Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01032/13.4BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/29/2016
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Mário Rebelo
Descritores:NOTIFICAÇÃO POR TRANSMISSÃO ELETRÓNICA DE DADOS
PRESUNÇÃO DE NOTIFICAÇÃO
Sumário:1. Nos termos do art. 19º LGT, o domicílio fiscal das pessoas colectivas é o local da sede ou direção efectiva ou, na falta destas, do seu estabelecimento estável em Portugal.
2. O domicílio fiscal integra ainda a caixa postal eletrónica nos termos previstos no serviço público de caixa postal eletrónica (art. 19º/2 LGT).
3. Os atos em matéria tributária que afetem direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados (art. 36º/1 do CPPT).
4. As notificações por transmissão eletrónica de dados constituem uma modalidade válida, legal, de levar um facto ao conhecimento de uma pessoa ou chamá-la a juízo, conforme dispõe o n.º 9 do art. 38º do CPPT, na redação introduzida pela Lei n.º 3-B/2010, de 28/4.
5. Estas notificações consideram-se feitas no momento em que o destinatário aceda à caixa postal eletrónica. (art. 39º/9 do CPPT na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 3-B/2010 de 28/4).
6. Caso o contribuinte não aceda à caixa postal eletrónica em data anterior, a notificação presume-se efetuada no 25º dia posterior ao seu envio (n.º 10 do art. 39 do CPPT, na redação da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro).
7. Se a transmissão eletrónica de dados foi entregue na caixa postal eletrónica em 23/11/2012, a notificação presumida (art. 39º/10 CPPT) ocorreu no 25º dia posterior, ou seja, em 18/12/2012.
8. Este preceito consagra uma presunção legal de recebimento da notificação. E esta só pode ser ilidida quando se comprove que o contribuinte comunicou a alteração da caixa postal eletrónica, nos termos do art. 43º do CPPT, ou que lhe foi impossível essa comunicação.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:M..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

M… Lda. inconformada com a sentença proferida em 23 de Janeiro de 2014 pela MMª juiz do TAF de Braga que julgou verificada a exceção de caducidade do direito de ação e absolveu a AT da instância, interpôs recurso terminando as alegações com as seguintes conclusões:

SEMPRE A RECORRENTE RECEBEU DA A.T. COMUNICAÇÕES PELO CORREIO NORMAL, NUNCA RECEBEU NADA PELA VIA ELETRÓNICA E NUNCA TEVE CONHECIMENTO DO TEOR DESSAS COMUNICAÇÕES PELA VIA ELETRÓNICA JÁ QUE NÃO CONSTA DOS AUTOS QUE TAIS NOTIFICAÇÕES FORAM EFETIVAMENTE RECEBIDAS PELA RECORRENTE JÁ QUE SE TRATAM DE DECLARAÇÕES RECEPTICIAS, ALTERANDO O FATO DADO COMO PROVADO NO PONTO C)
TERMOS EM QUE SE REQUER COM O SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELENCIAS, SEJAM OS AUTOS REENVIADOS PARA O TRIBUNAL DE 1ª INSTANCIA, JULGANDO IMPROCEDENTE A EXCEPÇÃO DA CADUCIDADE DO DIREITO O QUE PARECE SER DE INTEIRA JUSTIÇA

CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou no julgamento da questão de direito ao considerar extinto por caducidade o direito de impugnar a liquidação oficiosa relativa ao exercício de 2010.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados:
A) Em 15 de novembro de 2012, foi elaborada, em nome da Impugnante, a liquidação n.º 2012 8310015370, relativa a IRC do ano de 2010 - conforme documento a folhas 22 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
B) Da liquidação a que se alude em A), resultou um valor a pagar de 39.271,82 euros - conforme documento a folhas 22 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
C) A demonstração da liquidação a que se alude em A) e as correspondentes demonstrações de liquidação de juros e de acerto de contas foram remetidas à Impugnante por via eletrónica - conforme documentos a folhas 22 a 27 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
D) Da demonstração da liquidação a que se alude em A) consta a menção:
“(...) Pode reclamar ou impugnar nos termos e prazos estabelecidos nos artigos 137.º do CIRC e 70º e 102º do CPPT” - conforme documento a folhas 22 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
E) Da demonstração de acerto de contas a que se alude em C) consta como data limite de pagamento o dia 31 de dezembro de 2012 — conforme documento a folhas 26 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
F) Em 07 fevereiro de 2013, foi instaurado no Serviço de Finanças de Cabeceiras de Basto, o processo de execução fiscal n.º 0370201301001663, em nome da Impugnante - conforme documento a folhas 1 do Processo de Execução Fiscal junto aos autos (PEF), cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
G) O processo de execução fiscal a que se alude em F), visa a cobrança do valor a que se alude em B) - conforme documento a folhas 1 do PEF, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
H) A Impugnante foi citada no âmbito do processo de execução fiscal a que se alude em G), em 20 de fevereiro de 2013 - conforme documentos a folhas 4 do PEF e a folhas 36 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
I) A petição da presente impugnação judicial foi remetida para o Serviço de Finanças de Cabeceiras de Basto, por via eletrónica, em 22 de maio de 2013 - conforme documento a folhas 4 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido.
*
O Tribunal formou a sua convicção com base nos documentos indicados relativamente a cada um dos factos, os quais não foram impugnados.

ADITAMENTO DE FACTOS.
Oficiosamente, ao abrigo do disposto no art. 662º/1 do NCPC, aditamos à matéria de facto os seguintes factos:
J) À liquidação de IRC n.º 29128310015370, relativa a 2010, no valor de 39.271,82 junta a fls. 22 corresponde ao código de documento expedido 2012200008255487 (fls. 23) e foi entregue na caixa postal eletrónica do ViaCTT em 23/11/2012.
K) À demonstração da liquidação de juros n.º 201200011048674, junta a fls. 24, corresponde-lhe o código de documento expedido n.º 201200008255688, junto a fls. 25, o qual foi entregue na caixa postal eletrónica do ViaCTT em 23/11/2012.
L) À demonstração de acerto de contas a que corresponde o n.º de compensação 201200011048674 junta a fls. 26, corresponde ao código de documento expedido n.º 201200008251564 o qual foi entregue na caixa postal eletrónica do ViaCTT em 23/11/2012 (fls. 27).

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
A RECORRENTE deduziu impugnação judicial contra a liquidação oficiosa de IRC de 2010 alegando, em síntese, que a notificação da inspeção tributária deveria ter sido realizada na pessoa do sócio gerente. Não o tendo sido, tal acarreta a nulidade de todos os actos praticados pela AT desde aquela notificação.
Invoca ainda a exceção de litispendência porque corre termos no mesmo tribunal a impugnação de outro tributo (IRC) relativo a 2010.
Além do mais, alega que todas as facturas contabilizadas e que foram sujeitas a inspeção correspondem a transações efetivas.
A AT defendeu-se por exceção, alegando que a liquidação impugnada foi notificada à IMPUGNANTE por correio eletrónico da qual constava como data limite de pagamento o dia 31 de Dezembro de 2012, pelo que o prazo limite para pagamento terminou em 31 de março de 2013 (domingo de Pascoa e período de férias judiciais), transferindo-se o prazo para o dia 2 de abril de 2013.
Assim sendo, a impugnação foi apresentada depois do prazo legal.
Respondeu o IMPUGNANTE confirmando a citação no dia 20/2/2013 mas impugnando os restantes factos alegados na contestação.

Feita esta breve resenha, vejamos o mérito do recurso que nos é submetido.

Nos termos do art. 19º LGT, o domicílio fiscal das pessoas colectivas é o local da sede ou direção efectiva ou, na falta destas, do seu estabelecimento estável em Portugal.

O domicílio fiscal integra ainda a caixa postal eletrónica nos termos previstos no serviço público de caixa postal eletrónica (art. 19º/2 LGT).

Por força do n.º 9 do art. 19º da mesma lei (na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro), na redação aplicável, “Os sujeitos passivos do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas com sede ou direção efetiva em território português e os estabelecimentos estáveis de sociedades e outras entidades não residentes, bem como os sujeitos passivos residentes enquadrados no regime normal do imposto sobre o valor acrescentado, são obrigados a possuir caixa postal eletrónica, nos termos do n.º 2, e a comunicá-la à administração fiscal”.

Os atos em matéria tributária que afetem direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados (art. 36º/1 do CPPT).

As notificações por transmissão eletrónica de dados constituem uma modalidade válida, legal, de levar um facto ao conhecimento de uma pessoa ou chamá-la a juízo. E mesmo as notificações que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes podem ser efectuadas por transmissão eletrónica de dados, que equivalem, consoante os casos, à remessa por via postal registada ou por via postal registada com aviso de recção (art. 38º/1 e 9 do CPPT, este último na redação dada pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril).

Estas notificações consideram-se feitas no momento em que o destinatário aceda à caixa postal eletrónica. (art. 39º/9 do CPPT na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 3-B/2010 de 28/4).

Se o contribuinte não aceder à caixa postal electrónica, a notificação considera-se efectuada no 25º dia posterior ao seu envio, salvo nos casos em que se comprove que o contribuinte comunicou a alteração daquela nos termos do art. 43º, ou este demonstre ter sido impossível essa comunicação (n.º 10 do art. 39º redação da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro),.

Esta norma contém uma presunção legal de notificação (“considera-se efectuada”) no 25º dia posterior ao envio, em caso de ausência de acesso à caixa postal eletrónica.
Como tal, nos termos do art. 350º/2 do Código Civil, pode ser ilidida pelo contribuinte mediante prova de que comunicou a alteração daquela nos termos do art. 43º, ou demonstre ter sido impossível essa comunicação.

Consta dos factos provados, entre o mais, que a demonstração da liquidação e as correspondentes demonstrações de liquidação de juros e de acerto de contas foram remetidas à Impugnante por via eletrónica (alínea C) dos factos provados). E que da demonstração de acerto de contas consta como data limite de pagamento o dia 31 de dezembro de 2012 (alínea E dos factos provados).

Desconhecemos se a IMPUGNANTE/RECORRENTE acedeu à caixa do correio e se acedeu, em que data o fez - mas se acedeu, só poderá ter sido em data posterior à presumida. Porém, sabemos que a transmissão eletrónica de dados foi entregue na caixa postal eletrónica em 23/11/2012, conforme aditamento oficioso de factos.

Como tal, a notificação presumida (art. 39º/10 CPPT e 350º/1 do Código Civil) ocorreu no 25º dia posterior, ou seja, em 18/12/2012.

O prazo para deduzir impugnação é - neste caso -, de três meses a contar do termo do prazo para pagamento voluntário (art. 102º/1-a) do CPPT). Prazo que por ter natureza substantiva se conta nos termos do art. 279º/b-c) do Código Civil, como expressamente determina o art. 20/1 do CPPT e não se suspende em férias judiciais.

Assim, tendo a notificação ocorrido em 18/12/2012, o prazo para impugnação expirou em 19/3/2013.

Donde resulta que a petição inicial apresentada em 22 de Maio de 2013 é manifestamente extemporânea.

A ora RECORRENTE impugnou os factos alegados pelo ERFP relativos à exceção de caducidade do direito de impugnar. Só que neste caso não lhe basta impugnar os factos articulados pela AT para criar dúvida sobre a veracidade dos mesmos e assim devolver-lhe o ónus de maior esforço probatório, sob pena de a questão ser decidida contra si, como sucede nas situações previstas no art. 346º do Código Civil.

Neste caso não é assim porque o n.º 10 do art. 39º do CPPT (na redação aplicável, que é a que lhe foi conferida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro) institui uma presunção legal de notificação no 25º posterior ao envio.

A AT, que tem a seu favor a presunção legal de recebimento, escusa de provar o facto que a ela conduz (art. 350º/1 do Código Civil).

O contribuinte, por seu turno, pode (apenas pode) ilidir a presunção se comprovar que comunicou alteração da caixa postal eletrónica nos termos do art. 43º ou que lhe foi impossível fazer essa comunicação.

Nas alegações de recurso afirmou a RECORRENTE que nunca recebeu nenhum correio eletrónico mas tem vindo a receber notificações pelo correio normal e não «compreende como é que a demonstração da liquidação e ainda a demonstração da liquidação de juros e de acerto de contas foram enviadas à recorrente pela via electrónica e a citação para o processo de execução fiscal foi pela via do correio normal», e que não consta dos autos «prova de que a recorrente teve conhecimento dessas comunicações enviadas eletronicamente – apenas se sabe que foram enviadas, eventualmente».

Contudo, nem na pi nem na resposta à exceção alegou que a notificação se deu em data posterior à presumida (ou que não se deu de todo) e que comunicou a alteração daquela nos termos do art. 43º do CPPT, ou mesmo que lhe foi impossível essa comunicação.

Ou seja, não alegou sequer factos que uma vez provados tivessem aptidão para ilidir a presunção de notificação nos termos expostos.
Razão por que o recurso não pode proceder.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 29 de setembro de 2016.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira