Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00588/18.0BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/25/2024
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Margarida Reis
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA; NULIDADE DA SENTENÇA;
CONDENAÇÃO À PRÁTICA DE ATO;
INCOMPETÊNCIA RELATIVA; INFORMAÇÃO VINCULATIVA;
Sumário:
Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva:
I. Apenas se verifica a nulidade por omissão de pronúncia quando o tribunal de primeiro conhecimento da causa deixe de se pronunciar, em absoluto, sobre as questões suscitadas pela parte, devendo entender-se como tal as causas de pedir invocadas, naturalmente, quando o seu conhecimento não for considerado prejudicado, e não os argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocadas pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas “questões”

II. Tendo sido formulado um pedido de condenação à prática de ato devido, como é o caso, o objeto da ação é a pretensão material do interessado, e não a putativa invalidade do ato, não podendo o Tribunal limitar-se a devolver a questão ao órgão administrativo competente.

III. O que se retira da alegação da Recorrente, é que a mesma pretende que o ato seja praticado não só com determinado conteúdo, como também pelo órgão competente.

IV. Não é indubitável que o ato, a ter sido praticado pelo órgão competente, tivesse o mesmo conteúdo, sendo ainda certo que o que está vedado ao Tribunal é que a questão seja devolvida ao órgão administrativo competente, consequência que sempre estaria afastada através da procedência da presente ação com fundamento no apontado vício de incompetência relativa, pois o que assim se conclui é que a questão que a Recorrente pretende ver apreciada nunca o foi pelo órgão competente.

V. Para cumprir o regime processual aplicável e assim, o desiderato do legislador, que na ação de condenação à prática de ato devido pretendeu “afastar a lógica revisora, própria dos processos de cassação”, o que há que concluir é pela procedência da ação determinando-se, em consequência, a condenação da Ré a que o ato seja praticado pelo órgão competente.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A Federação « X », inconformada com a decisão proferida em 2021-07-03 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a ação que interpôs tendo por objeto a informação vinculativa sancionada por despacho proferido em 2018-07-05 pela Subdiretora-Geral da ATA, referente ao enquadramento jurídico-tributário dos prémios atribuídos no âmbito de dois tipos de competições desportivas columbófilas distintas, a FCI – Grand Prix de Portugal e o Campeonato Nacional de Fundo e na qual pediu a anulação do ato impugnado por incompetência relativa do órgão que o praticou, e, “[s]em conceder”, a sua anulação por erro de direito nos pressupostos, “determinando-se não serem os prémios monetários identificados considerados rendimentos de prestações de serviços inseridos na categoria B do IRS, com as demais consequências legais”, vem interpor o presente recurso.

A Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES
1.º A Recorrente recorre da sentença proferida nos autos de processo acima identificados, a fls. 228 e seguintes do processo eletrónico (documento com a referência SITAF 005087199), por com a mesma não se conformar;
2.º A Recorrente impugna a matéria de facto dada como provada e não provada, por entender, existir erro de julgamento e inexatidões na matéria de facto dada como provada e porque a mesma se mostra insuficiente perante a matéria a que o Tribunal a quo foi chamado a decidir;
3.º Assim, a sentença recorrida incorreu em inexatidão e erro de julgamento quanto ao ponto 2 da matéria de facto dada como provada. Naquele ponto, a sentença recorrida refere que “Em 20.11.2011 a ora Autora submeteu junto da Autoridade Tributária e Aduaneira um pedido de informação vinculativa (...)”. Ora, como prova o documento 1 junto com a petição inicial, presente a fls 11-13 dos autos, bem como a fls 1-6, do processo administrativo apenso (concreto meio probatório, constante do processo, que impõe decisão sobre este ponto da matéria de facto impugnada diversa da recorrida), o pedido de informação vinculativa formulado pela Recorrente foi apresentado em 16 de novembro de 2017 (e não 20.11.2011). Pelo que deve, em consequência, o enunciado no ponto 2 da matéria de facto dada como provada, ser alterado e substituído nos seguintes termos: “Em 16.11.2017, a ora Autora submeteu junto da Autoridade Tributária e Aduaneira um pedido de informação vinculativa (...)”.
4.º Deverão, ainda, ser aditados à matéria de facto dada como provada, os seguintes factos, que se relevam essenciais para a boa decisão da causa:
8) Da informação vinculativa n.º ..875 não consta qualquer referência ou menção a qualquer ato de delegação de poderes ao Subdiretor-Geral, nem ao despacho de delegações de poderes que o corporizaria;
9) A columbofilia é um desporto amador, no qual, em Portugal, não se disputam competições desportivas de natureza profissional;
10) O FCI – Grand Prix de Portugal é uma competição não profissional;
11) O Campeonato Nacional de Fundo é uma competição não profissional.
12) Na competição FCI – Grand Prix de Portugal, os pombos são entregues ao cuidado dos treinadores residentes no columbódromo, os quais, através de um programa intensivo de treinos em voo, procuram dotar os pombos-correio das performances físicas e de orientação em voo, que lhes permita efetuar uma prova desportiva final com cerca de 400 km;
13) Quanto ao segundo tipo de competição – o Campeonato Nacional de Fundo – os pombos-correio participantes são treinados e selecionados pelos columbófilos, tendo em conta o apuramento genético, através de múltiplos cruzamentos, e, um treino específico que permita aos “atletas” pombos correio, superar a dificuldade e as exigências colocados por uma prova de longa distância.
5.º Quanto ao facto que se pretende aditar e enunciado na conclusão 4.ª sob o n.º 8), o concreto meio probatório, constante do processo, que impõe decisão sobre este ponto da matéria de facto impugnada diversa da recorrida é precisamente a informação vinculativa n.º ..875, constante do documento n.º 2 junto com a petição inicial (a fls 79 e seguintes dos autos) e de fls 65 e 66 do processo administrativo apenso. Ao não ter levado à matéria de facto dada como provada, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC.
6.º Quanto aos factos que se pretendem aditar e enunciados na conclusão 4.ª sob os n.ºs 9), 10) e 11), o mesmo foi alegado pela Recorrente, no artigo 19.º da sua petição inicial (e sem contestação por parte da ATA). Efetivamente, como consta da matéria de facto dada como provada (ponto 1. da matéria de facto dada como provada) e do enquadramento jurídico decorrente da atribuição de estatuto de utilidade pública desportiva (cfr. artigo 2.º do Regime jurídico das federações desportivas; e Despacho nº 1710/2014, de 15 de janeiro), a Recorrente é uma federação unidesportiva de modalidade individual, não possuindo uma liga profissional – o que decorre dos seus estatutos juntos em anexo ao documento n.º 1 junto com a petição inicial. Caso, na columbofilia, se disputassem competições desportivas de natureza profissional, a Recorrente deveria, nos termos do artigo 26.º, n.º 2, do Regime Jurídico das Federações Desportivas, integrar uma liga profissional. Os factos que se pretendem aditar e enunciados na conclusão 4.ª sob os n.ºs 9), 10) e 11) são, assim, factos públicos e notórios, que, consequentemente, não carecem de alegação ou prova, nos termos do artigo 412.º do Código de Processo Civil;
7.º Ao não ter levado à matéria de facto dada como provada os factos enunciados na conclusão 4.ª sob os n.ºs 9), 10) e 11), o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC, bem como o disposto no artigo 412.º do Código de Processo Civil;
8.º Quanto aos factos que se pretendem aditar e enunciados na conclusão 4.ª sob os n.ºs 12) e 13), os mesmos resultam do pedido de informação vinculativa dirigida à AT, e, bem assim, do documento junto com a petição sob o n.º 1. Na verdade, são factos integrantes da concreta descrição factual realizada pelo requerente do pedido de informação vinculativa;
9.º Ora, o artigo 68.º, n.º 20, alínea c), da LGT, ao consagrar a possibilidade de recurso contencioso autónomo relativamente às decisões da administração tributária relativas ao enquadramento jurídico-tributário dos factos constante da resposta ao pedido de informação vinculativa, impõe que a avaliação que recai sobre o Tribunal que aprecia tal enquadramento seja realizada à luz dos factos constantes do pedido de informação vinculativa, já que sãoestes que importam enquadrar. E, sendo assim, como cremos que seja, deveria o Tribunal a quo ter consagrado na matéria de facto dada como provada os enunciados na conclusão 4.ª sob os n.ºs 12) e 13), como resulta inequivocamente provado através do pedido de informação vinculativa junto como documento 1 da petição inicial e constante do processo administrativo instrutor a fls 1-6.;
10.º Ao não ter consagrado estes dois concretos factos na matéria de facto dada como provada, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 607.º, n.º 4, do CPC e 68.º da LGT.
11.º Deverá, ainda, ser aditado à matéria de facto dada como não provada, o seguinte facto, essencial para a correta decisão da causa:
1) A Diretora-Geral da AT já havia sancionado, antes da informação vinculativa n.º ..875, entendimento acerca de outras situações em que estavam em causa prémios atribuídos no âmbito de concursos/competições desportivas.
12.º Este facto foi alegado no artigo 46.º da contestação apresentada pela ATA, para justificar a validade do ato praticado pela Subdiretora-geral, em delegação de poderes. Não obstante, nenhuma prova foi junta aos autos que confirmasse tal facto. Perante a ausência de prova, nomeadamente de prova documental, sempre teria o Tribunal a quo que ter julgado tal ponto concreto da matéria de facto como não provado;
13.º Ao não ter levado à matéria de facto dada como não provada o facto enunciado na conclusão 11.º sob o n.º 1), o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC;
14.º A Recorrente alegou um vício de incompetência relativa e pediu o decretamento da anulação do ato que sancionou a informação vinculativa impugnada. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre tal pedido formulado pela Recorrente, argumentando não ter “tal vício e consequente pedido, face à natureza e conteúdo do ato impugnado em causa, (...) qualquer relevo perante a pretensão material da ora Autora (cfr. artigo n.º 66.º, n.º 2 do CPTA)”;
15.º A Recorrente não se conforma com tal entendimento. A sentença carecia de analisar os fundamentos jurídicos vertidos e invocados nos autos quanto à invalidade do ato que sancionou a informação vinculativa impugnada, constituindo nesses moldes matéria decisória para o Tribunal a quo, cuja omissão inquina inelutavelmente a sentença recorrida, enfermando-a de nulidade por omissão de pronúncia, pelo que se requer seja na presente sede levada a cabo a referida análise do pedido de declaração da anulabilidade de tal ato por vício de incompetência relativa, concluindo pela respetiva procedência;
16.º O Tribunal a quo fez errada interpretação do artigo 66.º, n.º 2, do CPTA. Este normativo legal não isenta o Tribunal a quo de se pronunciar sobre todas as questões suscitadas pelo impugnante, particularmente quando não profira, a final, uma pronúncia condenatória. Nos termos do citado normativo, verificando-se a existência de um vício que determina a anulação do ato impugnado, o Tribunal a quo deverá declará-lo e prosseguir para a análise da pretensão material do interessado. Caso a pretensão material do interessado obtenha provimento, a eliminação do ato administrativo da ordem jurídica faz-se através da pronúncia condenatória realizada pelo Tribunal. Caso não tenha provimento, então subsiste sempre a questão do vício imputado, e declarado pelo Tribunal, do ato administrativo impugnado. Neste último caso, a eliminação do ato administrativo da ordem jurídica faz-se através da declaração, pelo Tribunal, da sua anulação;
17.º Ao não ter entendido assim e ao não se ter pronunciado quanto ao vício imputado ao ato, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 66.º, n.º 2, do CPTA, bem como o disposto no artigo 608.º, n.º 2, do CPC, padecendo a sentença recorrida de omissão de pronúncia;
18.º A Recorrente pede, assim, a pronúncia por este Tribunal quanto a tal pedido. A informação vinculativa impugnada foi sancionada pelo Subdiretor-geral da AT, no âmbito de alegada delegação do Diretor-geral. No despacho em causa não é feita qualquer menção ao ato de delegação nem ao Despacho que o corporiza, o que já de si representa um vício procedimental do ato que redunda na incompetência relativa e na anulação do mesmo, nos termos do artigo 44.º e 48.º do CPA, que se deverá ser reconhecida;
19.º Mais, nos termos do disposto no artigo 68.º n.º 1 do LGT e no Decreto-Lei n.º 118/2011 de 15 de setembro, as informações vinculativas sobre a situação tributária dos sujeitos passivos são sancionadas e proferidas pelo Diretor-geral da Autoridade Tributária. O Despacho 801/2018 de 19 de janeiro opera uma delegação de poderes, no ponto II, 1.1 alínea b), no qual são delegadas nos subdiretores gerais da AT, relativamente às unidades orgânicas cuja competência lhes foi também delegada através deste Despacho, as competências para “apreciar e decidir os pedidos de informação vinculativa formulados ao abrigo do artigo 68.º da LGT, sempre que esteja em causa o esclarecimento de normas legais já objeto de sancionamento superior”;
20.º Ora, no caso dos autos, nem o ato impugnado faz qualquer menção ao ato de delegação nem ao Despacho que o corporiza, nem refere se é ao abrigo de tal despacho acima identificado que o ato praticado pelo Subdiretor-geral é praticado, nem resulta provado que a AT tenha realizado qualquer sancionamento anterior acerca de outras situações em que estava, em causa prémios atribuídos no âmbito de concursos/competições desportivas;
21.º Assim, também por esta razão, a decisão sobre o pedido de informação vinculativa aqui em causa não estava abrangida pelo âmbito da delegação, devendo o ato impugnado praticado pelo Subdiretor-geral ilegal, por extravasar os limites da própria delegação, ser anulado. O ato padece, assim, de vício de incompetência relativa, sendo anulável, nos termos do disposto no artigo 163.º do CPA, o que deverá ser determinado, com as demais consequências legais daí decorrentes. Ao não ter decidido assim, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 68.º da LGT, 66.º, n.º 2, do CPTA, 608.º, n.º 2, do CPC e 44.º, 48.º e 163.º do CPA;
22.º A sentença recorrida padece, ainda, de erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico-tributário realizado. Em primeiro lugar, a sentença recorrida não se pronuncia quanto ao enquadramento jurídico-tributário em sede de Imposto do Selo. Andou mal, salvo melhor entendimento, o Tribunal a quo ao assim o ter feito. É que, nos termos do artigo 68.º, n.º 20, alínea c), da LGT, ao Tribunal compete, precisamente proceder a uma avaliação do enquadramento jurídico-tributário das situações fáticas colocadas pelo contribuinte à AT e que esta qualificou na sua resposta ao pedido de informação vinculativa;
23.º Ora, no caso dos autos, a AT pronunciou-se tanto quanto ao enquadramento em sede de Imposto do Selo, como quanto ao enquadramento em sede de IRS, pelo que deveria o Tribunal a quo ter-se debruçado sobre ambos os enquadramentos. Ao não o fazer, violou o Tribunal a quo o disposto no artigo 68.º, n.º 20, alínea c), da LGT, padecendo a sentença recorrida de nulidade por omissão de pronúncia;
24.º Acresce que a análise dos dois regimes jurídicos – o do Imposto do Selo e o do IRS – é indissociável, atenta a evolução legislativa nesta matéria. Na verdade, para um correto enquadramento jurídico-tributário da questão colocada, torna-se necessário proceder à análise da evolução legislativa relativamente às normas de incidência do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e do imposto do selo, o que se desenvolve nas alegações de recurso supra e para as quais se remete integralmente, nomeadamente no que respeita ao alargamento das normas de incidência incorporado pela LOE1990 e à transferência das normas de incidência relativamente a prémios obtidos em concursos para o Imposto do Selo com a LOE2010;
25.º No âmbito da legislação em vigor até à LOE2010, era entendimento pacífico da AT que os prémios obtidos em torneios ou campeonatos, ainda que no âmbito de uma atividade desportiva não profissional, eram rendimentos que integravam a categoria G do IRS (incrementos patrimoniais), nos termos do artigo 9.º, n.º 2, do CIRS, com a redação então em vigor, constituindo ganhos fortuitos. E assim o foi, também, na jurisprudência dos tribunais superiores. Veja-se a este propósito o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo 0432/11.9BELRS, datado de 13 de janeiro de 2021 (disponível em https://www.direitoemdia.pt/document/s/237024), no qual se refere expressamente que “para efeitos desse art. 152.º, foi considerado que a diferença entre sorteios e concurso consiste em a esperança de ganho residir somente na sorte, ou conjuntamente na sorte e na perícia do jogador – assim, no acórdão do S.T.J. de 28-11-07, proferido no proc. 7P3186, acessível em www.dgsi.pt. No entanto, tal como a autora acima citada defende a pág. 81, que, regulamentando a Lei do Jogo e o Código do I.R.S. actividades semelhantes, tal ocorre em perspectivas diferentes, pois “a referida norma de incidência contida no artigo 9.º, n.º 2, do Código do IRS ao referir-se a prémios atribuídos em quaisquer sorteios ou concursos, evidencia a intenção do legislador em abranger o maior número de realidades possíveis.”;
26.º No entanto, no âmbito de tal legislação, já a AT entendia que, apesar do alargamento da norma de incidência, havia prémios atribuídos em concursos que estavam excluídos de tributação em sede de IRS, daqui se retirando que não foi intenção do legislador tributar todos os prémios atribuídos;
27.º A partir da entrada em vigor da LOE2010, as importâncias ou prémios atribuídos em quaisquer sorteios ou concursos, até então considerados incrementos patrimoniais da categoria G de IRS, passaram a ser tributados (de novo) em sede de Imposto do Selo, de acordo com a verba 11.2. Acresce que a LOE2010 deixou intacta a delimitação negativa prevista no artigo 12.º do CIRS, reforçando a convicção de existirem prémios atribuídos em concursos não sujeitos a IRS;
28.º Ora, como refere Olga Cruz, “decorre da leitura da norma prevista no Código do IRS agora revogada [antigo artigo 9.º, n.º 2], bem como da norma atual prevista na TGIS [verba 11.2], que o legislador teve a clara intenção de manter na incidência desta norma exatamente as mesmas realidades que se encontravam abrangidas pelo anterior regime de tributação” (in “A tributação em IRS dos prémios atribuídos em jogos, sorteios ou concursos”, 2014, Lisboa: Instituto Superior de Gestão, p. 39);
29.º Ou seja, o que estava sujeito a imposto no âmbito do IRS, passa a estar sujeito a imposto no âmbito do IS e, a contrario, o que não estava sujeita a imposto no âmbito do IRS continua a assim permanecer;
30.º Isto mesmo consta da fundamentação da sentença recorrida, referindo a mesma que “atualmente, face ao teor das alíneas n.º 1 do artigo 9.º do CIRS, não mais os prémios atribuídos m concursos poderão ser ali enquadrados como rendimentos da categoria G”, precisamente fruto da sua tributação atual em sede de Imposto do Selo. No entanto, prossegue a sentença recorrida na indagação sobre se, “face à tipicidade fechada de rendimento resultante do próprio Código do IRS, (…) podem ser qualificados como rendimentos das restantes categorias”. E aqui, salvo melhor entendimento, reside o erro de julgamento da sentença recorrida. É que as normas de incidência (em sede de IRS até 2010 e em sede de IS a partir de 2010) são as mesmas e indissociáveis. Se o prémio atribuído em concurso não estava sujeito a IRS até 2010, também não o estará sujeito a IS a partir de 2010, muito menos estará sujeito a IRS, como rendimento das restantes categorias, a partir de 2010;
31.º O legislador, ao definir quais os prémios que estão sujeitos a imposto (IRS até 2010 e IS a partir de tal data) – os atribuídos em concursos em que ocorra algum grau de aleatoriedade associado ao fator sorte – , procedeu a uma delimitação negativa específica da norma de incidência. E essa norma indica que estão apenas sujeitos a tributação os prémios atribuídos em concursos em que ocorra algum grau de aleatoriedade associado ao fator sorte. Os restantes, como refere Inês Salema (acima citada), não estão sujeitos a tributação;
32.º E se assim é, como cremos que seja, os prémios atribuídos no âmbito do FCI – Grand Prix de Portugal e no âmbito do Campeonato Nacional de Fundo caem fora do âmbito de incidência definidos nos termos do CIS, quer no âmbito de incidência prevista no CIRS, não havendo, em consequência, lugar à tributação;
33.º O disposto no artigo 3.º, alínea t), do CIS, e a verba 11.2.2 da tabela anexa ao IS, procede a uma delimitação negativa de incidência específica relativamente aos prémios que estão sujeitos a imposto, deixando de fora os prémios atribuídos em concursos como os apreciados na sentença recorrida;
34.º Ao não ter decidido assim, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 103.º, n.º 2, da CRP, 68.º, n.º 20, alínea c), da LGT, e artigo 3.º, n.º 2, alínea t), do CIS e verba 11.2.2. da tabela anexa ao CIS;
35.º Mais, deveria a sentença recorrida ter apreciado de forma autónoma as duas situações fáticas que foram submetidas à Autoridade Tributária para enquadramento: os prémios atribuídos no âmbito das competições desportivas do FCI – Grand Prix de Portugal e os prémios atribuídos no âmbito do Campeonato Nacional de Fundo, pois que os dois concursos encetam características distintas com relevo para o correto enquadramento jurídico tributário em causa;
36.º Na primeira situação – dos campeonatos FCI – Grand Prix de Portugal – é flagrante a desadequação da atuação do columbófilo como sendo atividade de desportista, para efeitos de IRS, enquanto atividade exercida por sujeitos passivos desse imposto, com o código 1323, caindo, assim, salvo melhor entendimento, por terra a argumentação expendida pela sentença recorrida;
37.º O caso em apreço, como resulta do ponto 3. da matéria de facto dada como provada e dos pontos concretos da matéria de facto provada que a Recorrente pretende ver aditados, não integra quaisquer rendimentos de desportistas. O desportista é aquele que por mérito do seu trabalho obtém resultados melhores ou piores em competição face a outros competidores. No caso em apreço – do FCI Grand Prix de Portugal – os pombos são entregues ao cuidado de treinadores da Recorrente e são esses que mediante um programa intensivo os procuram dotar de capacidades superiores para competir. Assim, a partir da sua receção, todos os pombos participantes passam a ser propriedade da Recorrente, competindo à mesma decidir o seu fim. Os pombos são entregues ao cuidado de treinadores residentes no columbódromo, os quais, através de um programa intensivo de treinos de voo, procuram dotar os “atletas” das performances físicas e de orientação em voo, que lhes permita efetuar uma prova desportiva final, nalguns casos, com cerca de 400km. Ora, o prémio que é atribuído ao columbófilo nestas circunstâncias não pode ser considerado um rendimento de desportista;
38.º Ao ter entendido em sentido contrário, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 3.º, n.º 1, alínea a) e b), 12.º, 27.º e 151.º do CIRS, e 1154.º do Código Civil;
39.º Acresce que a sentença recorrida limita-se a afirmar, quanto aos dois tipos de prémios enunciados – os atribuídos no âmbito do FCI – Grand Prix de Portugal e os atribuídos no Campeonato Nacional de Fundo –, que os mesmos são um rendimento obtido em consequência de uma prestação de serviços realizada pelo columbófilo ganhador à Recorrente. Ao contrário do que entende a sentença recorrida, o columbófilo que inscreve o seu pombo-correio no concurso do FCI – Grand Prix de Portugal e que paga por tal inscrição, não presta qualquer serviço à aqui Recorrente. E também não o faz o columbófilo que participa nos Campeonatos Nacionais de Fundo;
40.º Como o próprio proémio do número 1 do artigo 3.º indica, são tributados como rendimentos da categoria B aqueles que provenham de uma atividade empresarial ou profissional. A caracterização de uma atividade como sendo empresarial ou profissional impõe o preenchimento de três pressupostos essenciais: a) a habitualidade; b) a previsibilidade; e c) a orientação da atividade para a obtenção de lucro ou rendimento. Assim, a atividade a desenvolver pelo sujeito passivo tem que ser reiterada, frequente, usual. O seu exercício e o correspondente ganho deve ser passível de ser antecipadamente previsto e o seu exercício deve ser orientado para a obtenção de vantagem económica;
41.º Ora, nenhuma das três características acima descritas resultam dos factos dados como provados pela sentença recorrida, nem da exposição formulada pela Recorrente à Administração Tributária, nem tão pouco resultam dos factos enquadradores elencados pela própria Administração Tributária na resposta ao pedido de informação vinculativa;
42.º Mais, a ausência de orientação para o lucro ou de intenção de desenvolvimento de uma atividade económica constitui, também, fator excludente da sujeição a tributação como rendimento da categoria B como ato isolado;
43.º É que quer o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º do CIRS, quer o disposto na alínea i) do n.º 2 do artigo 3.º do CIRS, exigem que haja a prestação de um serviço. No caso vertente não se vislumbra que serviço possa estar a ser remunerado ao columbófilo. E não se diga, como na sentença recorrida, que para existir uma prestação de serviços basta comparecer ou inscrever-se numa prova. Em primeiro lugar, o prémio designado, em qualquer uma das competições, é eventual, não sendo a sua atribuição certa. Em segundo lugar, o prémio não constitui uma contraprestação ou remuneração pela participação do columbófilo na prova, mas sim um prémio, eventual, pago aos melhores, aos mais bem classificados, não havendo qualquer pagamento ou prémio monetário aos restantes. Em terceiro lugar, o columbófilo participante em provas columbófilas não exerce qualquer atividade económica, não tendo a sua atuação qualquer objetivo de obtenção de lucros ou rendimento;
44.º Para fundamentar a existência de um rendimento sujeito a tributação, a sentença recorrida faz apelo ao disposto no artigo 12.º, n.ºs 3 e 5, que prevê uma delimitação negativa do imposto. Ora, como bem refere a sentença recorrida, “o que não quer dizer, claro está, que no caso de determinada situação não se encontrar prevista na referida norma de delimitação negativa da incidência do IRS, se possa considerar o contrário, ou seja, que o facto está sujeito a imposto, pois de acordo com o princípio da legalidade, na sua vertente de tipicidade tributária (artigo 103.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa), a qualificação de um facto como gerador de imposto depende do seu enquadramento nas normas de incidência do mesmo, pelo que se determinada situação não foi contemplada na lei, a sua tributação encontra-se afastada”;
45.º Mas se bem enunciou o princípio da tipicidade tributária, a sentença recorrida acaba por não lhe dar qualquer acolhimento, já que se limita a afirmar que estando um conjunto de situações abrangidas pela delimitação negativa do artigo 12.º do CIRS, então todas as outras que lá não estão são sujeitas a imposto, o que constitui, precisamente, uma violação do princípio da tipicidade;
46.º Assim, perante a matéria de facto dada como provada e os factos que se pretendem ver alterados e aditados com o presente recurso, sempre deveria o Tribunal a quo ter entendido não estarem os prémios atribuídos no âmbito do FCI – Grand Prix de Portugal e no âmbito do Campeonato Nacional de Fundo sujeitos a tributação em sede de IRS ou em sede de IS. Ao não ter decidido assim, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 103.º, n.º 2, da CRP, 68.º, n.º 20, alínea c), da LGT, 3.º, n.º 1, alínea a) e b), 12.º, 27.º e 151.º do CIRS, 1154.º do Código Civil, artigo 3.º, n.º 2, alínea t), do CIS e verba 11.2.2. da tabela anexa ao CIS.
Normas jurídicas violadas: artigos 103.º, n.º 2, da CRP, 68.º, n.º 20, alínea c), da LGT, 3.º, n.º 1, alínea a) e b), 12.º, 27.º e 151.º do CIRS, 1154.º do Código Civil, artigo 3.º, n.º 2, alínea t), do CIS e verba 11.2.2. da tabela anexa ao CIS, artigos 44.º, 48.º e 163.º do CPA, artigo 66.º, n.º 2, do CPTA, artigos 412.º, 607.º, n.º 4 e 608.º, n.º 2, do CPC.

Termina pedindo:
Termos em que, e nos melhores de direito, deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-a por acórdão que dê provimento à ação proposta pela Recorrente, concluindo-se, conforme pedido na sua petição inicial, assim se fazendo JUSTIÇA!
***
A Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais conclui como se segue:
III CONCLUSÕES
Em face de todo o exposto supra, a Recorrida formula as seguintes conclusões:
1.ª A Recorrente interpôs o presente Recurso contra a sentença proferida a 2021-07-03 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, apontando-lhe omissões de pronúncia e erros de julgamento em matéria de facto e de direito;
2.ª Em primeiro lugar, alega a Recorrente que a sentença sub judice padece de inexatidão e erro de julgamento quanto ao ponto 2 da matéria de facto dada como provada, uma vez que a 2011-11-20 a ora Recorrente apresentou o pedido de informação vinculativa junto da ora Recorrida, quando na realidade tal pedido foi deduzido a 2017-11-16;
3.ª Ainda que tal lapso se verificasse, o mesmo não redundaria no propalado erro de julgamento, mas em mero lapsus calami que não influi (nem influiu), minimamente, na economia da decisão;
4.ª Em segundo lugar, invoca a Recorrente que o tribunal a quo andou mal ao não aditar à matéria de facto dada como provada diversos factos relacionados com a própria Recorrente e as competições, afirmando que tais factos são públicos e notórios;
5.ª Não estamos perante quaisquer factos públicos e notório;
6.ª Facto notório é aquele que é do conhecimento geral no país, pelo cidadãos comum e pelas pessoas regularmente informadas;
7.ª A natureza da Recorrente e as atividades por ela desenvolvidas não são, minimamente, do conhecimento do normal cidadãos português, mas quando muito pelas pessoas envolvidas na columbofilia;
8.ª Ainda que a natureza da Recorrente e as atividades por ela desenvolvidas não sejam secretas, certo é que também não são do conhecimento do grande público e, por conseguinte, do tribunal a quo;
9.ª Não se pode exigir a um tribunal que conheça a natureza e atividades da Recorrente, a não ser que tais factos decorressem do exercício das suas funções (o que a Recorrente não alega e, menos ainda, prova);
10.ª Em terceiro lugar, alega a Recorrente que tribunal a quo errou ao não aditar o facto de a Recorrida já ter emitido uma informação vinculativa sobre situação conexa com a presente;
11.ª A Recorrente revela um desconhecimento sobre a natureza ou o valor das informações vinculativas por parte da Recorrente;
12.ª Como a própria designação indicia, as informações vinculativas são atos informativos, não são atos destinados a produzir efeitos definidores da situação jurídica do sujeito passivo, serão, quando muito, atos preparatórios dos atos tributários;
13.ª O caráter vinculativo das informações vale somente para o caso concreto que lhe deu origem, logo, ainda que se estivesse perante uma aparente similitude de situações entre a informação vinculativa sub judice e a pretensa informação vinculativa omitida na sentença, a circunstância de a Recorrida ter veiculado um dado entendimento numa informação vinculativa jamais permite que raciocínio nela expendida e os efeitos dela decorrentes se estendam ao caso vertente;
14.ª Em face disto, é perfeitamente inócua a eventual omissão por parte do tribunal a quo relativamente a uma informação vinculativa sobre uma situação conexa com a presente, precisamente porque tal informação vinculativa destinou-se ao caso concreto que esteve por detrás da sua emissão;
15.ª De resto, tal informação vinculativa traduzir-se-ia em mero argumento persuasivo, mas sem qualquer carácter decisivo, uma vez que redundaria em mero parecer livremente apreciado pelo tribunal a quo;
16.ª Logo, a eventual omissão propalada pela Recorrente não atingiria a economia da decisão sub judice;
17.ª Em quarto lugar, alega a Recorrente que o tribunal a quo omitiu pronúncia sobre a questão da incompetência relativa suscitada petição inicial;
18.ª Basta atentar ao teor da página 15 da sentença para se constatar que o tribunal a quo apreciou tal questão;
19.ª A Recorrente parece confundir “omissão de pronúncia” com uma (hipotética) “insuficiência de fundamentação”;
20.ª Ainda que se verificasse uma insuficiência de fundamentação na sentença, nem por aí a Recorrente poderia obter sucesso, pois constitui jurisprudência consolidada que só a absoluta falta de fundamentação é suscetível de gerar a nulidade da sentença;
21.ª Ainda que no ato praticado não conste a indicação de o mesmo ter sido praticado no uso de delegação de poderes, tal irregularidade não é apta a produzir o efeito almejado pela Recorrente, porquanto tal omissão não se traduziu em qualquer diminuição das suas garantias;
22.ª Para a Recorrente era (e é) perfeitamente irrelevante o facto de o ato em causa ter sido praticado por quem o efetivamente praticou, uma vez que o meio de reação seria sempre o mesmo;
23.ª Os direitos e interesses da Recorrente não sofreram o mínimo “beliscão”, sendo certo que a defesa contra a decisão sub judice se tornou efetiva por via da Ação Administrativa;
24.ª O apontado vício não assume caráter invalidante e resume-se a mera irregularidade que não afeta a substância do ato sub judice.
25.ª Sempre se afiguraria justificada a aplicação ao caso vertente do princípio de aproveitamento dos atos administrativos;
26.ª Em quinto lugar, alega a Recorrente que o tribunal a quo não se pronunciou quanto ao enquadramento jurídico-tributário em sede de IS;
27.ª Todavia, o tribunal a quo não se pronunciou, nem tinha de se pronunciar, porquanto a questão fundamental prende-se com o enquadramento em sede de IRS, sendo que é em sede deste imposto que incide o dissídio entre Recorrente e Recorrida;
28.ª O eventual enquadramento em sede de IS redunda numa questão teórica;
29.ª Não compete aos tribunais decidir questões puramente teóricas, nem ultrapassar divergências doutrinárias;
30.ª Aos tribunais cabe o papel de dirimir litígios, tendo por base problemas concretos e alcançar a paz jurídica;
31.ª Quando muito, o enquadramento em sede de IS poderia relevar a título de argumento;
32.ª Constitui jurisprudência firmada, aos tribunais impende a obrigação de resolver todas as questões suscitadas pelas partes, mas o mesmo tipo de obrigação não se verifica quanto aos argumentos invocados;
33.ª Em sexto e último lugar, alega a Recorrente que o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter corroborado o enquadramento jurídico-tributário de IRS efetuado pela Recorrida;
34.ª Ainda que o premiado (i.e., o criador do pombo-correio) não exerça uma atividade profissional ou empresarial na data da atribuição do prémio, tal não significa que não possa ter praticado um ato empresarial ou profissional, ou seja, um ato isolado;
35.ª Para efeitos de IRS, um ato isolado é considerado rendimento de categoria “B” quando resulte do exercício de uma atividade, por conta própria, de prestação de serviços;
36.ª O facto de a atividade em causa constituir uma atividade amadora, não possuindo a Recorrente qualquer liga profissional, por não organizar competições desportivas de carácter profissional, não é, por si só, suficiente para o afastamento do seu enquadramento no âmbito de uma prestação de serviços;
37.ª À semelhança da prática de qualquer outra modalidade desportiva não profissional, quando o atleta, ainda que amador, atue por conta própria, o rendimento daí resultante é considerado categoria “B”, rendimentos empresariais e profissionais.
38.ª No sentido da sujeição a IRS dos prémios em causa, importa ainda ter em linha de conta o disposto no artigo 12º do CIRS, onde estão previstas diversas exclusões no âmbito do IRS.;
39.ª A contrario sensu, entende-se que os rendimentos resultantes de prémios que não caiam no âmbito desta delimitação negativa de incidência integram a base de incidência do IRS;
40.ª Por tudo isto, a sentença recorrida, ao julgar improcedente a Ação Administrativa, fez uma correta interpretação e aplicação da lei, motivo pela qual deve ser mantida na ordem jurídica.
Termina pedindo:
Termos em que, por todo o exposto supra e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve ser negado provimento ao Recurso interposto, com todas as legais consequências.
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A Digna Magistrada do M.º Público junto deste Tribunal foi oportunamente notificada nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146.º, n.º 1 do CPTA, nada tendo vindo requerer ou promover.
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Os vistos foram dispensados, com a prévia anuência das Ex.mas Juízas Desembargadoras-Adjuntas.
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O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, tal como decorre do disposto nos arts. 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do Código de Processo Civil (CPC), disposições aplicáveis ex vi art. 1.º do CPTA.
Assim sendo, no caso em apreço, atentos os termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso, há que apurar se a decisão sob recurso padece de nulidade por omissão de pronúncia, ou dos erros de julgamento de facto e de direito que lhe são imputados pela Recorrente.
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II. Fundamentação
II.1. Fundamentação de facto
Do saneador-sentença prolatado pela primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz, tendo o respetivo ponto 2 dos factos provados, e o ponto 1 dos factos não provados, sido alterados de modo a refletir a decisão proferida no presente recurso.
III – FUNDAMENTAÇÃO de facto
Factos provados
Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos:
1. A ora Autora é uma associação de direito privado sem fins lucrativos, fundada em 05.11.1945, com o estatuto de utilidade pública desportiva concedido em 1994, que tem por objecto a organização e desenvolvimento da prática de actividades desportivas, culturais e demais atribuições conferidas pela Lei, no âmbito do exercício da columbofilia;
2. Em 20.11.2017 a ora Autora submeteu junto da Autoridade Tributária e Aduaneira um pedido de informação vinculativa «quanto ao enquadramento tributário dos prémios monetários atribuídos no âmbito das provas e campeonatos por si organizados» datado de 16.11.2017, por lhe suscitarem dúvidas «se serão os mesmos enquadráveis em qualquer das categorias de rendimentos contempladas no CIRS, e, a sê-lo, qual, bem como da necessidade ou não de (…) ser obrigada a proceder à retenção na fonte e, em caso afirmativo, qual a percentagem e os procedimentos a adoptar tendo em consideração que os participantes no caso do FCI Grand Prix de Portugal são cidadãos residentes em Portugal e noutros países»;
Cfr. requerimento junto como documento n.º 1 da p.i., presente a fls. 11-13 dos autos e a fls. 1-6, 64 e 65 do PA em apenso.
3. A prova organizada pela ora A., denominada “FCI Grand Prix de Portugal 2018”, possuía no seu regulamento, entre outras, as seguintes regras:
«Condições Gerais - ... 2018
(…)
2. Qual o período de recepção dos pombos?
Os pombos deverão ser enviados entre 1 de Abril a 15 de Maio de 2018.
3. Qual a idade dos pombos à data de envio?
No momento do envio dos pombos a idade não deverá ser inferior a 30 dias nem superior a 45 dias.
4. Os pombos deverão ser previamente vacinados?
Os pombos deverão ser vacinados contra a doença de Newcastle 10 a 15 dias antes da sua entrega, especificando aquando do envio, a data de vacinação e a vacina utilizada (homologada em Portugal).
(…)
6. Quais os documentos a enviar com os pombos?
Com os pombos devem ser expedidos os Pedigrees + Títulos de propriedade.
7. Diversos
- Todos os pombos serão anilhados com anilhas electrónicas
- A Federação « X » manterá informação permanentemente actualizada em ...
- Todos os pombos participantes são considerados propriedade da Federação « X », competindo à mesma decidir o seu fim.
- As datas dos treinos oficiais, da prova final bem como as respectivas distâncias, poderão ser alteradas de acordo com as condições meteorológicas ou outras circunstâncias supervenientes especiais.
- A organização não assume qualquer responsabilidade em caso de perda de pombos, acidente ou doença que impeça a sua participação nos treinos ou prova final. Não haverá lugar à devolução das taxas de inscrição.
- Em caso de acidente ou morte de algum pombo durante a adução, o mesmo poderá ser substituído, sem custos extras, até ao dia 21 de Maio. Nesta situação os proprietários serão notificados pela organização.
(…)
Condições de Participação
1. Tipo de Participantes
A Prova é aberta à participação de columbófilos portugueses e estrangeiros.

2. Inscrições
- A taxa de inscrição é de € 100 (cem euros) por pombo;
- Os columbófilos poderão agrupar-se escolhendo uma designação para a equipa.
- Cada equipa será constituída por um máximo de 12 pombos.
- No caso de participar com mais do que uma equipa deverá identificá-las (equipa A, equipa B...)
- Por cada equipa de 5 pombos admite-se a participação gratuita de mais 1 pombo extra.
- Por cada equipa de 10 pombos admite-se a participação gratuita de mais 2 pombos extras.
- Uma vez constituídas as equipas não serão permitidas a transferência de pombos entre equipas.
- Todos os pombos inscritos no FCI Grand Prix de Portugal concorrem aos prémios da classificação geral individual, classificação do pombo às e classificação por equipas.
- No acto da inscrição deverão ser comunicados os dados bancários para transferência de eventuais prémios, os contactos telefónicos e correio electrónico para envio de informações relevantes sobre os seus pombos no decurso do campeonato e a sua fotografia, em formato JPG, para que a Federação « X » divulgue no seu site sempre que os respetivos pombos se destaquem nas provas.
- A inscrição para a prova só será considerada após o pagamento.
(…)
3. CLASSIFICAÇÕES E PRÉMIOS (TENDO POR BASE A PARTICIPAÇÃO DE 1.500 POMBOS)
Todos os pombos inscritos no FCI Grand Prix de Portugal acedem às seguintes classificações: Geral individual, Hotspots, Meia-final, Pombo Às e Equipas.
As tabelas de prémios aplicam-se para uma participação máxima de 1.500 pombos. Caso o número de pombos seja superiores ou inferiores a 1.500 pombos, os prémios serão recalculados proporcionalmente ao número de pombos inscritos.
3.1 Classificação Geral Individual
- Será efectuada uma classificação individual para 3 HOTSPOTS, SEMI-FINAL e outra para a prova FINAL;
- Consideram-se “HOTSPOTS” os três treinos oficiais (> a 100km) que antecedem a SEMI-FINAL;
- Considera-se a SEMI-FINAL o treino mais longo que antecede a prova FINAL.
3.1.1 Classificação - HotSpots
Em cada Hotspot será atribuído um prémio monetário aos três primeiros classificados.
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
3.1.2 Classificação - Semi-Final
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
3.2 Classificação Pombo Ás
A classificação será estabelecida através do somatório das médias obtidas nos treinos oficiais (superiores a 100 km) + prova final;
- Serão excluídos da classificação do pombo Ás todos os pombos que não classificarem na prova final;
- Em caso de empate prevalece o pombo que obteve a melhor classificação na prova final;
- Na prova final, o período de constatação termina com 25% dos pombos chegados ou às 20h00 do dia seguinte à solta.
- Serão divulgadas, treino a treino, as classificações provisórias relativas ao Pombo Ás.
3.3.1 Prémios Classificações do Pombo Ás
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
3.3 Classificação por Equipas
Participam nesta classificação todas as equipas inscritas no FCI Grand Prix Portugal;
A equipa vencedora é aquela que obtiver a soma mais elevada no conjunto das médias obtidas pelos 2 primeiros pombos da equipa em todos os treinos oficiais realizados (superiores a 100 km) e na prova final; (…)
3.3.1 Prémios Classificação por Equipas
Será atribuído um troféu e um diploma às 5 primeiras equipas.
3.4 Prémios de participação – Leilão
A Federação « X » efetuará um leilão com todos os pombos chegados na prova final.
Será atribuído ao columbófilo titular dos pombos um prémio de participação equivalente a 50% do valor gerado pelo seu pombo (menos as despesas inerentes ao leilão), desde que atinja o valor mínimo de 150,00 euros no leilão (…)»;
Cfr. “Regulamento Grand Prix de Portugal 2018”, junto à p.i., presente a fls. 33-verso e ss. dos autos.
4. A prova organizada pela ora A., denominada “Provas Nacionais de Fundo 2018”, possuía no seu regulamento, entre outras, as seguintes regras:
«Art.º 2º Organização
1. As Provas são organizadas pela Federação « X » com a colaboração das Associações Distritais e Colectividades.
(…)
Art.º 3º Participação
1. As provas são abertas à participação de todos os Columbófilos federados na Federação « X ».
2. Os participantes poderão enviar até ao máximo de 15 pombos para o campeonato do columbófilo e 130 para o campeonato do pombo às.
Art.º 4º Inscrições
1. As inscrições serão feitas nos clubes e enviadas às Associações no período por estas indicado antes de cada uma das provas de fundo nacionais.
2. A Federação « X » não cobra qualquer taxa para participação nos Concursos Nacionais.
(…)
Art.º 9º Tipo de Classificações
A Federação « X » elaborará as seguintes classificações tendo em consideração o somatório dos resultados obtidos nas duas provas:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)
Art.º 13º Prémios
1. Considerando-se o cômputo das 2 provas serão atribuídos prémios aos melhores columbófilos e melhores pombos de acordo com o estipulado no quadro seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
5. Em 05.07.2018 foi proferido despacho pela Subdiretora-Geral da Área do Rendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira, «por delegação do Diretor Geral», sancionando a informação vinculativa n.º ..875 que possui o seguinte teor:
«Informação
Vem a requerente, apresentar um pedido de informação vinculativa sobre o enquadramento tributário dos prémios atribuídos no âmbito de competições desportivas columbófilas.
1 - Esta explica que a Federação « X » participa e organiza campeonatos da Europa, do Mundo e Olimpíadas da modalidade, bem como promove e organiza provas desportivas de carácter internacional e nacional. A nível interno, desenvolve, ainda, campeonatos locais, regionais e inter-regionais.
2 - A Federação organiza com periodicidade anual uma prova desportiva, designada FCI - Grand Prix de Portugal. Esta prova desportiva destina-se à participação individual para columbófilos nacionais e internacionais inscritos em Federações desportivas que integrem a Federação Columbófila Internacional (FCI), contando os resultados obtidos para o Ranking Mundial da modalidade estabelecido por aquela entidade.
3 - Este evento insere-se no âmbito da prática de uma modalidade desportiva, a columbofilia, que se caracteriza, entre outros aspetos, através da criação e seleção de pombos-correio para competição desportiva.
4 - Esta competição realiza-se com um enquadramento regulamentar específico para a prova, onde estão previstas todas as incidências do evento.
5 - O regulamento prevê um conjunto de classificações decorrentes da confrontação desportiva dos respetivos pombos-correio previamente inscritos.
6 - Para cada uma dessas classificações e participação estão previstos prémios monetários nas condições e conforme o disposto no regulamento do FCI Grand Prix de Portugal.
7 - A Federação « X » organiza com periodicidade anual provas de carácter nacional na especialidade de grande fundo (+ de 700 km).
8 - Nestas provas participam o universo dos columbófilos portugueses filiados na Federação « X ».
9 - O seu regulamento prevê um conjunto de classificações decorrentes da confrontação desportiva dos respetivos pombos-correio previamente inscritos.
10 - Para algumas dessas classificações estão previstos prémios monetários nas condições e conforme o disposto no artigo 13º do regulamento das provas nacionais de fundo.
11 - Nesta medida e tendo em consideração, por um lado, o estipulado no Código do Imposto de Selo (CIS), especialmente, o artigo referente à verba 11.2.2 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS) e, por outro, as especificidades supra descritas das provas desportivas columbófilas colocam-se dúvidas sobra a eventual sujeição a imposto do selo dos prémios atribuídos no âmbito dos eventos supra referenciados.
12 - Importa assim esclarecer se os eventos - FCI Grand Prix de Portugal e Campeonato Nacional de Fundo - poderão subsumir-se no conceito de “Jogo” ou modalidade afim, para efeitos de enquadramento na referida verba.
13 - De igual modo e tendo em conta a especificidade, do enquadramento jurídico da Federação « X » e do contexto em que se atribuem os prémios monetários nas provas desportivas de columbofilia existem dúvidas se serão os mesmos enquadráveis em qualquer das categorias de rendimentos contempladas no CIRS, e, a sê-lo, em qual, bem como da necessidade ou não de a Federação « X » ser obrigada a proceder à retenção na fonte e, em caso afirmativo, qual a percentagem e os procedimentos a adotar tendo em consideração que os participantes no caso do FCI Grand Prix de Portugal são cidadãos residentes em Portugal e noutros países.
14 - Assim, vem a Federação « X » requerer que seja esclarecido o enquadramento tributário dos prémios atribuídos nas competições acima descritas.
Enquadramento:
1. Em sede de IRS, o antigo artigo 12º do Código do IRS, que previa a tributação dos prémios de quaisquer lotarias, rifas e apostas mútuas, totoloto, jogos de loto e bingo, bem como as importâncias ou prémios atribuídos em quaisquer sorteiros ou concursos, efetivamente pagos ou postos à disposição foi alterado pela entrada em vigor da Lei do Orçamento de Estado para 2010, passando a tributação dos prémios de jogo a ser efetuada em sede de Imposto de Selo.
2. Cabe assim determinar se os rendimentos descritos pela requerente se enquadram no conceito de prémios de jogo ou não.
3. O regime legal em vigor, definido pelo Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, com as sucessivas alterações legislativas, de entre as quais se realça o Decreto-Lei n.º 10/95, de 19/01, que procedeu à reformulação da Lei do Jogo define, no seu artigo 1.º, os jogos de fortuna ou azar como aqueles «(…) cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte.».
4. No que respeita às modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar, o art.º 159.º, nº 1, da Lei do Jogo define-as como as “operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente na sorte, e que atribuem como prémios coisas com valor económico.”, considerando-se como tal, nomeadamente, rifas, tômbolas, sorteios, concursos publicitários, concursos de conhecimentos e passatempos.
5. Advém das normas supra referidas que o elemento determinante para a qualificação de determinada operação como sendo afins dos jogos de fortuna ou azar reside, fundamentalmente, no fator sorte.
6. Sucede que, não obstante a utilização, nos Regulamentos apresentados, dos termos “concurso” e “prémio”, os eventos promovidos pela requerente inserem-se no âmbito da prática de uma modalidade desportiva relacionada com a criação e seleção de pombos-correio para competição, a Columbofilia. Com efeito, estes eventos são competições columbófilas em que os prémios são atribuídos em função da classificação dos participantes, na sequência da confrontação desportiva dos respetivos pombos-correio inscritos. Nessa conformidade, a classificação final e consequente obtenção dos prémios pelos participantes resultará dos treinos realizados, da capacidade física e de orientação dos pombos-correios inscritos e não de qualquer fator sorte.
7. Ora, não estando a obtenção dos prémios condicionada pelo fator sorte, relacionando-se antes com o desempenho de cada pombo-correio na competição, não pode a operação em causa qualificar-se como modalidade afim dos jogos de fortuna ou azar, não se podendo enquadrar na categoria de prémios de jogo.
8. Assim, e ainda que os rendimentos recebidos sejam designados de “prémios” e que estes sejam obtidos no decurso de uma prova denominada de “concurso”, com esta iniciativa pretende-se premiar o mérito desportivo dos candidatos/atletas, não se vislumbrando que o fator “sorte” possa influir no resultado final.
9. Não é, pois, possível encontrar similaridades entre a atividade de criação e treino de pombos-correio para prestação de provas em concurso columbófilo com, por exemplo, a atividade de um comprador de rifas ou a de um participante num concurso patrocinado por uma empresa comercial no qual alguns dos seus clientes são escolhidos aleatoriamente para receberem um prémio monetário ou um prémio em espécie.
10. No primeiro a obtenção do prémio depende da perícia, do treino, da aptidão, das qualidades do criador e do pombo, no segundo depende de um jogo de sorte e azar, depende exclusivamente de situações aleatórias que não são controláveis.
11. Assim, e no caso em apreço, o que está em causa é a prestação desportiva dos pombos-correio, em competições ou concursos columbófilos e a qualificação do prémio que os seus criadores possam auferir, o qual se enquadra na categoria B do IRS, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 3º do Código do IRS.
12. O enquadramento dos prémios atribuídos aos vencedores de provas desportivas pode considerar-se como rendimentos de prestações de serviços, inseridos na categoria B do IRS, sendo que se o sujeito passivo estiver incluído no regime da contabilidade organizada pode deduzir os valores gastos na inscrição da prova.
13. Caso o sujeito passivo não se encontre inscrito para o exercício de uma atividade profissional/empresarial será qualificado como a prática de um ato isolado.
Conclusão:
14 - Pelo que os prémios pagos aos criadores de pombos-correio nas provas/concursos columbófilos, constituem rendimentos da categoria B do IRS, nos termos da alínea b), do n.º 1 do art.º 3 do Código do IRS.
15 - Por conseguinte, a Federação « X » está obrigada a reter imposto sobre os prémios que seja devedora à taxa em vigor à data do pagamento ou colocação à disposição do rendimento, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 101º do Código do IRS.
16 - Todavia, tratando-se de rendimentos da categoria B pagos a não residentes, pode não existir a obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRS quando, por força de convenção destinada a evitar a dupla tributação celebrada por Portugal, a competência para a tributação dos rendimentos não seja atribuída a Portugal ou o seja de forma limitada. Nesta situação é necessário que o beneficiário dos rendimentos faça prova da sua verificação, conforme definido no artigo 101º-C do Código do IRS.»;
Cfr. informação vinculativa n.º ..875 junta como documento n.º 2 da p.i., presente a fls. 43 verso e ss. dos autos e a fls. 65-66 do PA em apenso.
6. A informação vinculativa aludida no ponto anterior e o seu respectivo sancionamento foram levados ao conhecimento da ora A. por ofício da Direcção de Serviços de IRS, datado de 06.07.2018, e do qual constava expressamente que, nos termos do disposto no artigo 68.º, n.º 20 da LGT, «o enquadramento jurídico-tributário dos factos constantes da resposta ao pedido de informação vinculativa é passível de recurso contencioso autónomo, no prazo de três meses»;
Cfr. ofício n.º ...73 junto como documento n.º 2 da p.i., presente a fls. 43 dos autos e a fls. 64-verso do PA em apenso.
7. Em 10.10.2018 deu entrada no presente Tribunal, via SITAF, a p.i. que deu origem aos presentes autos.
Cfr. registo de entrada/comprovativo de entrega a fls. 3-4 dos autos.
*
Não existem outros factos alegados a dar como provados ou não provados e a considerar com interesse para a decisão.
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos presentes nos autos, não impugnados, e constantes do processo administrativo em apenso, tudo conforme o que se deixou plasmado a propósito de cada um dos pontos do probatório.
Factos não provados
Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dá-se como não prvado, com interesse para a decisão, o seguinte facto:
1. A Diretora-Geral da AT já havia sancionado, antes da informação vinculativa n.º ..875, entendimento acerca de outras situações em que estavam em causa prémios atribuídos no âmbito de concursos/competições desportivas.
*
II.2. Fundamentação de Direito
Alega a Recorrente que a decisão sob recurso padece de várias nulidades por omissão de pronúncia, e ainda de erros de julgamento de facto e de direito.
Atendendo à sua precedência lógica, começarão por se apreciar as invocadas nulidades por omissão de pronúncia.
Assim, argumenta a Recorrente que a sentença padece de nulidade, por não se ter pronunciado sobre o vício de incompetência relativa e sobre o pedido de “decretamento da anulação do ato” (cf. conclusões 14 e 15 das alegações de recurso), e por não se ter pronunciado quanto ao enquadramento jurídico-tributário em sede de Imposto do Selo dos factos relativamente aos quais requereu a informação vinculativa em causa nos autos (cf. conclusões 22 e 23 das alegações de recurso).
Desde já se adianta que não tem razão.
A nulidade que invoca encontra-se prevista na alínea b) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA, ali se prevendo que é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Ora, e ao contrário do alegado pela aqui Recorrente, é manifesto que na decisão sob recurso se explicita o motivo pelo qual não é conhecida a causa de pedir sustentada no vício de incompetência relativa, e, consequentemente, o motivo pelo qual não foi conhecido o pedido de decretamento de anulação do ato, o que de resto foi percecionado pela Recorrente, pois tal como referente, “[o] Tribunal a quo não se pronunciou sobre tal pedido formulado pela Recorrente, argumentando não ter tal vício e consequente pedido, face à natureza e conteúdo do ato impugnado em causa, (...) qualquer relevo perante a pretensão material da ora Autora (cf. artigo n.º 66.º, n.º 2 do CPTA)(cf. conclusão 14.ª das alegações de recurso).
Com efeito, a este propósito resulta da fundamentação da decisão recorrida o seguinte:
(…)
Sendo certo que a ora A. aponta ainda ao despacho que sancionou a visada informação vinculativa um vício de incompetência relativa, pugnando pela sua anulação por essa mesma razão, sempre se diga que, sendo tal vício reconhecido e o despacho anulado, isso apenas levaria a que a AT não ficasse vinculada ao entendimento por si expresso, podendo, ainda assim, replicá-lo em posteriores actos de liquidação, pelo que tal vício e consequente pedido, face à natureza e conteúdo do acto impugnado em causa, não têm qualquer relevo perante a pretensão material da ora Autora (cfr. artigo n.º 66.º, n.º 2 do CPTA).
(…)
Tanto basta para que se conclua que não se verifica a invocada nulidade por omissão de pronúncia.
O mesmo se conclui relativamente à invocada falta de apreciação do enquadramento jurídico-tributário em sede de Imposto do Selo dos factos relativamente aos quais a Recorrente requereu a informação vinculativa em causa nos autos.
Sobre esta questão, resulta o seguinte da decisão sob recurso:
(…)
Assim, desde logo se constata que a ora A. não coloca em causa o enquadramento jurídico-tributário plasmado na visada informação vinculativa na parte em que se considerou que os prémios em causa não estavam sujeitos a tributação em sede do Imposto de Selo (cf. facto provado sob o ponto 5.) e, como tal, o Tribunal apenas se pode pronunciar quanto à tributação dos mesmos em sede de IRS, na precisa medida que é esse enquadramento jurídico-tributário que não é aceite pela ora Autora.
(…)
Este trecho da decisão deve ser interpretado em consonância com a alegação da Recorrente na respetiva PI, da qual expressamente resulta o seguinte (destacado nosso):
(…)
32.º
A Autoridade Tributária, na sua resposta, veio manifestar não se encontrarem tais prémios abrangidos pelo estipulado no Código do Imposto de Selo (CIS), especialmente, o artigo referente à verba 11.2.2 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), a qual sujeita a imposto do selo «Os prémios do bingo, de rifas e do jogo do loto, bem como de quaisquer sorteios ou concursos, com excepção dos prémios dos jogos sociais previstos na verba 11.3 da presente Tabela» - e bem!
(…)
35.º
Pelo que, como bem decidiu a Administração Tributária (parte que não se pretende atacar ou alterar com a presente acção), o pagamento dos prémios monetários das provas identificadas não é qualificada como modalidade afim dos jogos de fortuna ou azar, razão pela qual não é passível de tributação em sede do CIS (como bem já tinha interpretado a Autoridade Tributária e Aduaneira no Processo 2016001305 – IVE n.º 10934, com despacho concordante de 27.09.2016 da Diretora de Serviços da DSIMT, por subdelegação da Subdiretora-Geral da Área de Gestão Tributária – Património).
(…)
Quis assim o Tribunal a quo deixar claro que apenas apreciaria a causa de pedir sustentada na ilegalidade do enquadramento jurídico em sede de IRS dos factos invocados perante a Administração Tributária e para efeito da respetiva qualificação relativamente àquele tributo, uma vez que, como referira a Recorrente na sua PI - e como, de resto, não poderia deixar de ser, uma vez que na informação vinculativa em causa se conclui que os prémios em questão não se encontravam sujeitos a imposto de selo -, a mesma não pretendia questionar a respetiva qualificação em sede de Imposto de Selo.
Por outro lado, sempre se dirá, e não obstante o enquadramento que a Recorrente faz da nulidade esteja incorreto, na medida em que o Tribunal a quo não estava de modo algum obrigado a apreciar a argumentação jurídica na qual a Recorrente sustentou a causa de pedir fundada no erro de direito nos pressupostos da informação vinculativa por errada interpretação do regime aplicável em sede IRS, estando apenas obrigado a apreciar as questões – entenda-se, as causas de pedir – suscitadas e não os argumentos invocados para as suportar, ainda assim também na errada formulação que efetua não tem razão, na medida em que o Tribunal não deixou de discorrer sobre esta matéria na sustentação jurídica em que suportou a decisão, quando ali se refere o seguinte:
(…)
Sucede que com a Lei do Orçamento do Estado para o ano de 2010 (Lei n.º 3-B/2010, de 28.04), a tributação dos prémios provenientes de jogos, concursos ou sorteios passou a ter lugar em sede de Imposto de Selo, pela aplicação da actual verba 11.2 da Tabela Geral de Imposto de Selo, sendo revogado o n.º 2 do artigo 9.º do CIRS. Pelo que, actualmente, face ao teor das alíneas do n.º 1 do artigo 9.º do CIRS, não mais os prémios atribuídos em concursos poderão ser ali enquadrados como rendimentos da Categoria G.
(…)
A este propósito, não pode igualmente deixar de se recordar e sublinhar que esta matéria tem sido apreciada e explicitada pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores ad nauseum, neste mesmo sentido, de que apenas se verifica a nulidade por omissão de pronúncia quando o tribunal de primeiro conhecimento da causa deixe de se pronunciar, em absoluto, sobre as questões suscitadas pela parte, devendo entender-se como tal as causas de pedir invocadas, naturalmente, quando o seu conhecimento não for considerado prejudicado, e não os argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocadas pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas “questões” (cf., designadamente, os Acórdãos do STA proferidos em 2014-05-28, no proc. 0514/14, e em 2012-09-19, no proc 0862/12, ambos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt).
Donde não resta senão concluir que as nulidades por omissão de pronúncia assacadas pela Recorrente à decisão recorrida não se verificam, devendo o recurso ser julgado improcedente neste extrato.
Prosseguindo, e mantendo o critério da apreciação das questões suscitadas no recurso de acordo com a respetiva precedência lógica, há que apreciar os erros de julgamento de facto invocados.
Assim, alega a Recorrente que o ponto 2 da fundamentação de facto da decisão sob recurso contém um lapso, pois ali se refere que a aqui Recorrente submeteu o pedido de informação vinculativa em 20 de novembro de 2011, quando o que resulta do documento n.º 1 junto com a PI, constante a fls. 11-13 dos autos, e do documento junto a fls. 1- 6 do Processo Administrativo Tributário (PAT) apenso é que o pedido foi apresentado em 16 de novembro de 2017 (cf. conclusão 3.ª, das alegações de recurso).
Ora, dos documentos identificados pela Recorrente resulta que o pedido de informação vinculativa em causa se encontra datado de 16 de novembro de 2017, mais resultando da cópia do ofício n.º ...73 de 2018-07-06 da Direção de Serviços de IRS através do qual lhe foi comunicada a emissão da informação vinculativa (cf. fls. 64 do PAT) e da impressão do “detalhe do pedido” extratado da base de dados do “Sistema de Informação e Gestão de Informação Vinculativa” que o mesmo foi submetido à Autoridade Tributária e Aduaneira em 20 de novembro do mesmo ano (cf. fls. 65 do PAT).
Crê-se, por isso, que a menção no ponto 2 da fundamentação de facto da decisão recorrida à submissão do pedido de informação vinculativa perante a Autoridade Tributária e Aduaneira em “20.11.2011” terá resultado de um lapso de escrita.
Não deixa, por isso, de ter razão a aqui Recorrente quando alega que aquele ponto 2 contém uma imprecisão, pelo que o recurso é julgado procedente quanto a esta questão concreta, passando a constar daquele ponto 2, entretanto já supra corrigido, que “Em 20.11.2017 a ora Autora submeteu junto da Autoridade Tributária e Aduaneira um pedido de informação vinculativa «quanto ao enquadramento tributário dos prémios monetários atribuídos no âmbito das provas e campeonatos por si organizados» datado de 16.11.2017, por lhe suscitarem dúvidas «se serão os mesmos enquadráveis em qualquer das categorias de rendimentos contempladas no CIRS, e, a sê-lo, qual, bem como da necessidade ou não de (…) ser obrigada a proceder à retenção na fonte e, em caso afirmativo, qual a percentagem e os procedimentos a adoptar tendo em consideração que os participantes no caso do FCI Grand Prix de Portugal são cidadãos residentes em Portugal e noutros países»(cf. ponto 2 da fundamentação de facto, supra).
Alega ainda a Recorrente que deveriam ser aditadas à matéria de facto as asserções que elenca na conclusão 4.ª das suas alegações de recurso, explicitando nas conclusões 5.ª, 6.ª e 8.ª os meios de prova de onde entende que devem ser extraídas, e ainda que se deveria discriminar como não provado que “a Diretora-Geral da AT já havia sancionado, antes da informação vinculativa n.º ..875, entendimento acerca de outras situações em que estavam em causa prémios atribuídos no âmbito de concursos/competições desportivas” (cf. conclusão 11.ª das alegações de recurso).
Ora, no que diz respeito ao facto que pretende que seja aditado com o n.º 8 (“Da informação vinculativa n.º ..875 não consta qualquer referência ou menção a qualquer ato de delegação de poderes ao Subdiretor-Geral, nem ao despacho de delegações de poderes que o corporizaria”, cf. conclusão 4.ª das alegações de recurso), não havia que aditar à fundamentação de facto que da informação vinculativa não consta qualquer menção à delegação de poderes, atendendo a que o que resulta da PI é que a Recorrente pretende que o ato seja anulado por padecer do vício de incompetência relativa, e não por nele não se identificar o ato de delegação, tanto mais que ali identifica e analisa o Despacho de delegação de competências (cf. arts. 12.º, 13.º da PI), que assim revela conhecer, pelo que tal aditamento sempre se revelaria despiciendo para a questão a decidir.
Já quanto ao facto que pretende que seja discriminado como não provado (que “a Diretora-Geral da AT já havia sancionado, antes da informação vinculativa n.º ..875, entendimento acerca de outras situações em que estavam em causa prémios atribuídos no âmbito de concursos/competições desportivas”, cf. conclusão 11.ª das alegações de recurso), há que dar razão à Recorrente.
Com efeito, e como melhor veremos adiante, a sentença erra ao desvalorizar o vício de incompetência relativa assacado ao ato, que ali deveria ter sido apreciado, sendo relevante para tal apreciação o preenchimento do requisito imposto nos termos do ponto II, n.º 11, alínea b) do Despacho da Diretora-Geral da ATA n.º 801/2018, de 7 de dezembro de 2017, publicado no DR, II série, n.º 14, de 19 de janeiro de 2018, pp. 2330-2336, a saber, se o órgão competente, no caso, a Diretora Geral da ATA, teria já anteriormente sancionado o esclarecimento das normas legais objeto da informação vinculativa.
Ora, o que se constata é que a Ré, a quem incumbia o ónus da prova deste facto, não produziu prova neste sentido, pois embora alegue de modo vago na sua contestação que “… a Directora-Geral da AT sancionou entendimento acerca de outras situações em que estavam em causa prémios atribuídos no âmbito de concursos/competições desportivas …” em momento algum identifica em concreto a que “outras situações” se refere.
Assim sendo, procede o recurso neste segmento, devendo discriminar-se como não provado que “a Diretora-Geral da AT já havia sancionado, antes da informação vinculativa n.º ..875, entendimento acerca de outras situações em que estavam em causa prémios atribuídos no âmbito de concursos/competições desportivas”, encontrando-se este aditamento já refletido na fundamentação de facto pertinente supra elencada.
Quanto às asserções que pretende que sejam aditadas à fundamentação de facto com os n.ºs 9 (“A columbofilia é um desporto amador, no qual, em Portugal, não se disputam competições desportivas de natureza profissional”), 10 (“O FCI – Grand Prix de Portugal é uma competição não profissional”) e 11 (“O Campeonato Nacional de Fundo é uma competição não profissional”), as mesmas não correspondem a factos, mas sim a ilações, como, aliás, resulta do que refere na conclusão 6.ª, quando ali reconhece que tais afirmações resultam da conjugação da sua natureza jurídica de associação de direito privado sem fins lucrativos, com o facto de beneficiar do estatuto de utilidade pública desportiva, atento o enquadramento jurídico decorrente da atribuição deste mesmo estatuto de utilidade pública desportiva, assim como da interpretação dos seus estatutos conjugada com o disposto no art. 26.º, n.º 2, do Regime Jurídico das Federações Desportivas.
Trata-se assim não de factos públicos e notórios, como pretende, mas antes de ilações, ou conclusões, a que se chega pela interpretação conjugada da sua natureza jurídica e estatuto à luz dos regimes jurídicos a que alude.
Por outro lado, e ao contrário do que alega, a omissão destas asserções do probatório – de onde não podiam constar por não estarem em causa factos concretos, mas sim ilações, como acaba de se explicitar - não teve qualquer influência na decisão proferida pelo Tribunal a quo, atendendo a que não deixou de considerar estas circunstâncias no raciocínio que despendeu – e revelou na fundamentação da decisão - para concluir pela bondade da qualificação dos factos em sede de IRS efetuada pela Administração Tributária.
Motivo pelo qual também neste excerto deve ser julgado improcedente o recurso, por não se verificar o erro de julgamento de facto que invoca.
Por fim, e no que diz respeito aos factos que pretende que sejam aditados com os n.ºs 12 (“Na competição FCI – Grand Prix de Portugal, os pombos são entregues ao cuidado dos treinadores residentes no columbódromo, os quais, através de um programa intensivo de treinos em voo, procuram dotar os pombos-correio das performances físicas e de orientação em voo, que lhes permita efetuar uma prova desportiva final com cerca de 400 km”) e 13 (“Quanto ao segundo tipo de competição – o Campeonato Nacional de Fundo – os pombos-correio participantes são treinados e selecionados pelos columbófilos, tendo em conta o apuramento genético, através de múltiplos cruzamentos, e, um treino específico que permita aos “atletas” pombos correio, superar a dificuldade e as exigências colocados por uma prova de longa distância”) correspondem também a conclusões que se retiram da leitura e interpretação dos regulamentos dos dois concursos em causa, cujo teor, nos segmentos pertinentes, consta já do probatório, respetivamente dos seus ponto 3, no que se refere à prova “FCI Grand Prix de Portugal 2018” e ponto 4, relativamente às “Provas Nacionais de Fundo 2018”, sendo certo que também aqui o Tribunal a quo não deixou de considerar a natureza das provas e de refletir a mesma na fundamentação da decisão sobre recurso.
Pelo que também neste excerto deve ser julgado improcedente o recurso, uma vez que não se verifica o invocado erro de julgamento de facto.
Prosseguindo, alega a Recorrente que a decisão sob recurso padece de erros de julgamento de direito, violando o disposto no art. 66.º, n.º 2 do CPTA, ao não se pronunciar sobre o vício de incompetência relativa, não decretando a anulação da informação vinculativa, o disposto nos arts. 68.º da LGT, 66.º, n.º 2 do CPTA, 608.º, n.º 2 do CPC, 44.º, 48.º e 163.º do CPA ao não decidir pela verificação do vício de incompetência relativa e ao não anular o ato que sancionou a informação vinculativa impugnada.
Vejamos então.
De facto, o que resulta textualmente do disposto no n.º 2 do art. 66.º do CPTA, é que “Ainda que a prática do ato devido tenha sido expressamente recusada, o objeto do processo é a pretensão do interessado e não o ato de indeferimento, cuja eliminação da ordem jurídica resulta diretamente da pronúncia condenatória”.
Assim, sendo formulado um pedido de condenação à prática de ato devido, como é o caso, o objeto da ação, como resulta do disposto na supracitada norma, é a pretensão material do interessado, e não a putativa invalidade do ato, não podendo o Tribunal limitar-se a devolver a questão ao órgão administrativo competente, tal como se dispõe no n.º 1 do art. 71.º do CPTA, norma da qual expressamente resulta que “Ainda que o requerimento apresentado não tenha obtido resposta ou a sua apreciação tenha sido recusada, o tribunal não se limita a devolver a questão ao órgão administrativo competente, anulando ou declarando nulo o eventual ato de indeferimento, mas pronuncia-se sobre a pretensão material do interessado, impondo a prática do ato devido”.
Sucede, no entanto, que o que se retira da alegação da Recorrente, é que a mesma pretende que o ato seja praticado não só com determinado conteúdo, como também pelo órgão competente.
Ora, e atendendo a que como já aqui se referiu, não resultou provado nos autos que se tenham preenchido os requisitos constantes no ponto II, 1, 1.1., b) para a delegação de competências na Subdiretora Geral «AA», há que concluir que o ato não foi praticado pelo órgão competente.
Com efeito, expressamente resulta daquele ponto II, 1, 1.1., b) do Despacho n.º 801/2018 de delegação de competências o seguinte (destacado nosso):
(…)
II — Nos termos do disposto no artigo 9.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, republicada pela Lei n.º 64/2011, de 22 de dezembro, com a última alteração introduzida pela Lei n.º 128/2015, de 3 de setembro, conjugado com o artigo 44.º do Código do Procedimento Administrativo, delego, ainda:
1 — Nos Subdiretores -Gerais (…) «AA», relativamente à atribuição das unidades orgânicas e equipas multidisciplinares cujas competências lhe são delegadas no presente despacho,
1.1 — As competências para:
(…)
b) Apreciar e decidir os pedidos de informação vinculativa formulados ao abrigo do artigo 68.º da Lei Geral Tributária, sempre que esteja em causa o esclarecimento de normas legais já objeto de sancionamento superior;
(…)
Efetivamente, existindo no supramencionado Despacho n.º 801/2018 de delegação de competências previsão específica no ponto II, 1, 1.1., b) quanto à subdelegação de competências para apreciar e decidir os pedidos de informação vinculativa formulados ao abrigo do artigo 68.º da Lei Geral Tributária, como é aqui o caso, não era de aplicar ao caso, como pretende a Ré na sua contestação, o ponto 12.1 do referido despacho, do qual resulta o seguinte:
(…)
12 — Na Subdiretora -Geral, «AA»
12.1 — As competências a nível central, regional e local, no que se refere às áreas da gestão do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, dos benefícios fiscais e das relações internacionais, designadamente para apreciar e reconhecer os pedidos formulados ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 32.º da Lei n.º 16/2001, de 22 de junho.
(…)
Havia, assim, que aplicar ao caso a previsão especifica referente à delegação de competências para apreciar e decidir os pedidos de informação vinculativa constante no ponto II, 1, 1.1., b) do Despacho 801/2018, e não a previsão constante no ponto 12.1, aqui se esclarecendo, para melhor compreensão deste último, que o n.º 4 do art. 32.º da Lei n.º 16/2001 de 22 de junho (Lei da Liberdade Religiosa) diz respeito à possibilidade de uma quota equivalente a 0,5% do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, liquidado com base nas declarações anuais, poder ser destinada pelo contribuinte, para fins religiosos ou de beneficência, a uma igreja ou comunidade religiosa radicada no País.
Ora, e como expressamente resulta do teor da delegação de competências para apreciar e decidir os pedidos de informação vinculativa formulados ao abrigo do art. 68.º da Lei Geral Tributária, era necessário que em causa estivesse “o esclarecimento de normas legais já objeto de sancionamento superior(destacado nosso), o que não resulta provado nos autos.
Por outro lado, e ao contrário do que é referido na sentença recorrida, não é certo que o ato, a ter sido praticado pelo órgão competente, tivesse o mesmo conteúdo, sendo ainda certo que, tal como expressamente resulta do disposto no supracitado no n.º 1 do art. 71.º do CPTA, o que está vedado ao Tribunal é que a questão seja devolvida ao órgão administrativo competente, consequência que sempre estaria afastada através da procedência da presente ação com fundamento no apontado vício de incompetência relativa, pois o que assim se conclui é que a questão que a Recorrente pretende ver apreciada nunca o foi pelo órgão competente.
Por fim, o reconhecimento de tal invalidade não contende com a circunstância de nos autos ter sido formulado um pedido de condenação à prática de um ato, derivando, necessariamente, na respetiva anulação, colocando assim em causa a intenção do legislador de nesta matéria “afastar a lógica revisora, própria dos processos de cassação”, pretendendo que no caso “…como o processo não é um processo meramente impugnatório, mas um processo de plena jurisdição, ele tem necessariamente de terminar, sempre que seja julgado procedente, com uma sentença de condenação à prática de um ato administrativo” (cf. ALMEIDA, Mário Aroso de; CADILHA, Carlos Alberto Fernandes – Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos. 5.ª edição. Coimbra: Almedina, 2021, p. 514).
Com efeito, para cumprir o regime processual aplicável e assim, o desiderato do legislador, o que há que concluir é pela procedência da ação determinando-se, em consequência, a condenação da Ré a que o ato seja praticado pelo órgão competente, ficando assim prejudicado o conhecimento do mais alegado pela Recorrente no presente recurso [cf. n.º 2 do art. 608.º ex vi n.º 2 do art. 663.º, ambos do CPC, aplicáveis ex vi art. 1.º do CPTA].
Assim sendo, e em face do exposto, deverá o presente recurso ser julgado procedente.
***
Atento o decaimento da Recorrida em ambas as instâncias, é sua a responsabilidade pelas custas pelo presente recurso e em 1.ª instância, nos termos do disposto no art. 527.º, n.º 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA.
***
Conclusão:
Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva:
I. Apenas se verifica a nulidade por omissão de pronúncia quando o tribunal de primeiro conhecimento da causa deixe de se pronunciar, em absoluto, sobre as questões suscitadas pela parte, devendo entender-se como tal as causas de pedir invocadas, naturalmente, quando o seu conhecimento não for considerado prejudicado, e não os argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocadas pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas “questões”
II. Tendo sido formulado um pedido de condenação à prática de ato devido, como é o caso, o objeto da ação é a pretensão material do interessado, e não a putativa invalidade do ato, não podendo o Tribunal limitar-se a devolver a questão ao órgão administrativo competente.
III. O que se retira da alegação da Recorrente, é que a mesma pretende que o ato seja praticado não só com determinado conteúdo, como também pelo órgão competente.
IV. Não é indubitável que o ato, a ter sido praticado pelo órgão competente, tivesse o mesmo conteúdo, sendo ainda certo que o que está vedado ao Tribunal é que a questão seja devolvida ao órgão administrativo competente, consequência que sempre estaria afastada através da procedência da presente ação com fundamento no apontado vício de incompetência relativa, pois o que assim se conclui é que a questão que a Recorrente pretende ver apreciada nunca o foi pelo órgão competente.
V. Para cumprir o regime processual aplicável e assim, o desiderato do legislador, que na ação de condenação à prática de ato devido pretendeu “afastar a lógica revisora, própria dos processos de cassação”, o que há que concluir é pela procedência da ação determinando-se, em consequência, a condenação da Ré a que o ato seja praticado pelo órgão competente.
***
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao presente recurso, e em consequência, julgar a ação administrativa procedente, condenando a Ré a que a informação vinculativa em causa seja apreciada e decidida pelo órgão compente.
Custas pela Recorrida, em ambas as instâncias.
Porto, 25 de janeiro de 2024 - Margarida Reis (relatora) – Celeste Oliveira – Paula Moura Teixeira.