Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00240/12.0BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/12/2023
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:MÉTODOS INDIRECTOS;
ERRO NA QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL;
Sumário:
I. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, assente a verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabe ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).

II. No domínio de utilização de métodos indirectos o erro na quantificação da matéria tributável, as insuficiências no método são sempre substanciais, isto é, devem evidenciar um excesso de quantificação, não importando o seu quantum.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública (Recorrente) notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, a qual julgou procedente a impugnação judicial intentada por «X, Lda.» (Recorrida), contra as liquidações de IVA referentes aos períodos de Janeiro a Dezembro de 2008, no valor global de € 12.388,41, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou na parte que julgou procedente quanto às liquidações por métodos indirectos, a Impugnação apresentada por «X, Lda.», NIPC ..., contra as liquidações de liquidações de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) respeitantes aos períodos de Janeiro a Dezembro de 2008.
B. As liquidações impugnadas têm origem no procedimento de inspecção dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças ... no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI..........440.
C. A sentença recorrida concluiu “No caso dos autos, a AT dispunha de três elementos cuja credibilidade nunca foi colocada em causa: a lista dos alunos inscritos, a lista dos alunos que realizaram exame e a tabela de preços praticados pela impugnante.
D. Assim sendo, tem a impugnante razão quando afirma que teria sido possível à AT cruzar esses elementos com as facturas registadas na contabilidade e apurar o valor das prestações de serviços omitidas através do recurso à tabela de preços.
E. Esta metodologia teria permitido quantificar, sem dúvida, a matéria tributável de forma muito mais rigorosa e próxima da realidade. Já a metodologia utilizada, ao recorrer a uma percentagem média de omissão de facturação calculada a partir de uma amostra, introduz no cálculo da matéria tributável uma desnecessária dose de incerteza quanto à dimensão das omissões praticadas.
F. Adicionalmente, importa ainda referir que resultou provado que com referência a dois alunos – «AA» e «BB» – afinal existiam facturas emitidas durante o ano de 2008, pelo que a sua desconsideração necessariamente contribuiu para a sobrevalorização das omissões detectadas.
G. Em face do exposto conclui-se que as liquidações padecem, efectivamente, de excesso de quantificação, o que, concomitantemente, impõe a sua anulação.”
H. A Fazenda Pública não se conforma com o decidido, por entender que a douta decisão recorrida enferma de erro de julgamento, pelos motivos que se passam a explicar.
I. Assim, o douto Tribunal a quo, entendeu como provada a seguinte matéria, nos factos K) e L) que aqui se dão por reproduzidos.
J. Contudo com esta conclusão não pode a Fazenda Pública conformar-se pelas razões se passam a explicar.
K. No Relatório da Inspecção Tributária, nos autos, estão coligidos todos os indícios e motivos para a aplicação dos métodos indirectos e inclui o juízo crítico da análise efectuada, que aqui se dão por reproduzidos, sintetizando:
L. Falta de sustentabilidade do negócio evidenciado pela análise das demonstrações financeiras comparadas
M. Fortes Indícios da omissão do registo de serviços prestados
N. A inspecção tributária procedeu à notificação da impugnante, sendo disponibilizada por esta uma listagem de alunos inscritos em 2008;
O. Solicitou junto da ANIECA, listagem de alunos que prestaram provas durante o ano de 2008;
P. Mesmo solicitadas, não foram disponibilizadas as fichas (Modelo 2022) dos alunos, fichas que deveriam ser preenchidas e entregues no IMTT e que juntamente com a listagem da ANIECA e com a listagem da escola de condução permitiria o apuramento do numero real de alunos no ano de 2008 e respectiva facturação.
Q. O cruzamento da informação vertida nas referidas fichas modelo 22 com a informação coligida na listagem da ANIECA, permitiria apurar o verdadeiro número de alunos inscritos na escola de condução e deste modo verificar a facturação em falta real.
R. Contudo como a impugnante aqui recorrida não forneceu aos SIT as supracitadas fichas, os SIT viram-se obrigados ao cálculo da facturação em falta com recurso ao método de amostragem.
S. Assim, a partir de um teste de conformidade, a inspecção tributária verificou que não existiam facturas emitidas pela prestação de serviços para alguns alunos incluídos na listagem da ANIECA;
T. Verificou ainda, a inspecção tributária que, para alguns alunos, o valor facturado foi inferior ao valor dos preços de tabela.
U. Concluíram, quer a inspecção tributária, quer o perito da ATA e o perito independente na Comissão de Revisão, bem como na sentença proferida, que existiam indícios de que a contabilidade e as declarações não correspondiam à verdadeira situação patrimonial do sujeito passivo, ocorrendo uma impossibilidade de apurar de forma directa a verdadeira situação patrimonial da impugnante.
V. Impunha-se assim a quantificação por métodos indirectos, utilizando o método, de acordo com o artigo 90º da LGT, mais adequado à situação e aos elementos de que dispunha a inspecção tributária, (alínea i) sendo certo que se verificou, para alguns alunos que foram prestar provas, a omissão de facturas.
W. A IT, tendo por base a informação de todos os exames realizados pelos alunos da escola e os preços de tabela praticados para os serviços prestados, realizou um teste de amostragem comparando o valor dos serviços devidos pelos alunos em função da sua natureza, os preços de tabela praticados e os valores que foram facturados apurando um desvio de 70,51% entre os valores a factura e aqueles que foram facturados.
X. Entendeu a douta sentença recorrida que a AT dispunha de três elementos cuja credibilidade nunca foi colocada em causa: a lista dos alunos inscritos, a lista dos alunos que realizaram exame e a tabela de preços praticados pela impugnante.
Y. E por esse motivo considerou que a “impugnante tem razão quando afirma que teria sido possível à AT cruzar esses elementos com as facturas registadas na contabilidade e apurar o valor das prestações de serviços omitidas através do recurso à tabela de preços”.
Z. Se é certo que a inspecção tributária nunca pôs em causa a lista dos alunos da ANIECA, enquanto entidade terceira, o mesmo não sucedeu quanto à lista fornecida pela impugnante, sendo certo, recorde-se, que não obteve a listagem do IMTT, para em confronto das mesmas obter o número real de alunos no ano de 2008,
AA. Quando, o que está em causa é a omissão de valores facturados, cuja dimensão se desconhece.
BB. Por outro lado, a inspecção tributária não teve acesso aos elementos que verdadeiramente atestavam quais os alunos que frequentaram a escola em 2008, ou seja, as fichas individuais dos alunos a entregar às entidades competentes (IMTT).
CC. Ora, se a tributação por métodos indirectos pretende a aproximação ao rendimento real que, de outra forma, não foi possível apurar devido à incerteza sobre as facturas que se provou estarem omissas, bem como o seu valor e os alunos omitidos,(que podem ser mais do que o «CC», «DD», «EE», «FF», «GG» e «HH»), não se entende como pode o meritíssimo juiz a quo, validar a pretensão da impugnante sobre o método de cálculo que, a ser aplicado, seria um método directo de tributação;
DD. Ora, a utilização do método directo de tributação, no caso, foi ab initio a posição defendida pela impugnante, que sempre se opôs à aplicação da avaliação com recurso aos métodos indirectos;
EE. Contudo, a douta decisão em recurso já validou, fundamentadamente o recurso aos métodos indirectos e assim, não é pertinente e constitui, com o devido respeito, uma contradição para o Tribunal, que de forma convicta, assumiu que, no caso, não era possível o apuramento da matéria tributável por meras correcções técnicas.
FF. E de certa forma contraditório ao que é explanado na douta sentença recorrida.
GG. Ora, como tem sido entendido, de forma uniforme, pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, do ponto de vista do erro na quantificação, as insuficiências no método são sempre substanciais, isto é, devem evidenciar um excesso de quantificação.
HH. E, não é pelo facto de, no método de quantificação não se levar em conta este ou aquele item que fica demonstrado o erro na quantificação, a não ser que resulte daí ipso facto que os resultados apurados sejam excessivos.
II. Isto é, não é pelo facto de no método de quantificação não se levar em conta este ou aquele item que fica demonstrado o erro na quantificação, cabendo à ATA em caso de recurso à avaliação indirecta, dentro dos limites legais, eleger o critério que repute mais adequado à determinação da matéria tributável.
JJ. Na verdade, tendo a determinação da matéria tributável por métodos indiciários de ser feita por aproximação à realidade é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação.
KK. No caso em recurso, a ATA utilizou como tinha que utilizar, os elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência e tendo em conta as especificidades próprias da actividade do contribuinte, conduziriam com maior aproximação pela extrapolação dos factos conhecidos à aproximação da realidade que se procurava alcançar.
LL. Ora, a metodologia que foi aplicada no caso concreto, teve génese na constatação dos elementos recolhidos junto da impugnante e junto da ANIECA.
MM. Em nosso entendimento, e salvo respeito devido por diversa opinião, em nenhum momento a aqui recorrida demonstrou que os resultados apurados são excessivos, nem sequer trouxe aos autos qualquer elemento credível no sentido de colocar em causa os valores apurados pela AT ou de sustentar, com rigor, a sua tese.
NN. Contudo a douta sentença em recurso assim não o entendeu, dando como certo e verificado o excesso na quantificação, na parte em excedia um provável cálculo com base a lista dos alunos inscritos, a lista dos alunos que realizaram exame e a tabela de preços praticados pela impugnante.
OO. Nem sequer, tendo em conta, as próprias afirmações da impugnante no relatório que muitas vezes praticava preços não coincidentes com a tabela de preços, conforme pág. 7 e 10 do RIT.
PP. Os cálculos efectuados pela inspecção tributários foram ainda escrutinados e discutidos pelos peritos da ATA e impugnante em sede de pedido de revisão da matéria tributável onde ambos acordaram o valor a tributar em IVA, aceitando-se como razoável o critério aplicado no Relatório de Inspecção Tributária, se situaria em 12.388,41 euros, com base na percentagem apurada de 63,22% e emitidas liquidações de IVA com base no valor acordado pelos peritos da ATA e impugnante.
QQ. Objectivo que a aqui recorrida não demonstrou e que a douta sentença recorrida nem sequer aflorou, bastando-se com a apreciação negativa, entendendo a Fazenda Pública que estamos perante uma carência probatória, imputada aos Impugnantes, ao abrigo do ónus da prova, que jamais pode ser considerada como argumento passível de sedimentar a convicção do Tribunal na procedência da impugnação, como o fez,
RR. Do exposto se infere que a sentença recorrida, fez uma aplicação inadequada do disposto nos artigos 87º e 88º da LGT e art. 90º do CIVA, incorrendo em erro de julgamento pelo que deverá ser revogada.
Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.»

1.2. A Recorrida «X, Lda.», notificada da apresentação do presente recurso, apresentou contra-alegações, que concluiu do seguinte modo:
«1. Em suma e em face de todo que foi anteriormente exposto, podemos concluir que:
a) A Recorrente vem, em suma, invocar o (alegado) erro de julgamento do Tribunal a quo quanto à interpretação de que a AT incorreu em excesso de quantificação da matéria tributável por não ter optado pelo método mais adequado e racionalmente justificado ao apuramento da matéria coletável em causa;
b) A Fazenda Pública alega que do ponto de vista do erro na quantificação, as insuficiências no método utilizado para apurar a matéria coletável com recurso a métodos indiretos são sempre substanciais, isto é, devem evidenciar um excesso de quantificação;
c) O contribuinte pode demonstrar que há excesso de quantificação da matéria coletável através da prova de que o critério escolhido pela AT é inadequado;
d) No caso concreto, o Tribunal a quo concluiu categoricamente que a AT dispunha de três elementos cuja credibilidade nunca foi colocada em causa e a Recorrida tem razão quando afirma que teria sido possível à AT cruzar esses elementos com as faturas registadas na contabilidade e apurar o valor das prestações de serviços omitidas através do recurso à tabela de preços;
e) O critério alternativo proposto pela Recorrida – o cruzamento da lista dos alunos inscritos, a lista dos alunos que realizaram exame e as faturas registadas na contabilidade – teria permitido o apuramento do valor das prestações de serviços alegadamente omitidas através do recurso à tabela dos preços praticados pela Recorrida;
f) Consequentemente, a matéria coletável teria sido fixada num montante muito mais aproximado da realidade;
g) O critério utilizado pela AT baseou-se na média de faturação alegadamente omitida, calculada a partir de uma amostra;
h) O critério utilizado pela AT confere, assim, um elevado grau de incerteza sobre a dimensão das alegadas omissões de faturação;
i) Esta constatação é por demais evidente se tivermos em conta que relativamente a pelo menos dois dos alunos existiam faturas emitidas pela Recorrida no ano de 2018 que não foram consideradas pela AT, o que sobrevalorizou necessária e diretamente o valor total das alegadas omissões detetadas por referência à média da faturação alegadamente em falta;
j) A AT não escolheu o método mais adequado e razoável para o apuramento da matéria coletável;
k) Tendo a Recorrida evidenciado que o critério utilizado pela AT não é o mais apropriado e razoável e que o critério por si sugerido é mais credível e adequando para o apuramento da quantificação da matéria coletável, podemos concluir que a sentença do Tribunal a quo deverá manter-se;
l) As liquidações em apreço padecem de excesso de quantificação da matéria coletável, devendo, consequentemente, ser anuladas.
Pedido:
Nestes termos e nos demais que Vs. Exas. doutamente suprirão, deve o recurso interposto pela Fazenda Pública ser julgado totalmente improcedente e, consequentemente, a sentença aqui em apreço deve ser mantida. Pois, só assim se fará inteira e sã
JUSTIÇA!»

1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 670 SITAF, no sentido da procedência do recurso, no qual conclui:
«A Fazenda Pública vem interpor recuso da sentença do Mmº Juiz do TAF de Penafiel, datada de 30/01/2023 (fls. 578/618 do SITAF), que julgou procedente a impugnação apresentada pela impugnante “«X, Lda.»”, e que incidiu sobre as liquidações de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) respeitantes aos períodos de Janeiro a Dezembro de 2008, apuradas mediante métodos indirectos, e que tiveram origem num procedimento de inspecção dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto.
Invocou a impugnante:
– Erro manifesto nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos, dizendo que o Relatório de Inspecção Tributária (RIT) não está devidamente fundamentado e que da sua leitura não se consegue vislumbrar um só dos pressupostos e das condições capazes de legitimar o recurso a métodos indirectos de tributação
e
– Errónea qualificação e quantificação da matéria tributável, peticionando a manutenção dos valores contabilizados e declarados por si.
Na sentença recorrida, sendo julgada totalmente procedente a impugnação apresentada pelos impugnantes, foi determinada a anulação das liquidações de IVA na parte em que as mesmas resultaram do recurso a métodos indirectos.
*
É jurisprudência pacífica que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas pelos recorrentes das respectivas alegações.
*
A impugnante apresentou contra-alegações, nas quais defendeu que a sentença recorrida não merece qualquer censura, e que o recurso da AT deve ser julgado improcedente.
*
Alega a recorrente / Fazenda Pública, que a sentença incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, por errónea valoração dos factos levados ao probatório e errónea interpretação e aplicação do direito aplicável, mais concretamente do disposto nos artigos 87º e 88º da LGT e art. 90º do CIVA, tudo conforme melhor descreve nos pontos conclusivos das alegações de recurso apresentado, e para os quais apontamos e damos por reproduzidos, e nos quais se destacam os seguintes pontos:
...
“KK. No caso em recurso, a ATA utilizou como tinha que utilizar, os elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência e tendo em conta as especificidades próprias da actividade do contribuinte, conduziriam com maior aproximação pela extrapolação dos factos conhecidos à aproximação da realidade que se procurava alcançar.
LL. Ora, a metodologia que foi aplicada no caso concreto, teve génese na constatação dos elementos recolhidos junto da impugnante e junto da ANIECA.
MM. Em nosso entendimento, e salvo respeito devido por diversa opinião, em nenhum momento a aqui recorrida demonstrou que os resultados apurados são excessivos, nem sequer trouxe aos autos qualquer elemento credível no sentido de colocar em causa os valores apurados pela AT ou de sustentar, com rigor, a sua tese.
NN. Contudo a douta sentença em recurso assim não o entendeu, dando como certo e verificado o excesso na quantificação, na parte em excedia um provável cálculo com base a lista dos alunos inscritos, a lista dos alunos que realizaram exame e a tabela de preços praticados pela impugnante.
OO. Nem sequer, tendo em conta, as próprias afirmações da impugnante no relatório que muitas vezes praticava preços não coincidentes com a tabela de preços, conforme pág. 7 e 10 do RIT.
PP. Os cálculos efectuados pela inspecção tributários foram ainda escrutinados e discutidos pelos peritos da ATA e impugnante em sede de pedido de revisão da matéria tributável onde ambos acordaram o valor a tributar em IVA, aceitando-se como razoável o critério aplicado no Relatório de Inspecção Tributária, se situaria em 12.388,41 euros, com base na percentagem apurada de 63,22% e emitidas liquidações de IVA com base no valor acordado pelos peritos da ATA e impugnante.
QQ. Objectivo que a aqui recorrida não demonstrou e que a douta sentença recorrida nem sequer aflorou, bastando-se com a apreciação negativa, entendendo a Fazenda Pública que estamos perante uma carência probatória, imputada aos Impugnantes, ao abrigo do ónus da prova, que jamais pode ser considerada como argumento passível de sedimentar a convicção do Tribunal na procedência da impugnação, como o fez,
RR. Do exposto se infere que a sentença recorrida, fez uma aplicação inadequada do disposto nos artigos 87º e 88º da LGT e art. 90º do CIVA, incorrendo em erro de julgamento pelo que deverá ser revogada”.
Cremos que assiste razão à recorrente, a cujos fundamentos aderimos.
Damos por reproduzido o Parecer proferido pelo Ministério Público na 1ª Instância, com data de 23/02/2015 (fls. 522/527 do SITAF), o qual acompanhamos na íntegra, e que foi no sentido de improcedência da impugnação.
É nosso parecer que o recurso merece provimento.»

1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir: como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: artigo 639°, n°1, do Código de Processo Civil) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso. Assim sendo, as questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, cinge-se a saber se o Tribunal a quo errou na valoração dos factos ao considerar que o critério de determinação utilizado não era o mais adequado e padecia de excesso de quantificação, uma vez que a impugnação no mais foi julgada improcedente, nomeadamente na parte em que vinha posto em causa o recurso a métodos indirectos, o qual foi considerado legítimo.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1.ª instância e respectiva fundamentação:
«Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
A) A impugnante foi submetida, ao abrigo da ordem de serviço nº OI..........440, a um procedimento inspectivo externo de âmbito geral relativo ao exercício de 2008, tendo a mencionada ordem de serviço sido assinada pelo gerente da impugnante no dia 18-11-2010 (cfr. fls. 30 do PA apenso aos autos);
B) Em 14-12-2010 os SIT notificaram a impugnante para, no dia 05-01-2011, exibir por escrito os seguintes elementos relativos ao ano de 2008:
1. Explicação do motivo pelo qual, não foram discriminados os serviços prestados, que consideraram isentos de Iva, nas facturas emitidas e, apresentação de uma relação desses serviços com os valores cobrados por cada um.
2. Nos casos de reprovações, informar qual o valor cobrado por cada tipo de carta em conformidade com a legislação vigente e de que forma o mesmo é debitado aos alunos.
3. Modelos 2022 (ficha individual dos alunos), ou contas correntes e facturas relativas aos serviços prestados aos alunos indicados no quadro a seguir apresentado:
InscriçãoCódigoNome do AlunoCategoria
02-01-200808/0001«CC»AP
15-01-200808/0006«DD»CE
21-01-200808/0011«II»B
25-01-200808/0016«EE»CE
12-02-200808/0026«JJ»B
27-02-200808/0036«KK»B
18-03-200808/0052«LL»C
16-04-200808/0069«AA»C
22-04-200808/0074«MM»B
03-06-200808/0094«HH»C
12-06-200808/0099«NN»B
24-06-200808/0105«BB»C
30-06-200808/0111«FF»AP
01-07-200808/0116«OO»B
09-07-200808/0122«PP»B
11-07-200808/0128«QQ»B
24-07-200808/0149«RR»ALB
01-08-200808/0161«SS»B
14-08-200808/0172«TT»C
20-08-200808/0176«UU»B
22-08-200808/0181«VV»CE
28-08-200808/0186Eva Maria da Costa LoureiroB
04-09-200808/0194«WW»B
09-09-200808/0204«XX»CE
11-09-200808/0209«YY»B
30-09-200808/0222«ZZ»B
03-10-200808/0232«AAA»C
09-10-200808/0237«HH»APCE
17-10-200808/0242«BBB»C
23-10-200808/0247«CCC»C
18-11-200808/0263«DDD»B
(cfr. fls. 52-53 do PA apenso aos autos);
C) Na sequência do referido na alínea anterior, a impugnante remeteu a seguinte resposta aos SIT:
Dando satisfação ao solicitado:
– Os valores isentos não são serviços prestados, referem-se ás taxas de conta dos alunos entregues por estes para serem entregues junto da ANIECA e IMTT;
– Os valores cobrados aos alunos pelo ensino com vista à obtenção da carta de condução, são facturados através de Factura/Recibo não sendo cobrado valor adicional em caso de reprovação;
– O modelo 2022 é preenchido quando o aluno frequenta a escola e é entregue às entidades competentes.
Os serviços prestados são facturados por Factura/Recibo e consequentemente o seu registo não obriga nos termos da legislação contabilística e fiscal ao registo em conta corrente.
Todas as Facturas/Recibo constam da contabilidade e já foram colocadas à disposição.
(cfr. fls. 54 do PA apenso aos autos);
D) Na sequência do referido na alínea anterior, em 12-01-2011 os SIT notificaram a impugnante para, no dia 19-01-2011, apresentar as facturas/recibos correspondentes aos alunos indicados no quadro do ponto 3 da notificação referida na alínea B), nos seguintes termos:
Em referência à notificação efectuada em catorze de Dezembro do ano de dois mil e dez e tendo em conta a resposta apresentada por escrito em cinco de Janeiro de dois mil e onze ao que nela foi solicitado, notifica-se (...) para apresentar (...) as facturas/recibo correspondentes aos alunos indicados no quadro do ponto 3 (...) dado que embora esteja escrito na resposta apresentada, que “Todas as Facturas/Recibo constam da contabilidade e já foram colocadas à disposição”, o que sucedeu no decorrer do procedimento, relativamente aos alunos identificados no quadro atrás referido e que abaixo se apresenta, foi que ou não foram identificadas as facturas correspondentes, ou o seu valor é inferior ao dos serviços tabelados e que lhe foram prestados, derivado do facto de não ter sido possível efectuar o controle inequívoco, uma vez que não nos foram exibidas as contas correntes ou as fichas individuais dos alunos (modelo 2022).
(cfr. fls. 55-56 do PA apenso aos autos);
E) Na sequência do referido na alínea anterior, a impugnante remeteu a seguinte resposta aos SIT:
Em resposta à vossa notificação temos a dizer que já foi dada a resposta ao pedido formulado, visto que é do mesmo teor da notificação anterior.
O técnico Dr. «EEE» acrescenta que, existem diferenças com valores facturados inferiores aos tabelados e que não foram emitidas Facturas/Recibo não identificando os respectivos clientes. Temos a referir que o preço que consta na tabela não é um valor fixo dependendo do cliente e de várias razões pode realmente ser cobrado um valor inferior à tabela.
(cfr. fls. 57 do PA apenso aos autos);
F) Tendo sido notificada para se pronunciar sobre o projecto de RIT, a impugnante apresentou, em 17-02-2011, um requerimento de cujo teor se destaca o seguinte:
«X, Lda.» (...) tendo sido notificada do Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, para o exercício do direito de audição, vem ao abrigo do disposto no artigo 37º do CPPT, requerer a notificação ou a passagem de certidão da fundamentação legalmente exigida, por ter sido omissa no referido projecto, designadamente: (...)
– a listagem de todos os alunos inscritos na escola no ano de 2008 mencionada na folha 6 do Projecto, que se alega ter sido entregue por esta empresa (ponto 2 capitulo IV);
– a lista com a identificação dos alunos que prestaram provas de exame fornecida pela ANIECA, a que se faz referência na folha 6 (ponto 2 capitulo IV);
– o teste de conformidade das facturas processadas e contabilizadas a que se faz referência na folha 6 (Ponto 2 capitulo IV);
– o teste que se diz ter abrangido o universo dos alunos, a que se faz referência na folha 10 capitulo V.
Relativamente ao anexo E, que faz parte da fundamentação, para que seja entendível solicita-se que também seja notificado o nome dos alunos e o nº das facturas a que se refere o anexo.
(cfr. documento nº 29 junto aos autos com a p.i.);
G) Na sequência do referido na alínea anterior, foi remetida à impugnante uma comunicação de cujo teor se destaca o seguinte:
Assim, passa-se à apresentação dos elementos solicitados, pela ordem do pedido: (...)
3. Listagem de todos os alunos inscritos na escola no ano de 2008 mencionada na folha 6 do Projecto.
Como referido no projecto a listagem foi fornecida nos escritórios do sujeito passivo, folhas anexas nº 3 a 7.
4. Lista com a identificação dos alunos que prestaram provas de exame fornecidas pela ANIECA.
A lista fornecida pela ANIECA é a das folhas anexas nº 8 a 12
5. Teste de conformidade das facturas processadas e contabilizadas
O teste de conformidade referido e explicado nas folhas 6 e 7, corresponde ao mapa do anexo E.
6. Teste que se diz ter abrangido o universo dos alunos
O teste referido abrangeu o universo dos alunos, sendo a selecção realizada por amostragem, da forma referida nas folhas 6 e 7 do projecto de relatório.
7. Identificação dos alunos e numero das facturas do Anexo E
O nome dos alunos consta da citada lista de inscrição fornecida pelo sujeito passivo e é o correspondente a cada numero de registo, ou numero de código, sendo que os números das facturas já constam do citado Anexo, no qual os elementos a elas relativos são apresentados nas colunas, com a seguinte sequência: numero, data, valor do serviço sem Iva, Iva e total.
(cfr. documento nº 30 junto aos autos com a p.i.);
H) As “folhas anexas nº 3 a 7” (lista de alunos inscritos) referidas na comunicação transcrita sob a alínea G) têm o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]



(cfr. documento nº 30 junto aos autos com a p.i.);
I) As “folhas anexas nº 8 a 12” (lista fornecida pela ANIECA) referidas na comunicação transcrita sob a alínea G) apresentam o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


(cfr. documento nº 30 junto aos autos com a p.i.);
J) Apesar da comunicação referida na alínea anterior, bem como as respectivas “folhas anexas”, ter sido recebida pela impugnante, esta não se pronunciou relativamente ao projecto de RIT (facto não controvertido);
K) Na sequência da realização do procedimento inspectivo referido na alínea A) foi elaborado, com data de 12-04-2011, o respectivo RIT, tendo-se aí concluído pela necessidade de proceder a correcções em sede de IVA com base nos fundamentos de facto e de direito descritos nesse documento, de cujo teor se destaca o seguinte:
III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MÉRAMENTE ARITMÉTICAS Á MATÉRIA TRIBUTÁVEL
Nas facturas que emitiu, o sujeito passivo não procedeu à liquidação de Iva sobre o valor de parte dos serviços facturados, mas não os discriminou, escrevendo nelas apenas a palavra isento e o valor. (...)
Tem-se, assim, que tanto a legislação existente, como a doutrina já produzida, estabelecem procedimentos distintos, dos seguidos pelo sujeito passivo em ordem à exclusão da tributação em Iva dos referidos encargos, pelo que nessa conformidade não há lugar à isenção de Iva sobre os referidos valores, sendo o imposto a liquidar por períodos de harmonia com o exigido pelo art. 1º, alínea a) do código do Iva o valor apurado no quadro seguinte:
(valores em euros)
PeríodosBaseTaxa deImposto
De impostoTributávelImpostoEm falta
Jan-08952,5121%200,03
Fev-081275,7621%267,91
Mar-081458,7921%306,35
Abr-081367,6121%287,20
Mai-08637,6621%133,91
Jun-081285,2621%269,90
Jul-083038,8520%607,77
Ago-081588,4320%317,69
Set-081922,6320%384,53
Out-081181,9420%236,39
Nov-08617,7920%123,56
Dez-08556,8720%111,37
Total15884,1 3.246,61
O total do imposto em falta ascende € 3 246,61.
IV – MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS
O fundamento para a determinação da matéria tributável por métodos indirectos, assenta no descrito nos pontos seguintes:
1 – Falta de sustentabilidade do negócio evidenciado pela análise das demonstrações financeiras comparadas
A evolução dos resultados directos de exploração no triénio 2006/2008 foi a apresentada no quadro seguinte:
(valores em euros)
RUBRICAS200620072008
Proveitos de exploração:
Prestação de serviços100622,5995648,3895869,42
1 -Total de proveitos de exploração100622,5995648,3895869,42
Custos directos exploração:
Fornecimentos Ser. Externos86899,7178184,0462972,56
Custos c/pessoal76353,6379860,5560285,07
Amortizações do exercício16003,4819049,8716658,01
2 – Total de custos exploração179256,82177094,46139915,64
(3=1-2) – Resultado de exploração-78634,23-81446,08-44046,22
Os resultados apurados no quadro anterior mostram, que as prestações de serviços foram em todos os anos insuficientes para a cobertura dos correspondentes custos directos de exploração.
Atentando, agora na evolução dos resultados fiscais e na sua aplicação no mesmo triénio, tem-se de acordo com as mesmas demonstrações financeiras, o seguinte:
(valores em euros)
RUBRICAS200620072008
Resultados fiscais-38463,28-107302,59-64179,29
Resultados transitados-250625,02-289952,22-398973,31
Prestações suplementares265000395000445000
O quadro anterior mostra o apuramento sucessivo de prejuízos fiscais, com o consequente aumento do valor do saldo devedor da conta de resultados transitados e a resultante diminuição do capital próprio da sociedade, atenuada pela realização de prestações suplementares.
Tem-se assim, em conformidade com o exposto nos quadros anteriores, que o negócio se mostra inviável, sendo a actividade assegurada pela realização de prestações suplementares, o que em termos económicos não se nos afigura plausível.
2. Fortes Indícios da omissão do registo de serviços prestados
A nosso pedido o sujeito passivo forneceu uma listagem de todos os alunos inscritos na escola no ano de 2008.
Verificou-se, no decorrer do procedimento, que os alunos propostos a exames teóricos e práticos pela escola, se submeteram a provas nas instalações da ANIECA – Associação Nacional dos Industriais das Escolas de Condução sitas em ....
Solicitou-se então, àquela associação o envio da lista com a identificação dos alunos que nela prestaram
provas durante o ano de 2008, com os resultados que obtiveram, que foi prontamente fornecida.
Assim, com os elementos atrás recolhidos efectuou-se um teste de conformidade, das facturas processadas e contabilizadas, o qual consistiu no seguinte: seleccionaram-se alunos constantes da listagem de inscrição, começando no primeiro e seguindo a ordem cronológica de inscrição, com intervalos de cinco, verificando de seguida, se realizaram exames e em caso positivo, procurando a factura correspondente. A facturação é de processamento manual. O sujeito passivo não exibiu contas correntes, nem as fichas modelos 2022 dos alunos (exigidas pelo IMTT), pelo que para identificar as facturas correspondentes aos alunos seleccionados foi necessário efectuar o seu manuseamento.
Porém, nesse manuseamento, não se conseguiram identificar as facturas correspondentes à prestação de serviços, que de acordo com a listagem de exames fornecida pela ANIECA, foram prestados aos alunos constantes do quadro a seguir apresentado:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Refira-se ainda, que para além destes casos em que não foram identificadas facturas, houve outros em que o valor facturado foi inferior ao que, em face dos preços de tabela praticados para os serviços prestados, se mostrava devido.
Perante tal situação, procedeu-se no dia 14 de Dezembro do ano de 2010, à notificação da firma na pessoa da sócia-gerente para, exibir em 5 de Janeiro de 2011: (...)
Em resposta ao pedido na notificação, foi exibido em 5 de Janeiro de 2011 um documento escrito, Anexo B, em que se afirma o seguinte: “O modelo 2022 é preenchido quando o aluno frequenta a escola e é entregue às entidades competentes. Os serviços prestados são facturados por Factura/Recibo e consequente o seu registo não obriga nos termos da legislação contabilística e fiscal ao registo em conta corrente.
Todas as Facturas/Recibo constam da contabilidade e já foram colocadas à disposição”.
Perante esta resposta, notificou-se de novo a referida sócia-gerente, Anexo C, para no dia 19 de Janeiro de 2011, apresentar por escrito o numero das facturas correspondentes aos alunos indicados no ponto 3 da notificação efectuada em 14 de Dezembro de 2010.
Em resposta foi na data marcada na segunda notificação, apresentado um documento onde se refere: “Em resposta à vossa notificação temos a dizer que já foi dada resposta ao pedido formulado, visto que é do mesmo teor da notificação anterior”, anexo D.
3. Conclusão
Pelos elementos expostos no ponto 1, concluiu-se pela não sustentabilidade do negócio.
Porém, do exposto no ponto 2 infere-se, que existem fortes indícios de que a contabilidade não reflecte todas as operações realizadas no exercício, como o exige o nº 3 do art. 17º do código do IRC, em ordem a permitir o controle do resultado fiscal apurado.
Acresce ainda, que conforme ficou patente no mesmo ponto o sujeito passivo, embora convidado nos temos do previsto no art. 59º da Lei Geral Tributária a contribuir para o apuramento da verdade fiscal, tendo em conta a organização contabilística que possui, não prestou a colaboração solicitada.
Em face do atrás exposto, existem evidências de que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial do sujeito passivo, carecendo por esse facto as demonstrações financeiras da presunção de verdade referida no nº 1 do art. 75º da Lei Geral Tributária, devido aos indícios recolhidos da omissão do registo de proveitos, conforme previsto na alínea a) do nº 2 do mesmo artigo.
Assim, procede-se à determinação da matéria tributável de IRC por métodos indirectos por se verificar, a impossibilidade da sua comprovação e quantificação directa e exacta, como está previsto na alínea b) do art. 87º da Lei Geral Tributária, por insuficiência de elementos contabilísticos, como estipula a alínea a) do art. 88º do mesmo diploma legal, por remissão do previsto no nº 1 do art. 57º do código do IRC.
Vaie-se igualmente proceder à determinação do IVA em falta no ano de 2008, por métodos indirectos, de conformidade com os artigos 87º a 88º da Lei Geral Tributária atrás referidos por remissão do previsto no nº 1 do art. 90º do código do Imposto sobre o Valor Acrescentado.
(cfr. fls. 59-75 do PA apenso aos autos);
L) O método de cálculo do montante de IVA considerado em falta pelos SIT, na parte relativa aos métodos indirectos, encontra-se descrito no capítulo V do RIT, de cujo teor se destaca o seguinte:
V – CRITÉRIOS E CALCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS
O nº 1 do art.90º da Lei Geral Tributária, sugere vários critérios a ter em conta na determinação da matéria tributável de IRC por métodos indirectos, no caso se verificar a impossibilidade da sua comprovação e quantificação directa e exacta.
Um deles é o da alínea i), que prevê o cálculo de acordo com: “a existência de uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte.”
Ora entre os factos apurados, tem-se a informação de todos os exames realizados por alunos da escola, bem como os preços de tabela praticados para todos os tipos de serviços prestados e as facturas emitidas durante o ano.
Com base nestas três categorias de elementos realizou-se um teste por amostragem de comparação do valor dos serviços devidos pelos alunos, em função da sua natureza e preços de tabela praticados e os valores que foram facturados.
Esse teste abrangeu o universo dos alunos inscritos no ano de 2008 e gerou três tipos de resultados, a saber: falta de emissão de factura, emissão por um valor inferior ao dos preços de tabela e emissão pelo valor dos preços tabelados.
A soma das diferenças obtidas para cada caso, constitui o desvio de amostragem entre os valores a facturar e aqueles, que foram facturados e é de acordo com o Anexo E, em percentagem do valor facturado de, 70,51%.
Assim, extrapolando o desvio da amostra para o universo total, tem-se o seguinte valor de serviços omitidos à contabilidade e corrigidos do ano:
(valores em euros)
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
DeclaradosCoef. CorrecçãoCorrecçãoCorrigidos
(1)(2)(3 = 1 x 2)(4 = 1 + 3)
95869,420,705167597,53163466,95
A correcção a efectuar ao valor dos serviços declarados é de € 67 597,53, sendo o valor dos serviços corrigidos de € 163 466,95.
As consequências em sede de IRC e de IVA, resultantes da correcção do valor dos serviços prestados, são as seguintes: (...)
IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO
O valor a tributar em Iva é o da correcção dos serviços atrás calculado, distribuindo-se o imposto em falta por períodos, de acordo com a estrutura dos serviços já tributados, conforme quadro seguinte:
(valores em euros)
PeríodosBase tributávelTaxa deImposto
deTributadaPeso relativoA tributarImpostoem falta
Imposto(1)%(2)(3)(4=2x3)
Jan-085132,040,064055,8521%851,73
Fev-086874,520,096083,7821%1277,59
Mar-087730,520,16759,7521%1419,55
Abr-0866670,085407,8021%1135,64
Mai-082729,570,032027,9321%425,86
Jun-086704,90,085407,8021%1135,64
Jul-0814202,70,1812167,5620%2433,51
Ago-088558,90,117435,7320%1487,14
Set-088948,750,117435,7320%1487,14
Out-086833,250,096083,7820%1216,75
Nov-083041,40,042703,9020%540,78
Dez-0825900,032027,9220%405,58
Total80013,6167597,53 13816,91
O total do imposto em falta por aplicação de métodos indirectos ascende a € 13 816,91.
(cfr. fls. 59-75 do PA apenso aos autos);
M) O “Anexo E” referido no RIT apresenta o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(cfr. fls. 114 e 163 do suporte físico dos autos);
N) Por requerimento de 20-05-2011 a impugnante pediu, ao abrigo do disposto no art.º 91º da Lei Geral Tributária (LGT), que fosse instaurado o procedimento de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, tendo também solicitado a nomeação de perito independente (cfr. documento nº 26 junto aos autos com a p.i.);
O) O perito indicado pela Autoridade Tributária e Aduaneira considerou que a aplicação de métodos indirectos se afigurava correcta, mas considerou que a matéria tributável deveria ser corrigida, nos termos e com os fundamentos que constam do respectivo parecer de 03-10-2011, de cujo teor se destaca o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(cfr. fls. 94-97 do PA apenso aos autos);
P) O perito independente considerou que a aplicação de métodos indirectos se afigurava correcta, mas considerou que a matéria tributável deveria ser corrigida, nos termos e com os fundamentos que constam do respectivo parecer de 06-10-2011, de cujo teor se destaca o seguinte:
A aplicação de métodos indirectos parece correcta porquanto o Contribuinte não forneceu ao Inspector Tributário as facturas que lhe foram solicitadas oportunamente através das notificações de 14 de Dezembro de 2010 e de 12 de Janeiro de 2011. No que às facturas respeita, o contribuinte respondeu por carta de forma sucinta e evasiva, sendo que quanto à 1ª notificação informou “todas as facturas/recibo constam da contabilidade e já foram colocadas à disposição”, e no que concerne à 2ª referiu apenas “...já foi dada resposta ao pedido formulado, visto que é do mesmo teor da notificação anterior”.
Resulta claro que perante ausência das facturas, supostamente não encontradas nas pastas da contabilidade durante o trabalho de campo, solicitadas posteriormente ao contribuinte e por este não disponibilizadas, que há indícios de omissão contabilística de rendimentos, situação que impossibilita a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (alínea b) do art.º 87º da LGT) por ausência de elementos contabilísticos (alínea b) do art.º 88º da LGT), e consequentemente motiva a aplicação de métodos indirectos na determinação da matéria colectável e na quantificação do valor do IVA por liquidar.
Verifica-se que o anexo E, que resume o resultado do teste de amostragem realizado pela Inspecção Tributária, inclui dados respeitantes a exames realizados já em 2009. Nada sendo referido, quer no Relatório da Inspecção Tributária quer no Pedido de Revisão deduzido pelo Contribuinte, quanto ao momento da facturação, ajuíza-se como mais lógico que o seu valor mais representativo seja processado em data mais próxima da do exame. Por essa razão entende-se que os dados da amostragem relativos aos exames realizados em 2009 deveriam ser excluídos do cálculo das diferenças em valor e percentagem, resultando, nessa conformidade, a sua redução para 4.792,76 euros e 63,22%, respectivamente.
Extrapolando as diferenças corrigidas de amostragem para o universo, conclui-se que haveria lugar a uma correcção de 60.608,65 ao valor dos serviços prestados (95.869,42€*0,6322), pelo que o total dos serviços após correcção ascenderia a 156.478,07 euros.
Consequentemente, o IRC corrigido corresponderia a um prejuízo tributável de 3.570,64 euros (­64.179,29€+60.608,65€), enquanto que o valor a tributar em IVA, aceitando-se como razoável o critério aplicado no Relatório de Inspecção Tributária, se situaria em 12.388,41 euros.
(cfr. fls. 92-93 do PA apenso aos autos);
Q) O perito indicado pela impugnante considerou que não estavam reunidos os pressupostos legais de que depende a aplicação de métodos indirectos, nos termos e com os fundamentos que constam do respectivo parecer de 07-10-2011, de cujo teor se destaca o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(cfr. fls. 89-91 do PA apenso aos autos);
R) Por não ter sido alcançado um acordo entre os peritos, em 13-10-2011 o órgão competente para o efeito proferiu a decisão de fixação da matéria tributável, de cujo teor se destaca o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(cfr. fls. 98-102 do PA apenso aos autos);
S) Em 01-11-2011 foram emitidas, com fundamento no RIT referido na alínea K) (na parte relativa às correcções meramente aritméticas) e na decisão referida na alínea anterior (na parte relativa aos métodos indirectos), as liquidações de IVA identificadas na tabela infra:
Nº da liquidaçãoQuantia total (€)Quantia decorrente do recurso a métodos indirectos (€)PeríodoData limite de
pagamento
...12963,69763,6701/200831-12-2011
...141.413,411.145,5002/200831-12-2011
...161.579,131.272,7803/200831-12-2011
...181.305,421.018,2304/200831-12-2011
...20515,74381,8405/200831-12-2011
...221.288,121.018,2206/200831-12-2011
...242.784,112.181,9107/200831-12-2011
...261.651,081.333,3908/200831-12-2011
...281.717,921.333,3909/200831-12-2011
...301.327,351.090,9610/200831-12-2011
...32608,43484,8711/200831-12-2011
...34475,02363,6512/200831-12-2011
(cfr. documentos nºs 2 a 25 juntos aos autos com a p.i.);
Mais se provou o seguinte:
T) A impugnante emitiu, com referência aos alunos identificados no quadro constante do RIT supratranscrito na alínea K) (capítulo IV [“motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos”], ponto 2 [“fortes indícios da omissão do registo de serviços prestados”]), as facturas discriminadas no quadro infra:
Nome do alunoNº da facturaData da facturaValor total da factura (incluindo IVA)
«CC»241331-12-2010154,93 €
«DD»241431-12-2010251,61 €
«EE»241531-12-2010251,61 €
«AA»9372008Ilegível
1000
«BB»114930-07-2008377,00 €
«FF»241631-12-2010154,93 €
«GG»241731-12-2010251,61 €
«HH»241931-12-2010154,93 €
(cfr. documentos nºs 53, 61, 73 (verso), 77, 105, 107, 129, 157 e 160 juntos aos autos com a p.i. e prova testemunhal).
*
FACTOS NÃO PROVADOS
Não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão da causa, atenta a causa de pedir.
*
MOTIVAÇÃO
A matéria de facto dada como provada foi a considerada relevante para a decisão da causa e resultou das posições assumidas pelas partes nos respectivos articulados e da análise crítica do teor dos documentos juntos aos autos e constantes do processo administrativo (PA), conforme discriminado em cada alínea do probatório, os quais não foram impugnados e que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do Tribunal.
Quanto à prova testemunhal, por se terem revelado isentos e coerentes, o Tribunal valorou os depoimentos de «FFF» (técnico oficial de contas da impugnante à data da inspecção) e de «GGG» (funcionário da impugnante desde 1989) para prova, em conjugação com a prova documental, do facto T).
A restante matéria alegada não foi julgada provada ou não provada por não ter relevância para a decisão da causa ou por não ser susceptível de prova, por se tratar de considerações pessoais ou de conclusões de facto ou de direito.»
2.2. De direito
A Recorrente (Fazenda Pública), como resulta do relatório deste acórdão, vem imputar à sentença recorrida erro de julgamento, partindo, no essencial da seguinte premissa: estando comprovado que se verificavam os pressupostos legitimadores de recurso a métodos indiciários a anulação da liquidação só podia fundar-se na prova inequívoca de que existiu erro ou excesso na quantificação, por errónea valoração dos factos levados ao probatório e errónea interpretação e aplicação do direito aplicável, ao abrigo do ónus da prova e do disposto nos artigos 87º e 88º da LGT e artigo 90º do CIVA [cfr. conclusões KK. a RR. das alegações de recurso].
Concretizando, argumenta que a Recorrida em nenhum momento “demonstrou que os resultados apurados são excessivos, nem sequer trouxe aos autos qualquer elemento credível no sentido de colocar em causa os valores apurados pela AT ou de sustentar, com rigor, a sua tese.”, incorrendo em erro a sentença ao dar “como certo e verificado o excesso na quantificação, na parte em excedia um provável cálculo com base a lista dos alunos inscritos, a lista dos alunos que realizaram exame e a tabela de preços praticados pela impugnante.” [cfr. conclusões NN. e PP.) das alegações de recurso], impunha-se que o Tribunal tivesse mantido na ordem jurídica a liquidação impugnada.
Em causa, nos presentes autos, está uma liquidação adicional de IVA que tem subjacente correcções técnicas e por aplicação de métodos indirectos levadas a cabo pela Administração Tributária e Aduaneira com referência ao exercício de 2008. Na sentença recorrida, o Juiz do Tribunal a quo, após ter delimitado o objecto da acção, enfrentou o tratamento de todas as questões que eram suscitadas em sede de p.i., relevando nesta sede, a conclusão nela expressa, pela legalidade do recurso à aplicação dos métodos indirectos e pela ilegalidade da liquidação por ser desadequado o critério utilizado na determinação da matéria tributável e padecer de excesso de quantificação.
Não obstante a decisão, na parte em que julgou legítimo o recurso aos métodos indirectos não venha questionada em sede de recurso, importa realçar em que termos é que a mesma ficou definida, isto é, em que elementos de facto e de direito se baseou, uma vez que, os elementos ali plasmados relevam para uma cabal percepção do critério de quantificação e da decisão em que assenta o raciocínio que acompanha o presente recurso, transcrevendo-se, por isso, aqui o discurso fundamentador da sentença no segmento relevante:
«(...) No que se refere ao primeiro momento de análise indicado – verificação dos pressupostos de que depende o recurso à avaliação segundo métodos indirectos interessa analisar a actuação da AT com vista à validação ou invalidação dos dados disponibilizados pelo sujeito passivo, incluindo a avaliação da quali­dade das omissões ou incorrecções verificadas, do ponto de vista da sua importância ou extensão, e a avaliação da credibilidade da escrita face a tais omissões ou incorrecções e, consequentemente, da sua capacidade de transmitir ou emanar a verdade fiscal daquele contribuinte.
Definido o regime legal aplicável, analisemos agora o caso concreto.
Como já se disse, a AT fundou a sua actuação nos art.ºs 87º, nº 1, al. b) e 88º, al. a), ambos da LGT, ou seja, a AT considerou estar perante uma situação de “impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável” (art.º 87º, nº 1, al. b), da LGT), em resultado de ter verificado a “inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução” (art.º 88º, al. a), da LGT).
E como chegou a AT à conclusão de que a contabilidade não reflectia todas as operações realizadas?
O procedimento adoptado encontra-se descrito no RIT e consistiu no seguinte: foram seleccionados alguns alunos, de seguida verificou-se se esses alunos tinham realizado exames e, caso tivessem, procurou-se a factura correspondente, sendo que em alguns casos não existia nenhuma factura em nome do aluno e noutros as facturas existentes apresentavam um valor inferior ao dos preços tabelados.
No que diz respeito aos alunos relativamente aos quais alegadamente não existia factura, a situação pode ser sintetizada, após exclusão dos alunos que realizaram exame em 2009, do seguinte modo:
Nome do alunoTipo de cartaData de exame
«CC»AP19-02-2008
«DD»CE15-01-2008
«EE»CE26-02-2008
«AA»C01-08-2008
«BB»C18-09-2008
«FF»AP07-08-2008
«GG»CE31-10-2008
«HH»APCE15-09-17-12-2008
Pois bem, resulta da matéria de facto provada (cfr. facto provado T)) que, relativamente a seis dos alunos indicados – «CC», «DD», «EE», «FF», «GG» e «HH» –, os SIT não poderiam ter localizado as respectivas facturas porque as mesmas não existiam ao tempo da inspecção (a primeira notificação para apresentação das facturas ocorreu em 14-12-2010 e as facturas foram emitidas com data de 31-12-2010).
Ora, se foram prestados serviços durante o ano de 2008 que apenas foram facturados durante o ano de 2010, e nada tendo a impugnante alegado, quer no momento próprio (i.e., quando notificada no âmbito do procedimento inspectivo), quer no procedimento de revisão, nem tão-pouco agora (em sede de impugnação), no sentido de esclarecer por que motivo as facturas não foram emitidas e registadas na contabilidade no momento da prestação dos serviços, tal como exigem os art.ºs 18º, nº 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) e 36º, nº 1, al. a), do Código do IVA (CIVA) (note-se, aliás, que a testemunha «GGG» declarou que as facturas apenas eram emitidas aquando dos pagamentos, e não aquando da prestação dos serviços), tal não pode deixar de constituir um fortíssimo indício de que durante o exercício de 2008 a impugnante não registou na sua contabilidade todos os proveitos respeitantes a esse exercício, o que faz cessar a presunção de veracidade e boa-fé de que a contabilidade beneficia e, por outro lado, abre a porta à aplicação de métodos indirectos, dado que fica demonstrado que os dados contabilísticos relativos ao ano de 2008 não permitem calcular a matéria tributável desse exercício de forma directa, i.e., segundo os critérios próprios do tributo em causa (in casu, IVA).
Conclui-se, pois, pela legalidade do recurso a métodos indirectos.»(fim de transcrição)
Em síntese, para o Tribunal a quo a Administração Tributária logrou demonstrar que os erros ou inexactidões detectadas na contabilidade inviabilizavam a comprovação directa e exacta da matéria tributável e que o recurso aos métodos indiciários era a única forma de a determinar pelo que se mostrava legitimada a tributação com base nas prestações de serviços que o contribuinte prestou e não facturou, ou tendo facturado o fez por um valor inferior aos dos preços tabelados.
Diz a Recorrente que, sendo assim, não podia o Tribunal a quo ter concluído ser desadequando o critério de quantificação utilizado, ocorrer excesso de quantificação e, com esse fundamento, anular a liquidação.
Diga-se, desde já, que estando em causa a determinação da matéria tributável por recurso a métodos indirectos, a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores há muito vêm firmando de forma unânime o entendimento de que «Recaindo sobre o sujeito passivo o ónus da prova do excesso na quantificação (artigo 74.º n.º 3 da LGT) e não tendo este logrado demonstrar erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada (artigo 100.º n.º 3 do CPPT), não pode a sentença recorrida fundar a anulação da liquidação na existência de “fundada dúvida” sobre a quantificação operada, ao abrigo do n.º 1 do artigo 100.º da LGT, pois que tal caminho lhe estava vedado na situação concreta dos autos, mercê do recurso a métodos indirectos (artigo 100.º n.º 2 do CPPT)» (in Acórdão do STA de 17.10.2018, proferido no processo n.º 261/11.0BECBR).
E comungamos da posição da Recorrente, de que em sede de ónus da prova, é ao contribuinte que incumbe alegar e provar que houve erro ou excesso de quantificação, sendo que tal ataque pode ser dirigido contra o concreto método escolhido para fazer funcionar a presunção é inadequado para o acerto, ainda que possível (por aproximação) dessa quantificação.
Efectivamente, “Ainda que caiba à Administração Tributária eleger o critério conducente à determinação da matéria tributável, o mesmo tem de revelar-se adequado e racionalmente justificado, isto é, tem de revelar-se como um modo adequado de aproximação à realidade que visa tributar”, pelo que, “Em caso de litígio entre o contribuinte e a Administração Tributária quanto ao critério eleito e aos resultados deste, cabe ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação ao caso concreto, isto é, aferir se o “critério presuntivo eleito” se revelou nas circunstâncias concretas ajustado e adequado ao fim tido em vista e se essa adequação e justeza de mostra comprovada pelos factos apurados.» (Acórdão do STA citado e Acórdão do TCA Sul de 18.06.2015, proferido no âmbito do processo n.º 7006/13).
Foi precisamente isso que aconteceu in casu, a recorrida atacou o critério utilizado, apontando mesmo um critério alternativo, como disso dá nota a sentença sob recurso, e mais demonstrou o excesso de quantificação que discorre do facto provado sob o item T) da matéria de facto provada e não impugnada pela Recorrente.
A sentença recorrida sobre a bondade do critério de quantificação e do seu excesso, discorreu nos seguintes termos:
«Questão distinta, e que se coloca já no plano da quantificação levada a cabo, é a questão de saber se não existiria outro método de quantificação que permitisse apurar um resultado mais próximo do real, nomeadamente o método sugerido pela impugnante nos art.ºs 53º e 56º da p.i., ou seja, o recurso à lista de alunos e à tabela de preços (abre-se aqui um parêntesis para fazer notar que a adopção de tal “metodologia” continuaria a situar-se no plano da avaliação indirecta, dado que mesmo nesse caso continuar-se-ia a desconhecer com rigor – por inexistência das facturas – os serviços prestados e as quantias devidas por tais serviços).
Como se disse já, se a AT lograr demonstrar os pressupostos que legitimam o recurso à avaliação indirecta, o contribuinte terá então o ónus de demonstrar a existência de excesso na quantificação (art.º 74º, nº 3, da LGT).
Faz-se no entanto notar que “ao contribuinte não está vedado alegar e provar que houve erro ou excesso de quantificação, designadamente alegando e provando que o concreto método escolhido para fazer funcionar a presunção é inadequado para o acerto, ainda que possível (por aproximação) dessa quantificação” pois embora “caiba à Administração Tributária eleger o critério conducente à determinação da matéria tributável, o mesmo tem de revelar-se adequado e racionalmente justificado, isto é, tem de revelar-se como um modo adequado de aproximação à realidade que visa tributar, cabendo “ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação ao caso concreto, isto é, aferir se o «critério presuntivo eleito» se revelou nas circunstâncias concretas ajustado e adequado ao fim tido em vista e se essa adequação e justeza se mostra comprovada pelos factos apurados”, ou seja, “embora seja certo que a determinação da matéria colectável com o recurso a presunções ou estimativas não constitui um apuramento real da actividade do contribuinte, mas antes aproximado, verosímil, razoável, o resultado alcançado pode ser contrariado e infirmado perante prova que efectivamente demonstre que tal matéria tem menor dimensão do que a encontrada ou que se encontra errado o critério utilizado pela Administração Tributária nessa quantificação (cfr. acórdão do TCAS de 05-06-2019, proferido no processo nº 454/04.613ESNT; os sublinhados são nossos).
Quer isto dizer que o excesso de quantificação não carece de ser demonstrado em concreto, podendo o impugnante bastar-se com a demonstração de que o “critério presuntivo eleito” não é, em abstracto, o mais adequado e racionalmente justificado.
Ademais, sendo certo que as situações de recurso a métodos indirectos implicam sempre uma certa dose de incerteza, o que é a consequência natural de não existirem elementos seguros que permitam a quantificação exacta da matéria tributável, não é menos certo que não se deve abandonar por completo os dados da contabilidade do sujeito passivo já que, não obstante os erros e omissões detectados, ainda assim a mesma poderá conter elementos fidedignos e úteis ao apuramento da matéria tributável (veja-se, neste sentido, o acórdão do TCAS de 17-10-2019, proferido no processo nº 932/09.0BELRS, no qual se considerou que “a circunstância de se recorrer à tributação por métodos indiretos não significa que a contabilidade da Recorrente tenha de ser desconsiderada, in totum, mas tão-só na parte que se considera não refletir a realidade e cuja presunção de veracidade é, por isso, afastada”).
No caso dos autos, a AT dispunha de três elementos cuja credibilidade nunca foi colocada em causa: a lista dos alunos inscritos, a lista dos alunos que realizaram exame e a tabela de preços praticados pela impugnante.
Assim sendo, tem a impugnante razão quando afirma que teria sido possível à AT cruzar esses elementos com as facturas registadas na contabilidade e apurar o valor das prestações de serviços omitidas através do recurso à tabela de preços.
Esta metodologia teria permitido quantificar, sem dúvida, a matéria tributável de forma muito mais rigorosa e próxima da realidade. Já a metodologia utilizada, ao recorrer a uma percentagem média de omissão de facturação calculada a partir de uma amostra, introduz no cálculo da matéria tributável uma desnecessária dose de incerteza quanto à dimensão das omissões praticadas.
Adicionalmente, importa ainda referir que resultou provado que com referência a dois alunos – «AA» e «BB» – afinal existiam facturas emitidas du­rante o ano de 2008, pelo que a sua desconsideração necessariamente contribuiu para a sobrevalorização das omissões detectadas.
Em face do exposto conclui-se que as liquidações padecem, efectivamente, de excesso de quantificação, o que, concomitantemente, impõe a sua anulação.» (fim de transcrição)
Confirma este tribunal o assim decidido. Vejamos por que razão.
Efectivamente, e contrariamente ao que a Recorrente aduz nas suas conclusões de recurso, a Recorrida carreou para os autos dados concreto, que logrou provar, dos quais se pode concluir, sem que dúvidas subsistam, que o método escolhido não foi o adequado e que os resultados a que através dele se chegaram se afastam (para mais e sem justificação plausível ou que tenha sido adiantada) da realidade que visava tributar.
Ou seja, embora seja certo que a determinação da matéria colectável com o recurso a presunções ou estimativas não constitui um apuramento real da actividade do contribuinte, mas antes aproximado, verosímil, razoável, o resultado alcançado pode ser contrariado e infirmado perante prova que efectivamente demonstre que tal matéria tem menor dimensão do que a encontrada ou que se encontra errado o critério utilizado pela Administração Tributária nessa quantificação.

Todavia, cumpre atentar que o excesso de quantificação não resulta da utilização de uma percentagem de omissão apurada por amostragem, embora reconhecemos a precaridade do critério que em si pode conduzir a um nível de incerteza que pode pecar por excesso ou defeito, quando na realidade e como apontado pela Recorrida a AT estava na posse de elementos (alunos inscritos, listas de examinandos, prestações de serviço facturadas e tabela de preços) que lhe permitiam, ainda no âmbito da aplicação de um critério presuntivo, na ausência da real facturação, alcançar um valor inatacável. Até porque não consegue este Tribunal atestar se o recurso ao critério por amostragem dos elementos existentes aponta no sentido de um excesso de quantificação. E, não ignoramos, até porque é a própria Recorrente que aclama atenção para tal, que a Recorrida em sede de RIT terá afirmado que praticava preços não coincidentes com a tabela de preços (confirmar conclusão OO. das alegações de recurso), o que nos leva a questionar se tal constatação de uma prática de descontos não deveria ter sido valorada pela AT. Mas neste particular nada decorre da matéria de facto que permita a este Tribunal tirar qualquer ilacção, sobre o critério utilizado e a não consideração de uma prática de descontos a levar em linha de conta por contraposição aos preços tabelados.
Mas certo é, contrariamente ao que a Recorrente aduz nas suas conclusões de recurso (conclusão PP.), que não é verdade que em sede de pedido de Revisão da matéria tributável tenha havido acordo do perito da Recorrida no valor a tributar em sede de IVA, aceitando o critério aplicado no RIT, como facilmente se depreende do teor do parecer vertido no item Q) da matéria de facto dada como provada, em que consta a sua posição de que não se encontram verificados os pressupostos legais de que depende a aplicação de métodos indirectos e repudia a validade da amostragem.
Sendo que, o que realmente importa, e a Recorrente não ataca, é a constatação factual que decorre do item T) da matéria de facto dada como provada com recurso a documentos juntos com a petição inicial e à prova testemunhal produzida, que na amostragem levada em linha de conta pela AT, temos alunos facturados que foram indevidamente considerados como omissos, o que só por si nos transporta para o campo do excesso de quantificação
Note-se, por fim, que o ónus da prova que o artigo 74º nº 3 da LGT faz impender sobre o sujeito passivo da obrigação tributária não é o de uma quantificação exacta da matéria colectável ou de determinados factores do que seria a sua determinação por avaliação indirecta, mas sim e tão só a prova de que houve excesso na quantificação obtida por métodos indirectos. Por isso, para provar o excesso na quantificação da matéria tributável, feita por métodos indirectos, basta ao sujeito passivo provar a existência, meramente qualitativa ou percentual, de elementos, relevantes para aferir ou alterar a quantificação, que não tenham sido considerados pela AT na quantificação que fez, independentemente do seu valor. É que mesmo que essa discrepância, valores não atendíveis se possam ter como “irrelevantes" no universo relevado pela AT, a constatação de que existe uma não consideração, temos por certo é que a mesma culmina em excesso, sendo que este fala por si e não o quantum do mesmo.
Da determinação da matéria colectável por métodos indirectos pode resultar desvantagem para o sujeito passivo, mas ela tem de ser evitada na medida do possível, daí a indispensabilidade de um imparcial e exigente labor instrutório da AT em ordem a uma quantificação indiciária da matéria tributável, tão próxima da realidade quanto possível.
Enfim, não há reparo que, no sobredito pressuposto jurisprudencial, se possa fazer, seja de um ponto de vista lógico, seja de um ponto de vista prudencial, à apreciação, feita na sentença recorrida, da prova dos factos discutidos no recurso, como assim, bem andou o Juiz a quo em julgar procedente a impugnação das liquidações impugnada, com fundamento em “excesso de quantificação”.

2.3. Conclusões
I. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, assente a verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabe ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).

II. No domínio de utilização de métodos indirectos o erro na quantificação da matéria tributável, as insuficiências no método são sempre substanciais, isto é, devem evidenciar um excesso de quantificação, não importando o seu quantum.

3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Porto, 12 de setembro de 2023

Irene Isabel das Neves
Cristina Paula Travassos Bento
Paula Moura Teixeira