Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00488/15.5BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:12/16/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL; ARTIGOS 319º E 320º DA LEI 35/2004 DE 29.07;
PERÍODO DE REFERÊNCIA; DESPEDIMENTO ILÍCITO; TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA.
Sumário:1. Fundo apenas garante um montante, duplamente limitado, conforme resulta do disposto nos artigos 319º e 320º da Lei 35/2004 de 29.07, que o legislador entendeu ser adequado e justo para, por um lado, proteger o trabalhador numa situação de perda de rendimentos que não lhe é imputável, com complemento do sistema de segurança social e, por outro, garantir a sustentabilidade do próprio Fundo. Limitado ao montante global e a um período de referência.
2. O facto de o trabalhador não optar pela reintegração no seu posto de trabalho ou por uma indemnização não tem a virtualidade de definir a data da cessação do contrato.
3. O contrato de trabalho, não optando o trabalhador pela reintegração, apenas cessa com o trânsito em julgado da decisão que declare ilícito o despedimento, pois só assim se compreende o direito a receber as retribuições que deixou de auferir até aí.
4. Tendo a sentença que declarou ilícito o despedimento transitado em julgado fora do aludido período de referência, não tem o trabalhador direito a receber os seus créditos pelo Fundo de Garantia salarial.*
*Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:RCSS
Recorrido 1:Fundo de Garantia Salarial, I.P.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RCSS veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 16.05.2016, pela qual foi julgada improcedente a acção administrativa especial que intentou contra o Fundo de Garantia Salarial, I.P. pedindo que sejam “declaradas nulas ou anuladas as decisões de indeferimento e a decisão de manutenção de indeferimento do direito da A. a receber os seus créditos pelo Fundo de Garantia Salarial, dentro dos seus limites e ¯ condenada a R. a pagar à A. os seus créditos laborais pelo Fundo de Garantia Salarial dentro dos seus limites acrescidos dos juros a partir da data do indeferimento”.

Invocou para tanto, em síntese, que há créditos laborais que se venceram dentro do período de referência, a que se reporta o artigo 319º da Lei 35/2004 de 29 de Julho, pelo que, ao julgar a acção totalmente improcedente, a sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 436º e seguintes do Código do Trabalho, o artigo 319º da Lei 35/2004, por omissão de aplicação.

O Fundo de Garantia Salarial contra-alegou, defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O Ministério público neste Tribunal emitiu parecer também no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1. O contrato de trabalho da autora não teve termo em 7 de Fevereiro de 2009.

2. Mas sim no dia 5 de Agosto de 2013.

3. A sentença do Tribunal do Trabalho, ponto 3 da matéria de facto, declara o despedimento ilícito, o que acarreta a nulidade do mesmo, mantendo-se o contrato.

4. Há créditos laborais constituídos e não pagos entre 4.11.2011 e 5 de Agosto de 2013, não sendo correto o que se diz no 2º parágrafo da sentença a fls. 14.

5. A relação laboral da recorrente com a entidade patronal terminou em 5 de Agosto de 2013.

6. Havendo créditos laborais dentro dos períodos a que se reporta o artigo 319º da Lei 35/2004 de 29 de Julho.

7. Foram violados entre outros os artigos 436º e seguintes do Código do Trabalho, o artigo 319º da Lei 35/2004 por omissão de aplicação.


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II – Matéria de facto.

Deram-se como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:

1. A Autora foi trabalhadora da S... – Sociedade de Limpeza Industrial e Doméstica, Lda (cfr. fls. 15 do processo administrativo).

2. Em 7 de Fevereiro de 2009 a Autora foi despedida (fls. 9 a fls. 11 do processo administrativo).

3. Em 15 de Fevereiro de 2010 foi proferida sentença no Tribunal de Trabalho do Porto condenando:

“(…) a ré S... – Sociedade de Limpeza Industrial e Doméstica, L.da a pagar à autora RCSS a quantia global de € 7.054,89€ (sete mil, cinquenta e quatro euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida das retribuições que se venceram desde a data da propositura da presente ação, à razão de € 213,33 mensais até ao trânsito em julgado da presente sentença a título de créditos laborais vencidos e vincendos e de indemnização por despedimento ilícito, acrescida ainda de juros legais de mora desde 07.FEV.09 e até integral pagamento”.
(cfr. fls. 9 a fls.11 do processo administrativo).

4. A insolvência da S... – Sociedade de Limpeza Industrial e Doméstica, L.da foi requerida em 4 de Maio de 2012 (fls. 8 do processo administrativo).

5. Tal insolvência foi declarada, no âmbito do processo n.º 523/12.9 TYVNG, que correu termos no Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, por decisão transitada em julgado em 2 de Novembro de 2012 (fls. 8 do processo administrativo).

6. Em 5 de Agosto de 2013 o Administrador de Insolvência da S... – Sociedade de Limpeza Industrial e Doméstica, Lda enviou uma carta à Autora comunicando:

“(…) a … rescisão unilateral do contrato de trabalho, começando nesta data o prazo legal para o respetivo Aviso. Com efeito a rescisão do seu contrato individual de trabalho, tem lugar a partir do dia 5 de Agosto de 2013, uma vez que, a sociedade empregadora foi declarada insolvente por sentença de 05 de Outubro de 2012, tendo sido de imediato encerradas as suas instalações e extinto o seu posto de trabalho. Nestes termos (…) deverá considerar extinto o seu contrato de trabalho (…)”.
(fls. 36 do processo administrativo).

7. Em 23 de Outubro de 2013 a Autora requereu ao Fundo de Garantia Salarial o pagamento dos créditos emergentes de contrato de trabalho no valor de 10 005,82€ (dez mil cinco euros e oitenta e dois cêntimos), dos quais 2 559, 96€ (dois mil quinhentos e cinquenta e nove euros e noventa e seis cêntimos) são referentes a retribuição de Março de 2009 a Fevereiro de 2010; 1 919, 97€ (mil novecentos e dezanove euros e noventa e sete cêntimos) relativos a subsídios de férias de 2001 a 2009; 1 919, 97€ (mil novecentos e dezanove euros e noventa e sete cêntimos) referentes a subsídios de natal de 2001 a 2009; e 3 605, 92€ (três mil seiscentos e cinco euros e noventa e dois cêntimos) emergentes da violação do contrato de trabalho (cfr. fls. 13 e fls. 14 do processo administrativo cujo teor se considera integralmente reproduzido).

8. Em face deste requerimento, apresentado pela Autora, os serviços do Réu elaboraram uma informação com o seguinte teor:

(…) De acordo com a informação constante no SISS verificou-se que a requerente cessou o contrato de trabalho em 03/02/2009.

Apresentou o requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho e sua cessação em 21/10/2013.

A requerente intentou uma ação laboral na 1.ª secção do Juízo Único do Tribunal do Trabalho do Porto onde por meio de sentença proferida em 10/02/2010 foram os seus créditos laborais reconhecidos. Não obstante e porque os mesmos não foram pagos, a requerente intentou junto do 3.º juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia a competente insolvência em 04/05/2012.

Sucede, porém, que o Fundo de Garantia Salarial, nos termos do n.º 3, do art. 319.º, da Lei n.º 35/2004, de 29/7 apenas assegura o pagamento dos créditos que lhe tenham sido requeridos até três meses antes da respectiva prescrição, nos seguintes termos:

O Fundo de Garantia Salarial só assegura o pagamento dos créditos que lhe tenham sido reclamados até três meses antes da respectiva prescrição.

Nos termos do n.º 1, do art.º 381.º, do Código de Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27/07 prevê-se que: Todos os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, extinguem-se por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho. Verifica-se portanto que tendo a requerente cessado o contrato de trabalho em 03/02/2009 e apresentado o requerimento em 21/10/2013, não apresentou o requerimento até 3 meses antes da respectiva prescrição, pelo que o requisito exigido pelo n.º 3 do art.º 319.º da Lei n.º 35/2004, de 29/07 não está preenchido, o que constitui fundamento para o indeferimento das pretensões formuladas pela requerente. (…)

Pelas razões de facto e de direito invocadas, propõe-se o indeferimento das pretensões formuladas pela requerente, com fundamento no não preenchimento do requisito exigido pelo n.º 3, do art.º 319.º, da Lei n.º 35/2009, de 29/07 (…)”.
(cfr. informação constante a fls. 21 a fls. 24 do processo administrativo).

9. Em 2 de Outubro de 2014 o Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial propôs o indeferimento do pedido da Autora de pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho (fls. 21 a fls. 25 do processo administrativo).

10. Por ofício de 15.10.2014 foi a Autora notificada de que o seu requerimento, “nos termos do despacho de 1 de outubro de 2014, do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial” foi indeferido porquanto “o requerimento não foi apresentado no prazo de 3 meses antes da respetiva prescrição, nos termos do n.º 3 do artigo 319.º da Lei 35/2004, de 29 de julho, conjugado com o prazo de prescrição previsto no Código de Trabalho” (fls. 46 do suporte físico do processo cujo teor se considera integralmente reproduzido).

11. A proposta de decisão acima referida foi notificada à Autora em 24 de Outubro de 2014.

12. A Autora pronunciou-se em sede de audiência prévia nos termos constantes de fls. 34 do suporte físico do processo cujo teor se considera integralmente reproduzido.

13. A Autora foi notificada da decisão de indeferimento, acima referida, no dia 3 de Novembro de 2014.

14. A Autora reclamou desta decisão (fls. 48 e fls. 49 do suporte físico do processo).

15. Os serviços da Ré elaboraram uma informação com o seguinte teor:

(…) tendo sido notificada em sede de audiência prévia do despacho do Exm.º Senhor Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial (…) vem dizer que:

O seu contrato de trabalho foi rescindido pelo AI em 5/8/2013, conforme documento que junta;

Apresentou o seu requerimento em 21/10/2013, cerca de dois meses e meio após a cessação do contrato de trabalho, pelo que não há razão para a prescrição invocada;

Reclamou os seus créditos no processo de insolvência, em sede de verificação ulterior.

Termina requerendo o deferimento do seu pedido.

Apreciando o referido pela requerente (…) na sua resposta o requerente vem dizer que o seu contrato de trabalho foi rescindido pelo AI em 5/8/2013 e apresentou o seu requerimento em 21/10/2013, cerca de dois meses e meio após a cessação do contrato de trabalho, pelo que não há razão para a prescrição invocada até porque reclamou créditos no processo de insolvência, em sede de verificação ulterior.

No que à prescrição diz respeito, e que esteve na base da nossa proposta inicial, entendemos que assiste razão à requerente.

Isto porque, sendo a requerente detentora de uma sentença proferida pelo Tribunal do Trabalho do Porto em 15 de Fevereiro de 2010 já junta ao requerimento inicial, o prazo de prescrição é o que se encontra estipulado no artigo 309.º do Código Civil, ou seja, 20 anos.

Resolvida esta questão teremos de nos debruçar sobre a data do vencimento dos créditos. Refere a requerente que o seu contrato de trabalho foi rescindido pelo AI em 5/8/2013. Da prova documental agora apresentada verifica-se, na realidade, o AI em 5/08/2013 comunicou à requerente a rescisão do contrato de trabalho.

A questão que se coloca é de saber se esta factualidade deve ser considerada para aferir a data de vencimento dos créditos.

Entendemos que não, porque à declaração do AI deve sobrepor-se a sentença do Tribunal de Trabalho do Porto proferida em 15 de Fevereiro de 2010, onde é referido expressamente que a requerente foi despedida em Fevereiro de 2009.

Logo, tendo a acção de insolvência sido instaurada em 4/05/2012 e a requerente cessado o contrato de trabalho em 3/02/2009 verifica-se que os créditos não venceram nos seis meses que antecederam a data da propositura da acção, como é requisito exigido pelo n.º 1 do artigo 319.º da Lei 35/2004, de 29/7. Em face disto propomos a manutenção do indeferimento agora com fundamento no facto dos créditos não se terem vencidos no período de referência previsto no n.º 1 do artigo 319.º da Lei 35/2009, de 29/7 (…)”.
(cfr. informação constante de fls. 41 a fls. 42 do processo administrativo).

16. Por despacho de 19 de Janeiro de 2015, o Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial manteve a decisão de indeferimento do requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho com os seguintes fundamentos:

Atenta a resposta e analisada toda a factualidade verifica-se que não foram apresentados factos susceptíveis de alteração da decisão de indeferimento anteriormente proferida.

Os créditos requeridos não se encontram abrangidos pelo período de referência, ou seja, nos seis meses que antecedem a propositura da ação (Insolvência, falência, Recuperação de empresa ou PEC) nos termos do n.º 1 do artigo 319.º da Lei 35/2004, de 29/7 ou após a data da propositura da mesma ação, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo”.
(cfr. fls. 51 do suporte físico do processo cujo teor se considera integralmente reproduzido).


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III - Enquadramento jurídico.


O Fundo de Garantia Salarial tem uma finalidade social que justifica que sejam adoptados limites à sua intervenção, não só limites temporais que decorrem do enquadramento comunitário que lhe está subjacente (Directiva 80/987/CC, de 20.10), como também, limites às importâncias pagas.

Fundo apenas garante um montante, duplamente limitado, conforme resulta do disposto nos artigos 319º e 320º da Lei 35/2004 de 29.07, que o legislador entendeu ser adequado e justo para, por um lado, proteger o trabalhador numa situação de perda de rendimentos que não lhe é imputável, com complemento do sistema de segurança social e, por outro, garantir a sustentabilidade do próprio Fundo.

Limitado ao montante global e a um período de referência.

Neste sentido ver o acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 07.10.2016, no processo 00166/12.7 PNF, e a jurisprudência aí citada.

Quanto ao período de referência, dispõe o n.º1 do artigo 319.º, da Lei 35/2004, 29.07:

“O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317.º que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da acção ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior” (declaração de insolvência).

Daí que os créditos fora do período de referência a que alude o n.º 1 do artigo 319º da Lei 35/2004, de 29.07, ainda que existam e estejam reconhecidos, não podem ser pagos pelo Fundo de Garantia Salarial.

Encontrando-se a data da cessação do contrato de trabalho dentro do período de referência, o trabalhador tem direito a receber, pelo Fundo de Garantia salarial, os créditos salariais referentes à retribuição pelas férias e respectivo subsídio.

No seu recurso, a Autora refere, apontando para o facto provado sob o n.º6, que o seu contrato de trabalho cessou em 05.08.2013, e não, como foi decidido, em 07.02.2009, pelo que, invoca, os créditos laborais em apreço estão dentro dos períodos a que se reporta o artigo 319º da Lei 35/2004 de 29 de Julho.

Mas sem razão.

O facto essencial que a Autora, ora Recorrente, invoca é este:

“Em 5 de Agosto de 2013 o Administrador de Insolvência da S... – Sociedade de Limpeza Industrial e Doméstica, Lda enviou uma carta à Autora comunicando:

“(…) a … rescisão unilateral do contrato de trabalho, começando nesta data o prazo legal para o respetivo Aviso. Com efeito a rescisão do seu contrato individual de trabalho, tem lugar a partir do dia 5 de Agosto de 2013, uma vez que, a sociedade empregadora foi declarada insolvente por sentença de 05 de Outubro de 2012, tendo sido de imediato encerradas as suas instalações e extinto o seu posto de trabalho. Nestes termos (…) deverá considerar extinto o seu contrato de trabalho (…)”.

Ora, desde logo, o administrador de insolvência não tem competência para definir situações jurídicas ou direitos, em caso de litígio como sucede, conforme se constata do elenco de funções descritas no artigo 55º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas aprovado pelo Decreto-Lei 5/2004, de 18.3.

Nem poderia ter tal competência, sob pena de inconstitucionalidade da norma que a atribuísse, dado estar reservada da definição de situações jurídicas e direitos litigiosos aos tribunais, no artigo 202º, nº2, da Constituição da República Portuguesa.

De todo o modo, no caso concreto, o Administrador da Insolvência da S..., empresa para a qual a Autora trabalhou, indica o dia 05.10.2013 como data da cessação do contrato sem que se perceba qual o fundamento de facto ou de direito de tal indicação.

Pelo contrário, logo a seguir, afirma que a sociedade empregadora foi declarada insolvente por sentença de 05.10.2012, tendo sido de imediato encerradas as suas instalações e extinto o seu posto de trabalho.

Ou seja, o próprio Administrador da Insolvência acaba por apontar uma outra data, esta sim justificada, como fim do contrato de trabalho, a data da declaração judicial de insolvência que datando embora de 05.10.2012, apenas transitou em julgado em 02.11.2012 – facto provado sob o ponto n.º5.

Na decisão recorrida tece-se as seguintes considerações a este propósito:

“Do exposto resulta que a declaração da ilicitude do despedimento tem como consequência o pagamento, por parte do empregador, de uma indemnização pelos danos causados e a reintegração do trabalhador, podendo o trabalhador poderá optar pelo pagamento de uma indemnização em substituição da reintegração.

Da análise da sentença que declarou a ilicitude do despedimento da Autora não resulta que esta tenha optado pela reintegração no posto de trabalho.

No entanto, depreende-se que, além de uma indemnização no valor de 7 054, 33€, a Ré foi condenada no pagamento das retribuições que se venceram desde a data da propositura da ação, bem como no pagamento de uma indemnização pelo despedimento ilícito, ou seja, a Autora não foi reintegrada no posto de trabalho, tendo a Ré sido condenada no pagamento do montante requerido (7 054, 33€), acrescido das retribuições em falta e de uma indemnização pelo despedimento ilícito.

Termos em que se conclui que a Autora não foi reintegrada no seu posto de trabalho tendo o seu contrato de trabalho cessado em 7 de fevereiro de 2009, informação que é parcialmente corroborada pelos próprios registos da Segurança Social que indicam como data de término do contrato de trabalho com aquela empresa fevereiro de 2009”.

É certo que, como consta da decisão recorrida, a Autora não optou pela reintegração, tanto assim que recebeu uma “indemnização por despedimento ilícito”, para além das retribuições a que teria direito se não fosse o despedimento (ver facto provado sob o n.º3).

Sucede que, ao contrário do decidido, o facto de o trabalhador optar pela reintegração no seu posto de trabalho ou por uma indemnização não tem a virtualidade de definir a data da cessação do contrato.

O despedimento ilícito não produz efeitos pela circunstância de o trabalhador não optar pela reintegração.

Na verdade, dispõe o n.º1 do artigo 389.º do Código de Trabalho, Lei n.º 7/2009, de 12.02, sob a epígrafe “Efeitos da ilicitude de despedimento”:

“Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado:

a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais;

b) Na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade …”

Por seu turno termina o n.º1 do artigo 390.º do mesmo diploma:

“Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento”.

O que significa que o contrato de trabalho, não optando o trabalhador pela reintegração, apenas cessa com o trânsito em julgado da decisão que declare ilícito o despedimento, pois só assim se compreende o direito a receber as retribuições que deixou de auferir até aí.

No entanto, apesar de não ser correcto este fundamento de facto e de direito da decisão, a data do termo do contrato reportada a 07.02.2009, data do despedimento, a conclusão essencial e decisiva, de que os créditos em causa não estão compreendidos no período de referência a que alude o n.º 1 do artigo 319º da Lei 35/2004, mostra-se correcta.

Tanto quanto resulta dos factos provados não houve recurso da sentença que declarou ilícito de despedimento e, tendo sido esta proferida em 15.02.2010 (facto provado sob o n.3), transitou em julgado em Março de 2010.

Ora a declaração de insolvência foi requerida em 04.05.2012, pelo que os créditos vencidos na data da cessação do contrato de trabalho, com o trânsito em julgado da sentença que declarou a ilicitude do despedimento, em Março de 2010, estão claramente fora do período de referência, ou seja, seis meses antes da dedução do pedido de insolvência.

Ora um contrato cessado não pode, por impossibilidade lógica e legal, voltar a cessar.

Ou seja, o contrato de trabalho que cessou em Março de 2010, com o trânsito em julgado da sentença que declarou a ilicitude do despedimento, não poderia cessar posteriormente, em particular na data referida pelo Administrador de Insolvência da “S...”, 05.08.2013.

Assim como não se pode considerar cessado com o trânsito em julgado da declaração de insolvência, em 02.11.2012.

Mas ainda que se entendesse que o contrato de trabalho apenas tinha cessado nesta última data, também os créditos em apreço, todos derivados da cessação do contrato de trabalho, estariam fora do período de referência, ou seja, fora do período de seis meses que antecederam 04.05.2012, porque seriam posteriores.

Não se vencendo tais créditos no período de referência estabelecido pelo n.º 1, do artigo 319.º, da Lei n.º 35/2004, de 29/07, não pode o Fundo de Garantia Salarial assegurar o seu pagamento.

Tal como decidido na decisão recorrida, embora com fundamentos não coincidentes.

Termos em que, não merece provimento o presente recurso, uma vez que o acto praticado pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial não padece de qualquer vício que o inquine com anulabilidade ou nulidade, tal como decidido pelo Tribunal a quo.


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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantém a decisão recorrida, embora por fundamentos não coincidentes.

Custas pela Recorrente.
Porto, 16.12.2016
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Luís Garcia
Ass.: Alexandra Alendouro