Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02100/06.4BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/27/2014
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Pedro Marchão Marques
Descritores:OPOSIÇÃO; REVERSAO; PRESCRIÇÃO.
Sumário:I. A determinação do prazo de prescrição a aplicar faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei, ou seja, a determinação do prazo a aplicar depende do tempo que faltar para a prescrição se completar à face de ambas as leis, considerando o momento da entrada em vigor da lei nova.
II. Nos termos do n.º 5 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, o prazo de prescrição das dívidas suspende-se durante o período de pagamento das prestações autorizadas e só a exclusão desse regime determina a cessação do efeito suspensivo do prazo de prescrição.
III. Aos actos com efeito suspensivo da prescrição, aplica-se a regra do n.º 2 do art. 48.º da LGT de que as causas de suspensão em relação ao devedor principal produzem efeitos em relação ao responsável subsidiário, independentemente do momento em que ocorrer a citação deste último.
IV. A subordinação da extensão ao responsável subsidiário dos efeitos dos actos praticados em relação ao devedor originário, que se estabelece no n.º 3 do art. 48.º da LGT (a citação daquele até ao 5.º ano posterior ao da liquidação), apenas está prevista quanto aos actos interruptivos da prescrição e não também quanto às causas de suspensão da prescrição.
V. A citação do responsável subsidiário determina a interrupção da prescrição nos termos previstos no n.º 1 do artigo 49.º da LGT, com a consequente inutilização de todo o período de prescrição anteriormente decorrido (art. 326.º, n.º 1 do Código Civil). Tanto a citação do devedor originário como a citação do devedor subsidiário têm eficácia interruptiva, pois que estando em causa uma só instância executiva, em que pela reversão se opera uma alteração subjectiva da instância, nada permite retirar eficácia interruptiva à citação do devedor subsidiário.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:A...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A Fazenda Pública (Recorrente), não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que declarou a prescrição da dívida exequenda e julgou procedente na oposição deduzida por A...(Recorrido), na qualidade de responsável tributário subsidiário, contra a execução fiscal n.º 3581200401019937 e apensos, instaurada originariamente à “H...& Filhos, Lda.”, para cobrança coerciva de IVA dos exercícios de 1991 e 1992 e IRC de 1993, no montante global de EUR0 900.942,98, dela veio interpor o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:

A. Nos presentes autos foi proferida sentença que considerou prescritas as dividas relativas a IVA dos anos de 1991 e 1992 e IRC do ano de 1993, no montante de € 7.593,11 em cobrança coerciva no processo de execução fiscal (PEF) n.º 3581200401019937 e apensos.

B. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, padecendo a decisão recorrida de erro na matéria de facto e na aplicação do direito, pelas razões que passa a expender.

Vejamos,

C. Independentemente do regime aplicável às dívidas em causa ser o CPT, diploma ao tempo da ocorrência dos factos tributários, a aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em resultado da previsão normativa do artigo 297.º do CC, não impõe a aplicação de um ou outro regime em bloco, ou seja, do CPT ou da LGT (que sucedeu ao CPT), pois, só se refere à lei que altere o prazo e não aos termos em que se conta, nem tudo o que releva para o seu curso.

D. Assim, em matéria de prescrição de obrigação tributária, a lei nova não poderá atribuir eficácia extintiva a períodos de tempo que, face à lei antiga, não tinham relevância para efeitos de prescrição, designadamente aqueles que cuja relevância decorre de actos com efeito suspensivo ou interruptivo.

E. Por sua vez, e ao que ao caso também nos interessa, o Decreto-Lei n.º 124/96 de 10 de agosto, a chamada “Lei Mateus”, veio estabelecer, relativamente à generalidade dos devedores do Estado, “um regime geral de pagamento em prestações mensais iguais, até um máximo de 150, com redução, nos casos normais, de juros de mora vencidos e vincendos” (cfr. o respectivo preâmbulo), cujo n.º 10 do artigo 14º deste diploma que “O deferimento do requerimento determina (…) a suspensão dos processos de execução fiscal em curso (…)” e o n.º 5 do seu artigo 5.º “O prazo de prescrição das dívidas suspende-se durante o período de pagamento em prestações”.

F. Tem sido entendimento jurisprudencial, que a suspensão do prazo prescricional do regime prestacional ao abrigo da Lei Mateus será pelo prazo pelo qual foi deferido o pagamento dos créditos, até existir um despacho expresso de exclusão do regime prestacional, por verificação de ausência de condições para a manutenção nesse regime.

Assim,

G. Há desde logo que considerar que o prazo de prescrição, e como entendeu nesta parte e bem, o Tribunal a quo, suspendeu-se entre 1997 e 2003, mais propriamente entre 27 de Fevereiro de 1997 (data da adesão ao plano prestacional previsto no Decreto-lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, como fixado no ponto E do probatório) e 16 de Novembro de 2003 (data do despacho de exclusão por falta de pagamento das prestações, como fixado no ponto E do probatório).

H. Só uma vez desaparecida esta qualidade impeditiva, o prazo volta a correr, e na sua contagem inclui-se aquele que decorreu antes do aparecimento da causa suspensiva com o que vai decorrer após a sua cessação.

I. Por outro lado, há que atender à citação do responsável subsidiário, aqui oponente, a qual reveste a mesma eficácia interruptiva que a do devedor originário, uma vez que se trata de uma só instância executiva, em que pela reversão, se opera uma alteração subjectiva.

J. Todavia, na sentença recorrida olvidou-se por completo a relevância da citação do responsável subsidiário enquanto facto interruptivo da prescrição.

K. O aqui oponente, responsável subsidiário, foi citado em 14.07.2006 e não 14.07.2007, como o Tribunal a quo fixou no ponto C. do probatório, conforme decorre dos autos, facto do probatório que, por influir na decisão da causa, preliminarmente, aqui se requer que seja alterado ao abrigo dos poderes que são concedidos ao Tribunal ad quem pelo n.º 1 do art. 662.º do Código de Processo Civil.

L. Ao que ao caso importa, o facto, como considerado pelo Tribunal a quo do oponente só ter sido citado após o 5º ano posterior ao da liquidação dos impostos, conforme art. 48º, n.º 3 da LGT, não importa nos presentes autos, uma vez que este normativo, por um lado, apenas se refere à interrupção e não à suspensão do prazo de prescrição, e por outro lado, a interrupção aí prevista é a relativa ao devedor principal, que não a que referimos – citação do oponente – que é relativa ao responsável subsidiário.

M. Subsumindo a factualidade atinente aos presentes autos ao direito aplicável, e referindo-nos à dívida mais antiga – 1991, temos que o oponente ao ter sido citado em 14.07.2006, data em que ainda não havia decorrido o prazo de prescrição mercê da supra referida suspensão do mesmo entre 27.02.1997 e 16.11.2003, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem os seus efeitos próprios, inutilizando o prazo decorrido sendo que o novo prazo de prescrição ainda nem sequer começou a correr, pois o processo de execução fiscal está ainda em curso, de acordo com o n.º 1 do artigo 327.º do Código Civil.

N. Neste enquadramento, conclui-se que o prazo de prescrição das dívidas exequendas ainda não atingiu o seu termo.

O. Pelo que a sentença que assim não decidiu, não pode manter-se na ordem jurídica.

Termos em que,

Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.



O Recorrido não apresentou contra-alegações.


Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, defendendo que deve ser negado provimento ao recurso.


Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.


I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, sem prejuízo daquelas que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente, traduzem-se em apreciar se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter entendido que a dívida exequenda se encontrava prescrita, não considerando devidamente todos os elementos de prova constantes dos autos, concretamente no que deriva da citação do responsável subsidiário.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto e que aqui se reproduz ipsis verbis:

A. O processo de execução fiscal nº 3581200401019937 e aps. foi instaurado a 20 de Julho de 2004 pelo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 3 contra a sociedade “H...& Filhos, Lda.” para cobrança coerciva de IVA dos exercícios de 1991 e 1992 e IRC de 1993 no montante global de € 900.942,98 (novecentos mil e novecentos e quarenta e dois euros e noventa e oito cêntimos);

B. B. A 07 de Julho de 2006 foi lavrado despacho de reversão contra o oponente, o qual se considera aqui integralmente reproduzido,

C. O Oponente foi citado a 14 de Julho de 2007 – por confissão, articulado 2º da petição inicial;

D. Não foi prestada garantia;

E. A devedora originária aderiu a 27 de Fevereiro de 1997 ao plano prestacional previsto no Decreto-Lei 124/96, de 10 de Agosto, tendo a 16 de Novembro de 2003 sido proferido despacho de exclusão por falta de pagamento das prestações acordadas – cfr. fls. 261 a 269;

F. Os presentes autos de oposição deram entrada a 31 de Julho de 2006, nos quais o oponente defende a verificação da prescrição da dívida exequenda no montante de € 7.234,56 (sete mil e duzentos e trinta e quatro euros e cinquenta e seis cêntimos);

G. A devedora originária foi citada a 03 de Setembro de 2004 – cfr. fls. 20-v.

Não foram consignados factos não provados.



Como assinalado pela Recorrente (conclusão K. do recurso), é manifesto que o Tribunal a quo incorreu em erro manifesto ao consignar no facto C. que “[o] Oponente foi citado a 14 de Julho de 2007”. Com efeito, desde logo tal acontecimento histórico se mostra impossível de ter ocorrido em Julho de 2007, uma vez que, como vem provado, os presentes autos de oposição deram entrada a 31 de Julho de 2006, pelo que, necessariamente, a citação do executado teria que ser anterior a esta data.

De resto, e adoptando os mesmos elementos da fundamentação da decisão da matéria de facto exteriorizada pelo Tribunal a quo, o que é confessado pelo oponente no artigo 2.º da p.i. de oposição é que. “(…) foi o oponente citado em 14 de Julho corrente, como responsável subsidiário – Doc. 1 que se junta e dá por reproduzido para os legais efeitos”. Ora, a expressão “corrente” (ano) é efectuada por referência ao ano de 2006, data em que a oposição foi deduzida. De resto, sempre o referido doc. 1 junto com a p.i. – “Citação (Reversão)” – indicado pelo oponente, tem aposta a data de 7.07.2006.

Assim, ao abrigo do disposto no art. 712.º, n.º 1, al.s a) e b), do CPC (na redacção aplicável), corrige-se a factualidade fixada em C. do probatório, passando nessa alínea a ler-se:

C) O Oponente foi citado a 14 de Julho de 2006 – por confissão, articulado 2º da petição inicial.



II.2. De direito

Nos autos estão a ser cobradas coercivamente dívidas provenientes de IVA dos anos de 1991 e 1992 e IRC de 1993 (cfr. o facto provado em A.).

Vejamos a sucessão de leis tributárias no tempo, a fim de determinar qual o prazo de prescrição aplicável: até 1 de Julho de 1991 esteve em vigor o Código de Processo das Contribuições e Impostos (CPCI), cujo art. 27.º estipulava o prazo de prescrição de 20 anos; nessa data, entrou em vigor o CPT (cfr. art. 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 154/91, de 17 de Abril, diploma que aprovou o CPT.), que, nos termos do art. 34.º, n.º 1, diminuiu para 10 anos esse prazo. Posteriormente, em 1 de Janeiro de 1999 (cfr. art. 6.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma que aprovou a LGT.), o referido prazo foi de novo encurtado para 8 anos pelo art. 48.º, n.º 1, da LGT.

Para se decidir a questão da sucessão das leis no tempo, impõe-se observar o disposto no art. 297.º, n.º 1 do C. Civil. Como ensina Jorge Lopes de Sousa, por um lado, as regras do art. 297.º do C. Civil aplicam-se directamente às leis que alteram prazos, embora já não se apliquem às leis que alteram causas de suspensão ou interrupção, pois que a estas (que não são leis que alterem prazos) vale a regra de aplicação no tempo constante do n.º 2 do art. 12.º do C. Civil: os efeitos jurídicos de factos que para tal relevem, são determinados pela lei vigente no momento em que eles ocorrem (cfr. Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, 2.ª ed., 2010, pp. 92 e 103).

Por outro lado, a determinação do prazo de prescrição a aplicar faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei, ou seja, a “determinação do prazo a aplicar depende do tempo que faltar para a prescrição se completar à face de ambas as leis, considerando o momento da entrada em vigor da lei nova”. Tal como se afirma no Acórdão do STA de 30.11.2011, proc. n.º 1012/11: “Quando esta entra em vigor falta a totalidade do tempo que ela prevê; por isso o que é necessário é calcular «o tempo que, nesse momento, falta para a prescrição à face da lei antiga. Se faltar menos tempo do que o previsto no novo prazo, é de aplicar o prazo da lei antiga”. E esta contagem do prazo que falta faz-se, por um lado, “considerando tudo o que consta da lei antiga (início, causas de suspensão e de prescrição) como se depreende do texto da parte final do nº 1 do art. 297º do CPPT”, mas, por outro lado, faz-se «sem ponderar a interferência de causas de suspensão ou interrupção da prescrição que possam vir a ocorrer na vigência da lei nova, só constatáveis a posteriori» (cfr. Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., pp. 94 a 96). Ou seja, para a determinação do prazo a aplicar o tempo que releva é o tempo que falta em abstracto, ou dito de modo inverso, cumpre averiguar se à data em que entraram em vigor as leis que encurtaram os prazos de prescrição faltava menos tempo para o prazo se completar à luz da lei antiga.

Como igualmente refere o Autor citado (idem, p. 95): “Seria diferente se a lei dissesse que se aplicava o regime legal que conduzisse mais rapidamente à consumação da prescrição, o que só poderia ser averiguado depois de ela se consumar. A expressão «falte» tem o significado evidente de colocar o intérprete, para determinar qual o prazo a aplicar, num momento anterior à consumação da prescrição, quando ainda não pode saber quais os factos interruptivos e suspensivos que poderão vir a ocorrer.

É manifesta a inaplicabilidade do prazo de 20 anos do CPCI às obrigações que se constituíram no âmbito da sua vigência, uma vez que, referindo-se a dívida mais antiga ao ano de 1991 e iniciando-se a contagem do respectivo prazo em 1 de Janeiro de 1992, nos termos do art. 27.º do CPCI, quando o CPT entrou em vigor – em 1 de Julho de 1991 – não tinha decorrido tempo algum.

A questão coloca-se apenas quanto ao prazo de 8 anos da LGT relativamente ao prazo de 10 anos do CPT: se até à data em que entrou em vigor a LGT (1 de Janeiro de 1999) a soma do prazo corrido for inferior ou igual a dois anos, não faltará menos tempo à face do CPT para a prescrição se completar, pois o prazo nele previsto é de 10 anos enquanto na LGT é 8 anos e por isso, será de aplicar o prazo da LGT; se faltar menos tempo do que o previsto no novo prazo, é de aplicar o prazo da lei antiga.

Vejamos, tomando em conta a dívida mais antiga, isto é, de 1991.

O prazo de prescrição de 10 anos do CPT conta-se desde 1 de Julho de 1992, data da entrada em vigor daquele Código, para a dívida de 1991, de acordo com o disposto no art. 297.º do C. Civil (e desde 1.01.1993 e 1.01.1994, para as dívidas de 1992 e 1993 - art. 34.º, n.º 2, do CPT).

Porém, a Executada originária veio a aderir em 27.02.1997 ao plano prestacional previsto no Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, vulgarmente designado por Plano Mateus (cfr. o provado em E. supra), tendo a 16.11.2003 sido proferido despacho de exclusão por falta de pagamento das prestações acordadas. Desde logo, como se vem entendendo, no âmbito do pagamento em prestações autorizado ao abrigo daquele regime, não só a paragem do respectivo processo de execução, decorrente de tal autorização, é imputável ao contribuinte (cfr. i.a., o Ac. do STA de 12.10.2011, proc. n.º 593/11), como face à redacção dada ao artigo 49.º da LGT pela Lei n.º 100/99, nada obstava a que se concedesse relevo às causas suspensivas autónomas em relação ao facto com efeito interruptivo. E, nos termos do n.º 5 do artigo 5.º do referido Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, o prazo de prescrição das dívidas suspende-se durante o período de pagamento das prestações autorizadas (entendendo-se como período de pagamento aquele que foi concedido ao contribuinte para pagar e não apenas aquele em que ele efectivamente pagou, pelo que só a exclusão desse regime determina a cessação do efeito suspensivo do prazo de prescrição – cfr. o Ac. do STA de 19.01.2011, proc. n.º 629/09).

Assim, como neste ponto entendeu o Tribunal a quo, e a Recorrente reitera, o prazo de prescrição suspendeu-se entre 27.02.1997 e 16.11.2003, ou seja, desde a data da adesão ao “Plano Mateus” e a data do despacho de exclusão por falta de pagamento das prestações. Pelo que, em 1 de Janeiro de 1999, data em que entrou em vigor a LGT, apenas havia corrido para a prescrição o prazo de 5 anos, 1 mês e 26 dias, relativamente à dívida de 1991. Logo, à data em que a LGT entrou em vigor, faltava menos tempo para se completar o prazo prescricional contado nos termos do CPT. O que significa que o prazo a considerar é o de dez anos do CPT.

Ora, sabido que o prazo de prescrição deixou de correr em virtude do efeito suspensivo da prescrição por força da adesão da executada originária ao designado “Plano Mateus”, apenas em 16.11.2003 o dito prazo de 10 anos recomeçou a sua contagem.

Continuando, de acordo com o art. 49.º, n.º 1, da LGT têm efeito interruptivo, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação, o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo e a citação (esta na sequência da alteração que a Lei n.º 100/99, de 26 de Julho). Verificando-se a citação do devedor originário em 30.09.2004 e do responsável subsidiário, ora Recorrido, em 14.07.2006, como ficou provado.

Como se afirmou no Acórdão deste TCAN de 30.04.2013, proc. n.º 706/06.BEVIS (por nós relatado): “(…) a citação do responsável subsidiário determina a interrupção da prescrição nos termos previstos no n.º 1 do artigo 49.º da LGT, com a consequente inutilização de todo o período de prescrição anteriormente decorrido (art. 326.º, n.º 1 do Código Civil). Na verdade, tanto a citação do devedor originário como a citação do devedor subsidiário têm eficácia interruptiva, pois que estando em causa uma só instância executiva, em que pela reversão se opera uma alteração subjectiva da instância, nada permite retirar eficácia interruptiva à citação do devedor subsidiário (neste sentido, i.a., os Acórdãos do STA de 24.03.1999, proc. n.º 21791, de 28.05.2008, proc. n.º 154/08, e de 19.01.2011, proc. n.º 629/09)”.

Ou seja, a citação do responsável subsidiário tem eficácia interruptiva do prazo prescricional de 10 anos que se encontrava em curso e que não havia ainda sido atingido.

Já se referiu que a citação da devedora originária se verificou em 30.09.2004. Pelo que ocorreu 10 meses e 14 dias depois da cessação da suspensão e somando este prazo ao já decorrido anteriormente temos decorridos do prazo de prescrição 6 anos, 2 meses e 16 dias. Esta citação teve dois efeitos: inutilizou todo o prazo decorrido anteriormente e impediu que voltasse a decorrer o prazo.

E produziu esses efeitos quer quanto ao responsável originário quer quanto ao responsável subsidiário.

Por outro lado, o prazo só voltaria a decorrer com o trânsito da decisão que extinguisse a execução ou com a paragem da execução por mais de um ano por motivo não imputável ao sujeito passivo (o que não vem provado).

No entanto, o Tribunal a quo entendeu que como o responsável subsidiário havia sido citado para além do 5.º ano posterior à liquidação, a interrupção da prescrição em relação ao devedor originário não produz efeitos em relação àquele, por força do disposto no artigo 48º, n.º 3 da LGT. Para tanto, consignou o seguinte discurso fundamentador:

Ora, o Oponente defende a aplicação na presente situação do artigo 48º, nº 3 da LGT, defendendo a Fazenda Pública o oposto.

Relembremo-nos que o oponente foi citado a 14 de Agosto de 2007 [2006] e que por sua vez, a devedora originária foi citada a 03 de Setembro de 2004. Assim sendo, foi citado após o quinto ano posterior ao da liquidação menos antiga (a de 1993).

Ora, o facto com efeito interruptivo em relação ao devedor originário ocorreu já na vigência da LGT, pelo que a sua eficácia em relação ao responsável subsidiário fica subordinada à verificação da condição de que depende (e que é a respectiva citação vir a ocorrer até ao termo do 5º ano posterior ao da liquidação) e previsto nesta mesma lei. Como refere Jorge Lopes de Sousa, in Notas sobre a aplicação no tempo das normas sobre prescrição da obrigação tributária, «A nova lei é a competente para fixar os efeitos dos factos que ocorram na sua vigência (art.º 12, n.º 2 do CC), pelo que pode fixá-los nos termos que entender desde que não haja legítimas expectativas a respeitar. No caso do art.º 48º, nº 3, a lei nova vem, relativamente aos factos a que reconhece efeito interruptivo da prescrição que ocorram na sua vigência, subordinar a produção de efeitos em relação ao responsável subsidiário a uma condição que é a citação até ao 5º ano a contar da liquidação.

Assim, também aqui, a solução do problema de aplicação da lei no tempo depende do momento em que ocorrer o facto interruptivo e não da eventualidade de, à face das regras do art.º 297 do CC, ser aplicável o regime do CPT ou da LGT no que concerne à duração dos prazos de prescrição.»

Daí que independentemente de ser aplicável à presente situação o prazo prescricional previsto no CPT, uma vez que o processo executivo foi instaurado em 2004, isto é, na vigência da LGT, que não reconhece ao contrário do CPT efeito interruptivo à sua instauração – sendo que o facto interruptivo relevante da prescrição, a citação do responsável originário, ocorreu ele também na vigência da LGT. Mas como o responsável foi citado para além do 5º ano posterior à liquidação das dívidas, a interrupção da prescrição em relação ao devedor originário não produz efeitos em relação àquele, por força do disposto no artigo 48º, nº 3 da LGT.

É, pois, neste ponto que assenta o dissídio, alegando a Recorrente que ao caso pouco importa o facto do oponente só ter sido citado após o 5.º ano posterior ao da liquidação da dívida, uma vez que o art. 48º, n.º 3, da LGT apenas se refere, por um lado, à interrupção e não à suspensão do prazo de prescrição e, por outro lado, a interrupção aí prevista é a relativa ao devedor principal e não a relativa ao responsável subsidiário (cfr. conclusão L. do recurso).

Vejamos então.

Dispõe o art. 48.º, n.º 3, da LGT, na redacção introduzida pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho, que: A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação.

Sobre este preceito, ensina Jorge Lopes de Sousa o seguinte (cfr. Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, 3.ª ed., 2003, p. 117-118):

No caso do art. 48.º, n.º 3, a lei nova vem, relativamente aos factos a que reconhece efeito interruptivo da prescrição que ocorram na sua vigência, subordinar a produção de efeitos em relação ao responsável subsidiário a uma condição que é a citação até ao 5.º ano a contar da liquidação.

(…)

É de salientar que a subordinação a condição da extensão ao responsável subsidiário dos efeitos dos actos praticados em relação ao devedor originário, que se estabelece no n.º 3 do art. 48.º da LGT, apenas está prevista quanto aos actos interruptivos da prescrição e não também quanto às causas de suspensão da prescrição, como tal denominadas, designadamente as previstas no n.º 3 do art. 49.º na redacção inicial. Quanto a estes factos com efeito suspensivo da prescrição, aplica-se a regra do n.º 2 do mesmo art. 48.° da LGT de que as causas de suspensão em relação ao devedor principal produzem efeitos em relação ao responsável subsidiário, independentemente do momento em que ocorrer a citação deste. Isto é, o período de suspensão derivado de factos denominados como causas de suspensão da prescrição em relação ao devedor principal, será também um período de suspensão em relação ao responsável subsidiário, mesmo que ele venha a ser citado apenas passados cinco anos a contar do ano da liquidação. Entendimento este subscrito pela Jurisprudência do STA, designadamente nos Acórdãos de 27.02.2008, proc. n.º 1069/07, de 14.07.2008, proc. n.º 431/08, e de 5.12.2012, proc. n.º 1225/12.

Ou seja, segundo este regime, a interrupção de prescrição determinada pela citação do devedor principal não produz efeitos relativamente ao responsável subsidiário se a citação deste for efectuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação. O que significa que, à luz deste regime, a prescrição pode não ocorrer relativamente ao devedor principal e ocorrer em relação ao devedor subsidiário (caminho aparentemente trilhado pelo Tribunal a quo). No entanto, aos actos com efeito suspensivo da prescrição, aplica-se a regra do n.º 2 do mesmo art. 48.º da LGT de que as causas de suspensão em relação ao devedor principal produzem efeitos em relação ao responsável subsidiário, independentemente do momento em que ocorrer a citação deste.

Aliás, a conclusão de que o n.º 3 deste art. 48.º apenas prevê causas interruptivas da prescrição e não também causas suspensivas, decorre da mera interpretação sistemática do próprio artigo: enquanto no n.º 2 o legislador fala em “causas de suspensão ou interrupção”, no n.º 3 apenas se refere a “interrupção da prescrição”. Se ao nível da previsão normativa o legislador identificou expressamente elementos diferentes susceptíveis de a integrar (os institutos da suspensão e da interrupção), estatuindo regimes distintos (para o n.º 2 e para o n.º 3), só pode concluir-se que o tatbestand ou facti-species da norma contida no referido n.º 3 apenas comporta causas interruptivas. O art. 9.º do C. Civil isso impõe, uma vez que a letra da lei, com o seu significado próprio, constitui um elemento irremovível da interpretação jurídica. Dito de modo diverso, se dúvida se suscitasse ao intérprete-aplicador sobre o alcance normativo do n.º 3 do citado art. 48.º da LGT, esta ficaria categoricamente esclarecida pelo confronto com a disposição imediatamente anterior (o n.º 2): o n.º 3 apenas contempla causas interruptivas (sob pena de postergação da norma por via de interpretação correctiva).

Assim, o regime plasmado no citado art. 48.º, n.º 3, da LGT é distinto da leitura que dele aparentemente foi feita pelo Tribunal a quo ou, pelo menos, não suporta o efeito jurídico que dele foi retirado.

É que, como assinala a Recorrente, mesmo que a citação da devedora originária (em 3.09.2004 – cfr. G. supra) não tenha produzido qualquer efeito interruptivo da prescrição relativamente ao oponente, ora Recorrido, certo é que relativamente àquele, enquanto responsável subsidiário, ocorreu a interrupção da prescrição com a sua própria citação para a execução (em 14.07.2006). Sendo que o período de suspensão derivado da adesão ao Plano Mateus (causa de suspensão da prescrição em relação ao devedor principal), é também um período de suspensão do prazo prescricional em relação ao responsável subsidiário. Donde, como no caso em apreço estamos a falar de uma causa de suspensão, resulta claramente que o referido n.º 3 do art. 48.º da LGT não tem, pois, aplicação, ainda que a citação do revertido, ora Recorrido, tenha sido efectuada para além do 5.º ano posterior à liquidação.

Ora, considerando que a citação do oponente tem relevância própria como facto interruptivo da prescrição, inutilizando todo o tempo até aí decorrido (8 anos, para a dívida mais antiga), é de concluir que o prazo de prescrição desta dívida (10 anos) ainda não atingiu o seu termo.

Deste modo, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao não ter ponderado devidamente a circunstância de o revertido, oponente e ora Recorrido, ter sido citado dentro do prazo de 10 anos e desse modo ter a sua própria citação, em 14.07.2006, constituído facto interruptivo do prazo prescricional. Neste enquadramento, haverá que concluir-se que o prazo de prescrição das dívidas exequendas não atingiu o seu termo.

Pelo que a sentença que assim não decidiu, não pode manter-se.

Posto isto, considerando que o único fundamento da oposição, como resulta manifesto do art. 19.º da p.i. apresentada, foi a prescrição da dívida exequenda (art. 204.º, n.º 1, al. d), do CPPT), em face do acabado de concluir, tanto basta para julgar improcedente a oposição.

Em conformidade, há que conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a oposição improcedente, como infra se determinará.



III. Conclusões

Sumariando:

I. A determinação do prazo de prescrição a aplicar faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei, ou seja, a determinação do prazo a aplicar depende do tempo que faltar para a prescrição se completar à face de ambas as leis, considerando o momento da entrada em vigor da lei nova.

II. Nos termos do n.º 5 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, o prazo de prescrição das dívidas suspende-se durante o período de pagamento das prestações autorizadas e só a exclusão desse regime determina a cessação do efeito suspensivo do prazo de prescrição.

III. Aos actos com efeito suspensivo da prescrição, aplica-se a regra do n.º 2 do art. 48.º da LGT de que as causas de suspensão em relação ao devedor principal produzem efeitos em relação ao responsável subsidiário, independentemente do momento em que ocorrer a citação deste último.

IV. A subordinação da extensão ao responsável subsidiário dos efeitos dos actos praticados em relação ao devedor originário, que se estabelece no n.º 3 do art. 48.º da LGT (a citação daquele até ao 5.º ano posterior ao da liquidação), apenas está prevista quanto aos actos interruptivos da prescrição e não também quanto às causas de suspensão da prescrição.

V. A citação do responsável subsidiário determina a interrupção da prescrição nos termos previstos no n.º 1 do artigo 49.º da LGT, com a consequente inutilização de todo o período de prescrição anteriormente decorrido (art. 326.º, n.º 1 do Código Civil). Tanto a citação do devedor originário como a citação do devedor subsidiário têm eficácia interruptiva, pois que estando em causa uma só instância executiva, em que pela reversão se opera uma alteração subjectiva da instância, nada permite retirar eficácia interruptiva à citação do devedor subsidiário.


IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em:

- Conceder provimento ao presente recurso;

- Revogar a sentença recorrida; e, em substituição,

- Julgar a oposição improcedente.

Custas em 1.ª instância pelo Recorrido, não sendo devido o pagamento da taxa de justiça nesta instância, uma vez que não contra-alegou.


Porto, 27 de Fevereiro de 2014

Ass. Pedro Marques

Ass. Pedro Vergueiro

Ass. Nuno Bastos