Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03509/10.4BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/18/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:CESSAÇÃO DE CONTRATO COMO PROFESSOR ASSOCIADO; AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO NECESSÁRIA À EXECUÇÃO DO D.L. Nº. 205/09, DE 31.08;
REGIME AVALIATIVO TRANSITÓRIO; PRINCÍPIO DA LEGALIDADE; PRETERIÇÃO DE AUDIÊNCIA PRÉVIA DE INTERESSADOS; APROVEITAMENTO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS
Sumário:I- Impondo o nº. 3 do artigo 19º do D.L. nº. 205/09 que, uma vez findo o período experimental, a conversão do contrato de trabalho dos professores catedráticos e associados depende de uma avaliação específica da atividade desenvolvida durante aquele período, de acordo com os critérios fixados pelo órgão legal e estatutariamente competente da instituição da ensino superior, em Regulamentação futura a aprovar, não podia a Ré, como forma de ultrapassar a sua própria inércia regulamentar, avaliar o Autor de com base num “regime transitório” de avaliação com reporte para os critérios de avaliação previstos no anterior regime do ECDU agora revogado, que fez entretanto aprovar por Despacho Reitoral nº. 105/2009, sob pena de atuação contra legem.

II- Mostrando-se evidenciada a falta de substrato legal para a atuação da Universidade do Minho descrita nos autos, especificamente traduzida na criação de um regime avaliativo transitório por parte da Universidade do Minho com reporte para os critérios de avaliação previstos no anterior regime do ECDU agora revogado, resulta absolutamente desnecessária o conhecimento do alegado em torno do artigo 22º do ECDU, pois, ainda que se concluísse que o ali preconizado não era impeditivo do chamamento à colação das normas previstas no anterior regime do ECDU, sempre o princípio da legalidade, enquanto postulado estruturante de atuação da atividade administrativa, o obstacularizaria completamente.

III- Não tendo a Recorrente cumprido o ónus da impugnação da matéria de facto, logo fica este Tribunal Superior impedido de alterar a matéria de facto fixada na sentença recorrida nos termos invocados pela Recorrente.

IV- Na situação recursiva, nada nos garante nada garante, bem pelo contrário, que se a ilegalidade detetada não tivesse sido cometida o conteúdo do ato impugnado teria sido o mesmo, desta feita, resultando aqui inviável a figura da fórmula latina “utile per inutile non vitiatur”, que habilita o julgador, mormente, o juiz administrativo a poder negar relevância anulatória ao erro da Administração.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:U.M,
Recorrido 1:J.A.D.R.L.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
* *

I – RELATÓRIO

U.M, com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL do Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [doravante TAF do Porto], de 05.03.2014, proferido no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada por J.A.D.R.L., também com os sinais dos autos, que indeferiu a Reclamação para a Conferência da sentença, datada de 20.03.2012, que julgou procedente a presente ação, e, consequentemente, anulou o despacho do Reitor da U.M de 27.08.2010, que, aderindo à deliberação do Conselho Cientifico da Escola de Engenharia da U.M de 07.07.2010, aprovou a cessação do contrato celebrado com o Autor, aqui Recorrido.

Em alegações, a Recorrente formulou as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso:

“(…)

A. A Recorrente considera que o Tribunal a quo não fez uma correta interpretação e aplicação do direito, não enfermando o ato em crise de qualquer das ilegalidades assacadas.

B. O art° 6º do Decreto-Lei n° 205/2009, de 31 de agosto, estabeleceu o regime de transição dos professores associados, prevendo no n° 5 que “os professores catedráticos e associados a que se refere o n° 2 podem optar pela duração do período experimental prevista no n° 2 do artigo 19° do Estatuto, na redação dada pelo presente decreto-lei”.

C. O Recorrido optou pelo período experimental de um ano, facto que comunicou ao então Reitor da Recorrente.

D. Findo aquele período, a conversão do seu contrato em contrato por tempo indeterminado, em regime de tenure, dependia da avaliação específica da atividade desenvolvida durante aquele período, de acordo com os critérios fixados pelo órgão legal e estatutariamente competente da instituição de ensino superior (artº. 19º. nº 3, ECDU).

E. Àquele data, e à semelhança das demais instituições de ensino superior públicas, a U.M não havia, ainda, fixado os referidos critérios.

F. Estávamos perante um vazio jurídico que importava preencher pelo que o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), por via da Recomendação n° 4/2009, deliberou que “(...) 2º - Os processos de nomeação definitiva já em curso à data da entrada em vigor do ECDU devem ser concluídos à luz da redação anterior do ECDU”.

G. Esta situação convoca a problemática da sucessão de leis e aplicação das leis no tempo sendo que, segundo o Professor Baptista Machado, a entrada em vigor de uma lei nova ou até de um sistema jurídico inteiramente novo não provoca um corte radical na continuidade da vida social.

H. No caso dos autos, legitimado pela deliberação do CRUP, o Reitor da Recorrente, através do Despacho RT n° 105/2009, de 31 de dezembro de 2009, recorrendo-se dos critérios de avaliação contidos no art.° 20° do anterior regime do ECDU, aplicáveis aos processos de nomeação de professores em curso pôde, transitoriamente, ultrapassar a alegada falta de regulamentação.

I. Esta decisão, contrariamente ao decidido no Acórdão recorrido, de modo algum violou “frontalmente o art° 19°, n° 3 do ECDU”.

J. A solução adotada, balizada pelo entendimento do CRUP, e à qual as Universidades aderiram na generalidade, era a única possível atenta a falta de regulamentação de critérios, motivo pelo qual se impunha o recurso ao art° 20° da anterior redação do ECDU.

K. O mencionado artigo estabelecia que “até noventa dias antes do termo dos períodos referidos...os professores catedráticos e associados deverão apresentar ao conselho cientifico da sua escola um relatório pormenorizado da atividade pedagógica e cientifica que hajam desenvolvido nesse período...”.(sombreado nosso)

L. Apesar das várias interpelações, o Recorrido nunca entregou o sobredito relatório, impossibilitando o Conselho Científico de proceder à sua análise pelo que, à falta de objeto de apreciação, aquele órgão só poderia propor a caducidade do contrato do Recorrido.

M. Não era de todo irrelevante a falta de apresentação do relatório da atividade científica e pedagógica.

N. E, tendo em conta a natureza das funções do docente universitário, enunciadas no art° 4o e ss. do ECDU (regime vigente), bom de ver é que os critérios adotados, e que constavam do anterior regime, em tudo se aproximam daqueles que o art° 19° do atual regime manda fixar.

O. Quaisquer critérios de avaliação a adotar pelo Conselho Científico sempre reconduziriam à análise de atividade pedagógica e científica do docente, bem como quaisquer outros elementos relevantes para apreciação do relatório curricular (conforme, aliás, já dispunha o artº 20º do anterior ECDU). 

P. Na prática, o Conselho Científico tanto podia aplicar os critérios do regime anterior como quaisquer outros que viesse a adotar - mister era que pudesse avaliar, situação que, como se viu, o Recorrido não permitiu.

Q. Não acompanhamos o Acórdão na parte em que refere que às regras do período experimental seria “exclusivamente aplicável o disposto no presente Estatuto”.

R. O art° 22°, n° 1, do ECDU, na redação atual, estabelece que “aos períodos experimentais previstos nos contratos dos professores catedráticos, associados e auxiliares é exclusivamente aplicável o disposto no presente Estatuto”.

S. Porém, a intenção do legislador foi, tão só, acautelar a natureza especial do regime da carreira docente universitária afastando-o, relativamente ao período experimental, do regime geral previsto no art° 20° e ss. da Lei n° 12-A/2008, de 27 de fevereiro, o que se compreende atenta a natureza especial da carreira docente universitária.

T. A situação dos autos transpôs uma realidade transitória, em que ainda não haviam sido fixados os critérios a que se refere o art° 22° do atual regime jurídico da carreira docente universitária.

U. Impunha-se chamar à colação as normas previstas no anterior regime ou, até, outros critérios que o Conselho Científico pudesse adotar, assim ultrapassando uma situação de vazio jurídico.

V. O ato do Reitor da Recorrente também não enferma de vício de anulabilidade, por preterição de audiência dos interessados.

W. Apesar das várias notificações, efetuadas por vários meios, o processo arrastou-se até ao dia 14 de setembro de 2010, sendo certo que o Recorrido foi efetivamente notificado em 16 de julho, e não apenas em setembro, como vem aventado no Acórdão.

X. “A lei não condiciona a perfeição da notificação ao efetivo recebimento pelo destinatário da correspondência, exigindo apenas que esta seja corretamente expedida para o respetivo domicílio. Compreende-se esta opção legislativa, pois seria excessiva a proteção dos interesses particulares em detrimento do interesse público, se a realização deste ficasse dependente das variadíssimas circunstâncias da vida pessoal de cada um dos interessados, mesmo que legítimas, sem falar na dificuldade de fiscalização de eventuais abusos meramente dilatórios. E naturalmente, salvo norma especial que no caso não existe, continua a impender sobre cada cidadão que parte de férias o ónus de gerir a sua casa e respetiva caixa de correio” (Ac. TCA-Sul, in Proc. 10304/00, de 22/0G/2D05).

Y. Ainda que assim não se considere, o que só por mera hipótese se admite, e sem prejuízo da validade do ato que aqui pugnamos, cremos que o ato em apreço poderá não ser anulável com base na teoria da “desvalorização do vício formal”, por entendermos que o ato praticado foi o ato devido em face da disciplina aplicável, não podendo ter conteúdo e sentido diverso, vigorando aqui o princípio do aproveitamento do ato.

Z. O princípio do aproveitamento do ato prescreve que não se justifica anular um ato, mesmo que ele enferme de vício de violação de lei ou de forma, sempre que estando em causa um comportamento vinculado, o ato que haja de se proferir não possa ter outro conteúdo senão aquele que lhe foi dado.

AA. “Em certos casos a lei dispensa o seu cumprimento e, noutros, a mesma pode degradar-se em formalidade não essencial e, portanto, ser omitida sem que dai resulte ilegalidade determinante da anulação do ato”.

“O cumprimento do disposto no art° 100° do CPA constitui assim, uma importante garantia de defesa dos direitos do administrado pelo que é considerada uma formalidade essencial. Todavia, e apesar disso, a mesma não deixa de ser uma formalidade instrumental que, em certos casos, pode degradar-se em formalidade não essencial e, portanto, ser omitida sem que dai resulte ilegalidade invalidante."

BB. Tal acontecerá nos casos em que, estando em causa uma atividade vinculada, a Administração concluiu que a decisão administrativa não poderá ser outra senão aquela que projeta tomar (vd. Acórdão STA de 2B/0B/97. Rec. 39792).

CC. “'Efetivamente, a natureza do vício verificado, e considerando que a preterição de formalidades essenciais pode ser objeto de desvalorização, importa verificar se a verificação do mesmo deve conduzir à anulação do ato recorrido. A desvalorização dos vícios de forma pode ocorrer por uma de duas vias, a saber, a degradação de formalidades essenciais em não essenciais e a desvalorização dos vícios formais, sendo que a degradação apenas se verifica nos casos em que se demonstra que a finalidade exigida com a formalidade preterida foi alcançada; no segundo caso, a desvalorização do vício formal apenas pode ocorrer em casos em que o ato que foi praticado foi o ato devido em face da disciplina aplicável, não podendo ter conteúdo e sentido diverso, vigorando o princípio do aproveitamento dos atos administrativos, nesse caso." (Ac. STA, in Processo 0787/10, de 0B/D9/2DII).

DD. Perante a ausência de relatório de atividades, a cuja entrega o Recorrido se encontrava obrigado, não restava outra solução ao Conselho Científico que não fosse propor a não manutenção do contrato de trabalho em funções públicas.

EE. Caso venha a verificar-se que o ato recorrido não foi precedido de audiência dos interessados, entendimento que não acompanhamos, sempre se deverá concluir pela desvalorização do vício respetivo nos termos supra enunciados.

FF. A repetição do ato que ora se anularia conduziria a que se praticasse um novo ato de igual teor ao recorrido, repetição que nenhuma vantagem traria, quer ao interesse público, quer ao interesse da recorrente, pelo que, em razão da economia dos atos públicos, deve ser considerada inoperante a hipotética ilegalidade formal e. consequentemente, manter-se o ato na ordem jurídica.

TERMOS EM QUE,

sempre com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o douto acórdão recorrido, como é legal e de inteira JUSTIÇA.

(…)".


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Notificado que foi para o efeito, o Recorrido não contra-alegou.

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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

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O Ministério Público neste Tribunal não emitiu o parecer a que alude o nº.1 do artigo 146º do CPTA.

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Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

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II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir resumem-se a saber se o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação e interpretação do direito do disposto (i) no artigo 19º, nº. 3 do ECDU; (ii) no artigo 22º do ECDU; e, bem assim, do (iii) preceituado nos artigos 100º a 103º do C.P.A., na redação vigente à data dos factos.
Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.
* *
III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos:
“(…)

1) Por despacho de 14.06.1999, do Reitor da U.M, publicado no Diário da República, II série, n.° 197, de 24/08/1999, foi o A. J. A. D. F. L. nomeado provisoriamente na categoria de Professor Associado do Grupo Disciplinar de Informática do quadro da mesma Universidade, com efeitos a partir da data do despacho autorizador, por conveniência urgente de serviço, tendo o A. subscrito o termo de posse em 24.08.99.

2) Em 25.10.2006, o A. subscreveu Termo de aceitação de nomeação como Professor Associado do Grupo Disciplinar de Informática, do Quadro, na modalidade de nomeação provisória.

3) E, em 30.09.2009, o A., tendo em vista o disposto no art.° 19° do DL n° 205/2009, de 31.08, declarou optar pelo período experimental de um ano (fl. 69 do p.a.)

4) O referido período experimental de um ano terminava a 31 de agosto de 2010.

5) Por ofício com a refª “ADM-24/2010”, datado de 30/08/2010, foi o A. notificado do ofício n.° DRH-785/2010, de 27-08-2010, assinado pelo Senhor Reitor da U.M, em 14.09.2010 (fl. 49 do p.a.).

6) O referido oficio n.° DRH-785/2010, de 27-08-2010, dirigido ao A. e subscrito pelo Reitor da U.M, referia que o Conselho Científico da Escola de Engenharia daquela Universidade havia reunido no dia 7 de julho de 2010, tendo em vista a avaliação do período experimental relativo ao contrato como Professor Associado, e a passagem do Requerente a contrato de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado em regime de tenure, mais constando do mesmo o seguinte: “Tendo sido aprovada, por unanimidade, a proposta de cessação do seu contrato, notifica-se V. Exa da decisão de fazer cessar o seu contrato como Professor Associado, com efeitos a partir de 1 de setembro de 2010, com a fundamentação constante da ata do conselho científico, cuja cópia segue em anexo (...).Assim, e nos termos dos art°s 100° e 101° do Código do Procedimento Administrativo, dispõe V. Exa. de 10 dias úteis, contados a partir da data de receção do presente oficio, para, querendo, dizer por escrito o que se lhe oferecer. Decorrido o prazo de 10 dias úteis sem que seja apresentada resposta, a presente decisão converte-se em definitiva.”

7) Dou aqui por reproduzido o teor da Ata da Reunião do Conselho Científico da Escola de Engenharia da U.M (EEUM) n° 07/2010, restrita a Prof. Associados e Catedráticos em regime de tenure, relativa à reunião do referido órgão de 07 de julho de 2010, para avaliação do período experimental e contratação por tempo indeterminado em regime de tenure do Doutor José Augusto Lima, constante de fls. 7 a 8 do p.a.

8) O número de membros que compõem o Conselho Científico da EEUM na sua versão restrita é de 20 (vinte).

9) Em 24.09.2010, o A. recebeu uma notificação judicial avulsa com o teor constante de fls. 66 do p.a., a qual foi requerida pela U.M e averbada à Secretaria-Geral das Varas e Juízos Cíveis do Porto em 01.09.2010, sendo fundamentos da mesma os seguintes:

“1. O Requerido celebrou um contrato de trabalho em funções públicas com a U.M, aqui Requerente, para o exercício de funções docentes como Professor Associado, pelo período experimental de um ano, nos termos e ao abrigo do Estatuto da Carreira Docente Universitária, aprovado pelo Decreto Lei n.° 205/2009, de 31 de agosto, com a redação dada pela Lei n.° 8/2010, de 13 de maio (doc. n.° 1).
2. Em cumprimento do disposto no art.° 19.° do Estatuto da Carreira Docente Universitária, o Conselho Cientifico da Escola de Engenharia da Universidade, reuniu no dia 7 de julho de 2010, tendo em vista a avaliação do período experimental relativo ao contrato como Professor Associado e a passagem do contrato para contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado em regime de tenure.
3. Tendo o Conselho Cientifico deliberado, naquela data e por unanimidade, a proposta de cessação do referido contrato, em virtude de o Requerido não ter apresentado o relatório das atividades realizadas - apesar de, por diversas vezes, instado para proceder à apresentação do dito relatório -, impedindo assim que fosse efetuada, pelo Conselho Científico, a avaliação do período experimental, (doc. n.° 2).
4. Consequentemente, e com os fundamentos referidos no ponto anterior, foi, em 13 de julho do presente ano, tomada a decisão, pelo Reitor da Universidade, de fazer cessar o contrato do Requerido como Professor Associado, com efeitos a partir de 1 de setembro de 2010 (doc. n.° 3).
5. Sucede que, até à presente data, não foi possível notificar o Requerido da decisão referida no número anterior, não obstante lhe terem sido enviadas três cartas registadas com aviso de receção, as quais foram sempre devolvidas, com indicação de “não levantamento” aposta pelos serviços dos correios.
6. Foi ainda diligenciada a notificação pessoal do Requerido, no seu domicílio, por duas vezes, embora também sem êxito.---
7. Também se enviaram dois e-mails para o endereço eletrónico institucional do Requerido, sem que este acusasse o seu recebimento.
8. Pretende, portanto, a Requerente notificar o Requerido da decisão de cessação do contrato que o vincula à Universidade, decisão essa com efeitos a 1 de setembro deste ano.
9. Mais pretende a Requerente notificar o Requerido para, nos termos dos arts. 100.° e 101.° do Código do Procedimento Administrativo, querendo, dizer por escrito o que se lhe oferecer, no prazo de 10 dias úteis após o recebimento da notificação que ora se requer.
10. Notificando-o ainda de que, decorrido o prazo de 10 dias úteis sem que seja apresentada resposta, a decisão de cessação do contrato converte-se em definitiva.” (fl. 67 e 68 do p.a.).
10) A partir de 14 de setembro de 2010, a R.:

a) Deixou de pagar a retribuição ao Requerente;

b) Comunicou à ADSE que o mesmo deixava de ser beneficiário da mesma;

c) Não lhe atribuiu qualquer tipo de serviço docente;

d) Desativou o cartão de acesso ao parque de estacionamento do campus da Universidade;

e) Vedou-lhe o acesso ao domínio de internet interno da Universidade (intranet);

f) Impediu-o de aceder ao gabinete que, enquanto docente lhe foi disponibilizado (Gabinete 2.10 no Edifício do Departamento de Informática, Campus de Gualtar).

11) Em 21.09.2010, o A. dirigiu ao Administrador da U.M, um requerimento de igual teor ao documento de fls. 18 e segs. do p.a., no qual requeria a documentação aí mencionada - “cópia do regulamento funcional (estatutos?) do Conselho Científico da Escola de Engenharia”, bem como certidões de teor de todos os documentos que constituem o processo administrativo que conduziu à emissão do ofício DRH-785/2010 - “necessária para o informado exercício do direito de audiência prévia”.

12) Como não lhe tivesse sido emitida certidão completa do processo administrativo, o A., em 13.10.2010, remeteu novo requerimento ao Administrador da U.M, solicitando-lhe a emissão de certidão de teor desse documento (fl. 100 do p.a.)

13) Com data de 18.11.2010, foi remetido ao A. o ofício com a refª “DRH - 1049/2010, UM-23055/2010”, através do qual lhe foi remetido o Despacho Reitoral RT - 105/2009, de 31 de dezembro, sendo o seguinte o seu teor:

“O Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU), com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 205/09, de 31 de agosto, carece de regulamentação em diversas matérias de nuclear importância para o correto funcionamento das Universidades.

Assim,

Considerando o disposto nos artigos 19.°, n°3, e 25°, n.° 1, do ECDU e a necessidade de clarificar o regime de avaliação específica da atividade desenvolvida pelos professores durante o período experimental e a transição para regime de contratação por tempo indeterminado em regime de tenure;

Nos termos do art. 83.°-A do ECDU e dos Estatutos da U.M, aprovo as seguintes regras:

1. As avaliações específicas dos docentes contratados por um período experimental e que requerem a contratação por tempo indeterminado em regime de tenure são realizadas pelo Conselho Científico, nos termos estatutários;

2. Enquanto não forem aprovados os critérios de avaliação específica previstos nos artigos 19.°, n.°3, e 25.°, n.°1, são aplicáveis as regras previstas no ECDU, na redação anterior ao Decreto-Lei n.° 205/09, de 31 de agosto, para a nomeação definitiva dos professores catedráticos e associados (art. 20.°) e para a nomeação definitiva dos professores auxiliares (art. 25.°);

3. Os Pareceres a elaborar e as deliberações dos Conselhos Científicos podem ainda fazer menção ao desempenho das funções previstas nos artigos 6.° e 63.° do ECDU, na redação agora conferida pelo Decreto -Lei n.° 205/09;

4. Nas deliberações do conselho científico apenas podem votar os professores de categoria superior ao lugar a prover, ou da própria categoria, tratando -se de professor catedrático;

5. As deliberações são tomadas em votação nominal justificada, não sendo permitidas abstenções:

6. Estando em causa a contratação por tempo indeterminado e em regime de tenure de professores auxiliares aplicam-se ainda as seguintes regras:

a) A maioria de 2/3 prevista no art. 25.°, n.° 1, do ECDU tem como universo de referência o conjunto dos membros do órgão presentes que satisfaçam as condições referidas no n.° 4.

b) As eventuais faltas às reuniões do Conselho Científico cuja ordem de trabalhos preveja a tomada de deliberações referidas no artigo 25.° do ECDU devem ser obrigatoriamente justificadas por escrito e levadas ao conhecimento do órgão na reunião em causa ou, excecionalmente, na reunião seguinte;

c) Não se formando maioria de 2/3 no sentido da contratação por tempo indeterminado e em regime de tenure, o docente é notificado nos termos e para os efeitos previstos no art. 25.°, n.° 2 e n.° 1, alínea b);

d) No caso previsto na alínea anterior, o docente é contratado por um período de seis meses, improrrogável,

7. Nos termos do n.°3 do artigo 19° e do n.°1 do artigo 25° do ECDU, cabe ao reitor a decisão final da contratação.

U.M, 31 de dezembro de 2009.

O Reitor,” (fls. 108 e 109 do p.a.).

14) No final do ano letivo 2009/2010, o A. entregou no Departamento de Recursos Humanos da Requerida, em 22/07/2010, comunicação de que iniciaria o período de férias a que tinha direito a partir de 27/07/2010.

15) Em 23.07.2010 o A. saiu de Portugal tendo regressado no dia 11.08.2010.

16) Por ofícios subscritos pelo Presidente da Escola de Engenharia da R. datados de 08.04.2010 e de 31.05.2010 (fls. 4 e 5 do p.a.), o A. foi notificado para remeter o respetivo relatório das Atividades Pedagógicas e Científicas, o qual não remeteu.


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Não se provou:

• Que o A. foi notificado do “despacho de cessação” no dia 16 de julho de 2010.

(…)”


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III.2 - DO DIREITO
O Autor, aqui Recorrido, intentou no T.A.F. do Porto a presente ação administrativa especial com vista à invalidade do despacho do Reitor, que determinou a cessação do contrato celebrado entre si e a R., ou, em alternativa, dos atos pelos quais foi determinada a cessação do seu contrato, e, designadamente, deixou de lhe ser paga retribuição, não lhe foi distribuído serviço docente, foi cancelada a inscrição na ADSE, o acesso à internet e ao parque de estacionamento, contrários à lei e inválidos.
O T.A.F. do Porto julgou esta ação procedente, consequentemente, anulando o despacho do Reitor da U.M de 27.08.2010 que, aderindo à deliberação do Conselho Científico da Escola de Engenharia da U.M de 7 de julho de 2010, aprovou a cessação do contrato celebrado com o A.
A Ré, aqui Recorrente, confrontada com esta decisão de procedência, após algumas vicissitudes processuais, reclamou para a Conferência, pedindo que recaísse um acórdão sobre a sentença da Meritíssima Juíza Relatora da primeira instância, que concedeu provimento à pretensão do Autor.
Porém, o Tribunal a quo, em conferência, decidiu, em 05.03.2014, indeferir a reclamação apresentada e manter a decisão reclamada.
Ora, é deste Acórdão que vem interposto o presente recurso jurisdicional, estribado em erro de julgamento, por errada aplicação e interpretação do direito, como se referiu supra, do disposto (i) no artigo 19º, nº. 3 do ECDU; (ii) no artigo 22º do ECDU; e, bem assim, do (iii) preceituado nos artigos 100º a 103º do C.P.A., na redação vigente à data dos factos.
Estes erros de julgamento estão veiculados nas alíneas B) a U) e w) a FF) das conclusões das alegações da Recorrente supra transcritas, respetivamente, substanciando-se, se bem se interpreta o pensamento ali vazado, nas alegações de que o Tribunal a quo não andou bem:
(i) ao julgar que o ato impugnado violou o artigo 19º, nº. 3 do ECDU, porquanto, dependendo a conversão em contrato por tempo indeterminado de docente após o terminus do período experimental da avaliação da atividade desenvolvida por docente, na falta de regulamentação desses mesmos critérios, impunha-se o recurso ao artigo 20º da anterior redação do ECDU, que estabelecia a obrigatoriedade de apresentação de um relatório pormenorizado da atividade desenvolvida, o que o Recorrido nunca fez, mostrando-se, dessa forma, legitimada a operada cessação do contrato de trabalho do Recorrido.
(ii) ao julgar que o ato impugnado violou o artigo 22º do ECDU, na medida em que o ali preconizado não obstaculizava o chamamento à colação das normas previstas no anterior regime do ECDU por forma a ultrapassar-se uma eventual situação de vazio jurídico;
(iii) ao considerar preterida a audiência prévia de interessados, visto que o Autor, aqui recorrido, foi, efetivamente, notificado em 16 de julho, e não apenas em setembro, sendo certo que, ainda assim não se entenda, tem lugar aqui o princípio do aproveitamento do ato administrativo, pois, perante a ausência da entrega do relatório de atividades, outra solução não se impunha à Ré, aqui Recorrente, senão fazer cessar o contrato de trabalho, não se justificando, por isso, a anulação do ato impugnado.
Vejamos, convocando, desde já, a fundamentação que, nestes particulares conspectos, ficou vertida no acórdão recorrido:
“(…)

Está em causa, em primeira linha a apreciação da legalidade do despacho do Reitor da U.M de 27.08.2010 que decidiu fazer cessar o contrato de professor associado a que o A. se encontrava vinculado com a fundamentação constante da ata do Conselho Cientifico de 07.07.2010.
O DL n.° 205/2009 de 31 de agosto procedeu à revisão do Estatuto da Carreira Docente Universitária.
Nos termos do seu art.° 6.°, n.° 2 “os atuais professores catedráticos e associados nomeados provisoriamente transitam, sem outras formalidades, para o contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado em período experimental.”.
“Os professores catedráticos e associados a que se refere o n.° 2 podem optar pela duração do período experimental prevista no n.° 2 do artigo 19.° do Estatuto, na redação dada pelo presente decreto-lei” (n.° 5 do mesmo artigo).
“Se o contrato referido no número anterior não for precedido por um contrato por tempo indeterminado como professor das carreiras docentes do ensino universitário ou do ensino politécnico ou como investigador da carreira de investigação científica, o mesmo tem o período experimental de um ano” (art.° 19°, n.° 2 do ECDU revisto pelo mencionado DL).
Como se demonstrou, o A. optou pela duração do período experimental de um ano, prevista neste artigo.
Nos termos do n.° 3 do mesmo preceito legal (na sua verão originária) “findo o período experimental, e em função de avaliação específica da atividade desenvolvida realizada de acordo com critérios fixados pelo órgão legal e estatutariamente competente da instituição de ensino superior, o contrato passa a contrato por tempo indeterminado em regime de tenure, nos termos do artigo seguinte, salvo se o órgão máximo da instituição de ensino superior, sob proposta fundamentada aprovada por maioria de dois terços do órgão científico legal e estatutariamente competente, decidir no sentido da sua cessação, decisão que deve ser comunicada ao professor até 90 dias antes do termo daquele período”.
O período experimental terminava no dia 31 de agosto de 2010.
Assim sendo, a decisão de cessação deveria ter sido comunicada ao A. até ao dia 2 de junho de 2010.
O que, como resulta da factualidade assente (note-se que a própria deliberação impugnada data de 7 de julho de 2010) manifestamente não sucedeu, violando-se assim, nesta parte, o disposto neste art.° 19°, n.° 3.
Refere ainda, o A. que não foram aprovados os critérios de avaliação específica da atividade desenvolvida a que se refere o art.° 19.°, n.° 3 do ECDU.
(…)
Nos termos do ponto 2. do Despacho Reitoral n.° 105/2009 de 31 de dezembro emanado nos termos do art.° 83°-A do ECDU, que supra se reproduziu, “enquanto não forem aprovados os critérios de avaliação específica previstos nos artigos 19.°, n.°3, e 25.°, n.°1, são aplicáveis as regras previstas no ECDU, na redação anterior ao Decreto-Lei n.° 205/09, de 31 de agosto, para a nomeação definitiva dos professores catedráticos e associados (art. 20.°) e para a nomeação definitiva dos professores auxiliares (art. 25.°).”
Ora, tal norma regulamentar viola frontalmente o art.° 19°, n.° 3 do ECDU já que aí se refere que a avaliação específica da atividade desenvolvida é realizada de acordo com critérios fixados pelo órgão legal e estatutariamente competente da instituição de ensino superior, impondo-se assim, em face da revogação das anteriores regras, que fossem aprovados tais critérios e não que se procedesse à aplicação do regime revogado.
Sendo portanto irrelevante a falta de apresentação do relatório pormenorizado da atividade pedagógica e científica, anteriormente exigido.
Resultando expressamente do art.° 22°, n.° 1 do ECDU que “aos períodos experimentais previstos nos contratos dos professores catedráticos, associados e auxiliares é exclusivamente aplicável o disposto no presente Estatuto”.
E que, nos termos do art.° 83°-A, n.° 3 do ECDU, “os regulamentos a aprovar pelas instituições mão podem afastar as disposições do Estatuto.
Pelo que o ato impugnado violou os art.°s 19°, n.° 3 e 22°, n.° 1 do ECDU.
(…)
A audiência dos interessados, como figura central do procedimento administrativo decisório de primeiro grau, representa o cumprimento da diretiva constitucional de "participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito" (artigo 267.°, n.° 5 da Constituição da República), determinando para o órgão administrativo competente a obrigação de associar o administrado à tarefa de preparar a decisão final.
Assim sendo, num procedimento administrativo, concluída a instrução, a administração, em princípio, nos termos do estabelecido nos art° 100° a 103° do CPA, tem a obrigação de promover a audiência dos interessados, devendo informá-los não só sobre o “sentido provável” da decisão, como ainda dos aspetos relevantes nas “matérias de facto e de direito” em que se fundamenta o projeto ou proposta de decisão.
Resulta da matéria factual provada que o A. jamais foi notificado, em data anterior à deliberação impugnada, para, querendo se pronunciar sobre o sentido provável da decisão.
No momento em que foi notificado (14.09.2010), já a deliberação tinha sido tomada e os seus efeitos começaram-se imediatamente a produzir.
Pelo que foi violado este direito de audiência prévia, sendo o ato impugnado também por esta via, anulável, nos termos do art.° 135° do CPA.
Em face de todo o circunstancialismo que envolveu a tomada da deliberação impugnada, não é possível afirmar que a decisão tenha sido a única legalmente admissível. Não se podendo afirmar a irrelevância da preterição da audiência prévia, inexiste fundamento para negar a eficácia invalidante deste vício e assim para o aproveitamento do ato.
(…)”.
Espraiada a fundamentação vertida no Acórdão recorrido, adiante-se, desde já, que não vislumbra razão para divergir do ali decidido nos domínios em análise.
Explicitemos pormenorizadamente este nosso juízo, deixando-se, desde já, assente que o presente caso recursivo é predominantemente regulado pelo Estatuto da Carreira Docente Universitária [doravante ECDU], na redação que emerge do Decreto-Lei nº. 205/2009, de 31.08.
É o seguinte o teor do artigo 6º do Decreto-Lei nº. 205/2009, de 31.08:
“(…)
CAPÍTULO III
Regime transitório
Artigo 6.º
Regime de transição dos professores catedráticos e associados
1 - Os atuais professores catedráticos e associados nomeados definitivamente transitam, sem outras formalidades, para o contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado em regime de tenure, nos termos do disposto no artigo 20.º do Estatuto, na redação dada pelo presente decreto-lei, mantendo os regimes de cessação, de reorganização de serviços e colocação de pessoal em situação de mobilidade especial e de proteção social próprios da nomeação definitiva.
2 - Os atuais professores catedráticos e associados nomeados provisoriamente transitam, sem outras formalidades, para o contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado em período experimental.
3 - Para os efeitos do número anterior:
a) O período experimental tem a duração do período de nomeação provisória previsto no regime vigente à data do seu início;
b) O tempo já decorrido na situação de nomeação provisória é contabilizado no âmbito do período experimental;
c) Concluído o período experimental, aplicam -se as regras constantes do n.º 3 do artigo 19.º do Estatuto, na redação dada pelo presente decreto -lei.
4 - Aos professores que se encontravam na situação de nomeação provisória e que transitam para contrato por tempo indeterminado em período experimental aplica-se o disposto no n.º 4 do artigo 88.º da Lei n.º 12 -A/2008, de 27 de fevereiro, por força do disposto no artigo 89.º da mesma lei.
5 - Os professores catedráticos e associados a que se refere o n.º 2 podem optar pela duração do período experimental prevista no n.º 2 do artigo 19.º do Estatuto, na redação dada pelo presente decreto-lei.
6 - A opção a que se refere o número anterior é comunicada ao órgão máximo da instituição de ensino superior no prazo de 30 dias após a data da entrada em vigor do presente decreto -lei.
(…)”
Por sua vez, preceituam os artigos 19º e 83- A, ambos do ECDU, na redação que emerge do Decreto-Lei nº. 205/2009, de 31.08:”

“(…)

Artigo 19.º

Contratação de professores catedráticos e associados [destaque nosso]

1 - Os professores catedráticos e associados são contratados por tempo indeterminado.

2 - Se o contrato referido no número anterior não for precedido por um contrato por tempo indeterminado como professor das carreiras docentes do ensino universitário ou do ensino politécnico ou como investigador da carreira de investigação científica, o mesmo tem o período experimental de um ano.

3 - Findo o período experimental, e em função de avaliação específica da atividade desenvolvida realizada de acordo com critérios fixados pelo órgão legal e estatutariamente competente da instituição de ensino superior, o contrato passa a contrato por tempo indeterminado em regime de tenure, nos termos do artigo seguinte, salvo se o órgão máximo da instituição de ensino superior, sob proposta fundamentada aprovada por maioria de dois terços do órgão científico legal e estatutariamente competente, decidir no sentido da sua cessação, decisão que deve ser comunicada ao professor até 90 dias antes do termo daquele período.

4 - Na situação de cessação prevista no número anterior, e sendo o caso, o docente regressa à situação jurídico-funcional de que era titular antes do período experimental, quando constituída e consolidada por tempo indeterminado.

(…)

Artigo 83.º-A

Regulamentos [destaque nosso]

1 - O órgão legal e estatutariamente competente de cada instituição de ensino superior aprova a regulamentação necessária à execução do presente Estatuto, a qual abrange, designadamente, os procedimentos, as regras de instrução dos processos e os prazos aplicáveis aos concursos e convites, no quadro da necessária harmonização de regras gerais sobre a matéria.

2 - No que se refere aos concursos, os regulamentos devem abranger a tramitação procedimental, designadamente as regras de instrução de candidaturas, os prazos, os documentos a apresentar, os parâmetros de avaliação, os métodos e critérios de seleção a adotar e o sistema de avaliação e de classificação final.

3 - Os regulamentos a aprovar pelas instituições não podem afastar as disposições do presente Estatuto.

(…)”.

A leitura concatenada dos preceitos de lei ordinária supra transcritos revela-nos, para o que ora nos interessa, que, com a entrada em vigor do citado D.L. 205/09, os atuais professores catedráticos e associados nomeados provisoriamente transitam, sem outras formalidades, para o contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado em período experimental, podendo estes optar pela duração do período experimental de 1 ano.
Neste particular, sublinhe-se o que dimana do probatório coligido nos autos sob os pontos 1 a 4, donde emerge designadamente que o Autor, tendo sido nomeado provisoriamente na categoria de Professor Associado, declarou optar pelo período experimental de 1 ano, que terminaria a 31 de Agosto de 2010.
Revela-nos ainda que, uma vez findo o período experimental, a conversão do contrato de trabalho dos professores catedráticos e associados depende de uma avaliação específica da atividade desenvolvida durante aquele período, de acordo com os critérios fixados pelo órgão legal e estatutariamente competente da instituição da ensino superior, em Regulamentação a aprovar, que não pode afastar as disposições do ECDU.
Contudo, e neste concreto domínio, não foi essa a atuação desenvolvida pela Ré nos autos, pois não avaliou o Autor de acordo com critérios fixados em nova Regulamentação a provar, mas antes com base num “regime transitório” de avaliação com reporte para os critérios de avaliação previstos no anterior regime do ECDU agora revogado, que fez entretanto aprovar por Despacho Reitoral nº. 105/2009.
O que serve para concluir que a Ré não seguiu a ritologia procedimental prevista no nº.3 do artigo 19º do ECDU, dessa forma, atuando expressamente contra legem.
Poder-se-á, contudo, objetar que a atuação assim desenvolvida pela Ré, sustentada no Despacho Reitoral nº. 105/2009, é admissível no procedimento em curso, atento um eventual vazio jurídico criado com a falta atempada de aprovação da Regulamentação necessária à execução do ECDU.
Antes de mais, refira-se que o vazio jurídico, rectius, regulamentar, a existir, é exclusivamente imputável à Ré, não podendo o Autor, aqui Recorrido, ser surpreendido com uma solução administrativa especialmente não prevista na lei para ultrapassar a própria inércia regulamentar daquela.
Até porque, e com reporte para os princípios gerais que regem a sua atividade, é sabido que a lei é simultaneamente fundamento e limite da atuação da de Administração Pública, axioma devidamente corporizado no princípio da legalidade [vertente positiva e negativa].
Pelo que, à míngua de expressa norma legal habilitante [princípio da legalidade na vertente negativa], não podia a Ré, aqui Recorrente, ultrapassar a sua própria inércia regulamentar com recurso à fixação de um “regime avaliativo transitório” com reporte para os critérios de avaliação previstos no anterior regime do ECDU agora revogado, que fez entretanto aprovar por Despacho Reitoral nº. 105/2009.
Efetivamente, mostrando-se este “regime avaliativo transitório” carecido do necessário e específico substrato legal de atuação conforme, encontrava-se a aqui Recorrente impedida de proceder da forma descrita nos autos, sendo, por isso, a atuação sustentada no Despacho Reitoral nº. 105/2009 inadmissível em curso.
Quando muito, e na melhor das hipóteses, seria de admitir que a solução jurídica divergiria do acabado de expor caso o fixado “regime avaliativo transitório” oferecesse mínima correspondência com a nova Regulamentação a aprovar - que, nesta altura, já se mostra concretizada no Regulamento dos Concursos para Recrutamento de Professores da Carreira Docente Universitária na U.M, aprovada pelo Despacho n.º 17945/2010 - por se manter em vigor em tudo quanto não contraria a nova Regulamentação.
Porém, esse não foi o caminho trilhado pela Ré, que, no âmbito da sua discricionariedade, fez aprovar critérios de avaliação totalmente divergentes dos previstos no anterior regime do ECDU agora revogado, e que transitoriamente, serviram de suporte à avaliação da atividade desenvolvida pelo Autor, aqui Recorrido.
Por conseguinte, não ocorre a errada aplicação e interpretação do disposto no artigo 19º, nº. 3 do ECDU.
Cumpriria agora centrar a nossa atenção em torno do alegado erro de julgamento, por errada aplicação e interpretação do artigo 22º do ECDU.
Ocorre, porém, que tal tarefa se nos apresenta como inútil por destituída de efetiva relevância considerando o que se vem de expender supra.
Na verdade, mostrando-se plenamente evidenciada a falta de suporte legal para a atuação da U.M descrita nos autos, especificamente traduzida na criação de um regime avaliativo transitório por parte da U.M com reporte para os critérios de avaliação previstos no anterior regime do ECDU agora revogado, resulta absolutamente desnecessária o conhecimento do alegado em torno do artigo 22º do ECDU, pois, ainda que se concluísse que o ali preconizado não era impeditivo do chamamento à colação das normas previstas no anterior regime do ECDU, sempre o princípio da legalidade, enquanto postulado estruturante de atuação da atividade administrativa, o obstacularizaria completamente.
E nesta falta de relevância reside o “punctum saliens” distintivo da falta de préstimo à boa decisão de causa.
Nestes termos, e também por falta de relevância para a decisão de mérito a proferir, improcede o invocado erro de julgamento de direito em análise.
Improcedem, pois, as conclusões vertidas nas alíneas B) a U) do presente recurso.
Resta-nos, pois, a questão de saber se o acórdão recorrido, ao decidir pela preterição da audiência prévia de interessados, incorreu em erro de julgamento, por violação das normas previstas nos artigos 100º a 103º do C.P.A, na redação vigente à data dos factos.
Efetivamente, a Recorrente insurge-se contra este entendimento, desde logo, porquanto entende que o Autor foi notificado foi, efetivamente, notificado em 16 de julho, e não apenas em setembro.
Tal invocação, porém, não se pode admitir, atento os moldes em que foi a mesma delineada na motivação do recurso em análise.
Na verdade, e admitindo que se trata de uma impugnação implícita da matéria de facto fixada em 1ª instância, caberia à Recorrente, sob pena de rejeição imediata, especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; bem como indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados.
Neste sentido, ver, de entre muitos outros em sentido idêntico, aresto deste Tribunal Central Administrativo Norte de 12.04.2015, tirado no processo 00418/12.6BEPRT, consultável em www.dgsi.pt.
Não tendo a Recorrente cumprido este ónus da impugnação da matéria de facto, logo fica este Tribunal Superior impedido de alterar a matéria de facto fixada na sentença recorrida nos termos invocados pela Recorrente.
Por conseguinte, o quadro fáctico a atender é o que resulta fixado em 1ª instância, e não um qualquer outro, como o pretendido pela aqui Recorrente.
Sendo aquele o contorno fáctico imutável do caso a decidir, do qual este Tribunal Superior não se pode desviar, é nosso entendimento que nada existe a objetar à interpretação perfilhada pelo Tribunal a quo categórica no sentido da ocorrência in casu preterição da audiência prévia de interessados.
Todavia, não se pode encerrar a questão sem considerar o princípio de aproveitamento do ato administrativo.
Na verdade, e como a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem reiteradamente decidido, “o princípio do aproveitamento do ato administrativo, negando a eficácia invalidante do vício constatado, só poderá valer em casos de atividade vinculada da administração e apenas quando se possa afirmar, com inteira segurança, que o novo ato a praticar pela Administração, em execução de julgado anulatório, teria forçosamente o conteúdo decisório idêntico ao do ato anulado” [cfr. por todos, os acórdãos do Pleno de 16.06.2005, Proc.° n.° 1.204/03, e de 15.10.99, Proc.° n.° 21.488].
Assim, para se entendesse ser aplicável em situações como a dos autos o princípio do aproveitamento dos atos administrativos, teria o Tribunal de concluir com toda a segurança que o cumprimento da formalidade que se preteriu em nada alteraria o sentido da decisão censurada nos presentes autos.
Em tais circunstâncias, o mais que pode aceitar-se é que o Tribunal deixe de proferir a anulação contenciosa se lhe for exibida prova [cujo ónus compete ao Réu] de que a violação cometida não teve qualquer espécie de influência no resultado decisório, que seria sempre o mesmo se os vícios procedimentais detetados não tivessem ocorrido.
Só que, no caso dos autos, essa demonstração não é segura, pois mostra-se estribada na obrigatoriedade de apresentação de um relatório de atividades por parte do Autor, aqui Recorrido, de acordo com os critérios fixados no fixado “regime avaliativo transitório”, cuja aplicação no caso concreto, já vimos, que se mostra claramente destituída de substrato legal.
Pelo que nada nos garante nada garante, bem pelo contrário, que se esta ilegalidade não tivesse sido cometida o conteúdo do ato impugnado teria sido o mesmo, resultando assim inviável a utilização aqui da figura da fórmula latina “utile per inutile non vitiatur”, que habilita o julgador, mormente, o juiz administrativo a poder negar relevância anulatória ao erro da Administração.
O que serve para concluir que se mostra bem realizado o julgamento realizado pelo Tribunal a quo no domínio em análise.
Concludentemente, improcedem as conclusões de recurso em análise.
Mercê de tudo o quanto ficou exposto, deverá ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e mantida a sentença recorrida, com a atual fundamentação.
Assim se decidirá.

* *
IV – DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em negar provimento ao recurso jurisdicional “sub judice”, e manter a sentença recorrida..
Custas pela Recorrente.
Registe e Notifique-se.
* *
Porto, 18 de outubro de 2019,

Ricardo de Oliveira e Sousa
Fernanda Brandão
Frederico de Frias Macedo Branco