Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00951/19.9BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/05/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:CONTRAORDENAÇÃO URBANÍSTICA- CONSTRUÇÃO DE MURO SEM LICENÇA- COIMA.
Sumário:1- O ilícito de mera ordenação social corresponde a uma censura de natureza social e administrativa cujo fundamento dogmático é a subsidiariedade do Direito Penal e a necessidade de sancionar comportamentos ilícitos mas axiologicamente neutros.

2- Na determinação da medida da coima, nos termos do artigo 18.º do RGCO, tem de atender-se ao princípio da proporcionalidade, sendo a coima determinada em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contraordenação (n.º 1).

3- A construção de um muro de suporte e vedação, confinante com a via pública, com uma altura aproximada de 0,80 metros em pedra e ripas de madeira sobrepostas com a altura aproximada de 1,20 metros sem a respetiva licença de construção, consubstancia uma contraordenação prevista na al. a) do n.º1 do art.º 98.º do RJUE, que nos termos do n.º2 desse normativo e, se imputável a uma pessoa coletiva, é punível com coima graduada €1500 até € 450 000.

4- No âmbito das contraordenações previstas no artigo 98.º do RJUE não se estabelece nenhuma classificação das mesmas como graves, muito graves ou leves, mas o diferente quadro sancionatório previsto nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 98.º do RJUE, fazendo corresponder à infração tipificada na alínea a) do n.º1 uma das mais pesadas sanções, revela o seu elevado grau de ilicitude.

5- Não é excessiva a coima de € 5.000,00 aplicada a uma pessoa coletiva que constrói um muro de suporte e de vedação, à margem da via pública, sem prévia licença de construção, atendendo a que o limite mínimo é de €1.500,00 e se está perante uma infração grave, sendo o montante aplicado próximo do limite mínimo.
(Sumário elaborado pela relatora – art.º 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Recorrente:C.
Recorrido 1:Município de (...)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO

1.1.C., S.A., com sede na Casa (…), NIPC (…), interpôs o presente recurso de decisão de aplicação de coima, ao abrigo do disposto no art.º 59.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27.10 (doravante RGCO), na sequência da coima aplicada pelo Senhor Vereador da Câmara Municipal de (...) no valor de € 5.000,00, acrescido de € 25,50 a título de custas devidas pela instrução do processo de contraordenação, com fundamento na violação do disposto no art.º 4.º, n.º 2, alínea c), do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16.12 (doravante RJUE), , p. e p. nos termos do art.º 98.º, n.º 1, al. a), deste último diploma.
A Recorrente encerrou as conclusões formulados, peticionando a procedência do recurso de impugnação judicial da decisão condenatória proferida no âmbito do processo de contraordenação GSP n.º 13/2019 P-COG e, em consequência:
a) Ser determinado o arquivamento dos autos, com fundamento na falta de notificação do início do procedimento, na falta de notificação do auto de notícia que subjaz ao presente processo contraordenacional e ainda na preterição do direito de audiência prévia;
Caso assim não se entenda,
b) Ser a Impugnante totalmente absolvida, por não se encontrarem preenchidos os pressupostos da responsabilidade contraordenacional;
Subsidiariamente,
e) Ser o ato que aplicou uma sanção contraordenacional à Impugnante declarado nulo ou, pelo menos, anulado, por violação dos ditames da determinação concreta da coima, ínsitos no artigo 18.º do RGCO.”

1.2. O recurso contraordenacional foi admitido liminarmente, e foi proposto pelo Ministério Público que a decisão a proferir fosse por mero despacho, ao que a Recorrente não se opôs, conforme requerimento que apresentou a manifestar essa posição.

1.3. O TAF de Penafiel proferiu saneador-sentença cujo dispositivo é do seguinte teor:
«Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgo improcedente o presente recurso de decisão de aplicação de coima, e, em consequência, mantenho na íntegra a coima aplicada à recorrente.
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Condeno a recorrente no pagamento das custas processuais devidas, fixando-se o seu quantitativo em 3 UC’s – cf. art.º 8.º, n.º 7, e tabela III do RCP.
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Registe, notifique e deposite.»

1.5. Inconformada com o assim decidido, a recorrente interpôs recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões:
«I. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente o recurso da decisão de aplicação de uma coima, no valor de 5.000,00€, e custas, no montante de 25,50€, aplicada pelo Município de (...) à ora Recorrente, no âmbito do processo de contraordenação GSP n.º 13/2019 P-COG.
II. Para sustentar a sua decisão, o Tribunal a quo considerou que os vícios que a Recorrente assacou à decisão punitiva não mereciam acolhimento e que a medida concreta da coima aplicada não merecia censura e era até “desproporcionada para menos”.
III. Salvo o devido respeito, não pode a Recorrente conformar-se com o sentido da decisão ora em crise, porquanto a mesma, conforme se propõe demonstrar, incorre em manifesto erro de julgamento de Direito.
IV. No caso sub judice, vem a Recorrente acusada de ter construído um muro de suporte e vedação em pedra, com altura aproximada de 0,80 metros, e ripas de madeira sobrepostas, com altura aproximada de 1,20 metros, sem qualquer controlo urbanístico prévio – circunstância, à luz do dispositivo ínsito na alínea a) do n.º 1 do artigo 98.º do RJUE, configura uma contraordenação sancionável com uma coima que, para as pessoas coletivas, varia entre os 1.500,00€ e os 450.000,00€.
V. Instado a apreciar a legalidade do procedimento em causa e a concreta sanção aplicada à Recorrente, o Tribunal a quo entendeu que o Município cumpriu todos os ditames da lei nesta matéria e que a sanção aplicada deveria até ser de valor superior, olvidando, contudo, que, na determinação do montante da coima, o Município fez tábua rasa dos critérios fixados para o efeito no RGCO e decidiu, sem elementos bastantes, pela aplicação de uma coima de valor manifestamente desproporcional face ao incumprimento da Recorrente.
VI. No que tange à determinação do montante da coima concretamente aplicada no âmbito de um processo contraordenacional, deverá a entidade administrativa autuante atender aos pressupostos plasmados no artigo 18.º do RGCO, a saber: (i) gravidade da contraordenação; (ii) culpa do agente; (iii) situação económica do agente; (iv) benefício económico retirado da prática da contraordenação.
VII. Quanto à gravidade da infração, inexistindo no RJUE parâmetros de graduação da gravidade das infrações urbanísticas, impende sobre o Município a obrigação de apreciar a conduta do particular em crise à luz da importância do bem jurídico violado e das exigências de prevenção geral.
VIII. No caso concreto, a Recorrente violou as determinações legais que impõem que, a realização de operações urbanísticas com relevo, devem ser submetidas a controlo prévio por parte da Administração.
IX. No entanto, a Recorrente tinha já desencadeado o procedimento de licenciamento necessário para o efeito, encontrando-se o mesmo já na fase de apreciação dos projetos de especialidades.
X. Como tal, razão alguma existe para que considere a infração como grave, uma vez que, caso assim fosse, todas as infrações seriam graves, perdendo razão de ser o pressuposto da gravidade ínsito no n.º 1 do artigo 18.º do RGCO.
XI. Tendo em conta a factualidade considerada provada – nomeadamente, o facto de a Recorrente ter desencadeado o procedimento de licenciamento devido e ter respondido a todas as solicitações do Município e a circunstância do referido procedimento estar perto do fim – deveria a infração aqui em causa ser considerada, no mínimo, leve.
XII. Na medida em que esta consideração influi diretamente na concreta medida da coima, constatando-se que o Município não realizou esta ponderação, outra não pode ser a conclusão senão a de que merece censura a decisão impugnada e, por maioria de razão, a sentença recorrida.
XIII. No que tange ao requisito da culpa do agente, será de ponderar, neste concreto ponto, que a Recorrente apenas se limitou a construir um muro que se inseria no âmbito de uma operação urbanística mais complexa, cujo procedimento de licenciamento se encontrava já em curso.
XIV. Verificando que o procedimento se encontrava em fase final e que era altamente provável vir a ser proferida uma decisão favorável à sua pretensão, tendo também em conta o lapso temporal já decorrido desde a data de entrada do seu pedido, a Recorrente tinha a convicção de que a construção do referido muro não acarretaria prejuízos e não seria sancionada, agindo, deste modo, de forma negligente.
XV. Tal circunstância não foi devidamente ponderada na análise empreendida pelo Município no que respeita à fixação do quantum punitivo, pelo que, também neste trecho merece reparo o julgamento realizado pelo Tribunal a quo à conduta do Município.
XVI. No que respeita à situação económica do agente, entendeu o Tribunal a quo que nenhum juízo negativo haveria a tecer à decisão punitiva do Município.
XVII. Com efeito, para efeitos de fixação da concreta medida da sanção a aplicar, impende sobre o Município a obrigação de apurar a concreta situação em que o infrator se encontra, solicitando-lhe, se for caso disso, os elementos necessários para o efeito, não podendo bastar-se com meras presunções.
XVIII. Sem prejuízo de constatar que não dispõe de quaisquer elementos atualizados sobre o estado de saúde financeira da Recorrente, entendeu o Município recorrer aos resultados financeiros de 2016 que esta haveria facultado num outro procedimento administrativo, tomando ainda em consideração que a mesma se encontrava a realizar várias obras.
XIX. Afigura-se manifestamente contrário os mais elementares ditames em matéria contraordenacional uma presunção de lucros tendo por base alegados serviços prestados pela Recorrente (quer quanto à sua efetiva concretização, quer quanto aos seus respetivos montantes).
XX. Aqui chegados, sendo a situação económica do agente um dos pressupostos a que o Município tem que atender para efeitos de fixação da medida concreta da coima, tendo o mesmo sido ignorado, dúvidas não restam de que o quantum determinado é manifestamente ilegal.
XXI. Relativamente ao benefício económico retirado da prática da contraordenação, como é bom de ver, a Recorrente vantagem alguma retirou da situação em apreço, sendo certo que, como o próprio Município admite, não existem dados para concluir o contrário.
XXII. Não se diga que o facto de ter “poupado” as taxas urbanísticas devidas pela operação em causa representa um qualquer benefício económico. Isto porque, como o próprio Município admite e o Tribunal reconhece, a Recorrente desencadeou o procedimento de licenciamento devido para levar a cabo a sua pretensão, impendendo sobre si a obrigação de liquidar as taxas urbanísticas devidas, a final.
XXIII. Acresce que, não pode a Recorrente deixar de notar que o Tribunal a quo, no que a este concreto ponto se refere, lhe tece uma série de juízos depreciativos, porquanto a mesma não juntou aos autos qualquer prova que infirme a conclusão do Município de que a sua situação financeira é estável.
XXIV. Salvo o devido respeito, é de sublinhar que não é sobre a Recorrente que impende a obrigação de provar a situação económico-financeira, uma vez que, sendo este um dos pressupostos que o Município deve atender para fixar a concreta medida da coima, é sobre o mesmo que recai o dever de apurar a factualidade necessária para atestar essa condição – verificação que não foi realizada!
XXV. No caso vertente, a verdade é que se desconhece quais os critérios de que o Município lançou mão para determinar a medida concreta da coima, pelo que outra não pode ser a conclusão senão a de que, sendo a sanção superior ao mínimo legal, a mesma se revela manifestamente excessiva.
XXVI. Instado a apreciar a legalidade do procedimento aqui em causa e do quantum sancionatório aplicado, o Tribunal a quo, olvidando os pressupostos estabelecidos no artigo 18.º do RGCO, e sem dispor qualquer base factual para o efeito, considerou a sanção desproporcionada para menos.
XXVII. Porém, e em face de tudo quanto se apurou, impunha-se ao Tribunal a quo que reconhecesse que, do ponto de vista do cumprimento da lei, o Município não cumpriu as obrigações que lhe estavam adstritas, concretamente, os pressupostos ínsitos no artigo 18.ºdo RGCO e fixou, sem mais, uma sanção pecuniária elevada à Recorrente.
XXVIII. Perante a factualidade apurada, entendendo o Município que a conduta da Recorrente deveria ser sancionada com uma coima – hipótese que se aventa por dever de patrocínio –, deveria a mesma ser fixada no mínimo legal.
XXIX. Em face de tudo quanto se expôs, dúvidas não restam de que o Tribunal a quo errou na análise que empreendeu aos ditames do RGCO, pelo que a sentença recorrida padece de clamoroso erro de julgamento de Direito, devendo, como tal, ser revogada com todas as legais consequências.

Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deve presente recurso ser admitido.
Cumulativamente,
Deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, revogando-se a decisão recorrida.»

1.4. O Ministério Público, na sequência do termo de vista aberto nos autos, a fls. 496 (paginação SITAF) pronunciou-se afirmando que «III- (…) faz sua a posição já assumida pelo Ministério Público no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel (fls. 400-digital).
IV- Considerando-se que são desnecessárias outras considerações, desde logo tendo em conta que a recorrente não põe em caus a prática da conduta que integra a contraordenação, mas tão só a medida da pena aplicada».

1.9. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.

2.1. O objeto do recurso define-se pelas conclusões extraídas pelo Recorrente da respetiva motivação – art. 412º, n.º 1, do CPP(1), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, como sejam as cominadas com a nulidade de sentença, com vícios da decisão e com nulidades não sanadas - artigos 379º e 410º, nºs 2 e 3, do CPP(2).

As questões que se encontram submetidas à apreciação do Tribunal ad quem e que importa decidir passam por saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de Direito por na determinação do montante da coima aplicada ter feito tábua rasa dos critérios fixados no RGCO e ter decidido sem elementos bastantes pela aplicação de uma coima de valor manifestamente desproporcional face ao incumprimento da Recorrente.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO

3.1. A 1.ª Instância deu como provados, com interesse para a decisão da causa, os seguintes factos:

«1. A ora arguida/recorrente é uma sociedade comercial que tem por objeto a administração, avaliação, compra, venda e revenda de imóveis, o arrendamento e exploração de bens imóveis, o aluguer temporário de locais de alojamento, a título oneroso, com ou sem fornecimento de refeições e de outros serviços acessórios, o comércio por grosso e a retalho de bens, novos e usados, sem especialização, a prestação de serviços de consultadoria, orientação e assistência operacional às empresas ou organismos em matéria de planeamento, organização, controlo, informação, gestão, reorganização e gestão financeira, a supervisão e gestão de empresas, o turismo em espaço rural de caráter agrícola, restauração e promoção de eventos, a produção e comercialização de vinhos comuns e licorosos, a olivicultura e produção de azeite e silvicultura e exploração florestal – cf. certidão permanente de fls. 67 a 75 do suporte físico dos autos;
2. Por ofício de 08.06.2018, de referência 3160/2018, o Município de (...) comunicou à ora arguida/recorrente o seguinte:
“(...)
Tendo conhecimento, através da fiscalização municipal, que V Ex.ª está a efetuar obras de demolição e reconstrução executadas sem controlo urbanístico, sita no caminho de (...), deste município, no uso das competências que me foram delegadas e subdelegadas pelo Despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal de 26-10-2017, notifico-o para não continuar com as obras, sem que, primeiro, obtenha a respetiva licença municipal ou apresente comunicação prévia.
Notifico ainda V. Exa. para, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data da receção da presente notificação, apresentar nos Serviços Técnicos desta Câmara Municipal, o pedido de licenciamento das referidas obras ou comunicação prévia, para uma possível legalização ou repor a situação anterior aos trabalhos efetuados.
(...)”;
Cf. documento n.º 3 junto com o recurso, de fls. 59 do suporte físico dos autos)
3. Correspondendo ao determinado no ofício melhor identificado no item que precede, em 20.07.2018 a aqui arguida/recorrente apresentou junto dos serviços do Município de (...) requerimento tendo em vista a obtenção de licença para a realização de obras de reconstrução e ampliação de uma habitação unifamiliar e construção de um muro de vedação, nos prédios urbanos descritos na conservatória do registo predial de Baião sob os n.ºs 977 e 1396, e inscritos nas respetivas matrizes prediais urbanas sob os artigos 161 e 1534, sitos em (...), concelho de Baião – cf. documentos de fls. 62 a 118 do suporte físico dos autos;
4. Este requerimento deu origem ao procedimento de licenciamento de obras de edificação que correu termos nos serviços municipais de Baião sob o número LE-EDI – 60/2018, no âmbito do qual, mediante novo ofício, este datado de 30.08.2018, de referência 4607/2018, aqueles serviços municipais solicitaram à ora arguida/recorrente o seguinte:
“(...)
Relativamente ao pedido de licenciamento mencionado em epígrafe, e tendo em conta o parecer técnico que recaiu sobre o mesmo, informo V. Exa. de que, deverá apresentar, no prazo não superior a 30 dias, os seguintes elementos:
1 - Proceder à anexação das Certidões do Registo Predial em conformidade com o levantamento topográfico;
2 - Levantamento topográfico rigoroso com a totalidade dos prédios urbanos “edificações”;
3 - Nova ficha com os elementos estatísticos “Q3” devidamente preenchida face à pretensão.
4 - Pormenor construtivo de acordo com o projeto apresentado;
5 - Peças desenhadas do projeto de arquitetura com a indicação dos corrimões no terraço proposto e na escada exterior.
(...)”;
Cf. documento n.º 5 junto com o recurso, de fls. 119 do suporte físico dos autos;
5. Tendo a aqui recorrente/arguida respondido a este ofício mediante requerimento escrito datado de 24.12.2018 – cf. documento n.º 6 junto com o recurso, de fls. 120 a 126 do suporte físico dos autos;
6. Ainda no âmbito do identificado procedimento n.º LE-EDI – 60/2018, por ofício de 11.01.2019, referência 252/2019, os serviços municipais de Baião comunicaram à ora arguida/recorrente o seguinte:
“(...)
Relativamente ao pedido de licenciamento mencionado em epígrafe, informo V. Ex.ª de que o projeto de arquitetura foi APROVADO por meu despacho datado de 09-01-2019.
Assim, deverá V, Ex.ª, no prazo de seis meses, a contar da data da receção deste ofício, apresentar os projetos das especialidades indispensáveis ao deferimento do processo em conformidade com o nº 4 do art.º 20º do Decreto-Lei n.º 555/99 de 16 de Dezembro, com as alterações posteriores.
(...)”;
Cf. documento n.º 7 junto com o recurso, de fls. 127 do suporte físico dos autos;
7. Em 15.04.2019, os serviços do departamento de urbanismo da Câmara Municipal de (...) elaboraram auto de notícia, identificado com a referência 12/2019, e tendo como infratora a aqui arguida/recorrente, e no qual se pode ler nomeadamente o seguinte:
“(...)
Procedeu à execução de um muro de suporte e vedação, constituído por pedra com altura de aproximadamente 0.80metros que suporta ripas de madeira com altura de aproximadamente 1.20metro, confinante com o caminho de (...), sem possuir qualquer tipo de controlo urbanístico prévia para o efeito.
Existe o processo de licenciamento 60/2018LE-EDI, que trata do licenciamento de reconstrução e ampliação de uma habitação e do muro de vedação em causa, que se encontra em fase de apreciação nos serviços técnicos, encontrando-se, desde o dia 09/01/2019, por despacho do senhor Vereador do urbanismo, aprovado o projecto de arquitectura. De todo o modo foi possível apurar no local que o muro não cumpre com o constante nas peças desenhadas apresentadas. Nesta data o muro encontra-se concluído.
(...)”;
Cf. documento de fls. 133/135 do suporte físico dos autos;
8. Em função do que foi instaurado e correu termos, naqueles serviços municipais, contra a aqui arguida/recorrente o processo de contraordenação n.º GSP 13/2019-P-COG – cf. documento de fls. 132 do suporte físico dos autos;
9. Mediante ofício de 29.04.2019, referência 2186/2019, os serviços municipais de Baião comunicaram à ora arguida/recorrente o seguinte:
“(...)
Tendo conhecimento, através da fiscalização municipal, que V. Ex.ª efetuou obras de construção de muro de suporte e vedação em domínio público sita no Caminho (...), deste município, no uso das competências que me foram delegadas e subdelegadas pelo Despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal de 26-10-2017, notifico V. Exa. para, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data da receção da presente notificação, repor a situação anterior às obras realizadas, uma vez que encontrando-se a mesma em domínio público não é legalizável.
(...)”;
Cf. documento n.º 8 junto com o recurso, de fls. 128 do suporte físico dos autos;
10. Por correio registado, e no âmbito do mencionado processo de contraordenação, os serviços municipais de Baião remeteram à arguida/recorrente ofício de referência 2252/2019, datado de 02.05.2019, para a morada “Rua de (...)”, e em que se pode ler o seguinte:
“(...)
Na sequência da participação elaborada a 15 de abril último, fica V. Ex.a notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 50º do diploma legal mencionado em epígrafe, para no próximo dia 13/05/2019 pelas 10.30 horas, comparecer nesta Câmara Municipal, a fim de ser ouvido como arguido, em auto de contraordenação, ou no prazo máximo de 15 dias úteis contados da receção desta notificação, apresentar querendo defesa por escrito, a qual poderá subscrita por advogado mandatado para o efeito, podendo, dentro do mesmo prazo oferecer prova documental e testemunhal, num prazo máximo de três para cada facto ou requerer a produção de outros meios de prova, bem como juntar documento comprovativo da situação económica. Da defesa escrita deverá constar obrigatoriamente o número do presente processo de contraordenação.
Poderá, querendo, fazer-se acompanhar por advogado.
Mais fica notificado que, a falta de defesa implica o prosseguimento imediato do processo para decisão final da autoridade administrativa.
Junto se anexa fotocópia da participação elaborada pelos Serviços de Fiscalização.
(...)”;
Cf. documento de fls. 136 do suporte físico dos autos;
11. O referido ofício foi recebido na morada acima referida em 06.05.2019 – cf. documento de fls. 137 do suporte físico dos autos, e informação da página oficial dos CTT no endereço https://www.ctt.pt/feapl 2/app/open/objectSearch/objectSearch.jspx, consultado nesta data;
12. A 04.07.2019, no âmbito do processo de contraordenação em mérito, foi elaborado pela respetiva instrutora documento escrito intitulado “relatório”, no qual se pode ler o seguinte, com relevo para a decisão:
“(...)
Violação da legislação aplicável:
Com a conduta descrita a arguida violou o disposto no artigo 4º, nº 2, alínea c), do D.L. 555/99 de 16 de Dezembro, na sua atual redação, o que constitui uma contraordenação prevista na alínea a) do n.º1 do artigo 98.º do D.L.555/99 de 16 de Dezembro, na sua atual redação, punida pelo n.º2 do artigo 98º do mesmo diploma legal, com coima graduada de € 1.500 até ao limite máximo de € 450.000 por se tratar de pessoa coletiva - A realização de quaisquer operações urbanísticas sujeitas a prévio licenciamento ou autorização, sem o respetivo alvará.
Instrução:
Na instrução do processo, observaram-se as normas estipuladas no regime geral das contraordenações, aprovado pelo D. Lei n.º 433/82 de 27 de outubro, na sua atual redação, durante o qual se procedeu à investigação, tendente ao apuramento concreto dos factos.
O auto de notícia faz fé em processo de contraordenação, até prova em contrário, quanto aos factos presenciados pela entidade autuante, sendo considerado, um documento autêntico nos termos do artigo 369º do C. Civil.
A arguida foi devidamente notificada nos termos e para os efeitos do artigo 50º do D.L n.º 433/82 de 27 de outubro na sua atual redação e não apresentou defesa.
Consultado o processo de licenciamento nº 60/2018 LE-EDI, verificou-se que o projeto de arquitetura se encontra aprovado desde o dia 09/01/2019 e desde aquela data, a aguardar a entrada do projeto das especialidades, pelo que, não existindo, ainda, alvará de construção, a obra permanece ilegal.
Consultado o processo FUT. DOC. 2840/2019 EXT e o processo anexo GSP Genérico nº 13/2019 PG-POI, verificou-se que o muro não está conforme as peças desenhadas, apresentadas e aprovadas (LE-EDI 60/2018), quanto à sua implantação, atendendo a que parte deste muro se encontra implantado em espaço pertencente ao domínio público.
No processo não existe qualquer referência à situação económica e financeira da empresa arguida, todavia, temos conhecimento pelos factos provados constantes num dos processos de contraordenação antecedentes (C.O.11/2017), que no ano de 2016 a arguida apresentou resultados líquidos na ordem dos 100.000,00 € e, mantém ainda a sua atividade.
É, também, do conhecimento público, quer concelhio, quer nacional, que no prédio ou local onde foram executadas todas as obras, alvo dos processos de contraordenação acima mencionados, funciona a conhecida “CASA (...)”, também conhecida como “Quinta (...)”, com sede na rua (...), reconhecida pelos seus serviços de turismo e eventos.
Consultados os antecedentes, verificou-se que a arguida foi participada anteriormente nos processos de contraordenação nº 11/2017, 42/2017, 73/2017, pela prática do mesmo tipo de infração, tendo sido, em todos eles admoestada por escrito e ainda, pela prática do mesmo tipo de infração, nos processos de contraordenação nº 40/2018, 68/2018, 01/2019, tendo sido condenada em coima.
Não obstante a existência destes antecedentes, para além deste concreto processo de contraordenação (C.O. nº 13/2019), foi instaurado em 24/05/2019 um outro processo (C.O. nº 18/2019), contra a mesma arguida, também pela prática do mesmo ilícito contraordenacional, que se encontra na fase inicial.
Depois de ponderadas as provas constantes dos autos nomeadamente:
- O auto da Fiscalização Municipal;
- C.O. nº 11/2017, 42/2017, 73/2017, 40/2018, 68/2018 e 01/2019;
- Processo LE-EDI 60/2018;
- Processo FUT. DOC. 2840/2019 EXT;
- Processo nº 13/2019 PG-POI;
- Processo C.O. nº 18/2019 P-COG;
- Registos existentes neste Município.
Consideram-se como provados os seguintes factos:
- No dia 15 de abril de 2019, a fiscalização municipal em deslocação à Rua de (...), verificou que a empresa C., S.A., com sede na mesma rua, procedeu à execução de um muro de suporte e vedação, constituído por pedra e ripas de madeira.
- O muro confina com o Caminho de (...), sito naquela União de Freguesias e Concelho.
- O muro tem uma altura aproximada de 0,80 metros em pedra e ripas de madeira sobrepostas na pedra, com altura aproximada de 1,20 metros, conforme se alcança das fotos anexas ao auto de notícia.
- As obras foram executadas e concluídas sem qualquer tipo de licença ou controlo urbanístico prévio para o efeito.
- Existe um processo de legalização apenas para parte do muro em questão com a designação LE-EDI 60/2018, em nome da arguida, com o projeto de arquitetura aprovado desde 09/01/2019, o qual se encontra ainda em apreciação nos serviços técnicos, a aguardar a apresentação dos projetos das especialidades.
- No processo de obras ilegais que corre no município sob a designação GSP Genérico nº 13/2019 PG-POI, verificou-se que o muro executado não está conforme as peças desenhadas, apresentadas e aprovadas no processo (LE-EDI 60/2018), quanto à sua implantação, atendendo a que parte deste muro se encontra implantado em espaço pertencente ao domínio público, impedindo a passagem de veículos agrícolas.
- A arguida é imputável, tendo agido livre e voluntariamente, bem sabendo que a sua conduta não é permitida por lei.
- A arguida quis e praticou a infração de forma dolosa, desejando efetivamente a sua realização. - Nos processos não existem dados atuais quanto à situação económica da arguida, apenas temos como referência, o processo de contraordenação nº 11/2017, em que é dado como provado que, no ano de 2016 a arguida apresentou resultados líquidos na ordem dos 100.000,00 € e temos conhecimento que mantém a sua atividade.
- É do conhecimento público, quer concelhio, quer nacional, que no prédio ou local onde foram executadas todas as obras, alvo dos processos de contraordenação acima mencionados, funciona a conhecida “CASA DA (…)”, também conhecida como “Quinta (...)”, com sede na rua (...), reconhecida pelos seus serviços de turismo e eventos.
- Para além do presente processo, a arguida tem antecedentes no Município de (...), pela prática do mesmo tipo de ilícito, em seis processos anteriores e um posterior a este, contabilizando-se um total de 8 processos de contraordenação, pela execução de operações urbanísticas sem alvará de licença de construção, ocorridos no período de dois anos, entre 2017 e 2019.
- Nestes termos, face aos elementos existentes no processo, consideram-se provados os factos constantes do auto de notícia, sendo esta contraordenação imputável à arguida, nos termos do artigo 8º do R.G.C.O.
(...)
Determinação da medida da coima
Nos termos do artigo 18º do Regime Geral das Contraordenações a determinação da medida da coima, dentro dos seus limites, é calculada em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou com a prática da contraordenação. Assim:
1.º - Gravidade da contraordenação
A atuação da arguida deve considerar-se grave, dado que esta iniciou e concluiu um muro ilegalmente, sem possuir licença municipal para o efeito.
A arguida deu continuidade ao seu modo de atuação, realizando obras ao arrepio da obrigatoriedade legal, sem previamente aferir da sua viabilidade.
Apesar de existir um processo no Município de (...) para a legalização de parte daquele muro (LE-EDI nº 60/2018), com o projeto de arquitetura aprovado desde 09/01/2019, tal não nos permite concluir que o seu desfecho seja a emissão de alvará de construção, pois, neste momento, apenas existem indícios de que tal poderá vir a suceder. A legalização só ocorre depois de verificados e aprovados todos os trâmites legais no setor de obras, o que ainda não sucedeu, porque se aguarda ainda a apresentação do projeto das especialidades e só depois de aprovado, finalmente a emissão do alvará.
Acresce ainda o facto de ter implantado parte do muro em domínio público.
2.º - Culpa do agente
A arguida tem pleno conhecimento que as obras de construção civil que levou a cabo, só poderiam ser efetuadas após a concessão da licença municipal.
A arguida é altamente reincidente, pois, pratica este tipo de infração recorrentemente (C.O. nº 11/2017, 42/2017, 73/2017, 40/2018, 68/2018, 01/2019). Nos primeiros três processos foi condenada numa pena de admoestação por escrito e nos restantes três foi condenada no pagamento de uma coima, em cúmulo jurídico, no valor de 4.000,00 €.
Posteriormente ao presente processo de contraordenação, já foi instaurado outro processo neste município, contra a arguida, pela prática do mesmo tipo de ilícito (C.O. nº 18/2019).
Face à reincidência sistemática concluímos que não é suficiente a aplicação de uma coima pelo mínimo legal, atendendo a que tal valor já não satisfaz as exigências de prevenção geral e sobretudo especial.
Compulsado o processo de contraordenação em apreço e analisados todos os elementos, conclui-se que efetivamente a arguida praticou a infração que lhe é imputada, agindo com dolo, bem sabendo que não o podia fazer, pelo que tal conduta é merecedora de censura jurídica.
Ademais, dos autos não foi possível apurar qualquer causa justificativa de arquivamento nos termos do nº 2, do artigo 54º do R.G.C.O. ou de exclusão previstos nos artigos 8 º, nº 2 e 9º a 11º do mesmo diploma legal.
3.º - Situação económica do agente
A arguida não apresentou qualquer prova no processo quanto à sua situação económica no ano de 2018/2019. Num dos processos antecedentes, a arguida declarou que ano de 2016 apresentou resultados líquidos na ordem dos 100.000,00 €, pelo que nos pautámos por este valor de referência e ainda atendendo ao volume de obras que vem desenvolvendo no decurso dos anos de 2017, 2018 e 2019, o que nos permite concluir que a situação económica da empresa, aqui arguida, será, pelo menos, estável.
Para avaliarmos, ainda que muito sumariamente, a situação económica da arguida, acresce o facto de, no prédio e local onde foram executadas as obras, funciona a conhecida “CASA (...)', também conhecida como “Quinta (...)', com sede na rua (...), reconhecida publicamente pelos seus serviços de turismo e eventos que proporciona.
4.º - Benefício económico retirado da contraordenação
Não existem dados no processo que nos permitam concluir que a arguida tenha obtido benefícios económicos na sua esfera patrimonial com a prática desta contraordenação; contudo, a existirem, a arguida terá obtido benefício económico com o valor das taxas municipais que ainda não dispendeu com a legalização (emissão do alvará).
Proposta da decisão
Considerando o acima exposto e em face da matéria dada como assente e vertida neste relatório, ponderada a situação à luz das disposições legais vigentes e dos critérios de determinação da medida da coima previstas no RGCO e respetiva aplicação às situações em análise, propõe-se: Que a arguida seja condenada pela prática do ilícito contraordenacional p. e p. pela alínea a), do nº 1 e nº 2, do artigo 98.º, do DL n.º 555/99, de 16/12, na sua atual redação:
a) Na coima legalmente prevista, no montante de 5.000,00 € (cinco mil euros);
b) No que concerne a sanções acessórias previstas no artigo 99.º do DL n.º 555/99, de 16/12, a sua atual redação e artigo 21.º da RGCO, salvo melhor opinião, de momento, não se sugere a sua aplicação;
c) A decisão condenatória deverá ainda incluir o montante das custas que de acordo com a deliberação Camarária de 11/02/23, deverá ser fixada em 25,50 Euros (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos).
(...)”;
Cf. documento de fls. 138/140 do suporte físico dos autos;
13. Após o que, em 02.08.2019, pelo vereador do pelouro do ambiente e urbanismo da Câmara Municipal de (...), foi proferida decisão no âmbito do processo de contraordenação em apreço, de igual teor ao relatório mencionado no ponto anterior, e em cujo segmento decisório se pode ler:
“(...)
Decisão
Considerando o acima exposto e em face da matéria dada como assente e vertida neste relatório, ponderada a situação à luz das disposições legais vigentes e dos critérios de determinação da medida da coima previstas no RGCO e respetiva aplicação às situações em análise, decide-se: Que a arguida seja condenada pela prática do ilícito contraordenacional p. e p. pela alínea a), do nº 1 e nº 2, do artigo 98.º, do DL n.º 555/99, de 16/12, na sua atual redação:
a) Na coima legalmente prevista, no montante de 5.000,00 € (cinco mil euros);
b) No que concerne a sanções acessórias previstas no artigo 99.º do DL n.º 555/99, de 16/12, na sua atual redação e artigo 21.º da RGCO, de momento, não se sugere a sua aplicação;
c) A decisão condenatória inclui ainda o montante das custas que de acordo com a deliberação Camarária de 11/02/23, foi fixado em 25,50 Euros (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos).
(...)”;
Cf. documento de fls. 141/143 do suporte físico dos autos;
14. Esta decisão foi comunicada à recorrente/arguida por ofício de 02.08.2019, de referência 3801/2019, expedida por correio registado, e dirigido à morada “Rua de (...)”, tendo o mesmo sido aí recebido em 05.08.2019 – cf. documentos de fls. 144/145 do suporte físico dos autos, e informação da página oficial dos CTT no endereço https://www.ctt.pt/feapl 2/app/open/objectSearch/objectSearch.jspx, consultada neste dia.
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2 – Factos Não Provados
Com relevo para a decisão do presente recurso, não subsistem factos que o tribunal tenha considerado como não provados.»
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III.B.DE DIREITO
3.2. Enquadramento

3.2.1. O ilícito de mera ordenação social corresponde a uma censura de natureza social e administrativa cujo fundamento dogmático é a subsidiariedade do Direito Penal e a necessidade de sancionar comportamentos ilícitos mas axiologicamente neutros. Conforme se adverte no Acórdão do TR de Coimbra, de 29/02/2012, proferido no processo n.º 125/11.7TBFCR.C1) “a configuração constitucional do processo contraordenacional, se o subordina ao reconhecimento de um conjunto de garantias inerentes à respetiva natureza sancionatória, não o equipara, contudo, ao processo penal, não conduzindo, por isso, no plano da aplicação do direito ordinário, à direta transposição para o primeiro de todas e quaisquer regras expressamente previstas para o segundo, designadamente em termos de os elementos que este particularmente inclui se tornarem, só por isso, comuns àquele. Da modelação constitucional do processo contraordenacional extraem-se, portanto, duas ideias de sentido aparentemente oposto mas complementar: a de que o processo contraordenacional, como sancionatório que é, se encontra subordinado ao reconhecimento de um conjunto de garantias que o aproximam do processo penal; e, a de que tais garantias não são equivalentes ou equiparáveis às garantias asseguradas no âmbito do processo criminal, designadamente em termos de viabilizar a conversão daquela aproximação numa sobreposição integral de regimes. Tal entendimento encontra-se consolidado na jurisprudência constitucional”.
Do ponto de vista teleológico, as contraordenações são uma medida de proteção da legalidade, o que justifica a maior flexibilidade na análise dos pressupostos da imputação, designadamente da culpa, que é diferente da culpa penal.
Do mesmo modo que se passa com o crime, a contraordenação também é constituída por três elementos que se desdobram na existência de (ii) facto típico (elemento material), (ii) culpabilidade ( elemento moral) e (iii) punibilidade (elemento sancionatório). Cfr. Oliveira Mendes e Santos Cabral, Notas ao Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas Almedina , p. 27;
No que concerne à culpabilidade em sede contraordenacional “(…) não se trata aqui de uma culpa, como a jurídico-penal, baseada numa censura ética , dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna, mas apenas uma imputação do facto à responsabilidade social do seu autor ; dito de outra forma, da adscrição social de uma responsabilidade que se reconhece exercer ainda uma função positiva e adjuvante das finalidades admonitórias da coima “ Cfr. Prof. Figueiredo Dias, “ O movimento da descriminalização e o ilícito de mera ordenação social “, Revista de Direito e Economia , 1983 , p. 51;:.
Note-se que atualmente é pacificamente admitida a responsabilização criminal das pessoas coletivas em certos tipos penais.
No Direito das contraordenações, contudo, a responsabilidade das pessoas coletivas, como é o caso do Recorrente, é um princípio geral que decorre do artigo 7.º do Regime Geral das Contraordenações, que constitui uma regra geral de imputação, com inúmeras concretizações em regimes especiais.
A imputação da infração à pessoa coletiva resulta de se considerar autor desta o sujeito que tiver violado (por ação ou por omissão) a proibição legal ou o dever jurídico cuja violação a lei comina com contraordenação, solução que é coerente com o facto de no Direito contraordenacional a ilicitude não assentar numa censura ético-jurídica mas sim na violação de um dever legal.
O art.º 32.º, n.º 10, da Constituição determina expressamente que “[n]os processos de contra-ordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa.
Por fim, assinala-se que na determinação da medida da coima, conforme decorre do disposto no artigo 18.º do RGCO, tem de atender-se ao princípio da proporcionalidade, sendo a coima determinada em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contraordenação (n.º 1). Se o agente retira da infração um benefício económico calculável superior ao limite máximo da coima, e se não existirem outros meios de o eliminar, admite-se que o montante da coima se eleve até ao montante do benefício, não podendo, porém, exceder um terço do limite máximo legalmente estabelecido (n.º 2). Por sua vez, quando houver lugar à atenuação especial da punição por contraordenação, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade (n.º 3).
Para além dos critérios de determinação da medida da coima acabados de enunciar, o n.º 8 do artigo 98.º do RJUE estabelece um fator de agravamento dos montantes máximos da coima relativamente a algumas infrações, quando a tramitação seguida haja sido a da comunicação prévia, o que corresponde a uma forma de reforçar a repartição de responsabilidades que, no âmbito das comunicações prévias, já aponta, em primeira linha, para os operadores privados e não para o município.
Feitas estas breves considerações, passemos ao caso concreto.

b.2 Dos erros de julgamento de direito
b.2.1. quanto á gravidade da infração

3.3.Vem o presente recurso jurisdicional interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou improcedente o recurso da decisão de aplicação de uma coima, no montante de € 5.000,00 (cinco mil euros), e custas, no montante de € 25,50 ( vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos), aplicada pelo Senhor Vereador da Câmara Municipal de (...) à Recorrente, no âmbito do processo de contraordenação GSP n.º 13/2019 P-COG, com fundamento na violação do disposto no art.º 4.º, n.º 2, alínea c), do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16.12 (doravante RJUE), , p. e p. nos termos do art.º 98.º, n.º 1, al. a), deste último diploma.
Entendeu o Tribunal a quo que os vícios que o Recorrente impetrou à decisão punitiva eram improcedentes, tendo confirmado in totum a decisão administrativa impugnada, afirmando, no que tange ao valor da coima aplicada ao Recorrente que a mesma não merecia censura e que era até “desproporcionada para menos”.
O Recorrente insurge-se contra a sentença sob sindicância por nela o Senhor Juiz a quo ter feito tábua rasa dos critérios fixados no artigo 18.º do RGCO para a determinação da coima, tendo decidido sem elementos bastantes, pela aplicação de uma coima de valor manifestamente desproporcional face ao incumprimento da Recorrente, pelo que ao assim decidir padece de flagrante erro de julgamento de direito, pelo que o presente recurso deve ser julgado totalmente procedente, revogando-se a decisão recorrida.

3.3.1.Para tanto começa por sustentar que, atendendo aos critérios estabelecidos no artigo 18.º do RGCO, não havia razão para que a entidade administrativa tivesse considerado a infração cometida consubstanciada na violação das determinações legais que impõem que a realização de operações urbanísticas com relevo devem ser submetidas a controlo prévio por parte da Administração, como grave, uma vez que, caso assim fosse, então todas as infrações seriam graves, perdendo razão de ser o pressuposto da gravidade ínsito no n.º1 do artigo 18.º citado.
A seu ver, tendo em consideração, conforme resulta da factualidade provada, nomeadamente o facto de a Recorrente ter desencadeado o procedimento de licenciamento devido e ter respondido a todas as solicitações do Município e a circunstância do referido procedimento estar perto do fim, deveria a infração em causa ter sido considerada, no mínimo, leve.

3.3.2.Trata-se de argumento que já tinha sido aventado pelo Recorrente perante o Tribunal a quo, tendo a este respeito a sentença recorrida considerado que:
«Em primeiro lugar, questiona a recorrente que o Município tenha considerado a contraordenação como grave, já que, seguindo aquele critério, todas as contraordenações seriam necessariamente graves, uma vez que as mesmas têm como pressuposto de facto uma prévia violação de determinado imperativo legal. Só por isso, diz, deve concluir-se pela errónea quantificação do montante da coima.
De facto, e ao contrário do que sucede com outros diplomas, o RJUE não contém uma definição do que considera como contraordenação grave; ou melhor, não dispõe no sentido de classificar as contraordenações.
Mas é de pouco relevo essa constatação para efeitos de aplicação das regras sobre a determinação da medida da coima. Isto porque o art.º 18.º, n.º 1, do RGCO manda atender à gravidade da contraordenação, pelo que a utilização deste critério depende no essencial da apreciação da atuação do infrator. Aliás, mesmo nos casos em que ocorre a classificação das contraordenações, é sempre necessário apurar a gravidade da infração, porque mesmo nessas situações existem limites mínimo e máximo a ponderar.
Em todo o caso, importa assinalar que no âmbito do RJUE é correto afirmar-se que a infração registada é uma das mais graves, porque significa que o infrator atuou ao arrepio de qualquer permissão administrativa. Essa conclusão extrai-se da circunstância de o limite máximo abstratamente previsto ser o mais elevado de todos, ou seja, € 450.000,00.
Depois, o Município apreciou a própria conduta da aqui recorrente, invocando que: iniciou e conclui a obra sem licença; continuou a sua execução, mesmo sabendo da ilegalidade; ainda não haviam sido apresentados os projetos de especialidades.
E bem andou ao fazê-lo. Ao contrário do que é afirmado no recurso, não é verdade que o Município se tenha limitado a constatar que ocorreu uma construção sem prévio licenciamento para daí concluir pela gravidade da contraordenação. E mesmo que o tivesse feito, nada havia a questionar nesse sentido, dado que efetivamente, à luz dos limites estabelecidos na lei, o comportamento em causa deve reputar-se como grave.»
E considerou bem, a nosso ver.

3.3.3. Está em causa a aplicação de uma coima, no montante de € 5.000,00, com fundamento na violação do disposto no art.º 4.º, n.º 2, alínea c), do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16.12 p. e p. nos termos do art.º 98.º, n.º 1, al. a), deste último diploma.
O artigo 98.º do RJUE, sob a epígrafe “Contraordenações”, dispõe o seguinte:
1- Sem prejuízo da responsabilidade civil, criminal ou disciplinar, são puníveis como contraordenação:
a) A realização de quaisquer operações urbanísticas sujeitas a prévio licenciamento sem o respetivo alvará de licenciamento, exceto nos casos previstos nos artigos 81.º e 113.º;
(…)
2 - A contraordenação prevista nas alíneas a) e r) do número anterior é punível com coima graduada de (euro) 500 até ao máximo de (euro) 200 000, no caso de pessoa singular, e de (euro) 1500 até (euro) 450 000, no caso de pessoa coletiva.
3 - A contraordenação prevista na alínea b) do n.º 1 é punível com coima graduada de (euro) 1500 até ao máximo de (euro) 200 000, no caso de pessoa singular, e de (euro) 3000 até (euro) 450 000, no caso de pessoa coletiva.
4 - A contraordenação prevista nas alíneas c), d), s) e t) do n.º 1 é punível com coima graduada de (euro) 500 até ao máximo de (euro) 100 000, no caso de pessoa singular, e de (euro) 1500 até (euro) 250 000, no caso de pessoa coletiva.
5 - As contraordenações previstas nas alíneas e) a h) do n.º 1 são puníveis com coima graduada de (euro) 1500 até ao máximo de (euro) 200 000.
6 - As contraordenações previstas nas alíneas i) a n) e p) do n.º 1 são puníveis com coima graduada de (euro) 250 até ao máximo de (euro) 50 000, no caso de pessoa singular, e de (euro) 1000 até (euro) 100 000, no caso de pessoa coletiva.
7 - A contraordenação prevista nas alíneas o) e q) do n.º 1 é punível com coima graduada de (euro) 100 até ao máximo de (euro) 2500, no caso de pessoa singular, e de (euro) 500 até (euro) 10 000, no caso de pessoa coletiva.
8 - Quando as contraordenações referidas no n.º 1 sejam praticadas em relação a operações urbanísticas que hajam sido objeto de comunicação prévia nos termos do presente diploma, os montantes máximos das coimas referidos nos n.os 3 a 5 anteriores são agravados em (euro) 50 000 e os das coimas referidas nos n.os 6 e 7 em (euro) 25 000.
9 – (…)
10 – (…)
11 – (…)
Resulta do disposto no citado artigo 98.º. n.º1, alínea a) que constitui contraordenação a realização de quaisquer operações urbanísticas sujeitas a prévio licenciamento sem o respetivo alvará de licenciamento, exceto nos casos previstos nos artigos 81.º e 113.º, sendo que nos presentes autos a Recorrente não questiona que violou as determinações legais que impõem a obrigatoriedade de prévio licenciamento para a realização de operações urbanísticas de relevo como a que levou a cabo consubstanciada na construção de um muro de suporte e vedação, confinante com a via pública, com uma altura aproximada de 0,80 metros em pedra e ripas de madeira sobrepostas com a altura aproximada de 1,20 metros sem a respetiva licença de construção.
O comportamento em causa consubstancia uma contraordenação que nos termos do n.º2 do artigo 98.º do RJUE, e por se tratar de pessoa coletiva é punível com coima graduada €1500 até € 450 000.
No caso, a coima aplicada à Recorrente, que é uma pessoa coletiva, foi de €.5000,00, montante que o Senhor Juiz a quo considerou pecar por defeito, mas que a Recorrente considera excessivo, em primeiro lugar, por entender não ter cometido uma contraordenação grave tal como foi considerada pela Administração e confirmada pelo Tribunal a quo.

3.3.4.É consabido que no domínio do direito contraordenacional e em sede de aplicação das sanções, o respeito pelo princípio da proporcionalidade assume uma particular relevância impondo a verificação de uma correspondência entre a gravidade da infração e a gravidade da sanção.
Em regra, “a gravidade de uma infração é determinada pela gravidade da ilicitude pressuposta pelo legislador. Ao classificar uma dada infração como grave o legislador considerou-a, em abstrato, portadora de uma ilicitude considerável, o que terá desde logo determinado uma moldura da coima com limites mínimos e/ou máximos superiores àqueles que foram determinados para as contraordenações que entendeu como sendo de gravidade menor ou de média gravidade. Depois, em função do caso concreto, e dentro dos limites da coima prevista pelo legislador, ir-se-á determinar a medida concreta da sanção em atenção às finalidades de punição das coimas e em atenção à culpa do agente. Todos estes elementos poderão ser determinantes para que se entenda que, pese embora se trate de uma contraordenação grave, portadora de uma ilicitude, em abstrato, grave, atento o caso concreto dever-se-á entender que o agente deverá ser punido com uma sanção próxima do seu limite mínimo. Porém, não se pode considerar que, atento o caso concreto, a ilicitude da conduta diminua de gravidade, depois de o legislador a ter classificado como sendo uma contraordenação grave, porque portadora de uma ilicitude considerada grave. Na verdade, sempre que o legislador, de forma geral e abstrata, classifica a infração como sendo grave, não poderá o julgador modificar a lei atribuindo menor gravidade àquela ilicitude. Por isto, não pode deixar de se entender que a classificação legal de uma contraordenação como grave afasta logo a possibilidade de o julgador considerar que aquela mesma contraordenação grave afinal é de “reduzida gravidade”
O legislador, ao classificar as contraordenações como graves, muito graves ou leves pretendeu assegurar o princípio da proporcionalidade entre as infrações e as sanções previstas. Este princípio não é assegurado sempre que atenta a gravidade da infração se decide pela aplicação de uma sanção que pressupõe a reduzida gravidade daquela”. Cfr. Ac. do STJ, de 26/09/2018, Proc. nº 215/15.7T8ACB.C1-A.S1;

3.3.5. No âmbito das contraordenações previstas no artigo 98.º do RJUE não se estabelece nenhuma classificação das contraordenações como graves, muito graves ou leves.
Porém, tal não significa, que esse preceito não forneça um contributo interpretativo na determinação do maior ou menor grau de ilicitude pressuposto pelo legislador relativamente a cada umas das concretas infrações a que faz corresponder um diferente enquadramento sancionatório. Antes pelo contrário.
Conforme resulta do conteúdo normativo do artigo 98.º do RJUE, que tivemos ensejo de transcrever, verifica-se que o legislador previu diferentes molduras sancionatórias consoante o tipo de comportamento contraordenacional tipificado nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 98.º do RJUE, fazendo corresponder à infração tipificada na alínea a) do n.º1 uma das mais pesadas sanções, cuja coima, no caso de pessoa coletiva, como é a Recorrente, varia entre um mínimo de €1.500,00 e um limite máximo de €450.000,00.
O diferente quadro sancionatório assim estabelecido revela o diferente grau de ilicitude previsto pelo legislador em relação às várias infrações urbanísticas previstas, ou seja, a distinta gravidade dos comportamentos puníveis como contraordenação.
No sentido apontado, escreveu-se em Acórdão deste TCAN Cfr. Ac. TCAN, de 14.02.2020, proc. n.º 00439/18.5BEAVR. que “Este escalonamento, em abstrato, da moldura sancionatória, traduz uma opção do legislador quanto aos termos em que devem ser punidos e reprimidos os comportamentos que, porque reprováveis, configuram contraordenação, e são reflexo natural da gradação da infração em função do respetivo grau de ilicitude”.

3.3.6.Na situação sub judice, considerando a moldura sancionatória prevista para o comportamento infracional tipificado na alínea a) do n.º1 do art.º 98.º do RJUE, onde se enquadra a contraordenação praticada pela Recorrente, que é uma das mais elevadas que se encontram previstas nesse normativo, necessariamente temos de concluir que a Recorrente, ao ter procedido à construção do muro de vedação e de suporte, à face da via pública, sem previamente ter obtido a necessária autorização administrativa, de modo a que fosse assegurada, através do controlo administrativo prévio, a observação dos respetivos requisitos, com o concomitante interesse público a salvaguardar, é uma infração grave.
Termos em que improcede o invocado fundamento de recurso.

b.2.2. quanto à culpa do agente

3.4.A Recorrente argumenta ainda, no que tange ao requisito da culpa do agente, que era de ponderar, neste concreto ponto, que a mesma apenas se limitou a construir um muro que se inseria no âmbito de uma operação urbanística mais complexa, cujo procedimento de licenciamento já se encontrava em curso e a fase de arquitetura havia já sido aprovada. Como tal, considerou que era altamente provável que viesse a ser proferida uma decisão favorável à sua pretensão, pelo que tinha a convicção de que a construção do referido muro não acarretaria prejuízos e não seria sancionada, tendo agido ingenuamente, ou seja, com negligência.
Porém, afirma que tal circunstância não foi devidamente ponderada na análise empreendida pelo Município no que respeita à fixação do quantum punitivo, pelo que também neste trecho merece reparo o julgamento realizado pelo Tribunal a quo à conduta do Município.
Mas sem razão.

3.4.1.A sentença recorrida procedeu a uma análise clara e detalhada do requisito da culpa, cuja fundamentação se mostra irrepreensível e que subscrevemos integralmente. Lê-se na mesma que : «Em suma, baseia esta ideia na circunstância de não se poder fazer sobre a sua conduta qualquer juízo de censura, no sentido de lhe ser imputada a contraordenação. Ou seja, entende que não está presente o requisito da culpa, ou o tipo subjetivo, como se pretenda. Isto porque, a seu ver, ocorre uma causa de exclusão de culpa.
Segundo diz, tal sucede porque deu cumprimento a todas as ordens do Município, nomeadamente no que respeita à apresentação do pedido de licenciamento das obras, bem como à apresentação de todos os documentos que o Município entendeu serem necessários para o deferimento da sua pretensão. Além disso, o processo de licenciamento das referidas obras viu já ser aprovado o projeto de arquitetura, encontrando-se em fase de análise os projetos de especialidades os quais, tudo indica, também virão a ser aprovados. Considerou assim que a licença seria emitida e, além do mais, a demora na emissão da respetiva licença acarretaria grandes prejuízos para a sua atividade económica, uma vez que já decorreu mais de um ano depois da apresentação do pedido de licenciamento.
Vejamos.
O conceito de contraordenação consta do art.º 1.º do RGCO, aí se dizendo que constitui contraordenação todo o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal no qual se comine uma coima. Sem necessidade de maiores considerandos, como se constata da utilização da expressão censurável, a existência de uma contraordenação depende de ser possível fazer um juízo de censura ao infrator; o mesmo é dizer que a punição a título de contraordenação depende da culpa, ou seja, do estabelecimento de um nexo ético-jurídico à atuação do agente.
A culpa pode assumir, como também é consabido, duas formas ou modalidades essenciais: dolo e negligência. Separam-se pela intencionalidade do agente na prática da infração: enquanto nos casos de dolo o agente teve intenção de praticar o facto ilícito (ou pelo menos configurou esse resultado como possível, mas conformou-se com ele, no caso de dolo eventual), no caso da negligência não atuou de acordo com o que normalmente lhe seria exigível. Sobre o assunto, vejam-se Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, “Contra-ordenações, Anotações ao Regime Geral”, 6.ª Edição, Áreas Editora, 2011, págs. 135/139.
No entanto, é preciso dizer que segundo o art.º 8.º, n.º 1, do RGCO só há punibilidade da negligência nos casos especialmente previstos na lei (como, por coincidência, sucede no RJUE, conforme se retira do seu art.º 98.º, n.º 9).
Ora, entende-se que a alegação da recorrente nem sequer corresponde a qualquer causa de exclusão da culpa. Pelo contrário.
Com efeito, cumpre não confundir os dois planos: de um lado, existe sempre a necessidade de repor a legalidade urbanística, seja pela legalização (sempre que possível), seja pela adoção de qualquer dos outros meios previstos no RJUE; de outro lado, existe o direito sancionatório, que não fica invalidado pelo primeiro. Sobrepõem-se, com finalidades distintas: num caso, repor a legalidade; noutro, sancionar o infrator.
Neste sentido, como resulta dos factos provados, a recorrente foi notificada para proceder à legalização das obras que já estava a executar – cf. ponto 2 dos factos provados. Ou seja, já estava a infringir a lei.
O facto de a recorrente ter atuado em conformidade decorre de um dever legal, e não constitui qualquer demonstração de ausência de culpa.
Além disso, o argumento invocado pela recorrente nem sequer corresponde a alguma das causas de exclusão da culpa previstas no RGCO ou no Código Penal, aplicável subsidiariamente. Desde logo, não se regista qualquer causa de inimputabilidade em razão da idade ou de anomalia psíquica (artigos 10.º e 11.º do RGCO), nem se pode cogitar qualquer erro sobre os pressupostos de facto que exclua o dolo (art.º 8.º, n.º 2, do RGCO); e também não é possível afirmar com base no alegado qualquer falta de consciência da ilicitude não censurável à recorrente (art.º 9.º, n.º 1, do RGCO). Da mesma forma, a circunstância de a recorrente ter pedido a legalização das obras, em decorrência de um dever legal que sempre lhe seria imposto, e que devia ter feito previamente, não se subsume a nenhuma das causas de exclusão da culpa previstas no Código Penal, designadamente excesso de legítima defesa ou estado de necessidade desculpante, situações de inexigibilidade de conduta diversa.
Finalmente, não só não ocorre qualquer causa de exclusão de culpa, não podendo como tal ser considerada a circunstância de ter sido pedida a legalização (conduta imposta por lei, nem sequer dependente de mera boa vontade da recorrente) ou o facto de o tempo decorrido para a apreciação do pedido poder causar danos ou prejuízos à atividade da recorrente, como se confirma que a recorrente atuou com dolo direto. Torna-se claro que a recorrente sabia da necessidade de pedir licença e que não o fez e, sobretudo, não se coibiu de continuar as obras mesmo depois de saber que a sua conduta era ilegal e que não dispunha de licença para as executar – o que assume frontalmente no recurso.
Sem prejuízo, parece ainda que a recorrente esquece que na decisão (que copia o relatório) é referido que naquela data ainda os serviços municipais se encontravam a aguardar a apresentação dos projetos de especialidades (por algum motivo a recorrente não apresentou o comprovativo de os ter já apresentado aos serviços municipais...) e sobretudo que no processo de legalização se veio a constatar que o muro construído não está sequer executado conforme as peças desenhadas ali apresentadas no que respeita à sua implantação. Circunstância que a recorrente deixa incólume no recurso, e que torna a sua conduta não apenas dolosa como altamente censurável.
Mesmo que fosse verdade a demora na apreciação dos projetos de especialidades, deveria a recorrente lançar mão dos meios legais ao seu dispor, em vez de persistir na ilegalidade.
Assim sendo, e em suma, não só não ocorre qualquer causa de exclusão da culpa, como se pode concluir que a recorrente atuou dolosamente e com elevadíssimo grau de censurabilidade, quer porque não dispunha de licença, quer porque continuou as obras mesmo sabendo da ilegalidade, quer ainda porque nem sequer apresentou projeto no âmbito do processo de legalização que correspondesse ao que efetivamente estava em execução.
Razão pela qual forçosamente terão de improceder as respetivas conclusões do recurso expendidas a este propósito.»

3.4.2.Dir-se-á que ninguém procede à construção de uma obra, como é o caso da construção levada a cabo pela Recorrente- muro de suporte de vedação à margem da via púbica- sem previamente obter da respetiva Câmara Municipal a correspondente licença/autorização para construir, apenas porque agiu negligentemente, pensando que o podia fazer e que daí não lhe adviriam quaisquer consequências. Quem constrói sem prévia licença/ autorização administrativa não ignora que não é detentor da habilitação legal para construir, pelo que, se ainda assim avança com a construção da obra, essa resolução é-lhe imputável a título de dolo.
E no caso, conforme consta do elenco dos factos provados, não era a primeira vez que a Recorrente levava a cabo construções sem prévio licenciamento, no Município de (...).
Cumpre também realçar que pese embora estivesse a correr um processo de legalização da referida construção, resulta provado que o muro edificado pela Recorrente não corresponde ao que retratou nas peças desenhadas que submeteu à apreciação dos competentes serviços da Câmara Municipal de (...), invadindo espaço do domínio público, o que de per se confirma a gravidade da infração em causa, da qual resulta encontra-se edificado um muro de vedação e de suporte, à margem da via pública, que a invadiu em parte, e que não é suscetível, sequer, de ser legalizado em toda a sua extensão.
É também para obstar a situações como esta, do surgimento de edificações que não possam ser legalizadas, que se exige o prévio licenciamento, e consequentemente, que se pune se forma mais expressiva o comportamento daqueles que infrinjam essa obrigação legal, ensinando a experiência que, por vezes, esses comportamentos sãos adotados pelos particulares ou pessoas coletivas, na expetativa da politica do facto consumado, ou seja, de que uma vez edificada uma construção sem licença ainda que a mesma não cumpra os requisitos exigidos para o seu licenciamento, a mesma permanecerá como tal, dada a dificuldade conhecida dos Municípios em determinar a demolição das obras já concluídas ainda que ilegais.
Quem leva a cabo a construção de um muro de vedação e suporte, à margem da via pública, sem previamente obter o necessário alvará de construção, não o faz por distração, mas fruto de uma resolução que tomou nesse sentido.
Termos em que improcede o apontado fundamento de recurso.

b.2.3. quanto à situação económica do agente

3.5.Por outro prisma, a Recorrente ataca decisão recorrida no que se refere ao montante da coima que lhe foi aplicada e que o Tribunal a quo confirmou, julgando até que o referido montante pecou por defeito, por diversamente, entender que o Município não cumpriu com a obrigação de apurar a concreta situação económica em que a mesma se encontrava, solicitando-lhe, os elementos necessários para o efeito.
Alega que, no caso, sem prejuízo de constatar que não dispunha de quaisquer elementos atualizados sobre o estado de saúde financeira da Recorrente, entendeu o Município recorrer aos resultados financeiros de 2016 que a mesma tinha facultado num outro procedimento administrativo, ignorando qual o estado financeiro atual que a Recorrente atravessa, bastando-se com informações recolhidas há quatro anos atrás. Por outro lado, diz ainda que, sem base fatual, o Município considerou a sua situação financeira como estável, tendo em conta as obras que a Recorrente alegadamente desenvolve naquele Município, o que, tudo, se manifesta contrario aos mais elementares ditames em matéria contraordenacional, na medida em que há uma presunção de lucros tendo por base alegados serviços prestados.
Assim, conclui que sendo a situação económica do agente um dos pressupostos a que o Município tem de atender para efeitos de fixação da medida concreta da coima, tendo o mesmo ignorado esse pressuposto, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao ter validado a sua atuação.

3.5.1.A tese perfilhada pela Recorrente em relação ao pressuposto relativo à sua situação económica denota, a nosso ver, uma errada compreensão sobre os ónus que impendem sobre a autoridade administrativa na instrução dos processos contraordenacionais.
Vejamos.

3.5.2. Quanto fixação do montante da coima, estabelece o artigo 8.º do RGCO que:
1 - A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contraordenação.
2 - Se o agente retirou da infração um benefício económico calculável superior ao limite máximo da coima, e não existirem outros meios de o eliminar, pode este elevar-se até ao montante do benefício, não devendo, todavia, a elevação exceder um terço do limite máximo legalmente estabelecido.
3 - Quando houver lugar à atenuação especial da punição por contraordenação, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade.
Nos termos deste preceito, a determinação da medida da coima, dentro dos seus limites, é calculada em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou com a prática da contraordenação.
Nesse sentido, sumariou-se em recente Acórdão do TCAS Cfr. Ac. TCAS, de 28.05.2020, proc. 1314/17.6BESNT; que: “- VI - A determinação da medida da coima faz-se, como manda o artigo 18º nº 1 do RGCO, em função da gravidade da contraordenação [cf. a gravidade da violação do dever, aqui jus administrativo, e as circunstancias objetivas que rodearam a violação], da culpa [cf. as formas de dolo ou os graus de negligência; os fins e as motivações do agente; a conduta anterior e a posterior à infração], da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contraordenação, onde se deve ter presente que a coima e a reprimenda social são também expressas pelo confisco das vantagens obtidas pelo infrator”.

3.5.3. Como bem se discorreu na sentença recorrida “Cumpre notar e sublinhar que, apesar de a recorrente se insurgir contra este aspeto, não apresenta nestes autos qualquer alegação e prova que infirme a conclusão do Município, o que já é particularmente revelador da sua conduta. Aliás, é inconcebível que a recorrente venha afirmar que a não referência ao procedimento em que foram obtidos os dados permite colocar em causa a sua veracidade: se os dados se referem à recorrente, forçosamente este sabe se são ou não verdadeiros, não se mostrando admissível especular com factos de conhecimento pessoal.
Depois, cumpre ainda dizer que foi dada à recorrente a oportunidade de fazer prova da sua situação económica, quando foi notificada para exercer o direito de defesa, o que não fez – cf. teor do ofício mencionado no ponto 10 dos factos provados.
Por outro lado, não é sequer verdade que o Município tenha presumido um qualquer rendimento. O que o Município afirma – e a recorrente, como se disse, não nega nem apresenta prova, limitando-se a questionar o critério utilizado – é que assumia como estável a condição económica da recorrente, partindo do único valor que conhecia. Não há qualquer presunção de lucros – até porque, se efetivamente a houvesse, partindo dos € 100.000,00, o valor da coima deveria ter sido muito superior. E pena é que a recorrente não tenha juntado a estes autos esses elementos, tal é o modo perentório da sua alegação.... Acrescente-se que o Município partiu de um dado que efetivamente conhecia, ao invés de especular com o que não sabe. E apenas presumiu, como dito, a estabilidade da situação financeira da recorrente.
Também não colhe a argumentação de que os elementos em causa não podiam ser utilizados por terem sido obtidos noutro procedimento. Com efeito, não estamos perante a obtenção de qualquer meio de prova tendo em vista demonstrar a prática da contraordenação, mas apenas de apurar, tanto quanto possível, a situação da recorrente. Que o Município presumiu como estável, e nada mais. Inclusive, com recurso à atividade conhecida da recorrente, circunstância que também não merece qualquer reparo (e, uma vez mais, não é em concreto negada pela recorrente, que não afirma em lado algum que não desenvolve atividade, que não realizou quaisquer obras, que o seu volume de negócios baixou consideravelmente...).
Além disso, mesmo que a situação económica da recorrente seja totalmente desconhecida, essa circunstância nunca obstaria à fixação do montante da coima. De facto, o Município podia ter sido bem menos benevolente, atendendo a que a recorrente nada disse, afirmando apenas o desconhecimento da situação, e fixando a coima somente com base nos demais critérios. O que não fez, assumindo apenas a mera estabilidade da situação financeira da recorrente, partindo do que era do seu conhecimento.»

3.5.4.Note-se que, no caso, a Recorrente, não obstante ter sido notificada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 50.º do RGCO, não apresentou defesa, desperdiçando a possibilidade de trazer ao processo prova que infirmasse a situação económica que resultava da declaração que efetuara num outro processo contraordenacional nos termos da qual em 2016 apresentou resultados líquidos de €100.000,00 e que, pese embora as obras que vinha executando no Município de (...), daí não decorria que tivesse uma situação económica compatível com a realização dessas obras.

3.5.5.Não o tendo feito, a sua atitude posterior, não infirma a correção da ponderação efetuada quanto à situação económica da Recorrente, antes denota o contrário, sendo certo que o grau de certeza exigível para se dar como provada a matéria de facto relevante a este respeito é uma certeza denominada de histórico-empírica, ou seja, a reclamada pelas exigências práticas da vida. Deste modo, se em 2016 a Recorrente declarou que teve resultados líquidos de €100.000,00, se continuou a laborar, e se após essa data desenvolveu um conjunto de obras naquele Município, é porque, com toda a certeza, a sua situação económica assim o permitiu, donde poder concluir-se ser detentora, à data da decisão, de uma situação económica estável.
Por fim, sempre se dirá, que não é excessiva a coima de € 5.000,00 aplicada a uma pessoa coletiva que constrói um muro de suporte e de vedação, à margem da via pública, sem prévia licença de construção, atendendo a que o limite mínimo é de €1.500,00 e se está perante uma infração grave, sendo o montante aplicado próximo do limite mínimo.

Termos em que improcede o invocado fundamento de recurso.

b.2.4. quanto ao benefício económico retirado da prática da contraordenação

3.6. Por fim, a Recorrente impetra erro de julgamento à sentença recorrida por considerar que a mesma, ao confirmar a decisão proferida pelo Município de (...), avalizou uma errada avaliação do requisito do “benefício económico retirado pela prática da contraordenação”, na medida em que a Recorrente não retirou nenhuma vantagem da situação em apreço.

3.6.1. Também, sob este prisma, não assiste razão à Recorrente, como bem se discorreu na sentença recorrida.
Lê-se a este respeito, na sentença recorrida que “o Município limitou-se a constatar que não dispunha de dados no processo que lhe permitissem concluir sobre os benefícios económicos que a arguida/recorrente tivesse obtido na sua esfera patrimonial, com a prática da contraordenação; mas, pelo menos, sabe-se que o que poderá existir reside nas taxas municipais que pagará com a emissão do alvará, e que apenas serão apuradas nesse momento. Nada mais é dito além disto, e nem sequer se alcança como daqui se pode retirar qualquer consequência invalidante quanto ao montante da sanção. Não se trata de nenhuma ficção, mas apenas de constatar que o não pagamento das taxas municipais constitui um benefício económico decorrente de não ter sido solicitada a licença para a operação urbanística, ainda que o seu montante seja desconhecido, e assumindo que a recorrente alguma vez legalizará a situação em termos urbanísticos.
De resto, não deixa de ser intrigante que a recorrente venha imputar ao Município a circunstância de assentar uma sanção em considerações genéricas, muitas delas vazias de conteúdo e com cariz meramente eventual (quase que em total juízo de prognose), quando faz exatamente o mesmo, ou seja, não alega rigorosamente nada de concreto quanto à sua situação financeira atual, ou quanto despendeu, por exemplo, com a elaboração dos projetos e apresentação do pedido de licença, entre outras circunstâncias que seriam relevantes e suscetíveis de infirmar as considerações tecidas na fixação do montante da coima.”
Como bem se pondera ainda na sentença recorrida o montante aplicado de “€ 5.000,00 é manifestamente abaixo do expectável para o caso em concreto, e não cumpre minimamente com as exigências de prevenção especial positiva e negativa. Noutros termos, perante aquilo que se conhece e o que vem descrito na decisão punitiva sem que se encontre impugnado nessa parte, julga-se que o valor da coima é desproporcionado para menos.
De facto, é preciso notar que, segundo a decisão administrativa, que nessa parte não vem questionada, a aqui recorrente já foi condenada em pelo menos seis processos de contraordenação anteriores; em três deles foi admoestada (e já aqui muito al se aceita que o Município lhe tenha proporcionado a benesse de três admoestações...), noutros três foi condenada em coima (em cúmulo jurídico); além do processo no âmbito do qual foi proferida a decisão aqui impugnada, consta ainda que foi instaurado outro processo, sob o número 18/2019. Todos eles, segundo se lê, pela prática da mesma infração em discussão nestes autos.
Nos processos em que foi condenada, foi aplicado cúmulo jurídico, e a coima concreta foi fixada em € 4.000,00 – sempre segundo a decisão, na parte deixada incólume.
Perante isto, além de dever ter sido ponderada a reincidência, é de considerar que a recorrente é propensa à ilegalidade, pautando a sua conduta pela constante e consciente violação da lei. Perante o que, em nosso entender, jamais seria concebível que não se aplicasse coima de, no mínimo, € 8.000,00, sob pena de não se garantir qualquer prevenção especial, seja ela negativa (do ponto de vista da própria sanção) seja positiva (do ponto de vista da correção da conduta da recorrente).
Enfim, vale aqui o art.º 72.º-A, n.º 1, do RGCO; caso contrário, a coima a fixar à recorrente seria seguramente superior”.

3.6.2.No caso, não se apurou o montante correspondente à vantagem que o Recorrente retirou do facto de ter praticado a contraordenação de que foi acusado e punido. Contudo, não tem razão quando afirma que não retirou nenhuma vantagem, uma vez que, para além do referido na sentença recorrida, retirou desde logo a vantagem de dotar a sua propriedade de um muro de vedação e de suporte, construído à margem da via pública que, de outra forma, ainda não teria construído, com as vantagens que daí decorrem e que são as que o terão levado a arriscar a construção desse muro sem a competente licença de construção.
Em face do exposto, impera concluir que a Recorrente não tem razão quanto defende que na determinação da medida da pena não foram cumpridos os mais básicos ditames que se lhe impõe, nas várias vertentes que questiona, impondo-se confirmar a sentença recorrida.
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IV.DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
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Custas pelo recorrente – artigos 92º nº 1 e 94º nº 3 do RGCO (DL. nº 433/82), 513º do CPP (DL. nº 78/87) e 8º nºs 7, 8 e 9 do RCP (DL. nº 34/2008).
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Notifique.

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Porto, 05 de março de 2021.

Helena Ribeiro
Conceição Silvestre
Alexandra Alendouro