Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01194/18.4BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/14/2023
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS;
DIREITO DE ACÇÃO;
CADUCIDADE;
Sumário:I- O prazo de caducidade do direito de acção a que se reporta o art. 255º do Decreto-Lei nº 59/99, de 2/3, conta-se, para o empreiteiro, a partir da notificação da decisão que lhe negue direito ou pretensão, praticada pelo órgão competente para a prática de actos definitivos sobre a matéria em causa.

II- Assim, no caso das empreitadas com o preço contratual superior ao montante de € 748.196,85, sendo competente para a prática de decisões definitivas a respectiva Câmara Municipal e não o seu Vice-Presidente, a notificação de decisão deste último órgão denegando pretensão ou direitos reivindicados pelo empreiteiro não releva para efeitos de contagem do referido prazo de caducidade.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
* *
I – RELATÓRIO
1. [SCom01...], S.A., Autora nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA em que é Réu o MUNICÍPIO ..., vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador-sentença editado em 07.03.2023, que julgou procedente a suscitada exceção de caducidade do direito de propor a presente acção, e, consequentemente, absolveu o Réu da instância.
2. Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)
I. Vem o presente recurso interposto do despacho saneador/Sentença, o Tribunal Recorrido, acolhendo integralmente a tese do R., considerou que o Direito da Autora de propor a presente ação havia caducado, por decurso do prazo previsto no artigo 255° do RJEOP.
II. A Decisão recorrida entendeu que o “acto administrativo” praticado pelo Exmo. Senhor Vereador da Câmara Municipal ..., em 11/12/2011, negou totalmente (na tese do R. e que o Tribunal aceitou) a pretensão da A. (que era a de reposição do equilíbrio financeiro do contrato de empreitada “Centro Cultural da ... – 3ª fase (ampliação/remodelação)) e foi praticado pelo órgão competente para a decisão de contratar e, por via disso, constitui o termo inicial da contagem do prazo de 132 dias previsto no artigo 255° do RJEOP.
III. Em particular, as razões de discordância para com a decisão recorrida centram-se na parte em que o Tribunal decide que:
IV. “Todavia, analisado o teor da comunicação de 11.12.2011 o Tribunal verifica que deste consta a assinatura do Vice- Presidente do R., à data, «AA», no qual, por despacho do Presidente da Câmara do R., de 02.11.2005, estavam delegadas competências para as funções relativas às “obras municipais” [cfr. ponto J) do probatório]. Decai, por isso, a alegação da A. quanto à incompetência do autor do acto”.
V. Ora, a aqui Autora não pode conformar-se com o assim decidido pelas seguintes 4 ordens de razões:
ü A delegação de competências relativas a “obras municipais" não inclui a delegação de competências para a decisão de celebração de contratos de empreitada;
ü Ainda que assim se não entenda, a delegação de competências “relativa a obras municipais" não abrange nem pode abranger a competência para a decisão de celebração de contratos de empreitada de valor superior a 150 000 contos;
ü Ainda que assim se não entenda, a alegada delegação de competências não contém os requisitos mínimos de validade e existência, padecendo por isso de nulidade;
ü O Alegado despacho de rejeição que, nos termos da decisão recorrida, constitui o termo inicial da contagem do prazo de caducidade não nega em absoluto o direito da Autora, antes confessa um crédito a favor da Autora no montante de 53550,00 acrescido de IVA devido pela prorrogação do prazo da empreitada pelo período de 9 meses.
1 - DO ÓRGÃO COMPETENTE PARA A DECISÃO DE CONTRATAR:
VI. A notificação de 13-12-2011 a que a Ré faz referência como decisão do ato de indeferimento, não é um ato administrativo definitivo, uma vez que não foi praticada pelo órgão competente.
VII. De fato, essa comunicação vem assinada pelo Exm°. Senhor Vice-Presidente da Câmara Municipal ... e não pelo Presidente da Câmara Municipal.
VIII. Também resulta da matéria de facto que a referida comunicação não faz referência a qualquer despacho de delegação de poderes, conferindo legitimidade para tal ato.
IX. Assim, não tendo o ato sido praticado pelo órgão competente, não existe qualquer ato juridicamente válido de indeferimento da pretensão da Autora.
X. Como resulta do artigo 8° da petição inicial, o preço contratual fixado para a empreitada foi de € 2.148.755,73.
XI. Atento o valor da empreitada dos autos, a competência para autorizar a respetiva despesa é da Câmara Municipal, nos termos dos artigos 18°, n°1, alínea b) e 29°, n°2, do DL n°197/99, de 8 de junho, aplicáveis às empreitadas de obras públicas ex vi do disposto no artigo 4°, n°1, alínea b) do mesmo diploma legal.
XII. De acordo com a Lei n.° 75/2013, de 12 de setembro, que aprovou o Regime Jurídico das Autarquias Locais, mais concretamente nos termos do disposto no artigo 33°, n° 1, al. f), compete à Câmara Municipal: “Aprovar os projetos, programas de concurso, cadernos de encargos e a adjudicação de empreitadas e aquisição de bens e serviços, cuja autorização de despesa lhe caiba;” 
XIII. Logo, a representação orgânica do recorrido, nos actos referentes à execução da empreitada dos autos, cabe à Câmara Municipal e não ao Senhor Presidente da Câmara e, muito menos, a qualquer Senhor Vereador e/ou Senhor Vice- Presidente da Câmara.
XIV. Nos termos do disposto no art. 29°, n° 2 do DL n°197/99, de 8 de junho “As competências atribuídas pelo presente diploma às câmaras municipais, às juntas de freguesia e aos conselhos de administração dos serviços municipalizados podem ser delegadas nos seus presidentes até 150000 contos, 20000 contos e 50000 contos, respectivamente.
XV. Do regime legal em apreço resulta claro que, atento o valor do contrato em causa, a competência para deliberar a celebração do contrato é da Câmara Municipal.
XVI. A Delegação dessa competência só é permitida por lei, até ao montante de 150000 contos (€ 748.196,85) estabelecido como limite máximo de competência para a decisão de contratar.
XVII. A Câmara Municipal não pode delegar no Presidente da Câmara nem este pode subdelegar em qualquer Vereador ou Vice-Presidente competência para a celebração de contratos de empreitada de montante igual ou superior a € 748.196,85.
XVIII. O “Despacho” referido da alínea “J” da matéria de facto dada como provada na interpretação de que o Presidente Delegou ou subdelegou no Vice Presidente as competências para a decisão de celebrar um contrato de empreitada no valor de € 2.148.755,73 é manifestamente contrária à Lei e aos princípios aplicáveis, violando norma imperativa.
XIX. Assim jamais se poderá considerar que o despacho de indeferimento do Vice- Presidente da Câmara através do qual este nega o direito da Autora constitui “a decisão ou deliberação do órgão competente para praticar atos definitivos”.
XX. Ainda que o Vice-Presidente tivesse competência delegada para o efeito, sempre o ato teria de fazer referência à delegação de poderes, nos termos dos artigos 47° e 48°, ambos do CPA, o que não se verifica.
XXI. De igual modo, o ato de negação da pretensão da Autora assinado pelo Vice- Presidente da Câmara Municipal (supostamente ao abrigo de um Despacho de delegação ou de subdelegação de poderes do Senhor Presidente da Câmara Municipal) também não faz qualquer referência a qualquer decisão/deliberação do órgão competente, in casu, a Câmara Municipal ....
XXII. Assim, não era possível para a Autora - em face do ordenamento jurídico em vigor à data - saber que se tratava de uma decisão definitiva do órgão competente para a prática de atos definitivos.
XXIII. Forçoso se torna, pois, concluir que até à presente data ainda não foi praticada qualquer decisão ou deliberação por parte do órgão competente do Réu acerca da pretensão formulada pela Autora.
XXIV. De onde decorre necessária e inelutavelmente que o prazo de caducidade do direito de ação previsto no artigo 255° do DL 59/99 ainda não começou a correr.
2. Quanto ao objeto da Delegação de competências (Despacho de 02/11/2005):
XXV. A decisão recorrida faz uma interpretação errónea ao considerar que a delegação de competências de funções “Obras Municipais” abrange a competência para a celebração e proferir decisões definitivas em questões atinentes com contratos de empreitada.
XXVI. o artigo 33°, n° 1, al. f) da citada Lei 75/2013, refere expressamente que compete à Câmara Municipal: “Aprovar os projetos, programas de concurso, cadernos de encargos e a adjudicação de empreitadas e aquisição de bens e serviços, cuja autorização de despesa lhe caiba”.
XXVII. Teria de ser esta a competência delegada para que a decisão notificada à Autora/Recorrente fosse definitiva (adotada pelo órgão competente).
XXVIII. A delegação de competência de “Obras Municipais” não engloba - nem pode englobar - as competências para aprovar os projetos, programas de concurso, cadernos de encargos e proferir decisões definitivas ao abrigo de contratos de empreitada.
XXIX. De onde decorre que o órgão competente para a prática de atos definitivos que no âmbito de empreitadas de obras públicas não foram - nem podiam ter sido - delegado no Vice-Presidente da Câmara Municipal ....
XXX. Razão pela qual a delegação de poderes no Exm°. Senhor Sr. Vice Presidente da Câmara Municipal não pode ser entendida como abrangendo a competência para a prática de atos definitivos na execução do contrato de empreitada.
3. Quanto à nulidade do Despacho de 02/11/2005:
XXXI. Como é bom de ver-se, as funções delegadas, maxime, as “Obras Municipais”, não foram, de modo algum, escalpelizadas, individualizadas e/ou concretizadas.
XXXII. Era é e continuará a ser impossível para qualquer empreiteiro medianamente sagaz e diligente, colocado perante o ato em apreço, perceber qual ou quais foram as concretas funções delegadas ao Senhor Vice-Presidente da Câmara no âmbito ou no universo das “Obras Públicas''... 
XXXIII. Como se sustenta no Douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 21/11/2019:
“i) Nos termos do disposto no art. 47.°, n° 1, do CPA, “[n]o ato de delegação ou subdelegação, deve o órgão delegante ou subdelegante especificar os poderes que são delegados ou subdelegados ou os atos que o delegado ou subdelegado pode praticar, bem como mencionar a norma atributiva do poder delegado e aquela que habilita o órgão a delegar”.
ii) O delegante deve especificar os poderes delegados (art. 47°, n.° 1). Com isto pretende a lei impedir delegações genéricas, o que é, aliás, reforçado com o disposto na alínea a) do artigo 45° do CPA ao determinar não poderem ser objecto de delegação “a globalidade dos poderes do delegante”.
iii) A especificação dos poderes delegados deve ser feita positivamente, isto é, por enumeração explícita dos poderes delegados ou dos actos que o delegado pode praticar....
v) Não tendo o despacho de delegação de competências especificado a delegação do exercício desse poder no vereador que praticou o acto punitivo, aplicando a coima, ainda que por remissão para a competência própria do presidente (a prevista no citado artigo 35.°, n.° 2, al. n), é o mesmo acto nulo.”. (Negrito nosso)
XXXIV. Mais se afirma no Douto Acórdão citado: “Como exige o artigo 47.° do CPA, no acto de delegação, o delegante deve especificar os poderes que são delegados, pretendendo-se com isto afastar delegações genéricas de competência. Como defende MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, uma fórmula deste tipo é ilegal e impotente para sustentar actos praticados ao abrigo da delegação de competências (cf. CPA comentado, 2.g ed., Almedina, p. 223). [sublinhados nossos]
XXXV. Citando ainda FERNANDA PAULA OLIVEIRA, «Do ponto de vista do conteúdo, o delegante deve especificar os poderes delegados (artigo 47°, n.° 1). Com isto pretende a lei impedir delegações genéricas, o que é, aliás, reforçado com o disposto na alínea a) do artigo 45° ao determinar não poderem ser objecto de delegação “a globalidade dos poderes do delegante”. A especificação dos poderes delegados deve ser feita positivamente, isto é, por enumeração explícita dos poderes delegados ou dos atos que o delegado pode praticar, e não negativamente, através de um “reserva genérica de competência” a favor do delegante - o que não exclui, obviamente, que ao indicar certo poder como delegado se excluam do seu âmbito certas faculdades ou atos (“reserva específica de competência”). - Noções Fundamentais de Direito Administrativo, 2016, 4.g ed., Almedina, p. 90/91....
XXXVI. É também este o entendimento de JORGE LOPES DE SOUSA e SIMAS SANTOS, ao sustentarem que «se um acto for praticado invocando delegação de poderes ou subdelegação inexistente ou ilegal, o acto estará afetado de vício de incompetência, que é fundamento para a sua anulação (art. 33.°, n.° 1, do CPP, aplicável por força do disposto no art. 42.°, n.° 1, do RGCO).» - Contra-ordenações, Anotações ao Regime Geral, 6g, ed., 2011, p. 297.
XXXVII. Escrevem Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e João Pacheco de Amorim, in Código do Procedimento Administrativo Anotado, vol. I., 1993, p. 276: “A delegação de poderes tem de ser delimitada positivamente: a lei exige a especificação dos poderes delegados (ou subdelegados) ou dos actos que os órgãos assim habilitados podem praticar.
Claro que uma especificação destas se pode fazer de diversas maneiras e questiona-se, nomeadamente, se a especificação exigida se traduz no enunciado escrito dos poderes delegados.
A resposta parece-nos dever ser negativa: o que o Código quis afastar com o requisito da especificação foi a possibilidade de se fazerem delegações genéricas de competência. Seria o caso, por exemplo, de uma delegação respeitante à "competência disciplinar" ou "para decidir sobre actos que impliquem a realização de despesas, pagamentos e recebimentos".
Qualquer fórmula deste tipo é ilegal e impotente para sustentar actos praticados ao abrigo de delegações de competência. Mas já se admitiriam, em contrapartida, as delegações cuja especificação seja feita, por exemplo, por remissão para uma norma de competência”.
XXXVIII. Como já se concluía no ac. do STA de 11.01.2007, proc. n° 899/06:
XXXIX. “O art° 37°, n° 1 do CPA [a que corresponde o actual art. 47.° do CPA), ao referir que o órgão delegante deve “especificar” os poderes que são delegados, usa o verbo no sentido corrente de “indicar”, “determinar” ou “mencionar” aqueles poderes, sempre no sentido de, por um lado, afastar as delegações genéricas de competência, mas, por outro lado, sem a exigência de um enunciado preciso e taxativo dos poderes delegados, impondo-se apenas uma indicação suficientemente clara, determinada e apreensível por qualquer destinatário”.
No caso não se coloca a questão de inexistência de norma habilitante. Mas tão-somente a falta de especificação do concreto poder ou conjunto de poderes delegados.”. 
XL. O Despacho do Senhor Vice-Presidente da Câmara Municipal ... não faz qualquer alusão à delegação de poderes ao abrigo da qual, supostamente, tomou a decisão que tomou e que se pretendeu impugnar nos presentes autos.
XLI. Ou seja, mesmo que a delegação de poderes levada a cabo pelo Senhor Presidente da Câmara fosse válida, a realidade é que também o despacho do Senhor Vice-Presidente não cumpre a Lei, designadamente o art.° 48° do Código de Procedimento Administrativo, pois que nenhuma referência faz à delegação de poderes por parte do Presidente da Câmara Municipal ao abrigo da qual o Senhor Vice-Presidente deu o despacho, contrariamente ao que estava obrigado por lei.
XLII. Do que vem de expor-se, resulta à saciedade que não só o Senhor Presidente da Câmara Municipal ... não tinha competências para tomar decisões no âmbito do contrato de empreitada celebrado com a aqui Apelante, no âmbito do concurso público lançado pela Autarquia (competência que cabia e cabe à Câmara Municipal, enquanto órgão executivo), como a delegação de competências que efetuou na pessoa do Senhor Vice-Presidente é nula, pelos motivos atrás aduzidos.
XLIII. Sendo a nulidade a todo o tempo invocável, sempre a Apelante estaria, como estava, em tempo de propor a acção administrativa que interpôs.
4 - DA AUSÊNCIA DE UM INDEFERIMENTO EXPRESSO E TOTAL DA PRETENSÃO DA AUTORA:
XLIV. Do cotejo da comunicação do Município Réu, de 11/12/2011, verifica-se que o Senhor Vice-Presidente da Câmara Municipal afirma, no que ao caso concreto interessa, que
“...3. Relativamente às alterações ao projeto de arquitetura, efectivamente elas existiram e algumas delas determinaram a consequente alteração dos projetos de especialidades.
4. As alterações ao projecto elétrico, que originaram as maiores alterações em obra, deveram-se a alterações legislativas ocorridas após a execução do projecto concursado.
6. Sendo certo e assumindo que houve atrasos na obra, a maioria dos quais "imputáveis ao dono de obra" devido a erros de projecto e outros, o valor desses trabalhos foi sendo apresento pelo empreiteiro, em diversas propostas, como trabalhos a mais, que após aprovação e execução fazem parte do balanço final da obra (em anexo). O valor destes trabalhos atingiu o montante de € 400.502,34 + IVA.
A realização destes trabalhos a mais, nos termos do artigo 27.° do Decreto-Lei n.°59/99, de 2 de março, implica a prorrogação do prazo contratual.
8. Como já foi referido, nos termos do disposto no n.° 3 do artigo 24.° do Decreto- Lei 59/99, de 2 de março, "os encargos relativos à montagem, construção, desmontagem e demolição do estaleiro são da responsabilidade do dono da obra e constituirão um preço contratual unitário".
Os custos de Montagem, Desmontagem e Manutenção do estaleiro apresentados na proposta para execução da presente empreitada, correspondem a € 35.700,00 + IVA, o equivalente a € 5.950,00 + IVA por mês, considerando o prazo de execução inicial da obra de 6 meses.
Nestes termos considera-se que o custo "adicional" com a Manutenção do Estaleiro poderá corresponder a € 53.550,00 + IVA, valor proporcional à prorrogação da obra pelo período de 9 meses.
9. Saliente-se que a inauguração da obra ocorreu a 20 de junho de 2010, e que a receção provisória, com cláusulas, que ainda não se encontram totalmente resolvidas, foi elaborada em 23 de julho de 2010.
Pelo exposto, consideramos que os custos de estaleiro durante o período de prorrogação da obra, são os únicos que serão imputáveis ao dono de obra, já que os custos diretos e indiretos, tal como já referido, se encontram "diluídos" nos valores unitários apresentados para realização dos trabalhos a mais.
Assim, não se considera razoável e legalmente aceitável o pedido de indemnização nos termos em que é apresentado.”.(sublinhado e negrito nossos) XLV. É o Réu que (embora não aceite integralmente o pedido de indemnização apresentado pela Apelante), sempre considera que será devido o pagamento do custo adicional com a manutenção do estaleiro que, afirma, “poderá corresponder a € 53.550,00 + IVA, valor proporcional à prorrogação da obra pelo período de 9 meses”.
XLVI. Por esse mesmo motivo, é manifesto, evidente, incontestável que o Apelado, na pessoa do Senhor Vice-Presidente não rejeitou liminarmente o pedido de indemnização efetuado pela Apelante,
XLVII. Pelo contrário, através daquele ato, o Dono de Obra aceitou que seria devido a título de custo adicional com a manutenção do estaleiro ao preço contratualmente em vigor pelo período de 9 meses (negando o demais peticionado pela A./Recorrente).
XLVIII. O Réu aceitou que deve à Autora/Recorrente o custo adicional de manutenção do estaleiro reclamado pela A.; 
XLIX. O Réu não negou, integral e definitivamente, qualquer direito indemnizatório à Apelante!!!
L. Ora, qualquer pater famílias, colocado na mesma situação da Autora, concluiria facilmente que a Câmara Municipal ... não negou peremtoriamente a pretensão da Apelante, apenas afirmou que apenas parte desse valor seria devido.
LI. Do despacho em causa não resulta que o Réu afirmou que não pagava um cêntimo que fosse do pedido, antes aceitou expressamente o pagamento dos custos adicionais de manutenção do estaleiro ao preço contratual no montante global de € 53.550,00 + IVA, correspondente ao proporcional devido pela prorrogação do prazo da obra pelo período de 9 meses.
LII. Sendo assim - como é - não se vislumbra como pode afirmar-se na decisão recorrida que “É, pois, cristalino o indeferimento expresso da pretensão da A., pelo que, soçobra, por esse motivo, a alegação da A. a este respeito.”.
LIII. Ora a entender-se expresso o indeferimento da pretensão da A. não restaria senão entender-se como confessado o valor aceite de 53.550,00 acrescido do respetivo IVA.
LIV. Na verdade, sendo os custos de estaleiro parte do valor reclamado pela Autora, não restaria ao Tribunal a quo - na interpretação que faz do despacho do Sr. Vice Presidente da Câmara - senão dar como confessado nessa parte o pedido da Autora, nos termos constantes do despacho expresso do Senhor Vice-Presidente com base numa alegada delegação de competências!
LV. Jamais a decisão do Vice Presidente da Câmara poderá ser interpretada como uma negação absoluta do direito da Autora.
LVI. De facto, neste sentido, veja-se o sumário do Acórdão proferido pelo TCAN, 1ª Secção - Contencioso Administrativo, processo n.° 01279/10.5BEBRG-A, de 06¬03-2015,
“2 - Para efeitos de constituir o termo inicial do prazo de caducidade de 132 dias previsto do referido Art° 255.° do RJEOP, terá de estar em causa uma decisão inequivocamente negativa.”
LVII. O prazo de caducidade do direito de ação a que se reporta aquele artigo 255°, conta-se, para o empreiteiro, a partir da sua notificação da decisão que lhe negue direito ou pretensão, decisão essa praticada pelo órgão competente.
LVIII. Ora, a comunicação de 13-12-2011 não é inequivocamente negativa, sendo até, o inverso, uma vez que o réu confessou ser devedor da Autora e nem essa quantia liquidou.
LIX. Salvo melhor opinião em sentido contrário, o réu confessou nessa missiva ser devedor de determinada quantia à Autora, pelo que não pode, com o devido respeito, alegar o inverso.
LX. Decidindo como decidiu a douta sentença recorrida VIOLOU:
i) o disposto nos artigos 18°, n°1, alínea b) e 29°, n°2, do DL n°197/99, de 8 de junho, aplicáveis às empreitadas de obras públicas ex vi do artigo 4°, n°1, alínea b) do mesmo diploma legal;
ii) A Lei n.° 75/2013, de 12 de setembro, que aprovou o Regime Jurídico das Autarquias Locais, mais concretamente o disposto no artigo 33°, n° 1, al.
f), nos termos do qual compete à Câmara Municipal: “Aprovar os projetos, programas de concurso, cadernos de encargos e a adjudicação de empreitadas e aquisição de bens e serviços, cuja autorização de despesa lhe caiba;
iii) e, ainda, os artigos 45° e 47° do CPA e, por último, o art.° 255° do RJEOP (…)”.
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3. Notificado que foi para o efeito, o Recorrido MUNICÍPIO ... produziu contra-alegações, que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “(…)
I. Aplica-se aos presentes autos as regras previstas no RJEOP, sendo que, nos termos do previsto pelo artigo 254.°, n.° 1 do RJEOP, revestem a forma de ação as questões submetidas ao julgamento dos tribunais administrativos sobre interpretação, validade e execução do contrato, sendo que este diploma entrou em vigor na vigência da LPTA, a qual fazia a distinção entre “ações” e “recurso contencioso de anulação”.
II. A ação interposta pela recorrente encontra-se prevista nos artigos 254.° e 255.° do RJEOP, sendo-lhe aplicável o prazo especial de caducidade previsto no predito artigo 255.° deste diploma.
III. Cumpre ainda dizer que se aplicará sempre o regime da caducidade, na medida em que, contabilizando apenas 132 dias úteis, desde 13.12.2011, a verdade é que quando a recorrente deu entrada em juízo da petição inicial dos presentes autos - quase sete anos depois há muito que tinha caducado o seu direito de intentar a ação.
IV. A recorrente ao intentar a ação, na data em que a interpôs, interpretando-se o regime jurídico que lhe é aplicável, a ação e a conduta inerte gerou a caducidade do direito de ação.
V. Assim será de manter a sentença proferida pelo Tribunal a quo nos seus exatos termos. (…)”.
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4. O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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5. O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.
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6. Com dispensa de vistos prévios, cumpre apreciar e decidir.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
7. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
8. Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir é a de determinar se o despacho saneador-sentença recorrido incorreu em erro de julgamento de direito, por violação do disposto nos artigos 18°, n°1, alínea b) e 29°, n°2, do DL n°197/99, de 8 de junho; no artigo 33°, n° 1, al. f) da Lei n.° 75/2013, de 12 de setembro; nos artigos 45° e 47° do CPA e, por último, no art.° 255° do RJEOP.
9. É na resolução de tal questão que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
10. São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida, cuja fidelidade e completude não se mostram questionadas em sede recursiva:
A) Em 21.07.2008, foi aprovada a “proposta de abertura de concurso”, relativa à empreitada «Centro Cultural da ... – 3ª fase (ampliação/remodelação)». - cfr. fls. 2 do processo administrativo;
B) Em 29.07.2008, foi publicado o “anúncio de concurso”, referente à mencionada empreitada, no Diário da República, II série, n.° 145, de 29.07.2008, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. fls. 6 e ss. do processo administrativo;
C) Por ofício datado de 19.02.2009, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a A. foi notificada da adjudicação da sua proposta, em deliberação de 02.02.2009. - cfr. fls. 147 do processo administrativo;
D) Em 15.04.2009, a A. e o R. subscreveram documento intitulado “Contrato n.° ... | ... | Centro Cultural da ... – 3ª fase (ampliação/remodelação)”, cujo teor aqui se dá por reproduzido. - cfr. fls. 156 e ss. do processo administrativo;
E) Com data de 30.03.2011, a A. remeteu ao R. uma “reclamação”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, “(...) destinada à reposição do equilíbrio financeiro no âmbito da empreitada identificada em epígrafe. (...)”. - cfr. fls. 169 e ss do processo administrativo;
F) Com data de 22.11.2011, a A. remeteu ao R. uma carta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)
Acusamos a receção da vossa missiva no passado dia 18 de novembro de 2011, a qual mereceu a nossa melhor consideração e nos merece os seguintes comentários:
No anexo designado por "Balanço Final da Obra" apuramos que não consta o valor devido a esta empresa a titulo de reequilíbrio financeiro no montante global de € 513.783,29 (quinhentos e treze mil, setecentos e oitenta e três euros e vinte e nove cêntimos), cuja justificação oportunamente apresentamos e, uma vez mais, se anexa e cujo teor damos aqui por integralmente reproduzido.
Em conformidade, solicitamos a V. Exas. que se dignem incluir aquele valor - € 513.783,29 (quinhentos e treze mil, setecentos e oitenta e três euros e vinte e nove cêntimos) - no documento denominado por "Balanço Final da Obra e procedam ao respectivo pagamento.
(...)”. - cfr. fls. 238 e ss do processo administrativo;
G) Com data de 11.12.2011, o R. remeteu à A. uma carta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)
Na sequência da receção do V. ofício de 22 de novembro de 2011, relativa ao Balanço Final da Obra da Empreitada do "Centro Cultural da ...", e nomeadamente no que respeita ao valor solicitado por Vs. Exas., relativo ao reequilíbrio financeiro da empreitada, cumpre-nos informar o seguinte:
1. De acordo com a análise do concurso público em causa, verifica-se que o prazo estabelecido no caderno de encargos do concurso era de 10 meses, sendo o mesmo um dos critérios de avaliação das propostas, com uma ponderação de 15%.
Na proposta apresentada pelo adjudicatário, o prazo de execução proposto foi de 6 meses, ou seja, uma redução de 40% do tempo face ao prazo máximo estabelecido no concurso.
Mesmo assim sendo, a proposta foi aceite e classificada em 1. lugar, tendo contribuído para esse facto o prazo proposto, cujo cumprimento é da responsabilidade da empresa [SCom01...], SA.
2. Relativamente aos fundamentos apresentados no 1.° pedido de prorrogação de prazo e agora usados como argumento para exigirem o pagamento de um montante indemnizatório para restabelecer o "reequilíbrio financeiro do contrato de empreitada", esclarecemos que:
a. A [SCom01...], SA, na fase de esclarecimentos do concurso apenas solicitou um esclarecimento relativo à duplicação de um artigo constante na lista de preços unitários;
b. Não solicitou esclarecimentos relativamente às demolições a efetuar não constarem de uma planta de demolições, nem tão pouco devido ao facto de na planta de estruturas estarem representadas as micro-estacas e a execução das mesmas não constar na lista de preços unitários. Referimos que os restantes concorrentes também não solicitaram esclarecimentos relativamente a estas duas questões;
c. A planta de demolições com a indicação dos elementos a demolir, foi entregue em 8 de maio de 2009, no entanto, confirmamos que a mesma se encontrava desfasada da realidade encontrada em obra.
d. A existência de um nível freático elevado, situação que dificultou os trabalhos de escavação e de execução dos elementos estruturais enterrados, é uma característica existente em quase toda a área do município, particularmente na zona da obra, dada a sua proximidade do mar, sofrendo inclusivamente o efeito das marés;
3. Relativamente às alterações ao projeto de arquitetura, efectivamente elas existiram e algumas delas determinaram a consequente alteração dos projetos de especialidades.
4. As alterações ao projecto elétrico, que originaram as maiores alterações em obra, deveram-se a alterações legislativas ocorridas após a execução do projecto concursado.
5. É alegado que a lista de quantidades final da especialidade de "Mecânica de Cena", "apenas", foi entregue no dia 26 de novembro de 2009, sendo isso um facto, ainda hoje, dia 12 de dezembro de 2011, ou seja mais de dois anos após a sua entrega e quase 18 meses após a inauguração da obra, esses trabalhos ainda se encontram em execução.
O Centro Cultural da ... encontra-se em funcionamento desde junho do ano passado, com o recurso sistemático ao aluguer de equipamento para todos os espetáculos, ascendendo os custos desse aluguer de equipamentos, até à presente data, a € 29.100,70 com IVA incluído.
6. Sendo certo e assumindo que houve atrasos na obra, a maioria dos quais "imputáveis ao dono de obra" devido a erros de projecto e outros, o valor desses trabalhos foi sendo apresento pelo empreiteiro, em diversas propostas, como trabalhos a mais, que após aprovação e execução fazem parte do balanço final da obra (em anexo). O valor destes trabalhos atingiu o montante de € 400.502,34 + IVA.
A realização destes trabalhos a mais, nos termos do artigo 27.° do Decreto-Lei n.°59/99, de 2 de março, implica a prorrogação do prazo contratual.
7. Importa referir que os preços unitários apresentados nas Propostas de Trabalhos a mais (e de acordo com as estruturas de custos das empreitadas) incluirão os custos diretos e indiretos referentes à realização da obra, já que os custos de estaleiro constituem uma obrigação do dono de obra e constituem um preço unitário à parte:
Custos diretos - Tudo o que é diretamente imputável às obras e em particular às respetivas tarefas (tijolos, pedreiro, carpinteiro, equipamentos...).
Custos indiretos - Custos associados à vida da empresa e que não são diretamente imputáveis às obras (salários de pessoal do escritório administração, custos com a sede ).
8. Como já foi referido, nos termos do disposto no n.° 3 do artigo 24.° do Decreto-Lei 59/99, de 2 de março, "os encargos relativos à montagem, construção, desmontagem e demolição do estaleiro são da responsabilidade do dono da obra e constituirão um preço contratual unitário".
Os custos de Montagem, Desmontagem e Manutenção do estaleiro apresentados na proposta para execução da presente empreitada, correspondem a € 35.700,00 + IVA, o equivalente a € 5.950,00 + IVA por mês, considerando o prazo de execução inicial da obra de 6 meses.
Nestes termos considera-se que o custo "adicional" com a Manutenção do Estaleiro poderá corresponder a € 53.550,00 + IVA, valor proporcional à prorrogação da obra pelo período de 9 meses.
9. Saliente-se que a inauguração da obra ocorreu a 20 de junho de 2010, e que a receção provisória, com cláusulas, que ainda não se encontram totalmente resolvidas, foi elaborada em 23 de julho de 2010.
Pelo exposto, consideramos que os custos de estaleiro durante o período de prorrogação da obra, são os únicos que serão imputáveis ao dono de obra, já que os custos diretos e indiretos, tal como já referido, se encontram "diluídos" nos valores unitários apresentados para realização dos trabalhos a mais.
Assim, não se considera razoável e legalmente aceitável o pedido de indemnização nos termos em que é apresentado.
O Vice-Presidente da Câmara Municipal
(«AA», Eng.°)
(...)’’. - cfr. fls. 262 e ss. do processo administrativo (vol. II);
H) Em 13.12.2011, a A. foi notificada da carta referida no ponto antecedente. - cfr. artigo 110° da petição inicial;
I) Com data de 21.12.2011, a A. remeteu ao R. uma carta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(...)
Acusamos a receção da vossa missiva no passado dia 13 de dezembro de 2011, a qual mereceu a nossa melhor consideração e nos merece os seguintes comentários:
1.Começamos por reiterar, dando aqui por integralmente reproduzido, tudo o que anteriormente lhes comunicamos sobre o reposição do reequilíbrio financeiro do contrato de empreitada identificado em epigrafe.
2. Entendemos, porém, acrescentar o seguinte:
3. A empreitada em causa era por "série de preços", à qual era aplicável o disposto nos artigos 18.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 59/99, de 2 de março, entretanto revogado.
4. Em conformidade, não lhe era aplicável o artigo 14.°do mesmo diploma, que dispunha expressamente sobre a obrigatoriedade de reclamação de erros e omissões do projecto no prazo máximo de 66 dias a contar da consignação, sendo certo que tal disposição referia-se em particular às empreitadas por "preço global".
5. Muito menos, se aplica aqui o disposto no artigo 61.° do Código dos Contratos Públicos (que, à data, ainda não estava em vigor e, como tal, não é aplicável à empreitada em apreço), nos termos do qual, em determinadas situações, os concorrentes devem reclamar dos erros e omissões no quinto sexto do prazo para apresentação de propostas.
6. Na verdade, perante erros do projecto, à situação em apreço era, e é, aplicável o disposto no n.° 1 do artigo 37.° e 38.°, do referido Decreto-Lei n.° 59/99, na parte em que prevê que pelas deficiências técnicas e erros de conceção do projecto e dos restantes elementos é responsável o dono da obra - MUNICÍPIO ... -, porquanto, no caso sub judice, o mesmo foi por ele apresentado a concurso.
7. Em conformidade com o exposto, não se aceita qualquer imputação à signatária de eventuais responsabilidades nos termos que V. Exas. pretendem demonstrar nas alíneas do ponto 2 da vossa missiva,...
8. ... porquanto todos os erros e deficiências constantes do projecto apresentado a concurso pelo Dono de Obra são da responsabilidade deste e, tratando-se a obra em causa de uma empreitada "por série de preços", os eventuais erros de projecto são detetados à medida que são executados os trabalhos, sendo certo que, em tempo oportuno, a signatária apresentou a devidas reclamações.
9. Acrescente-se que não competia à signatária a realização de qualquer estudo geológico, muito menos ser-lhe-ia exigido que tivesse conhecimento prévio das condições geológicas do terreno (a não ser que, em fase de concurso, lhe tivesse sido disponibilizado, que não foi), motivo pelo qual também se nega qualquer responsabilidade nos termos que V. Exas. pretendem na alínea d. do ponto 2 da vossa missiva.
10. No que respeita aos "trabalhos a mais", compete-nos referir que a sua existência não determina a impossibilidade de reposição do reequilíbrio financeiro.
11. Tratam-se de situações distintas, sendo que uma não impede a outra.
12. Na verdade, V. Exas., concordam com esse entendimento, porquanto, apesar de assumirem o pagamento de "trabalhos a mais", admitem também o pagamento de custos de estaleiro derivado da prorrogação do prazo de execução da obra por motivos que lhes são imputáveis.
13. Ora, estes custos de estaleiro mais não são do que um dos custos que integram a reposição do equilíbrio financeiro do contrato de empreitada.
14. Acresce que, apesar de V. Exas. apenas se pronunciarem no sentido de que apenas são devidos "custos de estaleiro", a verdade é que a prorrogação do prazo na presente empreitada, acarretou outros custos que se integram no conceito de reposição do equilíbrio financeiro.
(…)
Em conformidade, solicitamos a V. Exas. que se dignem reavaliar a vossa posição sobre assunto e, em conformidade, proceder ao pagamento de € 513.783,29 (quinhentos e treze m setecentos e oitenta e três euros e vinte e nove cêntimos), melhor discriminado nos documentos que anteriormente remetemos para V. Exas. e que aqui damos por integralmente reproduzidos.
(...)”. - cfr. fls. 271 e ss. do processo administrativo;
J) Em 02.11.2005, o Presidente da Câmara do R. proferiu “despacho”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais o seguinte: “(...)
1. O quadro de competências e o regime jurídico de funcionamento dos órgãos dos Municípios e das Freguesias estabelecido pela Lei n° 169/99, de 18 de setembro, na redação que lhe foi dada pela Lei 5-A/2002, de 11 de janeiro;
2. As competências próprias que me estão estipuladas pelo artigo 68° do preceito legal acima citado;
3. As competências da Câmara Municipal que me foram delegadas ao abrigo do n° 1 do artigo 65° conjugado com o artigo 64° da referida Lei;
4. A estrutura orgânica da Câmara Municipal ...:
Determino que:
1. Ao abrigo do disposto no n° 4 do artigo 58°, do n° 2 do artigo 65° e do artigo 69° da Lei 169/99, de 18 de setembro, na redação que lhe foi dada pela Lei 5-A/2002, de 11 de janeiro, no artigo 3° do Decreto-Lei n° 310/2002, de 18 de dezembro, e também com base no artigo 39° do Código do Procedimento Administrativo, delego ou subdelego nos senhores Vereadores todas as competências nas seguintes funções:
a) Vereador em regime de tempo inteiro e Vice-Presidente da Câmara:
Eng. «AA»
Aprovisionamento e Gestão de Equipamentos
Desporto
Mobilidade e Acessibilidade
Obras Municipais
(...)’’. - cfr. fls. 301 e ss. do processo administrativo (vol.I);
K) A petição inicial destes autos foi apresentada em juízo no dia 15.10.2018, através do «SITAF». - cfr. fls. 1 dos autos (suporte físico);
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III.2 - DO DIREITO
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11. Vem o presente recurso jurisdicional interposto do despacho saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro editado em 07.03.2023, que - concluindo que o despacho do Vice Presidente da Câmara Municipal ... de 11.12.2011 foi praticado pelo órgão competente para o efeito, consubstanciando uma clara recusa da pretensão da Autora de ser remunerada no montante de € 513.783,29 a título de indemnização pelas alegadas prorrogações legais de prazo para a conclusão da empreitada e sobreesforço -, julgou procedente a suscitada matéria excetiva de caducidade do direito de propor a presente acção, por se mostrar, com reporte à data de propositura da presente ação, já esgotado o prazo de 132 dias previsto no artigo 255º no Decreto-Lei n.º 59/99, 02.03 [RJEOP], tendo, consequentemente, absolvido o Réu da instância.
12. Com o assim decidido não se conforma a Recorrente, desde logo, por manter a firme convicção de que o despacho do Sr. Vice Presidente da Câmara Municipal ..., datado de 11.12.2011, não foi praticado pelo órgão competente para praticar atos definitivos no âmbito da execução da empreitada visada nos autos, não tendo, por isso, começado a correr o prazo e caducidade do direito de ação previsto no artigo 255º do DL 59/99.
13. Clama ainda que delegação de poderes no Sr. Vice Presidente da Câmara Municipal em matéria de “Obras Municipais” não pode ser entendida como abrangendo a competência para a prática de atos definitivos na execução do contrato de empreitada, ou, quando assim não se entenda, que nenhuma referência faz à delegação de poderes contrariamente ao que estava obrigado por lei, sendo, por isso, nulo e nenhum efeito o aludido despacho de 11.12.2011.
14. Derradeiramente, apregoa que o aludido despacho do Sr. Vice Presidente da Câmara Municipal ... jamais poderá ser interpretado como uma negação absoluta do direito da Autora, não podendo, por isso, aplicar-se-lhe a normação vertida no artigo 255º do RJEOP.
15. Apreciando.
16. É dado assente e aceite pelas partes recursivas que a presente empreitada é regida pelo DL nº 59/99, de 2/3.
17. Nos termos do artigo 255º do citado D.L. nº. 59/99, as ações sobre a interpretação, validade ou execução de contratos «(…) deverão ser propostas, quando outro prazo não esteja fixado na lei, no prazo de 132 dias contados desde a data da notificação ao empreiteiro da decisão ou deliberação do órgão competente para praticar actos definitivos, em virtude da qual seja negado algum direito ou pretensão do empreiteiro ou o dono da obra se arrogue direito que a outra parte não considere fundado (…)».
18. Como se decidiu no aresto do S.T.A., de 10.08.2003, tirado no processo nº. 0298/03: “(…) Resulta claro da norma transcrita que o prazo de caducidade do direito de acção se conta, para o empreiteiro, da notificação da decisão ou deliberação que lhe negue direito ou pretensão, praticado pelo órgão competente para a prática de actos definitivos sobre a matéria em causa. Ou seja, não basta que o órgão seja competente para a prática de certos actos, como parece estar subjacente à interpretação que é feita na sentença recorrida, mas que seja competente para a prática do específico acto ou actos de recusa das pretensões formuladas. Não faria sentido nem encontra apoio na letra nem no espírito da norma, que o prazo de caducidade se baseasse num acto praticado por órgão sem competência para a prática daquela categoria especifica de actos. Há que presumir que o legislador consagrou a solução mais acertada e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artº 9º, nº 3 do Cód. Civil) (…)”.
19. Portanto, para que se inicie a contagem do prazo de caducidade, é imperativo que o ato de indeferimento da pretensão do empreiteiro tenha sido praticado pelo órgão com competência para praticar atos definitivos em matéria de empreitadas de obras de públicas.
20. Revertendo ao caso concreto, e convocando a factualidade coligida no probatório, é inequívoco que o despacho do Sr. Vice-Presidente da Câmara Municipal ..., emanado em 11.12.2011, procurou responder à pretensão de reequilíbrio financeiro da empreitada veiculada pelo requerimento apresentado pela Recorrente em 22.11.2011, tendo considerado a mesma como sendo irrazoável e ilegalmente aceitável.
21. Porém, no caso de uma empreitada com o preço contratual de € 2.148.755,73, o órgão com competência para decidir definitivamente tal matéria é a Camara Municipal e não o seu Vice-Presidente.
22. De facto, nos termos da Lei nº. 75/2013, de 12.09, que aprovou o regime jurídico das Autarquias Locais, compete à Câmara Municipal “(…) aprovar os projetos, programas de concurso, cadernos de encargos e a adjudicação de empreitadas e aquisição de bens e serviços, cuja autorização de despesa lhe caiba (…) ” [cfr. alínea f) do nº.1 do artigo 33º].
23. Não se ignora que esta competência pode ser delegada no Presidente da Câmara [e deste para os respetivos vereadores], por força do disposto no artigo 34º da mesmo diploma legal.
24. Mas também não desconhecemos que esta competência só pode ser delegada nos termos e com o alcance supra explicitados até ao limite do montante de € 748.196,85, atento o preceituado no artigo 29º do D.L. nº. 197/99, de 08 de junho [normação repristinada pela Resolução n.º 86/2011, de 11 de abril].
25. O que nos transporta para a evidência de que a competência para decidir, desde logo, na matéria versada nos autos, no âmbito de empreitadas de obras públicas com o preço contratual acima do montante de € 748.196,85 é, claramente, pertença da órgão “Câmara Municipal”, por ser insuscetível de delegação.
26. Por conseguinte, em consonância com a lógica que se vem supra de expor, não resultando dos autos que haja sido comunicada à Recorrente qualquer decisão definitiva tomada pelo órgão competente - entenda-se, pela Câmara Municipal ... -, para praticar atos definitivos em matéria de empreitadas de obras publicas com o preço contratual de € 2.148.755,73, não se pode considerar decorrido o prazo de propositura da acção em causa, nos termos do artº 255º do citado DL nº 59/99.
27. O despacho saneador-sentença recorrido, ao concluir pela caducidade do direito de acção, violou aquele dispositivo legal, não podendo, por isso, manter-se, o que determina a prejudicialidade do conhecimento dos demais fundamentos do recurso jurisdicional interposto nos autos.
28. Consequentemente, deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, e revogada a decisão judicial recorrida, ao que se provirá no dispositivo.
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IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em CONCEDER PROVIMENTO ao recurso, e revogar o despacho saneador-sentença recorrido.
Custas pelo Recorrido.
Registe e Notifique-se.
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Porto, 14 de julho de 2023,

Ricardo de Oliveira e Sousa
Celestina Maria Galamba Caeiro Castanheira
Hélder Frazão da Costa Vieira Bonito