Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01410/08.0BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/13/2012
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:DELEGAÇÃO COMPETÊNCIA
INCOMPETÊNCIA AUTOR ACTO
DEMOLIÇÃO IMÓVEL ILEGAL
POSSE ADMINISTRATIVA
Sumário:1 . Porque o Presidente da Câmara “pode delegar ou subdelegar nos Vereadores o exercício da sua competência própria ou delegada” (art.º 69.º, n.º 2 da Lei 169/99, de 18/9), nenhuma ilegalidade existe quando ele delega nos vereadores alguma ou algumas das competências que a lei originariamente lhe atribui.
2 . A delegação de competências com vista à realização de uma atribuição da pessoa colectiva tem compreender os meios e poderes indispensáveis à sua efectiva concretização visto que se essa delegação for desacompanhada da transferência desses meios e poderes será desprovida de eficácia e não fará qualquer sentido.
3 . Quando o Presidente da Câmara delega num vereador a competência para "embargar e ordenar a demolição de quaisquer obras, construções ou edificações efectuadas por particulares ou pessoas colectivas, sem licença ou com inobservância das condições dela constantes, dos regulamentos” [art.º 68.º, n.º2, al. m) da Lei 169/99, de 18/9], ter-se-á de considerar que essa delegação (mesmo que inexistisse acto de delegação quanto v.g., à tomada da respectiva posse administrativa), integra a transferência dos poderes necessários ao embargo e demolição de tais obras, maxime, o de, em caso de recusa do seu proprietário, tomar posse administrativa dos prédios onde as mesmas foram executadas tendo em vista a sua demolição e a reposição do status quo ante.*
*Sumário elaborado pelo Relator
Data de Entrada:05/18/2011
Recorrente:J..., Ldª
Recorrido 1:Município de Barcelos
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Nega provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não se pronunciou
1
Decisão Texto Integral:Acordam no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:
I
RELATÓRIO
1 . "J…, L.da", com sede do lugar de S…, Barcelos, inconformada, veio interpor o presente recurso jurisdicional, da decisão do TAF de Braga, datada de 31 de Janeiro de 2011, que julgou improcedente a acção administrativa especial de pretensão conexa com actos administrativos, deduzida contra o recorrido MUNICÍPIO de BARCELOS, onde pretendia a anulação do acto que ordenou a demolição e a posse administrativa da construção edificada sem licenciamento.
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A recorrente nas suas alegações, formulou, a final, as seguintes conclusões:
"A) Na sua p.i., a Autora alegou que o acto que decretou a posse administrativa do imóvel foi praticado pelo Senhor Vereador Eng. M..., no uso de competências próprias, facto esse que o próprio Réu reconheceu tacitamente na sua Contestação, pois não só não impugnou especificadamente essa factualidade, como nem sequer se dignou alegar a existência concreta de um qualquer acto de delegação de poderes do Presidente da Câmara na pessoa do Sr. Vereador;
B) Com efeito, o Réu, nos seus articulados, nunca alegou em concreto a existência ou prática de um acto de delegação de poderes como o constante no item 25 dos Factos Provados constante na douta sentença recorrida;
C) Sucede que, só após ter sido notificado da resposta às excepções, é que o Réu Município veio juntar aos autos uma certidão alegadamente comprovativa da delegação de poderes do Sr. Presidente da Câmara no Sr. Vereador em causa elaborada pela sua funcionária Directora de Departamento Financeiro da Câmara Municipal de Barcelos;
D) Importa desde logo salientar que, não tendo sequer sido alegada pelo Réu a referida delegação de poderes a junção da referida certidão nada poderia comprovar de útil para a presente acção.
E) De qualquer modo, em virtude de essa certidão narrativa contradizer as informações prestadas à Autora, esta viu-se obrigada a impugnar o seu conteúdo e solicitar ao Tribunal que notificasse o Réu para juntar cópia certificada do despacho 52/2005 do Sr. Presidente da Câmara e das actas das reuniões da Câmara de Barcelos (e respectivas deliberações) de 03/11/2005 e 11/11/2005, para poder confirmar o teor da certidão narrativa com as respectivas deliberações.
F) No entanto, não só o Réu não juntou tal documentação que está na sua posse, como o douto Tribunal “a quo” optou por considerar provado esse facto (item 25 dos Factos Provados). Tendo sido com base nesse item que o Réu foi absolvido (quanto a nós precipitadamente) do pedido sem aguardar por tal apresentação de documentos que é manifestamente essencial para a boa decisão da causa;
G) Face ao exposto, entendemos que o item 25 dos Factos Provados constantes na douta sentença recorrida foi incorrectamente julgado, devendo ser extraído/retirado dos Factos Provados pelos seguintes motivos: a) não foi alegado pelo Réu nos seus articulados; b) Foi considerado provado com base em documento especificadamente impugnado pela Autora e sem que tenha sido realizado qualquer outro meio de prova; c) Não foram ordenados, como deviam, os meios de (contra) prova desse facto requeridos de modo fundamentado pela Autora;
H) Nesse sentido, torna-se óbvio que o Senhor Vereador Engenheiro M... não tinha competência para, de per si, ordenar a posse administrativa do imóvel como o fez, violando assim o art. 107º/1 do DL 555/99 de 16 de Dezembro;
I) Por outro lado, o DL 555/99 de 16 de Dezembro não prevê sequer a possibilidade de delegação de poderes nos Vereadores para praticar actos relativamente a essa matéria (determinar posse administrativa), como acontece noutros casos como por exemplo o art. 94º/1 do DL 555/99 de 16 de Dezembro.
J) Assim, mesmo que existisse tal acto de delegação de poderes (o que só por dever de patrocínio se considera), se o legislador não previu expressamente essa possibilidade (como fez noutros casos no mesmo diploma legal) tal só pode significar que não foi sua intenção permitir a delegação de poderes em matéria tão sensível e excepcional.
K) Com efeito, o art. 35º/1 do CPA é muito claro quando refere que o acto de delegação de poderes só é possível quando exista uma lei que o permita. E, relativamente a esta matéria, não existe qualquer lei habilitante da delegação de poderes.
L) Esta impossibilidade de delegação de poderes em matéria tão sensível justifica-se com a gravidade das consequências que advêm do acto que ordena a posse administrativa. Com efeito, este afigura-se como um acto administrativo altamente desfavorável para os seus destinatários na medida em que implica a possibilidade de entrada, permanência e a prática de actos de disposição em terrenos de titularidade privada, sem o consentimento dos proprietários (e mesmo contra a sua vontade) e sem o recurso prévio dos Tribunais.
M) Deste modo, mesmo que se confirme a existência desse acto de delegação de poderes (o que só por dever de patrocínio se considera), o acto que determinou a posse administrativa do imóvel praticado pelo Vereador da Câmara Municipal de Barcelos sempre estaria ferido de nulidade ou, pelo menos, de anulabilidade que foram expressa e atempadamente invocadas pela Autora na sua p.i".
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Notificada das alegações, apresentadas pela recorrente, veio o recorrido Município de Barcelos formular contra alegações que concluiu do seguinte modo:
1 . A decisão sobre o facto constante do ponto 25 da matéria dada como provada, porque decidido com base em documento autêntico cuja força probatória plena não foi elidida pela via da arguição da falsidade, não merece qualquer censura.
2 . O presidente da câmara pode, nos termos do n.° 2 do art.º 69° da Lei 169/99, de 18 de Setembro, delegar no seu vereador, a prática de actos administrativos, cuja competência seja própria, mormente, actos de determinação de posse administrativa.
3 . O disposto no Decreto-Lei 555/99 de 19 de Dezembro, em particular o seu art.º. 107°, em nada colide com a delegação de competências feita ao abrigo do n° 2 do art.º 69° da Lei 169/99, de 18 de Setembro.
4 . O acto de delegação de competências que se discute nos autos, não padece de qualquer vício, sendo perfeita e legalmente válido, respeitando na íntegra o disposto no art.º 35° do Código de Procedimento Administrativo.
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A Digna Procuradora Geral Adjunta, neste TCA, tendo Vista nos autos --- art.º 146.º do CPTA --- nada disse.
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Dispensados os vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, atenta a simplicidade da questão, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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2 . Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.ºA, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II
FUNDAMENTAÇÃO
1 . MATÉRIA de FACTO
A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto:
1 . A Autora é proprietária de um prédio rústico denominado de “Souto da Bouça”, com a área de 1470m2, inscrito na matriz rústica sob o art.º 666, descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos sob o n.° 00276/961104-Aldreu.
2 . Considerando o Regulamento do PDM de Barcelos, esse prédio encontra-se classificado como “Espaço Natural”.
3 . Uma parte classificada como “Mata ou Mato de Protecção a Reconverter ou a Estabelecer” e a parte restante classificada como “Orlas e sebes Vivas”;
4 . No Verão de 2006, a Autora, sem ter pedido licenciamento prévio, construiu um coberto/alpendre no prédio referido em 1., destinado a instalação de apoio/adstrita a uma exploração de manutenção e limpeza florestal, servindo para depósitos de madeiras provenientes dos espaços florestais circundantes.
5 . No dia 4 de Agosto de 2006, a divisão de Fiscalização do R. lavrou Auto de Notícia por Contra-ordenação contra B..., Lda, devido a construção do imóvel referido em 4., sem licença do município.
6 . Por despacho de 18 de Agosto de 2006, foi declarada a intenção da câmara municipal de proceder a demolição das obras ilegais.
7 . Em 12 de Setembro de 2006, foi o despacho comunicado a B..., Lda e também que dispõe do prazo de quinze dias para se pronunciar.
8. No dia 29 do Setembro do 2006 B..., Ld.ª informa o processo que não é proprietária da obra a que se refere a fiscalização.
9 . Por despacho do 4 do Outubro de 2006, foi ordenada a notificação da intenção do demolição e a instauração do processo por Contra-ordenação à ora A.;
10 . No dia 20 de Outubro de 2006, a A. solicitou ao Ex.° Presidente da Câmara Municipal do Barcelos a legalização de um edifício destinado a instalações directamente adstritas a explorações rurais e florestais, realizado no prédio descrito em 1.;
11 . O despacho referido em 9. foi notificado à A. em 3 de Novembro de 2006 e também que dispõe do prazo do quinze dias para se pronunciar.
12 . A pretensão referida em 10. foi indeferida em 6 de Novembro de 2006 e foi notificada ao A. em 8 de Novembro de 2006, mais o informando de que dispõe do prazo do dez dias para se pronunciar acerca do indeferimento.
13 . A A. pronunciou-se em 12 de Dezembro do 2006.
14 . Em 20 de Dezembro de 2006, foi a legalização indeferida com os mesmos fundamentos de 12.
15 . Em 27 de Dezembro do 2006, foi comunicado ao A. o dito indeferimento e também que dispõe do prazo de dez dias para se pronunciar acerca do mesmo.
16 . Em 27 de Dezembro do 2006, foi proferido despacho a ordenar a notificação da A. para em 30 dias proceder a demolição das obras, dado que não são legalizáveis, conforme foi verificado pelo indeferimento do processo de legalização.
17 . Despacho esse notificado à A. em 23 de Janeiro de 2007.
18 . Em 26 de Janeiro de 2007, a A. apresentou aditamento ao projecto.
19 . Em 16 de Março de 2007, foi o projecto indeferido.
20 . Em 20 do Março de 2007, foi comunicado à A. o dito indeferimento e também que dispõe do prazo do dez dias para se pronunciar acerca do mesmo.
21 . Em 7 de Junho do 2007, foi proferido despacho a ordenar a notificação da A. para em 30 dias proceder a demolição das obras dado as mesmas não serem legalizáveis, mesmo após a aprovação do novo PDM.
22 . Em 8 de Outubro do 2007, foi proferido despacho, notificado à A. em 25 do Outubro de 2007, a ordenar a demolição em 20 dias, prazo após o qual será ordenada a posse administrativa.
23 . A 31 de Março de 2008, o Vereador do R., Eng.º M..., proferiu o despacho ora impugnado, que foi notificado à A. em 26 de Junho do 2008, e é do seguinte teor:
“Determino a posse administrativa.
À Divisão de Conservação para proceder a demolição a expensas do infractor.”
24 . Dos autos, constam 2 (duas) certidões, juntas pelo Réu, referentes a reuniões de 03.11.2005 e de 11.11.2005, nas quais foram delegadas competências da Câmara Municipal no respectivo Presidente e deste nos Vereadores (em delegação ou sub-delegação), respectivamente – cfr. docs. a fls. 70 e ss., que aqui se dão por integralmente reproduzidos;
25 . Na reunião de 11.11.2005, referida na 1ª certidão, a fls. 70. e ss. a fls. 4 da mesma, consta delegada pelo Presidente da Câmara no Vereador Engº C..., dentre outras, a seguinte competência:“…tomar posse administrativa de imóveis…”.

2 . MATÉRIA de DIREITO
Assente a factualidade apurada, cumpre, agora, entrar na análise do objecto do recurso jurisdicional, que, tendo em consideração o acórdão deste TCA, de 6/5/2010 - fls. 170 a 177 dos autos - se limita a aferir da (in) competência do Vereador autor do acto que ordenou a posse administrativa do imóvel em causa, com vista à sua demolição, sendo que esta já não pode sequer ser questionada.
Atentas as alegações de recurso, sintetizadas nas conclusões supra transcritas, quanto a esta invalidade - incompetência do autor do acto - a recorrente centraliza a sua discordância em dois pontos concretos, a saber:
--- existência ou não de acto de delegação (ou subdelegação) de competência para ordenar a posse administrativa no Vereador autor do acto questionado; e,
--- se era possível essa delegação (ou subdelegação) - sendo certo que a recorrente já não questiona a conclusão inerente à degradação da irregularidade resultante da falta de menção desse delegação no acto que ordenou a posse administrativa, decidida na sentença recorrida.
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A sentença recorrida estribou a improcedência da argumentação da recorrente na seguinte argumentação:
"In casu, conforme se adiantou acima, cumpre, tão só e apenas, apreciar a legalidade do acto referido em 23. dos factos provados, que determina a posse administrativa do prédio em questão e apenas no tocante aos vícios que são (unicamente) imputados a este acto.
Ora:
Conforme foi adiantado no douto acórdão, proferido pelo Tribunal Central Administrativo – Norte, tal reconduzir-se-á, unicamente (cfr., também, artigo 37º da p.i.) à questão da alegada incompetência do seu autor.
Vejamos o que a respeito da posse administrativa nos diz o art.º 107º do RJUE (DL nº 555/99, de 16.12):
“1 - Sem prejuízo da responsabilidade criminal, em caso de incumprimento de qualquer das medidas de tutela da legalidade urbanística previstas nos artigos anteriores o presidente da câmara pode determinar a posse administrativa do imóvel onde está a ser realizada a obra, por forma a permitir a execução coerciva de tais medidas.
2 - O acto administrativo que tiver determinado a posse administrativa é notificado ao dono da obra e aos demais titulares de direitos reais sobre o imóvel por carta registada com aviso de recepção.
3 - A posse administrativa é realizada pelos funcionários municipais responsáveis pela fiscalização de obras, mediante a elaboração de um auto onde, para além de se identificar o acto referido no número anterior, é especificado o estado em que se encontra o terreno, a obra e as demais construções existentes no local, bem como os equipamentos que ali se encontrarem.
4 - Tratando-se da execução coerciva de uma ordem de embargo, os funcionários municipais responsáveis pela fiscalização de obras procedem à selagem do estaleiro da obra e dos respectivos equipamentos.
5 - Em casos devidamente justificados, o presidente da câmara pode autorizar a transferência ou a retirada dos equipamentos do local de realização da obra, por sua iniciativa ou a requerimento do dono da obra ou do seu empreiteiro.
6 - O dono da obra ou o seu empreiteiro devem ser notificados sempre que os equipamentos sejam depositados noutro local.
7 - A posse administrativa do terreno e dos equipamentos mantém-se pelo período necessário à execução coerciva da respectiva medida de tutela da legalidade urbanística, caducando no termo do prazo fixado para a mesma.
8 - Tratando-se de execução coerciva de uma ordem de demolição ou de trabalhos de correcção ou alteração de obras, estas devem ser executadas no mesmo prazo que havia sido concedido para o efeito ao seu destinatário, contando-se aquele prazo a partir da data de início da posse administrativa.”
O Autor sustenta que estas competências não são “delegáveis”, mas não sustenta tal conclusão com qualquer argumento legal sustentável, bastando-se com a afirmação de que no caso do art.º 94º do RJUE essa possibilidade de delegação foi plasmada expressamente.
No entanto, esse argumento não obsta a que se considere que essa menção expressa pretendeu excluir todas as outras competências para as quais tal menção não se verifica, em concreto.
Pelo contrário, teremos de entender, nesses casos, que onde o legislador não proíbe não cabe ao intérprete proibir.
Alias, é esse o sentido a retirar do que vem disposto no art.º 68º e 69º da L.A.L. (Lei nº 169/99, de 18.09, referente às competências dos Presidentes das Câmaras Municipais. Em particular, o art.º 69º, depois de, no art.º 68º, serem descriminadas competências que tendencialmente caberão à figura do Presidente da Câmara, diz-nos que:
1 - O presidente da câmara é coadjuvado pelos vereadores no exercício da sua competência e no da própria câmara, podendo incumbi-los de tarefas específicas.
2 - O presidente da câmara pode delegar ou subdelegar nos vereadores o exercício da sua competência própria ou delegada.
3 - Nos casos previstos nos números anteriores os vereadores dão ao presidente informação detalhada sobre o desempenho das tarefas de que tenham sido incumbidos ou sobre o exercício da competência que neles tenha sido delegada ou subdelegada.”
Neste caso, conforme se retira da certidão junta pelo Réu, em reunião de 11.11.2005, o Presidente da Câmara delegou no Vereador Engº .... certas e determinadas daquelas que são as suas competências originárias ou delegadas e dentre as quais se incluí a de “…tomar posse administrativa de imóveis…”
Delegada que foi a competência em questão, subsiste a questão da falta de menção dessa delegação.
No entanto, esta questão é pacífica, dentre a nossa jurisprudência, no sentido de tal falta de menção se traduz em mera preterição de formalidade e, por isso, é determinante de mera irregularidade, com o consequente aproveitamento do acto (cfr. por todos, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27.03.2003, proferido no proc. nº 0979/02, em www.dgsi.pt ).
Assim sendo, pelo que acima se expôs, terá de improceder a argumentação aduzida pela Autora e com ela o pedido formulado no sentido de ver o Réu condenado a emitir acto diferente daquele impugnado (e, na sua totalidade, a presente acção").
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Quanto ao 1.º ponto - existência ou não de acto de delegação (ou subdelegação) de competência para ordenar a posse administrativa no Vereador autor do acto questionado.
Questiona, a este propósito a recorrente, a factualidade dada como provada nos pontos 24 e 25 da factualidade provada.
Porém, sem qualquer razão, sendo certo que, não podendo já questionar a demolição da obra ilegal, mais não pretende que evitar, ou melhor, protelar essa demolição.
As certidões juntas aos autos - fls. 70 a 80 - dão conta, certificando nos termos legalmente previstos, quer a deliberação da CM de Barcelos, de 3/11/2005, que delega algumas das suas competências no Presidente da Câmara Municipal, quer do despacho 52/2005 do Presidente da CM de que deu conhecimento à Câmara Municipal, na reunião de 11/11/2005, onde este delega no Vereador Eng.º .... --- autor do acto impugnado - tomada de posse administrativa do imóvel --- nomeadamente "tomar posse administrativa dos imóveis nos termos e para os efeitos previstos o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação".
Ora quanto a esta certidão não foi arguida a sua falsidade, pelo que carece de relevância a argumentação ora pugnada pela recorrente, sendo certo que não se pode ignorar que os vereadores de uma qualquer câmara municipal nunca detêm competências próprias, mas antes apenas dispõem de competências delegadas ou subdelegadas do Presidente da CM:
Carece, assim, de total cabimento o argumento de que a recorrente havia sido informada de que o acto havia sido praticado no uso de competências próprias do Vereador .....
As certidões juntas aos autos - cuja validade não foi questionada através do incidente de falsidade - demonstram isso mesmo, pelo que a matéria dada como provada nos pontos 24 e 25 da factualidade provada se mostra objectivamente correcta.
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Quanto ao segundo ponto, também a recorrente carece de total razão, pois que, pese embora o art.º 107.º, n.º1 do RJUE, atribua a competência para a determinação da posse administrativa ao presidente da CM, por forma a permitir a execução coerciva de medidas de tutela da legalidade urbanística - tais como a demolição de obras ilegais ilegalizáveis - não se mostra afastada a possibilidade da delegação dessa competência nos vereadores, tais como decorre inexoravelmente do art.º 69.º, n.º2 da Lei 169/99, de 18/9, alterada pela Lei 5-A/2002, de 11/1.
Deste modo, temos por seguro que a delegação de competências era possível atenta a existência de lei habilitante - n.º2 do art.º 69.º da Lei 169/99, de 18/9 - prática concreta e eficaz de acto de delegação - despacho n.º 4/2005 do Presidente da CM de Barcelos - cfr. certidão de fls. 70 a 74 - sendo que a falta de indicação no acto da delegação constitui irregularidade que se degradou, na medida em que por via dessa invalidade/irregularidade, a A./recorrente não ficou impossibilitada de instaurar - como o fez - a pertinente acção administrativa (ainda que esta questão não seja já alvo de recurso, como supra se disse).
Assim, porque o Presidente da Câmara “pode delegar ou subdelegar nos Vereadores o exercício da sua competência própria ou delegada” (art.º 69.º, n.º 2 da Lei 169/99), nenhuma ilegalidade existe quando ele delega nos vereadores alguma ou algumas das competências que a lei originariamente lhe atribui. O que quer dizer que, apesar da competência para embargar e ordenar demolições de edificações erigidas ilegalmente, bem como ordenar a posse administrativa com vista à execução dessa demolição, estar radicada no Presidente da Câmara, nada impede que a mesma seja delegada num dos vereadores e que este, no uso dessa competência, ordene a tomada de posse administrativa, decidida em definitivo a demolição e sem que esta seja executada voluntariamente pelo administrado.
Por outro lado, sendo a competência o conjunto de poderes funcionais conferidos a um órgão de uma pessoa colectiva com vista à realização das atribuições que lhe estão cometidas, a sua delegação tem, necessariamente, de incluir os poderes indispensáveis ao seu cabal exercício visto que, de outro modo, aquelas atribuições não poderiam ser atingidas. Ou seja, a delegação de competências com vista à realização de uma atribuição da pessoa colectiva tem compreender os meios e poderes indispensáveis à sua efectiva concretização visto que se essa delegação for desacompanhada da transferência desses meios e poderes será desprovida de eficácia e não fará qualquer sentido.
Aliás, porque assim é, quando o Presidente da Câmara delega num vereador a competência para "embargar e ordenar a demolição de quaisquer obras, construções ou edificações efectuadas por particulares ou pessoas colectivas, sem licença ou com inobservância das condições dela constantes, dos regulamentos” (art.º 68.º, n.º2, al. m) da Lei 169/99), ter-se-á de considerar que essa delegação (mesmo que inexistisse acto de delegação quanto v.g., à tomada da respectiva posse administrativa), integra a transferência dos poderes necessários ao embargo e demolição de tais obras, maxime, o de, em caso de recusa do seu proprietário, tomar posse administrativa dos prédios onde as mesmas foram executadas tendo em vista a sua demolição e a reposição do status quo ante.
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Deste modo, sem necessidade de outras considerações, impõe-se apenas a improcedência do recurso e a consequente manutenção da decisão recorrida e validade do acto impugnado.

III
DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida.
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Custas pela recorrente.
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Notifique-se.
DN.
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Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pelo relator (cfr. art.º 138.º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil, “ex vi” do art.º 1.º do CPTA).
Porto, 13 de Janeiro de 2012
Ass. Antero Pires Salvador
Ass. Rogério Martins
Ass. Ana Paula Portela