Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00596/09.1BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/23/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Vital Lopes
Descritores:INCIDENTE DE REFORMA
Sumário:O incidente de reforma não deve ser usado para manifestar discordância do julgado ou tentar demonstrar “error in judicando” (que é fundamento de recurso) mas apenas perante erro grosseiro e patente, ou “aberratio legis”, causado por desconhecimento, ou má compreensão, do regime legal.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Banco... e Fazenda Pública
Recorrido 1:Fazenda Pública e Banco...
Decisão:Indeferido o pedido de reforma
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

Relatório

O Banco…, Recorrente e Recorrido nos autos, notificado do Acórdão reformador deste TCAN, de 15/09/2016, a fls.677/679 dos autos – que deferiu parcialmente o pedido de reforma quanto a custas requerido pela Recorrente e Recorrida Fazenda Pública, determinando fosse desconsiderada na conta final metade do remanescente da taxa de justiça – , vem pedir a reforma quanto a custas, invocando o disposto nos artigos 616.º, n.º1 e 666.º, do CPC.

É este o teor do requerimento apresentado:
«1.º
O referido acórdão de 12.02.2015 desse Ilustre Tribunal concedeu provimento parcial ao recurso interposto pelo ora Recorrente contra a sentença proferida no âmbito do processo identificado em epígrafe e negou provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública contra a referida sentença.
2.º
Em matéria de condenação em custas, referia-se no aludido acórdão “Custas na proporção do decaimento em ambas as instâncias, sem redução do excesso, atenta a complexidade da causa” (cf. página 102 do acórdão de 12.02.2015).
3.º
O Ilustre Representante da Fazenda Pública requereu em 05.03.2015 a reforma do acórdão de 12.02.2015 quanto a custas, na parte referente ao remanescente da taxa de justiça, peticionando a sua dispensa nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais.
4.º
Com referência a este requerimento respondeu o Recorrente em 07.05.2015 no sentido de que nada tinha a opor quanto “(…) à dispensa de pagamento pelas partes do remanescente da taxa de justiça devida no processo” (sublinhados nossos).
5.º
Sobre este requerimento foi proferido o acórdão de 15.09.2016, no âmbito do qual esse Ilustre Tribunal decidiu “(…) deferir parcialmente o pedido e ordenar se desconsidere na conta final metade do remanescente da taxa de justiça devida neste recurso” (cf. página 5 do acórdão de 15.09.2016).
6.º
Atenta a circunstância de o presente acórdão ser complemento e parte integrante do acórdão de 12.02.2015, e de o Recorrente se considerar prejudicado com a alteração da decisão quanto a custas, requer-se nos termos das normas acima identificadas a reforma do acórdão de 12.02.2015 no que toca à decisão referente ao remanescente da taxa de justiça.
7.º
De facto, o Tribunal circunscreveu o presente pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça ao recurso deduzido pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública, quando se lhe impunha que a decisão de dispensa do remanescente da taxa de justiça fosse proferida com referência a todo o processo, consubstanciado em ambos os recursos deduzidos pelo Recorrente e pela Fazenda Pública, contra a sentença proferida no processo n.º 596/09.1BEPRT pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.
8.º
Com efeito, não só ambos os recursos foram apreciados por esse Tribunal de forma conjunta, como é este o entendimento que melhor se coaduna com as normas aplicáveis e como o espírito do sistema.
9.º
A decisão de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça é efetuada tendo em consideração os custos que, em concreto, o processo consumiu ao sistema de administração de justiça (cf., neste sentido, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte proferido no processo n.º 3192/11.0BEPRT, em 06.05.2016.).
10.º
A ponderação destes custos é necessariamente realizada por referência ao processo que correu termos nesse Ilustre Tribunal e que se traduziu nos dois recursos acima indicados.
11.º
Com efeito, não se concebe que, sendo as partes vencidas em ambos os recursos, houvesse que ser necessária a apresentação de tantos requerimentos de dispensa de pagamento do remanescente quanto os números dos recursos e das partes.
12.º
Efetivamente, o remanescente da taxa de justiça apura-se por referência ao valor da causa (cf. artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais).
13.º
A causa submetida ao crivo desse Ilustre Tribunal tinha como valor a soma das correções controvertidas em ambos os recursos.
14.º
Pelo que é por referência a este valor global da causa que a dispensa do remanescente deve ser perspetivada e decidida.
15.º
Razão pela qual, em face do exposto, se impõe que a decisão sobre o pedido do remanescente da taxa de justiça seja proferida com referência à taxa de justiça devida por ambas as partes no processo, o qual compreendeu ambos os recursos.
16.º
Pelo que se requer, nestes termos, a reforma do acórdão de 12.02.2015 quanto à decisão sobre o remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 616.º, n.º 1, e 617.º, n.º 6, ambos do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPTT, nos termos supra peticionados».

Baseia o pedido no facto de o Acórdão ser complemento e parte integrante do Acórdão reformado, de 12/02/2015, que condenou as partes no pagamento das custas na proporção do decaimento e por se considerar prejudicado com a respectiva alteração, uma vez que o Acórdão reformador de 15/09/2016 circunscreveu a decisão de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ao recurso interposto pela Fazenda Pública.

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitiu mui douto parecer no sentido de ser rejeitado o pedido de reforma formulado pelo Banco…, uma vez que não foi requerida atempadamente nem na forma legalmente exigida, a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça. E isso porquanto tendo o requerente apresentado recurso excepcional de revista para o STA, era nas respectivas alegações que deveria requerer a reforma do Acórdão deste TCAN quanto a custas e não o fez.

Foram dispensados os vistos, dada a simplicidade da questão.

Cumpre decidir, pois que a tal nada obsta.

Apreciação



O Requerente baseia o pedido no facto de o Acórdão ser complemento e parte integrante do Acórdão reformado, de 12/02/2015, que condenou as partes no pagamento das custas na proporção do decaimento e por se considerar prejudicado com a respectiva alteração, uma vez que o Acórdão reformador de 15/09/2016 circunscreveu a decisão de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ao recurso interposto pela Fazenda Pública. Vejamos.


1. Sobre a reforma do acórdão, dispõe o art.º616.º ex vi do art.º666.º, do CPC:
1 - A parte pode requerer, no tribunal que proferiu a sentença, a sua reforma quanto a custas e multa, sem prejuízo do disposto no n.º 3.
2 - Não cabendo recurso da decisão, é ainda lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz:
a) Tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos;
b) Constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida.
3 - Cabendo recurso da decisão que condene em custas ou multa, o requerimento previsto no n.º 1 é feito na alegação.


2. Sucede que o Requerente não pediu ao tribunal a reforma do Acórdão de 12/02/2015 quanto a custas, apesar de ter sucumbido parcialmente no recurso.

3. Ouvido sobre o pedido de dispensa de remanescente requerido pela Fazenda Pública, limitou-se a informar nada ter a obstar ao pedido (cf. fls.670).

4. Assim, não pode agora, confrontado com o decisório do Acórdão reformador de 15/09/2016, pretender a reforma deste – porque é disso que efectivamente se trata, para a reforma do acórdão de 12/02/2015 já nem o Requerente dispunha de prazo – de modo a ver contemplada, na elaboração da sua conta a pretensão, antes nunca formulada, de dispensa do remanescente da taxa de justiça.

5. Se entende que tinha formulado oportunamente tal pedido a este tribunal e sobre o mesmo indevidamente não recaiu pronúncia, o caminho processual próprio era o da arguição de nulidade do Acórdão de 15/09/2016 (art.º615.º, n.º1 alínea d), do CPC), que não o incidente da reforma.

6. Acresce que, tal como reiteradamente o vem salientando a jurisprudência do STJ, a hipótese de reforma da sentença ou acórdão funda-se em lapso manifesto do tribunal na legalidade do julgado, contende com uma situação de carácter excepcional e, apenas se verifica quando o juiz incorra em erro grosseiro, juridicamente insustentável, por lapso manifesto, na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos – vd. Ac. STJ, de 24/02/2015, proc.º4578/07, Sumários, 2015, p.104, cit. em ”NCPC – Anotado”, de Abilio Neto, Ediforum, 4:ª ed., p.925.

7. Não serve o incidente da reforma para manifestar discordância com o julgado, ou tentar demonstrar “error in judicando” que é no fundo aquilo que o Requerente faz quando argumenta, nomeadamente e entre o mais, que «…não se concebe que, sendo as partes vencidas em ambos os recursos, houvesse que ser necessária a apresentação de tantos requerimentos de dispensa de pagamento do remanescente quanto os números dos recurso e das partes» (cf. fls.687).

8. Mostra-se inútil indagar se o pedido de reforma deveria constar das alegações do recurso excepcional de revista apresentado nos termos do disposto no art.º150.º do CPTA, tal como sustenta o Exmo. Senhor PGA em vista do disposto no n.º3 do art.º616.º do CPC, ou se, pelo contrário, tal colide com a natureza desse recurso, pois como se constata das respectivas alegações também nada a propósito nelas foi requerido.

Decisão

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em indeferir o pedido de reforma.
Custas do incidente a cargo do Requerente, que fixo em 2 UC.
Porto, 23 de Novembro de 2017
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Mário Rebelo