Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01024/06.0BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/21/2016
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Hélder Vieira
Descritores:NULIDADES ATÍPICAS; REPRESENTAÇÃO DE MENOR
MAIORIDADE NA PENDÊNCIA DO PROCESSO; CONSTITUIÇÃO DE ADVOGADO
Sumário:I — Perfazendo o autor 18 anos de idade no decurso do processo, cessa nessa data a sua incapacidade decorrente da menoridade, que até então era suprida pela intervenção processual dos pais, seus legais representantes.
II — Estando a parte representada por dois advogados nos autos, na renúncia de um deles ao mandato continua a mesma representada pelo advogado que não renunciou ao mandato.
III — Na relevância do disposto nos artigos 201º do CPC/1961 e actual artigo 195º do CPC/2013, é susceptível de influir no exame e na decisão da causa, a irregularidade consubstanciada na decisão de suspensão da instância, pela não constituição de novo mandatário, se, estando a parte representada por dois advogados, se verifica que a mandante continuava representada no processo pelo advogado constituído que não renunciou ao mandato.
IV — Nessa relevância, é ainda susceptível de influir no exame e na decisão da causa, as irregularidades consubstanciadas na omissão de notificação de actos processuais atinentes à suspensão, interrupção e deserção da instância, à parte que perfez 18 anos de idade no decurso do processo.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:PMPM
Recorrido 1:Município de Coimbra e Outro(s)...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer a final: "considerando tempestiva a arguição das nulidades em apreço e ainda pelo provimento do recurso, devendo anular-se o processado subsequente ao despacho judicial proferido em 06-06-2008, a fls. 236 do processo em suporte físico."
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I – RELATÓRIO
Recorrente: PMPM (PM)
Recorridos: Município de Coimbra (Município); EP-Estradas de Portugal, SA (EP); Associação Portuguesa de PCNRC (APPC).

Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que, no âmbito de acção administrativa comum, sob a forma ordinária, para efectivação de responsabilidade civil extracontratual, declarou extinta a instância, por deserção, e ainda: dos despachos que a precederam, de 06-06-2008, a fls. 236, que ordenou o cumprimento do artigo 39º, nº 3, do Código de Processo Civil (CPC), nas pessoas dos pais do Autor ora Recorrente; do despacho de 16-12-2010, a fls. 307, que declarou a instância interrompida nos termos do artigo 185º do CPC, todos por enfermarem de nulidade processual.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação(1) do recorrente, assim formuladas:

1. Interpõe-se o presente Recurso, do despacho de 6 de Junho de 2008, a fls. 236, que mandou cumprir o artigo 39º nº 3 do CPC de então, nas pessoas dos pais do Autor; do despacho de 16/12/2010, a fls. 307, que declarou a Instância interrompida nos termos do artigo 285º do CPC de então; e do despacho de 22 de janeiro de 2013, a fls. 323, que declarou a Instância extinta por deserção, por enfermarem de nulidade processual.

2. A presente acção administrativa comum, foi instaurada em 18/12/2006, pelos progenitores MFCP e seu marido, JCCM, em representação do então menor, ora Recorrente, PMPM.

3. O ora Recorrente, PMPM, nasceu a 13 de Janeiro de 1989, cf. certidão de nascimento que se junta sob o doc. 1, sendo que à data da instauração da presente acção, tinha 17 anos, e portanto a menos de um mês de perfazer os 18 anos.

4. O ora reclamante é o único titular dos interesses objecto dos presentes autos, alcançando capacidade judiciária para intervir pessoalmente nos presentes, com a maioridade a partir de 13/01/2007.

5. A capacidade judiciária, define-se como a susceptibilidade de a parte estar pessoal e livremente em juízo ou fazer-se representar por representante voluntário (art. 15 do CPC).

6. A manutenção dos progenitores AA. em representação do filho após a maioridade deste, constitui uma irregularidade processual, que o tribunal deveria ter suscitado e diligenciado pela sua sanação, sob pena de nulidade processual.

7. Atingindo a maioridade na decorrência dos presentes autos, deveria o tribunal notificar o ora reclamante para intervir pessoalmente nos autos, como Autor da acção, único titular da alegada relação material controvertida.

8. O que o tribunal nunca fez, e sempre olvidou, constituindo uma nulidade processual, que deve ser declarada, com as devidas consequências legais. Acresce que,

9. Os AA., pais em representação do menor, outorgaram procuração forense aos senhores doutores, JNP e RPM, ambos com domicílio profissional na R. FB…, Coimbra, junta aos autos a fls. 82.

10. Ainda em fase de articulados, após deduzidas as contestações e a réplica, o Dr. JNP, juntou aos autos, Renúncia da procuração que lhe foi emitida pelos AA. pais, cf. documento a fls. 234.

11. Seguindo-se despacho nos autos, a ordenar a notificação dos AA. para constituição de novo mandatário, cf. despacho datado de 6/06/2008, constante a fls. 236.

12. Não obstante a renúncia de mandato forense pelo Sr. Dr. JNP, na verdade, os AA. pais, sempre se mantiveram representados nos autos por advogado constituído, o Dr. RPM, tal como decorre da procuração forense constante a fls. 82.

13. Da parte dos AA. progenitores, nunca se verificou falta de representação de mandatário constituído nos autos, não havendo fundamento para cominar os AA. a constituir mandatário, constituindo o pressuposto erróneo que acabou por conduzir à suspensão da instância (despacho a fls. 297), interrupção da instância (fls. 307) e por fim a declaração da instância extinta por deserção (fls. 323).

14. A falta da notificação ao mandatário constituído, Dr. RPM, do andamento do processo em representação dos AA. pais, constitui igualmente uma nulidade processual, que deve ser reconhecida e declarada, declarando-se nulos todos os actos processuais decorrentes e subsequentes à sua falta, a saber a partir de fls. 233.

15. A falta de notificação do ora Recorrente para intervir pessoalmente nos autos, prejudicou a sua intervenção pessoal no processo, impedindo o exercício do contraditório na defesa dos seus interesses e influi naturalmente no exame e decisão da causa.

16. Não obstante a falta de notificação do ora reclamante para intervir pessoalmente nos presentes autos após a sua maioridade, na verdade os autos decorreram em defesa dos seus interesses até ao despacho datado de 30 de Abril de 2008, constante a fls. 231 e 232, despacho este, cuja notificação nunca chegou a ser cumprida às partes, na pessoa dos mandatários constituídos, por erróneo pressuposto de falta de mandatário por parte dos AA. em face da junção do documento de renúncia de mandato que se seguiu a fls. 234, assumindo o tribunal, por qual lapso, de que os AA. não tinham mandatário constituído.

17. Desde já, para os devidos e legais efeitos, o ora reclamante, declara ratificar todo o processado anterior ao despacho datado de 30/04/2008, a fls. 231 e 232, pugnando pela declaração de nulidade processual decorrente da falta da sua notificação enquanto titular único dos interesses em litígio e com capacidade judiciária e legitimidade processual a intervir pessoalmente nos autos, assim como, e sem prejuízo, da falta de notificação do mandatário dos AA. pais em sua representação, a partir do despacho de fls. 236, inclusive, declarando-se nulos os despachos de fls. 236, 307 e 323, ordenando-se a renovação da instância, o prosseguimento dos autos, com o cumprimento do despacho datado de 30/04/2008, a fls. 231 e 232.

18. Os despachos que se impugnam, violam o disposto nos artigos 129º e 130º, Art. 67º, todos do Código Civil art. 11º, 15º, art. 27 nº 1, art. 28º e art. 30º; art. 40 nº 1 nº 1 a), art. 43º, alínea a), art. 44º nº 1 e art. 247º, art. 195º todos do Novo Código de Processo Civil por aplicação supletiva do artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e art. 11º deste CPTA.

NESTES TERMOS,

E nos melhores de Direito, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas, deverá o presente recurso jurisdicional ser julgado provado e procedente, declarando-se nulos os despachos de fls. 236, 307 e 323, ordenando-se a renovação da instância, e o prosseguimento dos autos, com o cumprimento do despacho datado de 30/04/2008, a fls. 231 e 232, designadamente, na pessoa do ora Recorrente, como Autor.

ASSIM SE FAZENDO INTEIRA JUSTIÇA!”.

O Recorrido Município contra-alegou, em termos que se dão por reproduzidos, e, tendo elaborado conclusões, aqui se vertem:

1 – O recurso interposto não deverá se apreciado por manifestamente intempestivo.

2 – O Autor/recorrente não alega, nem prova – e incumbia-lhe tal alegação e prova – qual a data em que tomou conhecimento dos despachos e da sentença proferidos nos autos, por forma a aferir da tempestividade da interposição do recurso.

3 – Atendendo a que o Autor atingiu a maioridade em 13 de Janeiro de 2007 e que os pais foram notificados nos termos do disposto no artigo 39.º, n.º 3 do CPC para constituir novo mandatário, o prazo para interposição do recurso relativamente ao despacho de 6 de Junho de 2008, já há muito se encontra ultrapassado e o mesmo se aplica em relação ao despacho de 16/12/2010, que declarou a instância interrompida e ao despacho de 22 de Janeiro de 2013 que declarou a instância extinta por deserção.

4 – Incumbia aos pais do recorrente diligenciar por, de imediato, transmitir ao seu filho tais despachos e, por outro lado, informar o Tribunal da maioridade do filho, por forma a que o mesmo fosse notificado.

5 – Não incumbe ao Tribunal a obrigação de se substituir às partes, nem recai sobre o mesmo o dever de notificar o Autor quando este atingisse a maioridade.

6 - As partes devem agir de boa-fé processual e, nessa medida, incumbia aos pais do Autor o dever de, quando notificados dos despachos recorridos, alertar o Tribunal da maioridade de Autor para que fosse providenciada a sua notificação.

7 – Os despachos recorrido foram notificados às partes (pais do Autor), sem que as mesmas tenham suscitado qualquer nulidade e/ou interposto recurso, nem que estavam representadas por outro mandatário constituído ou relativamente à maioridade do Autor, ora recorrente.

8 – A sentença que julgou a instância extinta por deserção terminou a relação jurídica controvertida, não havendo lugar à prática legítima de quaisquer actos processuais.

9 – Não se verifica qualquer fundamento para a renovação da instância, nem se verificam as nulidades processuais invocadas.

10 – Não incumbia ao Tribunal o dever de notificar o Autor quando o mesmo atingisse a maioridade, nem tal resulta de qualquer disposição legal – que, aliás, o Autor não invoca – que comine de nulidade a omissão de notificação do incapaz aquando da aquisição da maioridade.

11 - Impendia aos pais, em cumprimento do dever geral de boa-fé processual, a obrigação de alegar e provar que o Autor atingiu a maioridade e que a partir dessa data teria que ser o mesmo notificado nos autos – o que não fizeram.

12 – Não se verifica nulidade processual por falta de notificação do outro mandatário constituído.

13 – O próprio mandatário renunciante, no seu requerimento de renúncia, requer que os Autores sejam notificados para constituir novo mandatário, evidenciando que o Dr. JNP era o único mandatário dos Autores constituído e o único que interveio nos autos.

14 – Os pais do Autor foram notificados da renúncia do mandato e nada disseram, designadamente, que estavam representados pelo Dr. RPM, pelo que bem entenderam e compreenderam que tinham que constituir novo mandatário.

15 - O Dr. JNP, notificado para informar o paradeiro dos pais do Autor, também não referiu, em qualquer momento, que devia ser notificado o outro mandatário constituído nos autos.

16 – Incumbia aos pais do Autor contactarem com o seu alegado mandatário – Dr. RPM – e informarem o Tribunal que tinham advogado constituído – o que não fizeram.

17- Os pais do Autor desinteressaram-se completamente pelo processo durante cerca de quatro anos e conformaram-se com os despachos proferidos nos autos, bem conhecendo-os e compreendendo perfeitamente o seu significado e alcance, o que tudo é bem demonstrativo da sua falta de diligência e boa-fé processual.

18 - Assim como o Autor, que bem sabia e conhecia da existência do processo, não se aceitando que, após oito anos decorridos da data da sua maioridade, venha suscitar as alegadas nulidades processuais.

19 - Concluindo-se que, como bem alega a Ré Associação, admitir o recurso e julgar procedentes as nulidades invocadas é frustrar completamente as expectativas e confiança jurídica que os Réus colheram do princípio do caso julgado.

20 – Os despachos e sentença recorrida não merecem qualquer reparo, não se verificando qualquer nulidade processual.

Termos em que e nos mais de direito, deve ser rejeitado o recurso por manifestamente extemporâneo e, em qualquer caso, negar-se provimento ao recurso interposto pelo recorrente, confirmando-se os doutos despachos recorridos, assim se fazendo JUSTIÇA.”.

A Recorrida EP contra-alegou, em termos que se dão por reproduzidos, e, tendo elaborado conclusões, aqui se vertem:

1. “O recurso interposto não deverá ser apreciado por manifestamente intempestivo.

2. Percorrido o requerimento e as alegações do Recorrente, em nenhum momento é alegado qual a data em que e por que forma, tomou conhecimento dos despachos e da sentença proferidos nos autos, para, assim se aferir da tempestividade da interposição do recurso, o que seria imperioso ter sido mencionado.

3. Todos os despachos em causa, foram sempre notificados aos restantes AA., nomeadamente, foram notificados nos termos do disposto no artigo 39º, n.º 3, do CPC, para constituir novo mandatário, do despacho que declarou a instância interrompida e bem assim do despacho que declarou a instância extinta por deserção.

4. Assim tendo àqueles sido notificados, era a eles quem incumbia comunicar ao filho de ambos (ora Requerente), já que os mesmos o representavam aquando da propositura da ação.

5. A instância consiste na relação processual através da qual se exerce e se tutela o direito que o A. pretende ver salvaguardado.

6. Essa relação processual inicia-se com a propositura de ação e subsequente citação do Réu e termina, normalmente, com uma sentença de mérito sobre a relação material controvertida.

7. No entanto, pode suceder que a relação processual sofra de vicissitudes diversas da relação substantiva que lhe subjaz, levando a que a extinção da instância ocorra não obstante se puder manter o direito substantivo que se visava salvaguardar.

8. Entre as causas de extinção da relação processual previstas no artigo 277.º CPC, consta a deserção, causa essa que extingue a instância sem de alguma forma contender com o direito substantivo a ela subjacente.

9. Conforme consta de fls. 323 dos autos à margem referenciados, parece-nos evidente que a relação processual findou com a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo a 23 de Janeiro de 2013, declarando extinta a instância por deserção.

10. Ora, uma vez finda a instância, não podem ser praticados atos processuais, pela simples mas decisiva razão de não existir uma relação processual que os legitime - neste sentido se pronunciou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-06-2004 (disponível em www.dgsi.pt).

11. É certo, porém, que há casos em que a lei admite a renovação da instância extinta, nos termos previstos no artigo 282.º do CPC.

12. Porém, no caso sub judice, não estamos manifestamente perante uma dessas situações excecionais, pelo que, não se vislumbra fundamento que sustente o pedido de renovação da instância deduzido pelo Recorrente, devendo, em consequência, ser o mesmo indeferido.

13. Os regimes, efeitos e prazos de arguição das nulidades processuais vêm previstos nos artigos 186.º e seguintes do CPC, podendo distinguir-se dois tipos de nulidades: as nulidades “típicas” ou “nominadas”, cujo regime vem contemplado nos artigos 186.º a 194.º, do CPC, e as nulidades “atípicas” ou “secundárias”, contempladas genericamente no artigo 195.º, do CPC, que obedecem ao regime previsto no artigo 199.º, do mesmo diploma.

14. As alegadas irregularidades invocadas pelo Recorrente dirão respeito ao segundo tipo, nomeadamente à omissão de atos que a Lei prescreve.

15. Quanto a estas, esclarece o artigo 195.º, n.º 1 do CPC, que as mesmas dizem respeito à prática da atos que a Lei não admita, bem como à omissão de atos ou formalidades que a lei prescreva, irregularidades essas que só produzem nulidade quando a Lei expressamente o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame e discussão da causa, sendo o respetivo regime de arguição regulado pelos artigos 197.º e seguintes do CPC, (no sentido exposto, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-09-2002, disponível em www.dgsi.pt).

16. Com efeito, o Recorrente sustenta o seu pedido de renovação da instância no facto de o Tribunal não o ter notificado para intervir pessoalmente nos autos aquando da aquisição da maioridade, o que, no entendimento do Recorrente, constitui uma “nulidade processual, que deve ser declarada, com as devidas consequências legais” (cfr. artigos 5.º a 7.º da douta Reclamação).

17. Porém, e salvo o devido respeito, o douto entendimento propugnado pelo Recorrente é desprovido de fundamento legal, na exata medida em que não vislumbramos qualquer disposição que comine com nulidade a omissão de notificação do incapaz aquando da aquisição da maioridade.

18. O Recorrente argui ainda que a falta de notificação do mandatário constituído quanto ao andamento do processo “constitui igualmente uma nulidade processual, que deve ser reconhecida e declarada, declarando-se nulos todos os atos processuais decorrentes e subsequentes à sua falta…” (artigo 14.º da douta Reclamação).

19. Porém, uma vez mais, o Recorrente não faz referência ao preceito legal que, no seu entendimento, fere de nulidade a falta de notificação do mandatário relativamente ao andamento do processo.

20. Além disso, é sabido que o mandato forense é muitas vezes conferido a mais do que um mandatário, mas, como resulta da prática forense, só um dos mandatários é que exerce o mandato e intervém efetivamente nos autos, apenas se atendendo a este para efeitos de notificação judicial.

21. Ora, o Ilustre Mandatário dos autores, Senhor Dr. JNP, foi sempre o único mandatário constituído que interveio nos autos, tendo sido notificado de todos os atos do processo até ao momento em que renunciou o mandato, sem que o Recorrente tenha colocado ou coloque quaisquer reservas quanto a esta questão.

22. Após a renúncia ao mandato subscrita pelo Senhor Dr. JNP, M.I. Advogado, o Tribunal limitou-se a cumprir a Lei, designadamente o atual artigo 47.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, que exige que a renúncia de mandato seja pessoalmente notificada ao mandante.

23. Essa notificação, porém, revelou-se infrutífera, pois que os autores decidiram mudar o seu domicílio sem informar o Tribunal a quo da sua nova residência.

24. Efetivamente, e após várias tentativas, ordena-se, nas fls. 253 e 263 do processo, a notificação do renunciante para vir aos autos informar do paradeiro dos autores, com a advertência de que a renúncia de mandato apenas produz efeitos após a notificação dos mandantes.

25. Na sequência dessa notificação, vem o Senhor Dr. JNP, M.I. Advogado, informar que não sabe do paradeiro dos autores, não tem nem teve mais contacto com os mesmos desde a data em que apresentou a renúncia ao mandato.

26. A verificar-se alguma nulidade, resulta do artigo 199.º, n.º 1 do CPC que a mesma deveria ter sido arguida nessa altura.

27. Por outro lado, resulta dos autos que os autores, salvo o devido respeito, se desinteressaram pelo processo, na medida em que desde a data da renúncia ao mandato pelo seu mandatário nunca mais procuraram obter informações, pedir explicações ou intervir de qualquer modo no processo, não tendo, sequer, atualizado a sua morada junto dos mesmos.

28. Desinteresse esse que se prolongou por cerca de quatro longos anos, em que a instância foi suspensa, depois interrompida e, por fim, extinta por deserção, sem que tenha sido deduzido um único requerimento, quer pelos próprios autores, quer por qualquer um dos seus mandatários constituídos, quer pelo próprio Recorrente, que podia e devia ter diligenciado pela proteção dos seus interesses, coisa que se coibiu de fazer.

29. Efetivamente, tal como alega na reclamação deduzida, o Recorrente tinha total e conhecimento da existência do processo sub judice e manteve sempre algum contacto com os pais após o acidente, pelo que podia e devia ter-se inteirado sobre o estado do processo.

30. Parece-nos, pois, que não pode o Recorrente legitimamente pretender, dois anos após o trânsito em julgado da referida sentença que declara extinta a instância, e oito anos após adquirir capacidade judiciária, frustrar por completo as expectativas e confiança jurídica que a Recorrida colheu do princípio do caso julgado sendo manifesta, como é, a falta de diligência demonstrada quer pelos pais do Recorrente, enquanto representantes, quer pelo próprio Recorrente, na qualidade de principal interessado no desfecho da causa.

31. Em suma, ainda que provadas fossem as nulidades arguidas, o que só por hipótese de exercício intelectual se equaciona, sempre se apresentaria extemporânea a respetiva reclamação.

32. Pelo que, as decisões recorridas não merecem qualquer reparo, nem o recurso aqui em apreço merece qualquer provimento.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser rejeitado por manifestamente extemporâneo, julgando-se improcedente, por não provado, confirmando-se os doutos despachos proferidos, por serem de inteira e merecida JUSTIÇA.”.

A Recorrida APPC contra-alegou, em termos que se dão por reproduzidos, e, tendo elaborado conclusões, aqui se vertem:

1. “Os doutos despachos recorridos – a fls. 236, 307 e 323 dos autos - não merecem os reparos judicativos que o Recorrente lhes faz.

2. Questão prévia: da extinção da instância - A instância consiste na relação processual através da qual se exerce e se tutela o direito que o autor pretende ver salvaguardado.

3. Essa relação processual inicia-se com a propositura de acção e subsequente citação do réu e termina, normalmente, com uma sentença de mérito sobre a relação material controvertida.

4. No entanto, pode suceder que a relação processual sofra de vicissitudes diversas da relação substantiva que lhe subjaz, levando a que a extinção da instância ocorra não obstante se puder manter o direito substantivo que se visava salvaguardar.

5. Entre as causas de extinção da relação processual previstas no artigo 277.º CPC, consta a deserção, causa essa que extingue a instância sem de alguma forma contender com o direito substantivo a ela subjacente.

6. Conforme consta de fls. 323 dos autos à margem referenciados, parece-nos evidente que a relação processual findou com a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo a 23 de Janeiro de 2013, declarando extinta a instância por deserção.

7. Ora, uma vez finda a instância, não podem ser praticados actos processuais, pela simples mas decisiva razão de não existir uma relação processual que os legitime - neste sentido se pronunciou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-06-2004 (disponível em www.dgsi.pt).

8. É certo, porém, que há casos em que a lei admite a renovação da instância extinta, nos termos previstos no artigo 282.º do CPC.

9. Porém, no caso sub judice, não estamos manifestamente perante uma dessas situações excepcionais, pelo que não se vislumbra fundamento que sustente o pedido de renovação da instância deduzido pelo Recorrente, devendo, em consequência, ser o mesmo indeferido.

SEM PRESCINDIR, e por mero dever de patrocínio,

10. Das nulidades processuais: os regimes, efeitos e prazos de arguição das nulidades processuais vêm previstos nos artigos 186.º e seguintes do CPC, podendo distinguir-se dois tipos de nulidades: as nulidades “típicas” ou “nominadas”, cujo regime vem contemplado nos artigos 186.º a 194.º do CPC, e as nulidades “atípicas” ou “secundárias”, contempladas genericamente no artigo 195.º do CPC, que obedecem ao regime previsto no artigo 199.º do mesmo diploma.

11. As alegadas irregularidades invocadas pelo Recorrente dirão respeito ao segundo tipo, nomeadamente à omissão de actos que a Lei prescreve.

12. Quanto a estas, esclarece o artigo 195.º, n.º 1 do CPC, que as mesmas dizem respeito à prática da actos que a Lei não admita, bem como à omissão de actos ou formalidades que a lei prescreva, irregularidades essas que só produzem nulidade quando a Lei expressamente o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame e discussão da causa, sendo o respectivo regime de arguição regulado pelos artigos 197.º e seguintes do CPC (no sentido exposto, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-09-2002, disponível em www.dgsi.pt).

13. Com efeito, o Recorrente sustenta o seu pedido de renovação da instância no facto de o Tribunal não o ter notificado para intervir pessoalmente nos autos aquando da aquisição da maioridade, o que, no entendimento do Recorrente, constitui uma “nulidade processual, que deve ser declarada, com as devidas consequências legais” (cfr. artigos 5.º a 7.º da douta Reclamação).

14. Porém, e salvo o devido respeito, o douto entendimento propugnado pelo Recorrente é desprovido de fundamento legal, na exacta medida em que não vislumbramos qualquer disposição que comine com nulidade a omissão de notificação do incapaz aquando da aquisição da maioridade.

15. O Recorrente argui ainda que a falta de notificação do mandatário constituído quanto ao andamento do processo “constitui igualmente uma nulidade processual, que deve ser reconhecida e declarada, declarando-se nulos todos os actos processuais decorrentes e subsequentes à sua falta…” (artigo 14.º da douta Reclamação).

16. Porém, uma vez mais, o Recorrente não faz referência ao preceito legal que, no seu entendimento, fere de nulidade a falta de notificação do mandatário relativamente ao andamento do processo.

17. Além disso, é sabido que o mandato forense é muitas vezes conferido a mais do que um mandatário, mas, como resulta da prática forense, só um dos mandatários é que exerce o mandato e intervém efectivamente nos autos, apenas se atendendo a este para efeitos de notificação judicial.

18. Ora, o Ilustre Mandatário dos autores, Senhor Dr. JNP, foi sempre o único mandatário constituído que interveio nos autos, tendo sido notificado de todos os actos do processo até ao momento em que renunciou o mandato, sem que o Recorrente tenha colocado ou coloque quaisquer reservas quanto a esta questão.

19. Após a renúncia ao mandato subscrita pelo Senhor Dr. JNP, M.I. Advogado, o Tribunal limitou-se a cumprir a Lei, designadamente o actual artigo 47.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, que exige que a renúncia de mandato seja pessoalmente notificada ao mandante.

20. Essa notificação, porém, revelou-se infrutífera, pois que os autores decidiram mudar o seu domicílio sem informar o Tribunal a quo da sua nova residência.

21. Efectivamente, e após várias tentativas, ordena-se, nas fls. 253 e 263 do processo, a notificação do renunciante para vir aos autos informar do paradeiro dos autores, com a advertência de que a renúncia de mandato apenas produz efeitos após a notificação dos mandantes.

22. Na sequência dessa notificação, vem o Senhor Dr. JNP, M.I. Advogado, informar que não sabe do paradeiro dos autores, não tem nem teve mais contacto com os mesmos desde a data em que apresentou a renúncia ao mandato.

23. A verificar-se alguma nulidade, resulta do artigo 199.º, n.º 1 do CPC que a mesma deveria ter sido arguida nessa altura.

24. Por outro lado, resulta dos autos que os autores, salvo o devido respeito, se desinteressaram pelo processo, na medida em que desde a data da renúncia ao mandato pelo seu mandatário nunca mais procuraram obter informações, pedir explicações ou intervir de qualquer modo no processo, não tendo, sequer, actualizado a sua morada junto dos mesmos.

25. Desinteresse esse que se prolongou por cerca de quatro longos anos, em que a instância foi suspensa, depois interrompida e, por fim, extinta por deserção, sem que tenha sido deduzido um único requerimento, quer pelos próprios autores, quer por qualquer um dos seus mandatários constituídos, quer pelo próprio Recorrente, que podia e devia ter diligenciado pela protecção dos seus interesses, coisa que se coibiu de fazer.

26. Efectivamente, tal como alega na reclamação deduzida, o Recorrente tinha total e conhecimento da existência do processo sub judice e manteve sempre algum contacto com os pais após o acidente, pelo que podia e devia ter-se inteirado sobre o estado do processo.

27. Parece-nos, pois, que não pode o Recorrente legitimamente pretender, dois anos após o trânsito em julgado da referida sentença que declara extinta a instância, e oito anos após adquirir capacidade judiciária, frustrar por completo as expectativas e confiança jurídica que a Recorrida colheu do princípio do caso julgado sendo manifesta, como é, a falta de diligência demonstrada quer pelos pais do Recorrente, enquanto representantes, quer pelo próprio Recorrente, na qualidade de principal interessado no desfecho da causa.

28. Em suma, ainda que provadas fossem as nulidades arguidas, o que só por hipótese de exercício intelectual se equaciona, sempre se apresentaria extemporânea a respectiva reclamação.

29. Pelo que as decisões recorridas não merecem qualquer reparo, nem o recurso aqui em apreço merece qualquer provimento.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado, com a consequente confirmação integral da decisão proferida, por ser de inteira e merecida JUSTIÇA.”.

O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de dever ser o Recorrente convidado a esclarecer e completar as suas conclusões de recurso, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 639º, nº 3, do CPC, em termos que se dão por reproduzidos, considerando-as deficientes “porquanto não explicitam, como deveriam, qual a data em que a A. tomou conhecimento dessas nulidades processuais, tendo em vista o esclarecimento deste Venerando TCA Norte, de modo a aquilatar da tempestividade da sua arguição”.

Na sequência da oficiosa notificação desse Parecer, as partes vieram espontaneamente aos autos, com requerimentos que ficam nos autos, dizer o seguinte, em síntese:

O Recorrente PMPM, entre o mais que alega, pede o seguinte: “Por economia e antecipação de eventual despacho do Meritíssimo Juiz Relator, no sentido de colmatar a deficiência conclusiva apontada pelo Digníssimo Ministério Público, desde já se requer em aditamento às conclusões apresentadas, das seguintes, sob o nº 17, alínea a) e b):

17 a) O Recorrente teve conhecimento do número do processo, tribunal e estado do mesmo, designadamente dos factos integradores das arguidas nulidades cujo conhecimento constitui o thema decidendum do recurso sub judice, por contacto telefónico com a sua patrona nomeada nos presentes autos, a 23 de Janeiro de 2015.

17 b) Foi através da sua Patrona Nomeada, com quem reuniu pela primeira vez a 19 de Janeiro de 2015, que após a mesma identificar e consultar os presentes autos, verificou o estado do processo e lhe relatou o andamento do processo, o seu desfecho e razões do mesmo, a 23 de Janeiro de 2015.”.

— O Recorrido Município, notificado da resposta apresentada pelo Recorrente, veio dizer que impugna e não aceita o alegado pelo Recorrente, considera que aquando do requerimento de protecção jurídica formulado pelo ora Recorrente e cuja decisão data de 30-12-2014, este sabia e tinha perfeito conhecimento da existência do processo e que o mesmo tinha sido arquivado e/ou extinto em data muito anterior a 19-01-2015 e a 23-01-2015; considera ainda que a mãe do Recorrente, identificada naquele pedido de protecção jurídica como integrando o seu agregado familiar, bem sabia, por ter sido notificada, de que a instância tinha sido julgada extinta em Janeiro de 2013, tendo o dever de comunicar tal facto ao filho, o que terá sucedido pois este, o Recorrente, declarou naquele requerimento junto do ISS pretender a «reabertura do processo». Termina, referindo que o Recorrente não faz qualquer prova dos factos alegados, não aceitando que o mesmo apenas tenha tido conhecimento do processo na data alegada e conclui pela manifesta extemporaneidade do recurso.

A Recorrida APPC, notificada da resposta deduzida pelo autor ao Parecer do Ministério Público, veio dizer, na sua síntese, e com os fundamentos que se Têm presentes e se dão por reproduzidos, queEm suma, atendendo a que o recorrente tinha conhecimento da existência do processo e podia ter nele intervindo desde que perfez 18 anos de idade, em 2007, até à extinção da instância, em 2013, deve negar-se o presente recurso, por se revelar extemporâneo, não relevando a alegação do recorrente na parte em que afirma só ter tomado conhecimento do mesmo em 23 de Janeiro de 2015.”.

Pronunciou-se, por fim, o Ministério Público, fundamentadamente, em termos que se dão por reproduzidos, considerando tempestiva a arguição das nulidades em apreço e ainda pelo provimento do recurso, devendo anular-se o processado subsequente ao despacho judicial proferido em 06-06-2008, a fls. 236 do processo em suporte físico.
Manifestaram-se as partes EP, Município e APPC em sentido contrário ao constante do Parecer do Ministério Público, em termos que aqui se dão por reproduzidos.

As questões suscitadas(2) e a decidir(3), se a tal nada obstar, resumem-se em determinar (i) se a instância se extinguiu e, caso afirmativo, se não é renovável, (ii) se ocorre a extemporaneidade da arguição das nulidades e (iii) se se verificam as nulidades atípicas suscitadas pelo Recorrente.

Cumpre decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – FUNDAMENTOS DE FACTO

A decisão de extinção da instância, por deserção, não apresenta elenco formal de factos, mas antes um enunciado de matéria, pacífica nos autos, integrado no discurso dirimente, que entendeu relevante para a decisão em causa.

Atentemos, antes de mais, nos factos que importa ter presentes:

1. Em 18-12-2006, MFCP (…) e marido JCCM (…), ambos na qualidade de legítimos representantes legais, por progenitores, do menor PMPM”, intentaram acção administrativa comum, sob a forma ordinária, no TAF de Coimbra contra o Município de Coimbra, o (à data) IEP – Instituto das Estradas de Portugal e ainda o NRC da Associação Portuguesa de PC, pedindo, em síntese, que os réus fossem condenados a pagar aos autores a quantia de 900.000,00€, por danos sofridos pelo identificado menor na sequência de uma queda de um muro com altura de cerca e 3 metros;

2. Os autores juntaram procuração forense, pela qual MFCP, “…na qualidade de legítima representante legal do seu filho menor PMPM vem constituir bastantes mandatários o Exmº Senhor Dr. JNP, com a cédula profissional nº 5...C e o Exmº Senhor Dr. RPM, com a cédula profissional nº 4...C, ambos com domicílio profissional na Rua FB, nº 36, 2º andar, 3000-179 Coimbra…”;

3. Citados, os réus contestaram;

4. Por despacho de 30-04-2008, foram os autores notificados para se pronunciarem, em 10 dias, no âmbito do incidente de chamamento à intervenção acessória da F/M... – Companhia de Seguros, SA;

5. Em 02-05-2008, o Advogado JNP apresentou nos autos “renúncia à procuração que lhe foi outorgada pela Senhora dona MFCP”;

6. Por despacho judicial de 06-06-2008, foi ordenada a notificação “nos termos do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 39º do Código de Processo Civil” e ainda: “Despacho de 30 de Abril de 2008: Aguarde as notificações em causa pela constituição de novo mandatário” — junta a fls. 234 dos autos (a menção de folhas dos autos será sempre efectuada para a versão em suporte de papel);

7. A carta de notificação da renúncia do mandato aos autores foi devolvida, com a menção de que “não atendeu”, tendo igualmente sido devolvida a segunda carta enviada com tal propósito — fls. 243 e 249 dos autos;

8. Por despacho de 13-03-2009 foi ordenada a notificação do mandatário renunciante para vir aos autos indicar a morada dos autores e, no incumprimento, foi o despacho renovado pelos despachos de 27-04-2009 e de 29-06-2009;

9. Em 09-07-2009, o Advogado JNP veio aos autos dizer que “…desde o momento em que renunciou à procuração, não mais voltou a ter contacto com a pessoa dos autores pelo que, desconhece de todo o paradeiro dos mesmos”;

10. Após pesquisas sobre a morada dos autores, pelo despacho de 22-09-2009, foi ordenada a notificação aos autores da renúncia ao mandato;

11. O aviso da recepção da carta dessa notificação do autor JCCM, mostra-se assinada e datada de 30-09-2009 — fls. 284 dos autos;

12. O aviso da recepção da carta dessa notificação da autora MFCP, mostra-se assinada e datada de 22-10-2009 — fls. 295 dos autos;

13. Com data de 23-11-2009, foi exarado despacho, a fls. 297 dos autos, despacho do seguinte teor, designadamente: “Tendo em conta o teor de fls. 234 e processado seguinte, em especial fls. 284 e 295, determino a suspensão da instância — cfr. 1ª parte do nº 3 do artigo 39º do CPC.”;

14. Desse despacho foram notificados JCCM, os mandatários do réu IEP, Advogada AG, do réu município, Advogado DML, do réu Associação, Advogado RC;

15. A carta para notificação daquele despacho de 23-11-2009 à autora MFCP foi devolvida, com a menção de que “não atendeu” — fls. 305 dos autos;

16. Com data de 16-12-2010, foi declarada interrompida a instância, nos termos previstos no artigo 285º do CPC e os autos mandados aguardar por seis meses — fls. 307 dos autos;

17. Desse despacho foram notificados JCCM, os mandatários do réu IEP, Advogada AG, do réu município, Advogado DML, do réu Associação, Advogado RC;

18. A carta para notificação daquele despacho de 16-12-2010 à autora MFCP foi devolvida — fls. 315 dos autos;

19. Por sucessivos despachos, de 27-06-2011, de 27-02-2012, de 28-06-2012, foi mantido o despacho de fls. 307 (de 16-12-2010);

20. Por decisão de 22-01-2013, a fls. 323 dos autos, foi decidido o seguinte, designadamente: “Por estarem reunidos os seus pressupostos (cfr. autos desde fls. 234, em especial fls. 297 e 307), declaro a presente instância extinta, por deserção (cf. Alínea c) do artigo 287º e artigo 291º do Código de Processo Civil).”;

21. Dessa decisão foram notificados JCCM, os mandatários do réu IEP, Advogada AG, do réu município, Advogado DML, do réu Associação, Advogado RC;

22. A carta para notificação daquela decisão de 22-01-2013 à autora MFCP foi devolvida, com a menção “não atendeu” — fls. 331 dos autos;

23. Aos autos foram apostos vistos, sendo para fiscalização, pelo Ministério Público, e em correição, pelo juiz titular do processo, ambos com data de 30-04-2013 — fls. 334 dos autos;

24. Em 30-01-2015, “PMPM, solteiro, maior (…) representado nos autos enquanto menor, pelos AA. Seus pais, MFCP e JCCM, vem deduzir reclamação de nulidades processuais”, culminando no seguinte pedido, designadamente: “Deve a falta de notificação do ora reclamante, PMPM, enquanto titular único dos interesses em litígio e com capacidade judiciária e legitimidade processual a intervir pessoalmente nos autos, assim como, e sem prejuízo, a falta de notificação do mandatário constituído, Dr. RPM em representação dos AA., progenitores em sua representação, de todo o andamento processual após o despacho de fls., 236, inclusive, serem declaradas nulidades processuais, declarando nulo todo o processado decorrente e subsequente, com a consequente renovação da instância, ordenando-se o prosseguimento dos autos com o cumprimento do despacho de fls. 231 e 232.”;

25. O Reclamante PMPM juntou ainda aos autos, a fls. 340 a 341, o assento de nascimento nº 6858 do ano de 2007, por informatização do assento nº 91/1989, lavrado em 16/01/1989, na Conservatória do Registo Civil de Coimbra, que regista o nascimento de PMPM, no dia 13 de Janeiro de 1989, filho de JCCM e de MFCP, na freguesia de Santo António dos Olivais, concelho de Coimbra;

26. Notificadas, as partes passivas pronunciaram-se nos autos no sentido do indeferimento da reclamação apresentada por PMPM — fls. 362 a 395 dos autos;

27. Seguiu-se despacho, a fls. 397 a 399 dos autos, do seguinte teor, designadamente:

O Autor PMPM, alegando que atingiu a maioridade em 13 de Janeiro de 2007, pelo que deixaram os seus pais, desde então, de o representar, e sem embargo não foi notificado para intervir pessoalmente nos autos, o que, diz, constituiu nulidade processual que deve ser declarada com todas as consequências, e que, de todo o modo, se é certo que houve renúncia ao mandato por parte de um dos mandatários dos seus pais, certo é também que eram dois os mandatários constituídos, pelo que também o despacho de 6/6/2008 mandando notificar os pais nos termos e com a cominação do artigo 39° n° 3 do CPC de então (fs. 236) incorreu numa nulidade processual, o mesmo acontecendo com os subsequentes e consequentes despachos de interrupção (fs. 307) e de deserção da instância (fs. 323), vem requerer que sejam declaradas tais nulidades e declarado nulo todo o processado decorrente e subsequente, com a consequente renovação da instância, que deverá prosseguir com o cumprimento do despacho de fs. 231 e 232 .

Notificados todos os demandados, apenas o Réu Município veio manifestar a sua oposição ao requerido, alegando que a instância está extinta e não há, in casu, previsão legal para a sua renovação. Mais diz que nada na lei obrigava à notificação do Autor, atingida a maioridade, para intervir por si no processo e que se alguma nulidade houve ela devia ter sido arguida té ao momento em que o renunciante foi notificado para dizer o paradeiro dos mandantes, conforme decorrerá do artigo 199° n° 1 do CPC. Mais diz que vir 8 anos depois da maioridade arguir estas pretensas nulidades é atentar contra a segurança jurídica e direitos consolidados na sua esfera jurídica.

Ao seu requerimento sub judice o Autor junta certidão de nascimento, comprovativa de que atingiu, efectivamente, a maioridade em 13 de Janeiro de 2007, isto é, menos de um mês depois de entrada a PI.

Quid juris?

Percorridos os Autos, confirma-se que efectivamente havia um segundo mandatário e que este não renunciara à procuração e nunca foi notificado quer do despacho que declarou a Instância interrompida nos termos do artigo 285° do CPC de então (16/12/23010, fs. 307), quer do Despacho que a declarou extinta por deserção (22/1/2013, fs. 323).

Por outro lado verifica-se que nos autos há notícia desde a entrada da réplica, a qual ocorreu em 27/2/2007 (cf. doc. junto com este articulado) de que o Autor perfez 18 anos no sobredito dia.

Parece, portanto, que o tribunal omitiu o conhecimento da falta de poderes de representação do Autor, por parte dos seus pais desde que aquele atingiu a maioridade, do CPC, bem como os actos necessários a repor a regularidade da instância quanto à parte activa, e, lavrando no duplo erro de o autor ser ainda menor representado pelos pais e de estes não terem mandatário forense no processo, proferiu os despachos ilegais de cominar a suspensão da instância se não fosse constituído outro mandatário, de declarar interrompida a instância e de a declarar deserta.

Nos termos do artigo 195° n° 1 do CPC a "prática de um acto que a Lei não admita bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa".

Contudo é inelutável que foram proferidos os despachos sobreditos e que o último deles produziu a extinção da instância por deserção.

Assim, o que está em causa não são meros actos processuais, indevidamente praticados ou omitidos, mas sim decisões judiciais erradas.

Quanto a estas, contudo, está esgotado o poder judicial desta primeira instância. Conforme artigo 627° n° 1 do actual CPC, as decisões judiciais são impugnáveis mediante recurso.

Assim, o meio processual legalmente admissível para impugnação dos despachos reputados de ilegais, designadamente os acima referidos, era o recurso, não a suscitação, por reclamação, de quaisquer nulidades processuais.

O Autor, com o requerimento que antecede, argúi perante a primeira instância a nulidade das sobreditas decisões judiciais. Portanto não usa do meio processual adequado para se insurgir contra os seus efeitos.

Dispõe o artigo 193° n° 3 do CPC actual, que "o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados".

Dado que nunca foi notificado de qualquer despacho proferido nestes autos o Autor estava em tempo, quando apresentou o requerimento que antecede, para recorrer de todos e quaisquer daqueles três despachos.

Assim sendo, convolo o requerimento do Autor que antecede em requerimento de recurso de apelação relativamente aos despachos de 6 de Junho de 2008, a fs. 236 ¬que mandou cumprir o artigo 39° n° 3 do CPC de então nas pessoas dos pais do Autor - de 16/12/2010, a fs. 307 - que declarou a Instância interrompida nos termos do artigo 285° do CPC de então - e de 22 de Janeiro de 2013, a fs. 323 - que declarou a Instância extinta por deserção.

O recurso é de apelação e subirá de imediato e nos próprios Autos, com efeito suspensivo.

Porém, uma vez que o requerimento convolado não apresenta conclusões, antes de mais, nos termos do artigo 639° n° 1 do NCPC, devidamente adaptados, ex vi artigo 140° do CPTA, convido o Autor a apresentar em cinco dias um aditamento ao requerimento sub judice, apresentando sinteticamente conclusões em conformidade com o exigido pelo artigo 639° n° 1 do NCPC.

Notifique, desta feita e por ora apenas o Recorrente (Autor PMPM).

Coimbra, 3/3/2015”;

28. PMPM apresentou as conclusões, a fls. 402 a 405 dos autos, já acima exaradas.

II.2 – FUNDAMENTOS DE DIREITO

Vejamos cada uma das questões, já acima elencadas, que se perfilam para conhecimento dirimente, relembrando que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito — nº 3 do artigo 5º do CPC.

II.2.1. Da eventual extinção da instância e sua renovabilidade

Suscitam os Recorridos Município, APPC e a EP, em síntese, ter ocorrido a extinção da instância e, não sendo a mesma renovável, a impossibilidade da prática de actos processuais nesta altura, por não existir uma relação processual que a legitime.

O Recorrente não se manifestou quanto a esta matéria.

Vindo arguidas nulidades susceptíveis de afectar a decisão ou decisões conducentes à extinção da instância, cumpre delas conhecer em primeiro lugar, relegando-se para momento posterior a esse conhecimento a apreciação da enunciada questão.

II.2.2. Da extemporaneidade da arguição das nulidades atípicas.

Como acima se viu, pelas conclusões das contra-alegações do Recorridos, vem suscitada a questão da extemporaneidade da arguição, pelo ora Recorrente, das nulidades, qualificadas de atípicas, com os argumentos ali expendidos e aqui se têm presentes.

Na verdade, não se reconduzindo as nulidades suscitadas às tipicamente previstas nos artigos 186º a 194º do CPC, restam as nulidades avulsamente arguíveis, atípicas ou secundárias, a que alude o artigo 195º do CPC.

Como regra geral sobre o prazo de arguição de nulidades atípicas rege o disposto no artigo 195º do CPC; assim, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que foram cometidas, podendo ser arguidas enquanto o acto não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência. O prazo em referência é de 10 dias — artigo 149º, nº 1, do CPC.

Tenha-se presente, por outro lado, queos menores cujo exercício de poderes parentais compete a ambos os pais são por estes representados em juízo (…)”, como dispõe o artigo 16º do CPC e já dispunha o artigo 10º do CPC/1961, sendo certo que “aquele que perfizer dezoito anos de idade adquire plena capacidade de exercício de direitos, ficando habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens”, reza o artigo 130º do Código Civil (CC).

Ora, tendo o recorrente adquirido personalidade jurídica no momento do seu nascimento (artigo 66º, nº 1, do CC) tem personalidade judiciária (artigo 5º, nº 2, do CPC/1961 e actual artigo 11º do CPC/2013), a qual consiste na susceptibilidade de ser parte (nº 1 do mesmo artigo), e tem igualmente capacidade judiciária, a qual consiste na susceptibilidade de estar, por si, em juízo (artigo 9º, nº 1, do CPC/1961 e actual artigo 15º, nº 1, do CPC/2013).

Como tal, a partir do momento em que o recorrente perfez 18 anos de idade, cessou a sua incapacidade decorrente da menoridade, que até então era suprida pela intervenção processual dos seus pais.

O Recorrente, menor à data da propositura da acção — 18-12-2006 —, perfez 18 anos de idade no dia 13-01-2007.

A partir dessa data, não consta dos autos que tenha constituído mandatário judicial ou que tenha sido notificado para tanto (artigo 33º do CPC/1961, à data) ou sequer notificado para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto do mesmo.

Reportando ao disposto no artigo 195º do CPC, compulsados os autos e tendo em mente os factos elencados, é seguro concluir que o Recorrente não esteve presente, nem por si nem por seu mandatário, no momento em que as arguidas nulidades foram cometidas.

Assim sendo, então o prazo de 10 dias para a sua arguição contar-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele.

Ponto é que haja intervindo ou sido notificado, tal como legalmente previsto.

Ora, neste caso, nem o Recorrente interveio em algum acto praticado no processo em data anterior à apresentação da reclamação convolada em recurso, nem o mesmo foi notificado para qualquer seu termo.

Após a prolação das decisões impugnadas, a primeira intervenção do Recorrente nos autos — e nessa data se iniciou o referido prazo de 10 dias — foi precisamente para arguir tais nulidades.

Em tempo, portanto.

Improcedem totalmente os fundamentos da suscitada extemporaneidade.

II.2.3. Das nulidades suscitadas pelo Recorrente.

Aos despachos em crise despachos de 06-06-2008, que mandou cumprir o artigo 39º, nº 3, do CPC/1961, de 16/12/2010, que declarou a instância interrompida e de 22-01-2013, que declarou a instância extinta por deserção — vem assacada pelo Recorrente a violação do disposto nos artigos 67º, 129º e 130º, todos do Código Civil, artigos 11º, 15º, 27º, nº 1, 28º, 30º, 40º, nº 1, alínea a), 43º, alínea a), 44º, nº 1, 247º e 195º todos do CPC/2013, ex vi artigo 1º do CPTA, e artigo 11º deste CPTA.

Reiterando que acima já se exarou sobre a questão da personalidade e capacidade judiciárias, relembra-se que o Recorrente, menor à data da propositura da acção — 18-12-2006 —, perfez 18 anos de idade no dia 13-01-2007.

A partir dessa data, não consta dos autos que tenha constituído mandatário judicial ou que tenha sido notificado para tanto (artigo 33º do CPC/1961, à data) ou sequer notificado para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto do mesmo.

À data da propositura da acção era representado pelos seus pais.

Ambos, em representação do seu filho menor e ora Recorrente, apresentaram em juízo a petição inicial, subscrita por advogado.

Juntaram duas procurações, cujos originais constam de fls. 81 e 82 dos autos em suporte de papel, ambas datadas de 27 de Novembro de 2006 e ambas subscritas pela mesma pessoa, MFCP, mãe do então menor, constituindo seus mandatários, em ambas as procurações, dois Advogados, o “Exmº Senhor Dr. JNP, com a cédula profissional nº 5...C e o Exmº Senhor Dr. RPM, com a cédula profissional nº 4...C, ambos com domicílio profissional na Rua FB, nº …, 3000-… Coimbra”.

Nenhuma procuração constituindo mandatário judicial se vislumbra junta por JCCM, pai do então menor.

Também não se vislumbra ter sido suprida essa falta de procuração (artigo 40º do CPC/1961).

Certo é que, após a citação dos Réus, em 02-05-2008, o Ilustre Advogado JNP apresentou nos autos “renúncia à procuração que lhe foi outorgada pela Senhora dona MFCP”.

Certo é também que MFCP continuou representada no processo pelo mandatário constituído, o Ilustre Advogado RPM.

No entanto, por despacho judicial de 06-06-2008, foi ordenada a notificação “nos termos do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 39º do Código de Processo Civil” e ainda: “Despacho de 30 de Abril de 2008: Aguarde as notificações em causa pela constituição de novo mandatário.

Esse despacho, veio a ser notificado à mandante em 22-10-2009, mas não foi notificado ao ora Recorrente, maior de idade a essa data.

Por despacho de 23-11-2009 foi determinada a suspensão da instância.

Desse despacho foram notificados JCCM, os mandatários do réu IEP, Advogada AG, do réu município, Advogado DML, do réu Associação, Advogado RC.

Mas não foi notificado o mandatário judicial de MFCP, nem a própria (cuja carta de notificação foi devolvida), nem o ora Recorrente, maior de idade a essa data.

Com data de 16-12-2010, foi declarada interrompida a instância, nos termos previstos no artigo 285º do CPC e os autos mandados aguardar por seis meses (despacho que foi mantido por sucessivos despachos, de 27-06-2011, de 27-02-2012 e de 28-06-2012).

Desse despacho foram notificados JCCM, os mandatários do réu IEP, Advogada AG, do réu município, Advogado DML, do réu Associação, Advogado RC.

Mas não foi notificado o mandatário judicial de MFCP, nem a própria (cuja carta de notificação foi devolvida).

O ora Recorrente também não foi notificado.

Por decisão de 22-01-2013 foi declarada extinta a instância, por deserção [alínea c) do artigo 287º e artigo 291º do CPC].

Mais uma vez, dessa decisão foram notificados JCCM, os mandatários do réu IEP, Advogada AG, do réu município, Advogado DML, do réu Associação, Advogado RC;

Mas não foi notificado o mandatário judicial de MFCP, nem a própria (cuja carta de notificação foi devolvida).

O ora Recorrente também não foi notificado.

Vejamos as consequências.

Com ensina MANUEL DE ANDRADE, in Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, 2ª ed., pag. 164, as nulidades do processo são quaisquer desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder — embora não de forma expressa — uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais.

Dispõe o artigo 195º do CPC, ex-artigo 201º do CPC/1961:

1 — Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.

2 — Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.

3 — Se o vício de que o ato sofre impedir a produção de determinado efeito, não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o ato se mostre idóneo.

Em que casos ou circunstâncias se deve entender que a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa é matéria não esclarecida pelo legislador, pelo que «só caso por caso a prudência e a ponderação dos juízes poderão resolver», como elucida ARTUR ANSELMO DE CASTRO, in Direito Processual Civil Declaratório, III, Almedina, 1982, pag. 109.

Vejamos, pois.

Apesar de MFCP ter constituído e estar representada por advogado nos autos, este nunca foi notificado dos despachos e decisão supra identificados, em violação do disposto nos artigos 228º, nº 2, 229º, 253º, 254º e 259º, todos do CPC/1961, ex vi artigo 1º do CPTA.

Decidiu-se suspender a instância, pela não constituição de novo mandatário, relativamente à mãe do Recorrente, quando esta se encontrava representada por advogado com procuração junta aos autos.

Outrossim, como já acima se exarou com fundamentos que aqui se reiteram, a partir do momento em que o ora Recorrente perfez 18 anos de idade (no dia 13-01-2007), cessou a sua incapacidade decorrente da menoridade, que até então era suprida pela intervenção processual dos pais, seus legais representantes.

Donde, iure proprio, podia e devia o ora Recorrente, na qualidade de autor, ser notificado, designadamente, do despacho que determinou a suspensão da instância, do despacho que declarou interrompida a instância e da decisão de extinção da instância, nos termos previstos no artigo 255º do CPC/1961, à data aplicável, uma vez que relativamente a ele não se havia cumprido o disposto no artigo 33º do mesmo CPC, em face do disposto no nº 1 do artigo 11º do CPTA/2002. A omissão dessas notificações ocorre em violação do disposto nos artigos 228º, nº 2, 229º, 255º e 259º, todos do CPC/1961.

Estamos, pois, em presença de actos assentes em pressupostos errados e omissões de actos e formalidades que a lei prescreve.

O artigo 20º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa garante o direito a um processo equitativo, que no caso se mostra violado, bem como violação do dever de assegurar a igualdade das partes, que ao Tribunal incumbe (artigo 3º-A do CPC/1961 e 4º do CPC/2013), mormente se a parte — designadamente, o Recorrente — não é notificada dos actos e factos processuais, entre o mais e no caso, atinentes e conducentes à suspensão, à interrupção e, finalmente, à extinção da instância, por deserção.

Mais ainda quando na génese dessa sequência processual que culmina na extinção da instância está, outrossim, a consideração de pressupostos que se revelam errados, pois não só a mãe do menor estava representada por advogado com procuração junta aos autos, cuja notificação foi omitida, como, por outro lado, o pai do menor não se encontrava representado por advogado nem quanto a ele foi cumprido o disposto no artigo 33º do CPC/1961, por falta de constituição de advogado, como, ainda, à data da prática de tais actos processuais havia já cessado a incapacidade do Autor decorrente da menoridade.

Em consequência directa e indirecta dos apontados actos e omissões, a acção foi conduzida à extinção, por deserção, sendo os mesmos susceptíveis de influir e influíram, decisiva e negativamente, no exame e na decisão da causa e, como tal, consubstanciam nulidade, nos termos do disposto no artigo 195º do CPC, ex-artigo 201º do CPC/1961.

Em consequência, cada um dos identificados actos e omissões produzem nulidade, devendo os mesmos ser anulados, sendo que, quando um acto tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente (nº 2 do artigo 195º do CPOC).

III. DECISÃO

Termos em que os juízes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte acordam em conceder provimento ao recurso e, em consequência:

a) anula-se o despacho de 6 de Junho de 2008, a fls. 236 dos autos em suporte de papel, que ordenou o cumprimento do artigo 39º nº 3 do CPC/1961 e anulam-se todos os termos subsequentes, incluindo os despachos de 16 de Dezembro de 2010, a fls. 307, que declarou a Instância interrompida nos termos do artigo 285º do CPC/1961, e de 22 de Janeiro de 2013, a fls. 323, que declarou a instância extinta por deserção.

b) ordena-se a remessa dos autos ao TAF a quo com vista à subsequente tramitação, desde que a tal nada mais obste.

Custas pelos Recorridos, por lhes terem dado causa.

Notifique e D.N..

Porto, 21 de Abril de 2016
Ass.: Helder Vieira
Ass.: Alexandra Alendouro
Ass.: João Beato
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(1) Nos termos dos artºs 144.º, n.º 2, e 146.º, n.º 4, do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4, e 685.º-A, n.º 1, todos do CPC, na redacção decorrente do DL n.º 303/07, de 24.08 — cfr. arts. 05.º e 07.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 41/2013 —, actuais artºs 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, 639.º e 640º do CPC/2013 ex vi artºs 1.º e 140.º do CPTA.
(2) Tal como delimitadas pela alegação de recurso e respectivas conclusões — artigos 608º, nº 2, e 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 2, 639º e 640º, todos do Código de Processo Civil ex vi artº 140º do CPTA.
(3) Para tanto, e em sede de recurso de apelação, o tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto, “ainda que declare nula a sentença, o tribunal de recurso não deixa de decidir o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito”, reunidos que se mostrem os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas — art. 149.º do CPTA.