pensão de reforma com aplicação do factor de sustentabilidade, o certo é que a presente acção se mostra intempestiva.

A tese da Recorrente, a prevalecer, esvaziaria de conteúdo útil as normas que fixam, de forma peremptória, prazos para a impugnação de actos meramente anuláveis, no caso o prazo de 3 meses em relação ao acto de 19.11.2014 que, indiscutivelmente, se consolidou na ordem jurídica. Bastaria apresentar novo requerimento sobre a mesma pretensão substantiva.

Porque efectivamente no caso concreto estamos sempre perante a mesma pretensão substantiva da Autora e agora Recorrente: a fixação da pensão de reforma sem aplicação do factor de sustentabilidade.

Basta olhar para o pedido formulado a final da petição inicial da presente acção:

“– DO PEDIDO
Nestes termos e nos mais de direito, como é de justiça, requer:
a) A anulação da decisão proferida em 2020/03/25, da autoria da CGA, que indeferiu o pedido de alteração da pensão da Autora, ato melhor identificado no ofício junto como doc. ...;
b) A condenação da Ré, CGA à prática do ato administrativo devido nos termos supra peticionados, nomeadamente à retificação da pensão de aposentação, com um aumento de 12,34%, anulando-se a aplicação do fator de sustentabilidade com efeitos desde 2014/11/19 pagamento dos diferenciais remuneratórios desde essa data;”

Por isso dispõe o n.º2 do artigo 38º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos:

“Sem prejuízo do disposto no número anterior, não pode ser obtido por outros meios processuais o efeito que resultaria da anulação do acto inimpugnável”.

No caso concreto, indiscutivelmente, a Autora pretende pela acção obter o efeito que resultaria da anulação do acto de 19.11.2014: a fixação da sua pensão de reforma sem aplicação do factor de sustentabilidade, com efeitos reportados à data daquele acto.

Mostra-se por isso acertado o fundamento essencial da decisão recorrida para julgar a acção intempestiva: o requerimento da Autora de 10.02.2020 traduziu, materialmente, uma reclamação da decisão de 19.11.2014 não tendo a virtualidade de suspender o prazo de propositura da acção de condenação à prática do acto devido.

Procedendo a matéria de excepção – que por natureza impede o conhecimento de mérito -, sempre padeceria de excesso de pronúncia qualquer decisão que se pronunciasse sobre o mérito da pretensão da Autora, agora Recorrente, ficando assim prejudicado o conhecimento dos fundamentos invocados, designadamente, nas conclusões 23 a 38 do presente recurso jurisdicional – artigos 1º e 89º, n.ºs 1, 2 e 4, alínea k), ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e artigos 278º, n.º1, alínea e), e 615º, n.º1, alínea d), segunda parte, ambos do Código de Processo Civil.

Termos em que se impõe manter a decisão recorrida.


*

IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

*

Porto, 01.03.2024

Rogério Martins
Isabel Costa
Paulo Ferreira de Magalhães, em substituição